terça-feira, 30 de maio de 2023

MADURO É A ESQUERDA IMATURA

 

Com o perdão do trocadilho óbvio do enunciado, a esquerda estatizante que tem se alicerçado nas relações capitalistas de mercado tem sido mau exemplo no curso da história bicentenária de luta contra o escravismo indireto do capitalismo republicano.  

A Venezuela juntamente com a Nicarágua não têm servido de bons exemplos de luta pela emancipação dos povos mundo afora, notadamente na América do Sul e Central.  

Repetem o figurino vivido pela Rússia e China, com a diferença que não possuírem a dimensão territorial e populacional das duas primeiras experiências de relações sociais pretensamente anticapitalistas de estado, e capacidade de sobreviverem intramuros.  

Ao conservar a forma política de governos fortes com fortes apoios milicianos-militares populistas, mantendo intactas as categorias capitalistas de modo de produção e circulação de mercadorias, terminarão até com maior brevidade, da mesma forma que as experiencias na Eurásia e Ásia daqueles países continentais que partiram de uma economia intramuros para o livre mercado sem nenhum pejo.  

Como se justificar a existência de grupamentos indígenas venezuelanos perambulando pelas ruas de várias cidades brasileiras a pedir esmolas como fugitivos de seu país de origem?! Nunca vi ninguém fugir de um lugar no qual reina a liberdade e a proteção social coletivas.  

A Venezuela pratica uma plutocracia capitalista de estado sustentada pela produção de petróleo de uma rica empresa estatal cujos dirigentes militares se privilegiam com tal gerenciamento e dão sustentação a um governo eleito sob a influência de minoritários grupos sociais privilegiados.  

Já passou da hora de os revolucionários anticapitalistas se rebelarem contra o uso das insígnias emancipacionistas históricas da estrela vermelha de cinco pontas e da foice o do martelo como luta dos trabalhadores da cidade e do campo como se tais governos representassem o ideal originário de combate à exploração da categoria capitalista trabalho abstrato representada pela mesma foice e martelo.  

Sempre houve uma certa confusão da simbologia da estrela vermelha de cinco pontas, justamente porque em vários momentos da história da luta contra a monarquia constitucional feudal, e contra o fascismo imperialista, juntaram-se republicanos, comunistas e até anarquistas numa frente ampla vermelha como se seus integrantes rezassem pela mesma cartilha.  

Na recente eleição presidencial brasileira vimos o que representa a polaridade entre o bem e o mal, de modo maniqueísta, como fato político que proporcionou o ajuntamento de A a Z da política em dois únicos lados e barcos pretensamente antagônicos.   

De Collor de Melo, Roberto Jefferson, banqueiros, empresários da Fiesp, Generais saudosos do regime de arbítrio, de um lado, a recém-convertidos ao projeto eleitoral lulista como Geraldo Alckmin, Aloísio Nunes, economistas neoliberais como Arminio Fraga, Pérsio Arida, Mônica de Bolle, políticos como Simone Tebet, empresários como Tasso Jereissati, entre tantos outros.  

A polarização política é em si conservadora do decadente status quo vigente porque anula o pensar; faz com que o medo de péssimo justifique a aceitação do ruim.  

Os republicanos burgueses, também chamados de conservadores - ou liberais, como nos Estados Unidos - sempre se opuseram aos comunistas marxista-leninistas, que por sua vez perseguiram os anarquistas.  

Entretanto, todos usaram as insígnias representativas de seus corolários ideológicos com simbologias similares que confundem conceitualmente quem as procura entender.  

A estrela vermelha de cinco pontas, numa leitura mais recente, passou a significar em cada uma destas pontas  

- (i) a defesa da juventude;  

- (ii) os militares para a defesa contrarrevolucionária;  

- (iii) o trabalhador do campo;  

- (iv) o trabalhador da cidade;  

- (v) a intelligentsia.  

O que se pode inferir de tudo isto é que as variações político-governamentais se assentam sobre uma mesma base: o modo de produção de mercadorias a partir do trabalho abstrato produtor de valor e todos os acessórios mercadológicos e institucionais no seu entorno, com os aperfeiçoamentos históricos a dar forma a uma imperfeição original.  

Por que todos endeusaram - até o titio Adolfo o fez - o trabalho abstrato produtor de valor e de mais-valia?!

Por que todos defendem a verticalidade do exercício do poder político?! 

Por que todos precisam de uma força militar e seus gastos bélicos exorbitantes e pagos por uma população cada vez mais exaurida economicamente, seja pela extração de mais-valia própria à produção de mercadorias a partir da mercadoria trabalho abstrato, e pela cobrança de impostos?! 

Por que prendem ou segregam socialmente quem elabora o pensamento crítico revolucionário fora da caixa, como se estes fossem uns chatos a clamar no deserto?! 

 Mas apesar de toda diferenciação cosmética dos projetos políticos, é por suas similaridades intrínsecas que eles se desgastam perante a população num processo pendular cíclico eleitoral ou ditatorial que agora está chegando ao ponto de inflexão irreversível: a contradição irremediável entre forma e conteúdo

As categorias capitalistas, antes de serem positivadas como o fazem todos os projetos políticos de governo, precisam ser negadas peremptoriamente, como modo de superarmos a fome, o retrocesso civilizatório, além dos impasses perigosos que nos rodeiam, tais como a guerra nuclear e o aquecimento global, 

O modo da produção capitalista estatal ou privado, ou ainda, híbrido nas duas formas, atingiu o seu limite existencial de capacidade de expansão pelos seus próprios fundamentos, impondo uma realidade de produção coletiva voltada para a satisfação das necessidades coletivas e de modo ecologicamente sustentável.  

Entretanto, tal modo de produção é incompatível com a existência de um estado cobrador de impostos aos cidadãos que sustenta tudo e a todos; dos poderes institucionais e forças militares à infraestrutura de produção capitalista - estradas, portos, energia, abastecimento de água, etc. -, razão pela qual nenhum dos atores políticos aceitam a transformação radical representada por um novo modo de produção social sem a intromissão indevida do valor, que não participa como nenhuma das substancias químicas existentes nos objetos  e serviços úteis e indispensáveis à existência humana.   

Como Lula e Maduro, que defendem as boas relações políticas entre governantes sul-americanos podem negar a política, se é nela e por ela que existem?!

