Congratulações ao Congresso Nacional pela
seriedade com que tratou e aprovou, em 2009, próximo da unanimidade, a volta da
obrigatoriedade do diploma de jornalismo! Foram 68 votos a 7 no primeiro turno
e 60 a 4 no segundo. Quando a Câmara dos Deputados der sua aprovação, dizíamos,
seremos jornalistas!
Nunca vamos dizer isso. A Câmara não aprovou. Deixou esse assunto quieto para sempre. Jamais receberemos a graça de exercer com reconhecimento nossa profissão apaixonante, a certeza de um país melhor e de lambujem reconquistarmos nossos direitos trabalhistas, porque não voltaremos a ter a profissão regulamentada.
Nunca vamos dizer isso. A Câmara não aprovou. Deixou esse assunto quieto para sempre. Jamais receberemos a graça de exercer com reconhecimento nossa profissão apaixonante, a certeza de um país melhor e de lambujem reconquistarmos nossos direitos trabalhistas, porque não voltaremos a ter a profissão regulamentada.
Desde a traumatizante decisão do Supremo Tribunal Federal que derrubou a obrigatoriedade, venho manifestando em prosa e verso meu tormento com aquela postura cavernosa do tribunal maior do país. Meus mais aflitivos lamentos em defesa da obrigatoriedade do diploma de jornalismo traduziram-se no envio do total de 600 cartas abertas, a cada um dos 80 senadores, 520 deputados federais e às Mesas Diretoras do Senado e da Câmara.
O momento de respirar fundo chegou com a correspondência da secretária-chefe da Mesa do Senado Federal, Cláudia Lyra Nascimento, informando que minha manifestação (Carta aberta ao Senado Federal) havia sido juntada ao processado da proposta de Emenda à Constituição nº 33, de 2009, que acrescenta o artigo 220 à Constituição Federal para dispor sobre a exigência do diploma de curso superior de comunicação social, habilitação jornalismo, para o exercício da profissão de jornalista. A matéria, encaminhada à Casa Revisora da Câmara dos Deputados, voltaria a tramitar no Senado Federal caso fosse aprovada alguma modificação de mérito. A Câmara emudeceu.
É chocante o descaso com que o profissional jornalista vem sendo tratado pelos defensores da não obrigatoriedade, à frente a Folha de S. Paulo --principalmente ela, que transformou em folclore a profissão de jornalista e em crendice popular a sua pregação de que, para ser jornalista, basta o cidadão ser minimamente alfabetizado.
Dois pontos de vista venho ressaltando nas minhas defesas da obrigatoriedade. Um, é que os patrões acabaram por restaurar impunemente o regime de escravidão no trabalho do jornalista. Dois, a não obrigatoriedade torna perpétua a escuridão cultural e política de 389 anos de exploração e de escravidão no país.
Quando deixei o Grupo Estado, faz 24 anos, o jornalista já não era registrado em carteira em mídia nenhuma. Em qualquer redação, 16 horas de trabalho por dia. Para ter emprego o profissional tinha de abrir firma própria, pagar impostos devidos a uma empresa comum, sem direito a férias, 13º, nem descanso semanal. Melhoria salarial, um pesadelo. Os dias de descanso eram determinados pelo patrão. Podiam ser no meio ou no fim da semana, e eram computados como férias. Trabalho de escravos, direitos de escravos.
De cambulhada, os patrões e seus cúmplices da empreitada arrasadora de dar sumiço a uma categoria profissional inteira, acabaram com a lei de imprensa, o que significa que se arrogam a tirania de injuriar, caluniar, ofender, impunemente. O auge da sufocação foi os opressores terem sepultado a regulamentação de uma profissão vital para a nação, exercida em cada quarteirão do país. A isso, regulamentação, seus comparsas chamam de corporativismo.
Para não dizer que não falou de flores, a Folha editou numa mesma página duas opiniões sobre o diploma de jornalismo. Uma, de seu dependente Clóvis Rossi, que garantiu um não, evidentemente. A outra, de um consagrado jornalista que equilibraria a balança dizendo sim, Jose Hamilton Ribeiro, 70 de profissão. O maior prejuízo da não obrigatoriedade recai sobre a Nação, disse José Hamilton Ribeiro.
O não de Clóvis Rossi é fundamentado em sua pregação de que o exercício do jornalismo depende apenas da conjugação de quatro verbos: ler, ouvir, ver e contar. Esse é a espécie do jornalista de cabresto ao gosto da Folha e seus assemelhados, sobressaltados com o diploma obrigatório e suas conseqüências para os seus encargos sociais, a principal delas é terem de respeitar as leis trabalhistas.
Que reinado feliz o deles, cercados de jornalistas arregimentados como seus escravos, inaptos para enxergar com nitidez a nação e o mundo, exercer e defender direitos. Horizontes esses discutidos e descortinados numa boa faculdade, sim senhores! Jornalistas a contento de um Frias Filho? Não, ponto e basta. Frias Filho, o próprio, que já havia balbuciado irresponsavelmente: em 15 dias eu faço um jornalista. Até parece!
A jornalista gaúcha Bianca Legasse coletou há alguns anos um punhado de mostrengos de expressão em jornais cariocas como O Globo, O Dia, Jornal do Brasil, Extra. Mostrou assim o quanto é rasteiro e ridículo o jornalismo sem escola:
- Apesar da meteorologia estar em greve, o tempo esfriou ontem intensamente.
- A nova terapia traz esperanças a todos os que morrem de câncer a cada ano.
- Os sete artistas compõem um trio de talento.
- A vítima foi estrangulada a golpes de facão.
- Os nossos leitores nos desculparão por esse erro indesculpável.
- No corredor do hospital psiquiátrico os doentes corriam como loucos.
- Ela contraiu a doença na época que ainda estava viva.
- Parece que ela foi morta pelo seu assassino.
- O acidente foi no triste e célebre Retângulo das Bermudas.
- O velho reformado, antes de apertar o pescoço da mulher até a morte, se suicidou.
- A polícia e a justiça são as duas mãos de um mesmo braço.
- Depois de algum tempo, a água corrente foi instalada no cemitério, para satisfação dos habitantes.
- O aumento do desemprego foi de 0% em novembro.
- O presidente de honra é um jovem septuagenário de 81 anos.
- Quatro hectares de trigo foram queimados. A princípio trata-se de um incêndio.
- Na chegada da polícia, o cadáver se encontrava rigorosamente imóvel.
- O cadáver foi encontrado morto dentro do carro.
- Prefeito de interior vai dormir bem e acorda morto.
Por Apollo Natali, que ingressara na imprensa antes do diploma de jornalista se tornar obrigatório e foi automaticamente isentado da nova exigência, à qual ficaram sujeitos apenas os iniciantes na profissão. Mesmo assim, depois de quase quatro décadas atuando nas redações, sentiu que havia uma lacuna em sua brilhante carreira e foi, sexagenário, fazer o curso de jornalismo, graduando-se com louvor aos 71 anos de idade.