segunda-feira, 29 de setembro de 2014

DA ADORAÇÃO BOCÓ À FRUSTRAÇÃO HOMICIDA

Um patético zé mané armou seu picadeiro num hotel de Brasília. Tomou refém ameaçando-o com uma arma de brinquedo, fingiu portar explosivos, fez exigências estapafúrdias (a extradição de Cesare Battisti e o efetivo cumprimento da Lei da Ficha Limpa), acabando por entregar-se à polícia como um cordeirinho. 

Conseguiu muito mais do que os 15 minutos de fama prometidos por Andy Warhol: 420 minutos. E agora mofará por um bom tempo no presídio ou no hospício, que é para deixar de ser besta.

O episódio me trouxe à lembrança um parágrafo antológico de Paulo Francis sobre o assassinato de John Lennon por parte de um energúmeno desses. Vale a pena reproduzi-lo aqui, pois disse tudo que havia para se dizer sobre os medíocres dispostos a tudo para sentirem-se momentaneamente menos insignificantes:
"A polícia chamada ao local apreendeu facilmente Chapman, (...) sorrindo, certo (e está certíssimo) que do anonimato se tornará, como Lennon, uma celebridade. Esse o motivo aparente do crime. O canibalismo de celebridades que é rotina neste país (e no Brasil e todo o mundo ocidental), graças a um sistema de comunicações que evita assuntos sérios, mas que fornece um 'circo' permanente, obsessivo, avassalador, sobre a vida dos bem-sucedidos e ricos, excitando sentimentos contraditórios, da adoração bocó dos fãs, à frustração homicida que às vezes se manifesta à la Chapman"

 De quantas outras "Imagine" Chapman nos privou?

A "FOLHA DE S. PAULO" NOVAMENTE ACHINCALHA A LUTA CONTRA A DITADURA

O jornal da ditabranda continua publicando péssimos editoriais sobre os acontecimentos dos anos de chumbo, talvez porque o papel então desempenhado pelo Grupo Folha foi nada menos que indecoroso, daí seu desconforto ao tocar nesses assuntos. 

Para quem quiser conhecer mais detalhes sobre tal papelão, recomendo a leitura deste meu artigo. Vale, contudo, destacar alguns trechos de um texto autocrítico publicado pela própria Folha de S. Paulo quando da comemoração do seu 90º aniversário: 
"A partir de 1969, a 'Folha da Tarde' alinhou-se ao esquema de repressão à luta armada, publicando manchetes que exaltavam as operações militares.
A entrega da Redação da 'Folha da Tarde' a jornalistas entusiasmados com a linha dura militar (vários deles eram policiais) foi uma reação da empresa à atuação clandestina, na Redação, de militantes da ALN... 
Em 1971, a ALN incendiou três veículos do jornal e ameaçou assassinar seus proprietários. Os atentados seriam uma reação ao apoio da 'Folha da Tarde' à repressão contra a luta armada.
Segundo relato depois divulgado por militantes presos na época, caminhonetes de entrega do jornal teriam sido usados por agentes da repressão, para acompanhar sob disfarce a movimentação de guerrilheiros. A direção da 'Folha' sempre negou ter conhecimento do uso de seus carros para tais fins [o grifo é meu]".
Sempre negou, mas ninguém, em sã consciência, acreditou!

PAGAMOS UM PREÇO ALTÍSSIMO POR
TERMOS SALVADO A HONRA NACIONAL

A visão que a Folha dá atualmente da faina da Comissão Nacional da Verdade e das reações militares é bem na linha de botar panos quentes e aparar arestas. Mas, se estas continuam existindo e machucando, é porque a Justiça não foi feita e tudo indica que jamais o será.

O mais inaceitável no editorial desta 2ª feira, 29 (acesse a íntegra aqui), são estes dois parágrafos:
"O principal mérito da Lei da Anistia, promulgada em 1979, foi o de permitir que o processo de democratização do país se desse num clima desanuviado dos ressentimentos que pesavam sobre ambas as partes em conflito.
A esmagadora maioria dos que se envolveram na luta armada, a começar da própria presidente Dilma Rousseff (PT), não tem problemas em fazer a revisão histórica de sua estratégia, fundada não só num romantismo revolucionário juvenil, mas também na exaltação da violência e num desprezo ao que então se desqualificava com o termo 'democracia burguesa'".
A redemocratização do País se deu, na verdade, em clima dos mais tensos, com a oposição tendo de engolir a anistia que igualou as vítimas a seus algozes porque era este o preço a pagar pela libertação dos presos políticos e a permissão de volta dos exilados. Mesmo assim, num primeiro momento foram excluídos os militantes condenados por ações armadas.