Há quem considere a política como um gênero ontológico de relações sociais do qual as formas criadas são espécies a serem aperfeiçoadas. Que me perdoe o mestre Bertold Brecht, a quem muitas vezes recorro, mas o analfabeto político é aquele que acredita na política como se ela tivesse o condão de tudo resolver.  

Lula recentemente afirmou que só na política e pela política se pode resolver os problemas sociais, razão pela qual ele defende a negociação política exaustiva com seus atores para a solução de problemas que fogem do alcance dessa, como o é a equação irresolúvel das contradições capitalistas que ele quer preservar quando fala em retomada do desenvolvimento econômico.  

Caso se queira emprestar ao termo política o sentido de uma sinonímia com o ato de pensar e agir socialmente, como todos a tem definido, o que seria já um enquadramento restritivo do significado desta última emanação do intelecto humano, deveríamos admitir política apenas como a negação dela própria, e subvertemos o enquadramento na camisa de força por ela representado atualmente. 

Maduro e Lula jogam um jogo no qual os dois sairão derrotados ao final da partida, desgastados tal como jogadores de dois times que empataram e não poderiam empatar sob pena de serem eliminados.  

Precisamos mesmo de um pensar que quebre o ovo, como fez Colombo diante do impasse de colocá-lo em pé.  (por Dalton Rosado) 


segunda-feira, 29 de maio de 2023

MARCHAMOS PARA O ABISMO E TALVEZ SEJA A ÚLTIMA CHANCE PARA CORRIGIRMOS O RUMO

Poder do Lula encolhe à medida que o de Lira cresce
P
erseguindo obsessivamente um projeto de poder pessoal, Lula tanto fez, o tempo todo, para evitar que um candidato de esquerda com menor rejeição e ideias atualizadas tomasse seu lugar na eleição presidencial de 2022 que conseguiu. Agora está colhendo o que plantou.

Mesmo surfando na rejeição ainda maior do palhaço exterminador de pobres, idosos e índios, pior presidente brasileiro de todos os tempos, Lula só obteve uma vitória minguada, na bacia das almas (ainda que não houvesse a sabotagem nas rodovias, dificilmente teria alcançado sequer quatro pontos percentuais de vantagem, ou seja 52% x 48% dos votos válidos).

O certo é que nem de longe o PT e a esquerda emasculada que ele avassalou constituem hoje a força política majoritária do país. E se mostram impotentes para evitar que duas das poucas pastas com iniciativas corretas e necessárias do Governo Lula sejam esvaziadas pelo Congresso Nacional: as do Meio Ambiente e dos Povos Indígenas. 

Para piorar, tudo leva a crer que isto seja apenas o começo. Neste final de maio, só não vê quem não quer: Arthur Lira é o presidente de fato do Brasil, enquanto o estupefato Lula parece conformar-se com o papel de rainha da Inglaterra, desde que o deixem brincar com irrelevâncias como a de ser o patrono do transporte individual num momento em que até as pedras da rua sabem que a priorização absoluta do transporte coletivo (acrescida de outras medidas, como a mudança da matriz energética) é imperativa para salvar a humanidade da extinção.
"Faz lembrar o Jânio Quadros não
sabendo para que lado ir em 1961"

Faz lembrar o Jânio Quadros aparvalhado de 1961, não sabendo para que lado ir, muito menos como lidar com um Congresso majoritariamente oposicionista. Ambos, aliás, evitaram reconhecer o real motivo de suas dificuldades para governar, o homem da vassoura atribuindo-as às forças ocultas e o imperador do PT à taxa básica de juros e outras desconversas.  

Coube ao veterano analista Ricardo Kotscho apontar o verdadeiro motivo (vide aqui): então como agora, quem deita e rola no Congresso Nacional são as forças do atraso, pois na democracia burguesa quem dá as cartas é o poder econômico. Então, p. ex., a bancada ruralista já detém 251 dos 513 deputados federais e 31 dos 81 senadores. 
"Donos de terra, gado e gente sempre tiveram forte poder no parlamento brasileiro desde o Império, mesmo com a progressiva industrialização e urbanização do país após a 2ª Guerra Mundial. Correndo em raia própria ou aliados às bancadas da Bíblia, do boi e da bala, os chamados ruralistas estão sempre na linha de frente do ataque aos direitos socioambientais em geral e aos avanços civilizatórios", ensinou o mestre Kotscho.
Resumo da ópera:
— ou o Lula  arrasta seu mandato até o fim sem poder real, posando de estadista lá fora e deixando suas políticas serem desfiguradas pelo centrão aqui dentro;
— ou tenta radicalizar como fizeram, cada um à sua maneira, Jânio e Jango, mas, como a correlação de forças lhe será tão desfavorável quanto era àqueles antecessores, vai acabar sendo deposto.

De um jeito de outro a esquerda brasileira perderá, seja dando sustentação a um mero serviçal dos donos do PIB, seja acompanhando-o numa guerra impossível de vencer e sofrendo depois a caça às bruxas que os direitistas vitoriosos sempre desencadeiam.

Então, o  racional a fazer seria desencanarmos de uma vez por todas do reformismo lulista e passarmos a construir uma esquerda de verdade, que mire a superação do capitalismo e não a obtenção de migalhas de poder dentro do regime de exploração do homem pelo homem.

Cai como uma luva para nós a frase celebre do dirigente esportivo Carlos Dittborn, quando um terremoto destruiu a infraestrutura com que o Chile contava para sediar o Mundial da Fifa de 1962: "Porque nada tenemos, lo haremos todo"

De resto, escrevo isto na esperança de ser desta vez escutado pelos companheiros de esquerda que dispõem dos meios que me faltam para colocar em ampla discussão o imperativo de tal guinada.
Dilma insistiu em cumprir o roteiro do impeachment até
o mais amargo fim, enquanto a direita acumulava forças

Repete-se a situação de 17/04/2016, aquele agourento domingo em que a Câmara Federal autorizou a abertura do processo de impeachment contra Dilma Rousseff. 

De bate-pronto eu alertei que, transposta a barreira mais difícil (era necessária a anuência de dois terços dos deputados), todas as demais, que requeriam maioria simples, seriam igualmente superadas.

Então, argumentei, a Dilma deveria renunciar imediatamente, pois se persistisse tentando evitar o inevitável até o mais amargo fim, a direita acumularia cada vez mais forças durante todo esse processo. 

Já se fosse encerrado o seu governo moribundo e se iniciasse imediatamente um movimento contra a posse do impopular Michel Temer, na linha das diretas-já, retomaríamos a ofensiva, colocando o inimigo na defesa.

Clamei no deserto, a Dilma perdeu mesmo todas as batalhas e a ultradireita, dando sucessivas demonstrações de força nas manifestações de rua, ganhou musculatura para tornar presidente um farsante crapuloso do baixo clero.

A autocrítica que a esquerda sempre fez nas grandes derrotas, mas deixou de fazer em 2016 e 2018 com as consequências desastrosas que todos conhecemos, terá de ser feita o quanto antes. Marchamos para o abismo e talvez ´seja a última chance para corrigirmos o rumo.
(por Celso Lungaretti)  

sábado, 27 de maio de 2023

O DESAGRAVO ESPANHOL A VINI JR. MUDARÁ ALGO NOS ESTÁDIOS? XAVI HERNÁNDEZ CRÊ NUMA MELHORA. PEP GUARDIOLA DUVIDA

"La Liga deveria aprender com a Premier League. Aqui [na Inglaterra] eles são muitos rígidos com isso, sabem o que precisa ser feito. 

O racismo é um problema do mundo inteiro, não de um lugar específico. Esta pode ser uma grande oportunidade para a Espanha dar um passo à frente. 

Mas, conhecendo como as coisas funcionam lá [na Espanha], não estou otimista. Vamos torcer para que a Justiça faça o que é certo [...] Mas, permita-me, isso não vai mudar nada na Espanha..." (Joseph Pep Guardiola, o melhor técnico do mundo neste século, tendo treinado o Barcelona entre 2007 e 2012, se transferido para o Bayern de Munique em 2013 e para o Manchester City em 2016)

"
Eu discordo [de Pep Guardiola]. Acho que é uma questão educacional. Você tem que educar as pessoas. O insulto não é normal e você tem que mudar as coisas" (Xavi Hernández, que foi meio-campista titular do Barcelona entre 1998 e 2015, jogador e depois treinador do All-Sadd do Catar de 2015 e 2021, tendo então voltado para a Espanha como técnico do Barcelona)  

Duas opiniões pra lá de respeitáveis no planeta bola
— a do técnico que revolucionou o futebol mundial e 
— a de um integrante daquele fantástico meio-de-campo com Messi e Iniesta, chamado para reconstruir o Barcelona depois de uma terrível crise financeira que arrastou consigo o time de futebol. 

Nesta sua nova fase, agora no banco de técnico, Xavi acaba de conquistar o primeiro título realmente importante do Barça desde sua debacle, o campeonato espanhol de 2022/2023.

Minha opinião? É a de que cada um tem um tanto de razão. 

O fator esquecido por quase todos os comentaristas esportivos é o de que não são  necessariamente racistas os torcedores que vaiam Vinícius Jr. quando seus times recebem a visita do Real Madrid.
Uma parte deles  decerto quer apenas desestabilizar emocionalmente o principal adversário, ao berrar ou gesticulando o insulto que mais possa servir para tirar o craque do sério. Com este tipo de torcedor, um incremento da educação pode, sim, funcionar.

Mas está certo o Guardiola quanto a existirem racistas/fascistas empedernidos na Espanha, que não vão mudar de jeito nenhum. Afinal, o sanguinário ditador Francisco Franco não permaneceu no poder de 1936 a 1975 apenas à custa do temor que suas forças repressivas inspiravam. Uma parte da população, reacionária e extremadamente católica, concordava com ele.

E são essas viúvas do Franco devem estar puxando as vaias e gritaria contra o Vini. (por Celso Lungaretti)

O FUTURO VAI REPETINDO O PASSADO

Para além disso, a reorganização econômica do Brasil para um regime agromineral-extrativista segue em frente. Bolsonaro foi o representante mais bem acabado desta nova lógica porque ele simplesmente a colocava sem peias, sem duplo discurso e sem qualquer tipo de vergonha. Lula retorna para dar um verniz civilizado para esta nova lógica, mantendo-a, mas com uma capa racionalista.

Nisto reside outro ponto débil com potencial para engolir o novo presidente, pois quanto mais avança a nova matriz econômica, mais fortes ficam as forças do atraso e, correlatamente, sua expressão política no Brasil, o bolsonarismo. 

A precarização das relações de trabalho, a flexibilização das leis ambientais, a dilapidação da indústria e das empresas públicas, a crise urbana com a explosão da violência, tudo isso fortalece o tripé reacionário do agronegócio, igrejas evangélicas e militarismo. Terá Lula condições de mexer no nervo disto e reverter as condições regressivas no Brasil? Eu diria que não

Não apenas o agora presidente eleito ajudou neste processo quando de suas passagens pelo governo federal, como também está hoje afiançado de modo íntimo com os grandes capitalistas brasileiros que almejam justamente o avanço do dito cujo, embora, como dito, num ritmo menos irascível. Seria preciso romper e radicalizar à esquerda, mas isto seria dissolver o grande pacto e recolocar a luta de classes noutro nível. 

Então, o futuro se prenuncia tenebroso. A extrema-direita seguirá mobilizada e o novo governo, centrado no passado e acreditando ser possível uma conciliação já caducada, aprofundando o modelo de espoliação do pais, estará muito em breve em face de uma profunda impopularidade e frustração. Neste momento, o pior poderá acontecer e os derrotados de hoje talvez voltem reenergizados. 

Não há saída além da mobilização popular e do avanço de transformações efetivamente positivas para o Brasil, rompendo com o modelo extrativista e democratizando de fato a vida social. 

Mas, é provável que isto talvez esteja para além da capacidade de Lula. 

Este texto foi escrito por mim em 31 de outubro de 2022, dia seguinte à vitória de Lula no segundo turno da eleição para presidente. Passados quase oito meses e com quase seis de governo Lula 3 é possível afirmar a justeza dessas palavras. Pior, o governo dá sinais claros de dissolução acelerada, colocando por terra seus principais trunfos na proteção ambiental e indígena

Não poderia ser diferente, pois, ao contrário de 2003, hoje é impossível a existência da conciliação de classes dado contexto de crise capitalista acelerada e o profundo processo de mudança da base econômica do país para o neoextrativismo. Não é possível agradar ao mesmo tempo, o agro e os índios, o agro e os ambientalistas, banqueiros e trabalhadores, comerciantes e trabalhadores. Claramente é necessário tomar um lado e Lula 3 não vacila em se assumir em favor dos capitalistas, jogando o povo comum aos leões. 