Foi, portanto, mediante a mais escrachada chantagem que os oposicionistas acabaram cedendo e concordando com o que sabiam ser uma abominação; afinal, tiranos não podem anistiar a si próprios em plena tirania. Fico a imaginar os criminosos de guerra nazistas munindo-se em 1944 de um habeas corpus preventivo semelhante. Se lhes houvesse ocorrido este brilhante expediente, teriam porventura evitado o julgamento de Nuremberg?    

Quero ser mico de circo se tal quadro caracteriza um "clima desanuviado dos ressentimentos que pesavam sobre ambas as partes". 

Quanto aos que pegamos em armas contra a ditadura, não me lembro de nenhum de nós fazendo a "exaltação da violência", muito menos em função de "romantismo revolucionário juvenil". 

Sabíamos que se tratava de uma opção quase suicida. Tínhamos plena consciência de que, sendo capturados, as piores torturas eram uma certeza e a morte, uma forte possibilidade. Só assumimos riscos tão extremos porque era a única maneira de continuarmos confrontando os usurpadores do poder sob o terrorismo de estado desmedido que eles desencadearam a partir do AI-5.  

Ao editorialista responsável por tais despropósitos, eu sugiro a leitura deste artigo  no qual relembro quão sofrido era nosso dia a dia. Não encarávamos uma barra tão pesada por fetiche pelas armas nem por arroubos adolescentes. Nosso motivo era bem outro: o de não suportarmos ver 90 milhões de brasileiros tratados como crianças tuteladas,  intimidadas e castigadas. 

E, como não sobrava "democracia burguesa" nenhuma no Brasil dos anos de chumbo, também não havia motivo nenhum para a desprezarmos naquele momento. Cada um de nós tinha algo muito mais imediato com que se preocupar: a própria sobrevivência, para continuar lutando o máximo possível, pois cada dia poderia ser o último.

Finalmente, no tocante a fazermos a revisão histórica da nossa estratégia, eu quero deixar bem claro que não me incluo na citada "esmagadora maioria" (aliás, desconheço qualquer pesquisa que respalde tal dimensionamento, o qual parece ser, isto sim, um chute conveniente).

A luta armada, na verdade, se constituía na única estratégia viável depois que todos os caminhos de contestação pacífica ao regime foram fechados e as torturas se tornaram bestiais e generalizadas, com os tribunais impedidos até de nos concederem habeas corpus.

O resultado foi trágico e até hoje não consigo aceitar o assassinato das duas dezenas de valorosos companheiros que conheci pessoalmente, incluindo um amigo de infância. 

Mas, o Brasil seria um país de pobres coitados se nem sequer uns poucos milhares de brasileiros houvessem se recusado a viver debaixo das botas. Pagamos um preço altíssimo por termos salvado a honra nacional. Merecemos respeito.

domingo, 28 de setembro de 2014

PT PODE TER PARTICIPADO DO ASSALTO AOS FUNDOS DE PENSÃO DE ESTATAIS

Enquanto a campanha de Dilma Rousseff insufla nos eleitores o medo daquilo que, segundo sua versão distorcida e falaciosa, Marina Silva faria se eleita, o noticiário mostra o que o PT tem realmente feito em seus três mandatos presidenciais consecutivos. É chocante ao extremo.

Quem acompanha o meu trabalho sabe que considero a corrupção inerente ao capitalismo e impossível de ser erradicada enquanto não dermos um fim à exploração do homem pelo homem, daí eu sempre ter evitado me alinhar com a bandeira do combate à dita cuja -até mesmo em 2008, quando boa parte da esquerda oportunisticamente tomava partido na guerra de gangues que se travava nos bastidores do poder, entre os esquemas favorável e contrário à fusão de duas grandes empresas de telecomunicações.

Mas, a reportagem de capa da Folha de S. Paulo deste domingo, 28 (cuja íntegra pode ser acessada aqui) embute uma acusação que, caso sua veracidade seja confirmada, é a mais grave que se fez até hoje ao PT, pelo menos para a sensibilidade dos homens de esquerda: a de ter levado os fundos de pensão da Petrobrás e dos Correios a investirem em papéis podres de empresas fantasmas ligadas ao doleiro Alberto Youssef, causando-lhes prejuízos de dezenas de milhões de reais.