Até quando se sustentará a popularidade lulista baseado nas reminiscências do passado é algo difícil de calcular. Mas o trem está descarrilhando de forma clara. (por David Emanuel Coelho) 



sexta-feira, 26 de maio de 2023

RACISMO CONTRA VINICIUS JÚNIOR EXPÕE PROPLEMA GRAVE NA SOCIEDADE ESPANHOLA

 

Milhares de torcedores num estádio cheio repetindo a altos brados, durante 70 minutos, xingamentos contra um jogador de futebol, por ser negro, equivalem a um linchamento. Inacreditável não ter havido uma suspensão definitiva do jogo com sua anulação ou a decisão de transferir a partida para outra data sem público. As declarações ou constrições posteriores pronunciadas e divulgadas pelo governo espanhol, diante da vergonhosa imagem exposta do país por esse escândalo mundial de racismo coletivo num estádio de futebol, chegam um tanto tarde.

O que esperavam a Liga Espanhola de Futebol, as instâncias esportivas do pais, o ministro de esportes, o governo espanhol no seu todo para intervir, já que não foi essa a primeira vez? A FIFA e a UEFA só interferem no caso de haver vítimas fatais, ou desconhecem ser o racismo um crime punido pela maioria dos países e, quem sabe, mesmo pela totalidade dos países europeus, sem se esquecer da ONU e dos órgãos internacionais de defesa dos direitos humanos?

E os patrocinadores dos clubes espanhóis toleram esse clima de arena, consideram normal a excitação lúdica racista para a promoção de seus produtos comerciáveis?

Haveria essa reação mundial sem a denúncia da imprensa? Talvez não, essa não foi a primeira vez que Vinícius Júnior foi alvo de racistas. Mas os dirigentes do futebol espanhol preferiam fechar os olhos… Uma mostra: o árbitro Ricardo de Burgos Bengoecheado, 37 anos, no encontro Real Madrid com Valência, registrou apenas um caso de torcedor chamando Vinícius de macaco, tendo interrompido o jogo por oito minutos por incidente racista. Na sequência, Vini Jr. acabou sendo expulso e sujeito a não participar nos próximos jogos do Real Madrid. Seria o caso da vítima ser punida?

Gianni Infantino, presidente da FIFA, diante das repercussões da crise criada, afirmou já existir um procedimento específico para se aplicar no caso de racismo durante o jogo. Deve ser suspensa a partida, os jogadores se retiram e se faz um anúncio no estádio informando que, se prosseguirem os insultos racistas, o jogo será suspenso e a vitória com seus três pontos será atribuída ao clube do jogador ou jogadores alvos de racismo. Infantino não disse por que esse procedimento ainda não é obrigatório, mas afirmou que deveria ser adotado por todos os países. E por que ainda não foi?

Por sua vez, embora também tardiamente, Luis Rubiales, presidente da Federação Real Espanhola de Futebol, reconheceu haver um problema de comportamento, de educação e de racismo no país, confessando-se consternado por atos que devem ser erradicados. O comitê de competição da Federação, dirigido por Rubiales, tem poderes para fechar tribunas, estádios e convocar uma Comissão governamental contra a violência, xenofobia e racismo nos esportes. Não se entende por que essa comissão ainda não foi convocada.

Não se pode esquecer estar uma parte do racismo espanhol ligada diretamente à extrema-direita fascista, vinda do antigo movimento fascista Fuerza Nueva, dentro da qual se destaca o partido Vox, ultraconservador ultranacionalista, militarista, racista, clerical, pró-imperialista, antifeminista e neoliberal. Partido que conta com o apoio do presidente de La Liga, Javier Tebas Medrano.

Essa crise do racismo espanhol no futebol lembra o velho franquismo e sua longa existência na Europa, mais longa que o salazarismo, como uma perniciosa doença cujas raízes permanecem vivas e, vez ou outra, afloram.

Esse cheiro do enxofre nazista não ficou restrito, na semana, ao episódio vergonhoso do racismo na Espanha. A pretexto de fazer um elogio familiar citando a atual guerra da Ucrânia contra a Rússia, o deputado federal Paulo Bilynskyj, do PL bolsonarista, citou o avô Bohdan Bilynskyj. Seu avô teria sido um herói por ter lutado aos 20 anos contra os comunistas soviéticos numa guerra mundial.

Ora, o deputado que era delegado, portanto deve ter feito curso universitário em Direito, deve saber que, na época do seu avô, havia uma guerra mundial dos aliados EUA, Inglaterra e União Soviética contra a Alemanha nazista. E que lutar contra os comunistas soviéticos equivalia a lutar com os nazistas de Adolf Hitler.

E que a 14.ª Divisão de Granadeiros da Waffen-SS Galizien, à qual pertencia seu venerado avô, era uma divisão nazista de ucranianos comandada por oficiais alemães. E que ao fazer o elogio póstumo do avô, emigrado ao Brasil em 1948, três anos depois do fim da Segunda Guerra Mundial, fez também o elogio da Waffen-SS e não dos ucranianos que hoje lutam contra a Rússia. Qualquer dúvida, perguntem ao Zelenski. (por Rui Martins

quinta-feira, 25 de maio de 2023

HAJA QUEIJO PARA TANTO RATO!

"A arapuca está armada/ e não adianta de fora protestar:/ quando se quer entrar num buraco de rato,/ de rato você tem que transar..."
 

Parece que a Marina Silva (vide aqui) desconhece esta pérola do Raulzito na canção As aventuras de Raul Seixas na cidade de Thor. Então, ela voltou a entrar no mesmíssimo buraco de rato do qual saiu esbravejando 15 anos atrás. 

Talvez não tenha percebido direito onde estava entrando, pois o visual mudou muito de 2008 para cá, à medida que mais e mais roedores foram chegando. Tratou-se de uma verdadeira infestação.

Agora o
centrão inteiro o frequenta, tendo se tornado, no mínimo, seu segundo buraco. Ou mesmo o buraco principal, até porque o Lula lhe entregou as chaves do ninho e recolheu-se a um cantinho, para não incomodar os que realmente mandam.

Haja queijo para tanto rato! 

E se de ratazana decidisse transar, a Marina perderia toda e qualquer credibilidade. Noblesse oblige, vai ter de abandonar pela segunda vez as más companhias. 

Magra como sempre foi, ela deve conseguir passar bem privando-se do queijo do poder. 

Ainda mais quando, como neste caso, se trata de um Limburger, o queijo mais fedido do mundo. (por Celso Lungaretti)

quarta-feira, 24 de maio de 2023

MAIS UMA VEZ LULA VAI COZINHANDO A AUTORIDADE DE MARINA SILVA

 

Lula deixou impressões digitais na artilharia contra Marina Silva. Com autorização do chefe, o Planalto deu aval ao Congresso para desidratar o Ministério do Meio Ambiente. Na briga pela exploração de petróleo na foz do rio Amazonas, o presidente ofereceu sobrevida a um projeto que a ministra trabalhava para enterrar.

O petista entrega alguns anéis de Marina para preservar outras áreas. Na negociação da medida provisória que muda a estrutura do governo, Lula aceitou que a Câmara tirasse da ministra a Agência Nacional de Águas e o Cadastro Ambiental Rural.

Sem força suficiente para enfrentar uma investida de deputados por mais influência no governo, o Planalto rifou parte do Ministério do Meio Ambiente. A capitulação foi assinada na segunda (22) durante um jantar do relator da MP com os ministros Alexandre Padilha e Rui Costa. Este último negociou a preservação de seu próprio poder da Casa Civil.

A cúpula do governo também atropelou o esforço de Marina para bloquear de vez a extração de petróleo no litoral norte. Lula deu uma segunda chance à Petrobras ao questionar os riscos ambientais e determinar que os estudos fossem refeitos.

Em Lula 2, o passado venceu. Lula 3 vai
no mesmo caminho. 
Na terça (23), Marina deixou uma reunião no Planalto com a sentença de que a decisão do Ibama contra a exploração seria "cumprida e respeitada". Na manhã seguinte, a Petrobras seguiu o incentivo de Lula e anunciou que insistiria no projeto.

A ministra reconheceu o golpe e denunciou o fogo amigo. Primeiro, comparou os planos da Petrobras a uma profanação. Depois, disse que tirar atribuições de seu ministério seria o mesmo que "implementar o governo Bolsonaro no governo Lula".

Na prática, Marina enfrenta uma guerra fria com o presidente. Lula prometeu à ministra influência sobre diversas áreas e extraiu dividendos da importância dada à agenda ambiental. Agora, ele usa batalhas internas para emitir sinais de que Marina não tem autoridade absoluta. A ministra, em poucas palavras, usa como arma o perigo da saída precoce de um símbolo do governo. (por Bruno Boghossian na Folha de São Paulo) 

COMENTÁRIO DO EDITOR: Já dizia um ditado: "se me enganam uma vez, vergonha para você. Se me enganam duas vezes, vergonha para mim"

Belo Monte: desastre total!
No segundo mandato de Lula, Marina abandonou o governo ao ser derrotada por Dilma na batalha por Belo Monte. O projeto havia sido embargado pelos órgãos ambientais, diante do altíssimo custo social e ambiental e do quase nulo ganho energético. Após 15 anos e quase uma década de funcionamento da referida Usina Hidrelétrica, os acontecimentos provaram o acerto de Marina, com o fracasso retumbante da finada Dilma e seu neodesenvolvimentismo aloprado, além da destruição da região em torno de Belo Monte, com o colapso do Rio Xingu, a explosão de violência em Altamira e, sobretudo, com a usina produzindo quase nada de energia. 

Agora, a história se repete enquanto farsa, para não deixar de repetir o lugar comum, com Lula jogando Marina aos leões do latifúndio - eufemisticamente tratado pelo nome de Agronegócio - e dando sinais de que irá, mais uma vez, atropelar as decisões de órgãos ambientais para tirar petróleo na boca da Floresta Amazônica. Pior para o presidente, que, no auge de sua megalomania e narcisismo, ainda acredita ser o grande e inquestionável líder de 20 anos atrás e não um capenga anão cuja vitória eleitoral se deu na bacia das almas. 

Marina hoje é um dos grandes escudos de Lula no exterior devido à áurea de defesa ambiental associada a ela. O outro é seu anteparo diante da extrema-direita tupiniquim, cujo enfraquecimento é de interesse dos neoliberais nos EUA e na Europa para fazer frente à suas próprias forças extremistas domésticas. Perdendo Marina, contudo, Lula 3 ficará sem um dos pilares, com um desgaste junto à opinião pública estrangeira irremediável. 

Mais uma vez Lula pode ser engolido por sua própria prepotência. (por David Emanuel Coelho) 

terça-feira, 23 de maio de 2023

NA ERA DOS OLIGOPÓLIOS, O EMPREENDEDORISMO É A IDEOLOGIA DECADENTE DE UM MUNDO DECADENTE

 

O capitalismo do século XXI é marcado pela falta de oportunidades e pela oligopolização da economia, com o predomínio de pouquíssimas empresas e a concentração da riqueza global nas mãos de um punhado de bilionários. Para a maioria esmagadora da humanidade resta apenas a precariedade e a ausência de futuro. Não é acidental, portanto, que a ideologia do empreendedorismo tenha surgido neste período enquanto contraface perversa de um mundo perverso. 

O empreendedorismo prega o potencial de cada indivíduo em ser patrão de si mesmo. Assim, já traz em seu seio a ideia da dominação e da naturalização da classe capitalista, pois mesmo o sujeito possuindo  autonomia, ele ainda estaria em uma dinâmica de exploração, no caso explorando a si mesmo e, de fato, tal ideia de auto exploração é perfeitamente cabível quando se sabe, a partir de pesquisas, que a maioria dos chamados empreendedores possui altíssimas jornadas de trabalho, praticamente nunca tirando férias, e sacrificam o próprio bem estar em nome de débeis lucros. 

No entanto, quando se desce ao detalhe das relações econômicas dos tais empreendedores, é visível a mentira da suposta autonomia destes indivíduos. Em sua maioria esmagadora são trabalhadores precarizados ou pequeno empresários subordinados a empresas maiores, as chamadas franquias. A propaganda vende a ideia de que estariam em pé de igualdade com os grandes capitalistas do globo, fazendo livremente seus próprios horários e não tendo de prestar contas a ninguém. Na realidade, se subordinam a relações econômicas draconianas, sendo obrigados a repassar grande parte de seus ganhos às corporações na forma de royalties, aluguéis e taxas, nada mais distante do ideal do burguês senhor de si mesmo. 

E isso está bem acomodado às relações oligopólicas do capitalismo contemporâneo, com terceirizações infinitas e subcontratações que ramificam toda a cadeia produtiva e de circulação das mercadorias em uma complexa estrutura centralizada em um núcleo duro de pouquíssimas mega corporações. Nesse cenário, a ideologia do empreendedorismo acaba servindo como justificativa bem elaborada para a super exploração na base da pirâmide social, dando ao indivíduo a ilusão de que ele é livre, não está sujeito a nenhum controle ou coação porque não possuí relação tradicional de subordinação econômica.

 Ou seja, o fato de ele não ser um assalariado comum, não respondendo a um patrão convencional, cria em sua consciência a falsa concepção de autonomia, de estar em pé de igualdade com os grandes capitalistas, quando, concretamente, está de todo subordinado aos ditames das mega corporações, trabalhando para elas e por elas.  

Muito pior é a situação de quem sequer consegue se encaixar dentro da lógica de subordinação às corporações e parte para atividades antes designadas como bico, mas hoje chamadas orwelianamente de empreendedorismo. Essas pessoas ficam completamente à margem do processo econômico regular e mal conseguem o suficiente para a sobrevivência. No caso, a ideologia do empreendedorismo as leva a acreditar que sua batalha diária pela sobrevivência as transforma em capitalistas, também patrões de si mesmas, quando apenas estão dentro de uma massa de indivíduos inabsorvíveis pelo capitalismo. 

Inclusive, esse grupo em específico é cada vez mais numeroso devido às mudanças tecnológicas do sistema produtivo e de circulação, com o fechamento de postos de trabalho mesmo no setor de serviços. Em um país economicamente débil igual o Brasil, com sua base produtiva limitada ao neoextrativismo, tais fatores disruptivos tendem a agravar o quadro, criando milhões e milhões de indivíduos sem qualquer função econômica, elemento certo para a desestabilização política e possíveis explosões sociais. A ideologia empreendedorista serve como uma tentativa de anteparo a isso. 

Ideia decadente de uma sociedade decadente, simples escarro da antiga concepção do self made man - que tinha lá sua verdade na época clássica do capitalismo liberal do século XIX -, o empreendedorismo é mais uma forma de justificar a exploração humana e a barbárie do capitalismo em sua fase agônica. (por David Emanuel Coelho) 



segunda-feira, 22 de maio de 2023

DISCURSO DE LULA NO G7 É MAIS DO MESMO

 Recebi de amigos lulistas a dica para ler o discurso de Lula no G7. Dois os amigos que entusiasmados me pediram para lê-lo por considerarem tal arrazoado e peroração de uma importância transcendental.  

Li atento e lamento informar a estes diletos amigos ter sido apenas mais do mesmo do que conheço do Lula, mesmo considerando que teria sido importante o convite dos países ricos para um representante de um país explorado, pobre em riqueza abstrata, mas rico em riqueza material e de dimensão continental, poder se sentar à mesa dos exploradores, caso tal oportunidade fosse corretamente utilizada.  

Lula é um representante da socialdemocracia politicista tradicional e que não apenas por sua origem de sindicalista e operário mutilado em serviço, mas por usar as insígnias simbólicas da esquerda, situa-se mais à esquerda dos que ali são seus parceiros predominantes no campo político democrático burguês.  

Evoca a singularidade de operário com ascensão ao poder burguês do Estado pelo voto, e isso agrada aos postulados da democracia burguesa no seu desiderato de querer passar a ideia de que o voto e a alternância burguesa no poder político é factível às classes menos favorecidas. 

Entretanto, é preciso esclarecer que o poder político burguês, mesmo nas mãos de um operário sindicalista fundador e presidente de um partido trabalhista na socialdemocracia, é essencialmente um poder burguês defendido pelos que detêm a hegemonia econômica de cúpula mundial assentados naquela cimeira e que ora se encontram perplexos diante da inviabilidade da forma e conteúdo essencial do modo de relação social que defendem e praticam. 

Eles adoram a simbologia de um governante originário das classes sociais inferiores à serviço. 

Lula começa dizendo que desde a última sua participação - sendo esta sua sétima- no encontro do G7, como convidado, o mundo vivia uma "crise financeira global de proporções catastróficas". Confesso que gostei que tenha reconhecido a dimensão catastrófica da crise do sub-prime de 2008/2009, à época considerada por ele equivocadamente como marolinha.  

Entretanto, continua seu discurso dizendo que o "ímpeto informador daquele momento foi insuficiente para corrigir os excessos da desregulação dos mercados e do estado mínimo". Lula defende um Estado forte como contraponto ao neoliberalismo desde que os patrões privados e o patrão estado continuem existindo.  

A socialdemocracia burguesa estatizante se contrapõe ao neoliberalismo apenas no campo das formas políticas de gerenciamento estatal em favor do capital, e isso não pode se constituir como uma dicotomia séria, de conteúdo essencial, porque não ataca as causas de debacle mundial ora existente e que desde sempre segregou as populações exploradas pela extração de mais-valia junto ao operariado que Lula quer representar.  

Continua o seu discurso afirmando que "a arquitetura financeira global mudou pouco e as bases de uma nova governança econômica não foram lançadas".  

Aqui Lula reclama e demonstra claramente que acredita no poder político estatal burguês de estabelecer uma nova governança econômica, desconhecendo - por ignorância ou oportunismo político? - a natureza da lógica funcional do capital que está falindo por conta de suas próprias contradições internas, e não porque esteja necessitando de correção de rumos político-administrativas.  


    
Lula deseja que os seus pares do G7 façam uma correção de rumos do tipo vão-se os anéis para que os dedos sejam conservados. Quer que os ricos sejam conscientes na sua exploração econômico-financeira e sejam racionais na predação ecológica que praticam mudando de comportamento. Algo assim como querer que o capeta se converta ao cristianismo.  

Continua a sua pregação afirmando que "por conta da falta de regulamentação correta e estímulos houve um enfraquecimento do sistema multilateral de comércio. O protecionismo dos países ricos ganhou força e a Organização Mundial de Comércio permanece paralisada. Ninguém se recorda da Rodada do Desenvolvimento".  

Lula sempre volta ao desejo de retomada do desenvolvimento econômico como todos os capitalistas pretendem, mais parecendo um sindicalista a querer ensinar aos patrões como devem administrar os seus lucros, e de modo a que a boa administração venha a beneficiar a todos, patrões e trabalhadores por ele explorados pela via da partilha conscienciosa do butim capitalista como se isto fosse possível.  

Continua dizendo que “a crise se deve a questões circunstanciais sobrepostas como a covid19; mudança de clima; tensões políticas decorrentes de uma guerra no coração da Europa; pressões sobre a segurança alimentar e energética; e ameaça à democracia”

Aqui ele inverte a análise sobre causa e feito. A crise mundial do capitalismo não decorre destes fatores, mas são estes fenômenos que ele admite existir, e existem, que são a consequência decorrente de uma forma de relação social que atingiu o seu limite existencial e ameaça a vida que ele diz defender.  

Tais fenômenos não são causa, mas efeitos decorrentes de uma causa original que precisa ser superada: o modo de produção de mercadorias e tudo que a ele se incorpora. Maior produção de mercadorias como quer Lula, agora já impossíveis de serem plenamente alavancadas graças às contradições dos fundamentos capitalistas que provocam o emperramento da lógica funcional da máquina capitalista, somente prolongaria a vida do que sempre foi ruim e que ora se tornou insuportável.  

Após conclui que “o sistema financeiro global tem que estar a serviço da produção, do trabalho e do emprego. Só teremos um crescimento sustentável de verdade direcionando esforços e recursos em prol da economia real”

Primeiro ele quer que a agiotagem internacional que penaliza o Brasil e os países pobres com juros escorchantes, e que já está prenunciando sua falência completa como se pode observar de algumas fissuras graves no dique de contenção incapaz de suportar a pressão da inadimplência da dívida pública e privada impagáveis - aí incluindo-se até os juros -, renuncie a tais juros a serem pagos aos rentistas mundo afora.  

Em seguida ele quer o dinheiro, que ora está desempregado por conta da incapacidade de expansão do capital, seja investido sem lucros e sem retorno confiável para a retomada do crescimento da economia real. Precisa que se informe a Lula que banqueiro só empresta a quem não precisa e nunca a quem não pode pagar, e que a agiotagem somente sobrevive se houver retorno aumentado do capital investido - critério da famigerada viabilidade econômica.  

Reclama que “o endividamento externo que vitimou o Brasil no passado (????), e hoje assola a Argentina, é a causa da desigualdade gritante e crescente, e requer do Fundo Monetário Internacional um tratamento que considere as consequências sociais das políticas de ajuste”.  

Devemos dizer incialmente que a dívida do Brasil em relação ao seu PIB é relativamente bem menor do que a dos países que estão sentados à mesa com Lula no G7, mas nós continuamos pagando juros de mais de 10% ao ano, enquanto aqueles têm até juros negativos.  

Ao invés de querer que o FMI seja condescendente, e pretender que o Banco do Brics seja parcimonioso na cobrança de juros, é necessário dizer que o Brasil não pode continuar a pagar juros que correspondem a quatro vezes o déficit da previdência social brasileira, cujos direitos previdenciários foram agora reduzidos, como queria Lula em 2003.  

Seria preciso dizer um NÃO! contundente ao pagamento de juros ao sistema bancário sediado nos países do G7, mas se quisesse e tivesse peito para dizer isto ele jamais seria convidado à mesa deste grupo.  

Considera que é possível a boa convivência do capital com a sustentabilidade ecológica quando diz “a falsa dicotomia entre crescimento e proteção ao meio ambiente está superada. O combate à fome, à pobreza e à desigualdade deve voltar ao centro da agenda internacional, assegurando o financiamento adequado e transferência de tecnologia.”  

Como algum Presidente da República pode dizer que a dicotomia entre crescimento econômico e proteção ao meio ambiente está superada?!  

Esquece-se ele que os Estados Unidos e a China, presentes ao G7, são as maiores economias do mundo e que são também os maiores emissores de CO² na atmosfera, causa cientificamente comprovada do atual aquecimento global que causa fome e destruição?! 

Francamente, esse discurso para agradar os ricos representa a definição explícita da conciliação política com o que há de pior na humanidade, e que precisa ser enfrentado com a verdade, mesmo considerando as conveniências de sobrevivência política neste mundo marcado pela hipocrisia governamental.  

Para terminar, Lula quer ampliar a participação do Brasil no que chama de concerto multipolar de nações, chamando para uma reforma no Conselho de Segurança da ONU, pretendendo a inclusão do Brasil neste organismo internacional.  

Não precisamos de concerto internacional, mas de conserto (com s mesmo) transnacional, que possa abolir as fronteiras;  

- não precisamos de juros baixos, mas da superação do próprio dinheiro e dos bancos;  

- não precisamente de investimentos econômicos para a sustentação racional da Amazonia, mas de abolição do forma valor e do dinheiro como causa dos males e da exploração mundo afora e da predação ecológica;  

-  não precisamos do desenvolvimento econômico mundial, mas de uma relação social na qual a produção coletiva esteja voltada para a satisfação das necessidades humanas; 

- não precisamos de uma ordem jurídica burguesa e eleitoral, mas de uma estrutura jurídica de base na qual a ordem social não seja delegada, mas exercida pelos interessados diretamente, e que o direito represente o ideia de realização do ideal de justiça; 

- não precisamos de pretendentes a estadistas, mas da abolição do próprio Estado. 

Basta de hipocrisia de salão! (por Dalton Rosado) 

sexta-feira, 19 de maio de 2023

MÃOS AO ALTO, CIDADÃO!

 

Pedi um veículo por aplicativo e logo após a caminhada o motorista reclamou dos buracos existentes na periferia para a qual eu me deslocava. O motorista aborrecido afirmou que o que ganhava, após pagar a taxa da empresa de aplicativo que usava o veículo do condutor para ganhar dinheiro, mal sobrava algum para o conserto do carro em razão das avarias causadas pela precariedade da malha viária naquele subúrbio. 

Conversa vai, conversa vem, perguntei-lhe se sempre fora motorista, me afirmando ele que havia trabalhado no escritório de uma empresa de ônibus interurbano que havia fechado as portas por conta da falta de usuários que pudessem pagar as passagens cada vez mais caras. 

Disse ser formado em administração e que agora ganhava menos, mas estava se virando nos trinta para sobreviver por falta de um emprego melhor. 

Ali estava um exemplo claro do que os novos nichos de emprego, mesmo mais mal remunerados, como os criados pelos aplicativos de transporte urbano mais baratos, eram infinitamente menores do que aqueles causados pela alta tecnologia cibernética criada pela microeletrônica.  

Os novos empregos criados, minoritários em relação ao total dos empregos perdidos, e pelo mesmo motivo, ou seja, pela tecnologia aplicada à produção de mercadorias e serviços, é a mais explícita contradição da lógica capitalista. 

Ao mesmo tempo em que engorda os lucros privados das empresas que buscam na tecnologia a redução de custos na produção de mercadorias e serviços, é também o mecanismo irreversível pelo qual é reduzida a massa global de lucro e mais valia, únicas capazes de promover o necessário aumento constante da massa de valor válida.  

A massa de valor global tem que ser necessariamente aumentada de modo constante, sem a qual não pode ocorrer a irrigação da economia de mercado, que, igual ao ser humano diante da falta de sangue no organismo, desfalece e morre.  

A emissão de moeda sem lastro, desconectada da produção de mercadorias que lhe autorize a emissão substanciosa, como sabemos, causa inflação, que é a tormenta existente hoje até nos países de moedas fortes, ou pretensamente fortes, que apenas se sustentam para sobreviver na credulidade dos governantes e rentistas dos países da periferia capitalista.  

Tem prazo de validade pré-determinada, e que está prestes a se esgotar, a conhecida subserviência governamental à ordem capitalista mundial pelos países da periferia capitalista, que diante da chantagem do sistema bancário internacional , o qual ameaça cortar a rolagem das dívidas que sustentam tais governantes submissos, aceitam as moedas ditas fortes e sem valor como se fossem válidas, tal como alguém que renegocia uma nota promissória de vencimento no longo prazo por uma emitente falido. 

A constante rolagem da dívida pública, seja com juros escorchantes como aqueles cobrados aos países pobres, ou mesmo com juros baixos ou até negativos para os países ricos, é mecanismo artificial com data futura de esgotamento e colapso.  

Entretanto, como tal desfecho falimentar da mediação social pela forma valor anêmica vem sendo prologado por conta da falta de um movimento revolucionário que pense e aja fora da caixa burguesa institucional e eleitoral, infelizmente aceita como alternativa democrático burguesa ao famigerado fascismo, numa polarização fora de foco, é o cidadão metido nesta camisa de força quem mais sofre, atribuindo a si mesmo uma culpa individual que não tem.  

Ao cidadão submetido à relação social capitalista incidem dois grandes processos de espoliação:  

- (i) a cobrança de impostos cada vez mais agressivos por conta da falência do Estado;  

- (ii) a extração de mais valia, que tem montante cada vez menor em face do desemprego estrutural causado pela contradição a que antes aludimos - alta tecnologia aplicada à produção de mercadorias e serviços. 

O cidadão espoliado pelo capital e seu Estado, paradoxalmente, mendiga e agradece a dois senhores:  

- ao capital que já não lhe oferece um emprego, hoje cada vez mais escasso e que o obriga à aceitação de tal exploração na lei da oferta e da procura, ou seja, da compra e venda da mercadoria força de trabalho humana assalariada - vide Marx, mais atual do que nunca, que afirmava que o exército de desempregados conspira contra o trabalhador empregado; 

-pela presença do Estado que o oprime a lhe proporcionar serviços na segurança pública, educação e saúde, serviços básicos de precária ou impossível efetividade, sem falar nos outros importantes que lhe são negados como infraestrutura urbana de circulação (daí a buraqueira na periferia) e habitacional, e serviços de cultura, esportes, lazer, etc. 

Enquanto isso, prega-se a volta da impossível retomada do desenvolvimento econômico e medidas de convivência civilizatória como contraponto à insensatez bárbara fascista e ao pensamento liberal burguês sempre ávido por governos ditatoriais nacionalistas xenófobos, racistas, misóginos, e retrógrados mantidos pela força das armas militares - que também existe como proselitismo de defesa dos oprimidos. 

Os governos conservadores - intitulados como liberais nos Estados Unidos e outros países da Europa, num sentido diferente daquele que por aqui lhe atribuímos ao termo -, vitoriosos pelo voto ou pela força ditatorial das armas, querem o estado mínimo como forma de concentrar recursos na infraestrutura de produção de mercadorias, gastos institucionais de incentivo à estrutura de poder que o sustenta e gastos militares.  

Nesse sentido, pregam a indispensabilidade do Estado na prestação de serviços como segurança pública, educação e saúde por empresas privadas remuneradas por particulares ou pelo próprio Estado (a chamada terceirização), tudo dentro do desiderato de promoção da economia capitalista. 

Os governos mais à esquerda querem um Estado forte, empresarialmente estatizante, pretensamente capaz de prover as necessidades do cidadão pagador de impostos. 

Como se vê, os pressupostos capitalistas de Estado, empresa estatal produtora de mercadoria e serviços e cobrança de impostos, estão claramente estabelecidos em ambos os projetos políticos.  

O que os une umbilicalmente é a existência do estado, da forma mercadoria (portanto capitalista) e dos impostos a serem cobrados ao cidadão exaurido economicamente, fatores que dão sustentação à ordem político-jurídico-constitucional estabelecida em ambos os projetos. 

O Estado é sempre opressor justamente porque se assenta sobre uma base de exploração do cidadão escorchado pelos fatores antes elencados. 

Acaso tivéssemos uma sociedade livre da opressão burguesa-estatal, na qual os indivíduos sociais fossem senhores de suas vontades e esclarecidos de modo a exercerem a sua soberania de vontade em uma ordem de produção social compartilhada e jurídico-constitucional horizontalizada, jamais agrediria a própria vida, expressa na sua subsistência cômoda e na sustentabilidade ecológica.  

O assaltante da esquina, que grita perdeu, playboy! de arma em punho ou o homem que cata restos de comida numa lixeira de bairro rico podem ser vítimas de uma mesma causa original: a exploração social e ordem jurídico-constitucional perversa do Estado, que tal como o meliante, nos diz: mãos ao alto, cidadão! (por Dalton Rosado)

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