Já me deixava profundamente enojado o fato de o PT haver se envolvido com personagens da estatura moral de Marcos Valério, Henrique Pizzolatto, Paulo Roberto Costa e Alberto Youssef, 

Agora, se o Partido dos Trabalhadores tiver mesmo participado do roubo de recursos destinados à complementação da aposentadoria dos trabalhadores, aí será melhor mudar de nome (Partido dos Criminosos do Colarinho Branco?). Ou se refundar. Ou se dissolver.

sábado, 27 de setembro de 2014

NOSSA SINGELA HOMENAGEM AO PAULO CHRIST SUPERSTAR

"Quem entra na vida pública tem que saber que também Jesus Cristo foi injustiçado, JK foi injustiçado, Getúlio foi injustiçado" 
(deputado federal Paulo Maluf, sobre as decisões da Justiça Eleitoral que, por enquanto, o mantém inelegível)

AUMENTAR A SORDIDEZ DA CAMPANHA PRESIDENCIAL MAIS IMUNDA DESDE 1989 PARECIA IMPOSSÍVEL. MENOS PARA A veja.

A jogada manipulatória está no topo da capa
Nunca me identifiquei tanto com o Glauber Rocha de Terra em Transe quanto agora, ao presenciar a campanha presidencial mais imunda desde a redemocratização. Vejo-a e relembro o desabafo do poeta Paulo Martins (Jardel Filho), que cai como uma luva para o show de aberrações e de horrores que nos é imposto:
"As coisas que vi naquela campanha! Uma tragédia muito maior do que as nossas próprias forças!"
De um lado, mentiras e falácias transformadas em trunfos; a aposta na fanatização dos prosélitos e no embotamento do espírito crítico; o recurso à manipulação mais ignóbil por parte de quem deveria despertar a consciência dos explorados, não tangê-los como rebanho para as urnas; a satanização de uma mera educadora só porque convém aos falsários fazê-la passar por banqueira; a interpretação totalmente deformada do que seja a independência do Banco Central, na verdade uma forma de evitar que decisões técnicas fiquem à mercê da vil politicalha; a atribuição à adversária de intenções que ela nunca teve nem manifestou, como a de anular conquistas dos trabalhadores, etc. 

É cópia escrachada dos métodos de Goebbels, sim, como eu denunciei muito antes do que qualquer vice! É puro stalinismo, sim, uma exumação do maniqueísmo mais selvagem dos tempos da guerra fria! É a política de hoje chafurdando nos esgotos do passado. 

Do outro lado, as armações ilimitadas da revista veja, com seu acesso ilegal a inquéritos que deveriam estar resguardados pelo segredo de Justiça, para pinçar acusações bombásticas contra a candidatura palaciana. Na edição deste sábado (27), a novidade é que Paulo Roberto Costa, em sua delação premiada à Polícia Federal, teria acusado a campanha de 2010 da Dilma de, por intermédio do terror dos caseiros Antonio Palocci (sempre ele!), haver pedido R$ 2 milhões, com urgência, ao esquema de corrupção da Petrobrás.

Isto, evidentemente, não poderá ser apurado nos nove dias que antecedem o 1º turno, mas vai servir para lançar uma grave suspeita sobre a presidenta, capaz de modificar intenções de voto. E, se confirmado pela investigação policial, terá consequências imprevisíveis na eventualidade de uma reeleição (vale, contudo, ressalvar que, levando em conta apenas o que foi divulgado até agora, seria difícil inculpar Dilma pelo suposto ou real pedido do Palocci --este poderia, p. ex., assumir a culpa sozinho, com a coisa morrendo por aí).

De qualquer forma, é tentativa de assassinato de reputação para influenciar a eleição mediante a utilização de jogo sujo e golpes baixos, exatamente como o PT faz com Marina Silva. Alguns consideram válido usar feitiços contra feiticeiros. Eu gostaria é de ver os dois tipos de bruxos assando juntos numa fogueira (simbólica, claro...).

E pensar que tantas vezes fui às ruas clamar por eleições diretas, até que finalmente consegui votar pela primeira vez para presidente da República... aos 39 anos de idade! Mesmo tendo mantido sempre um pé sensatamente atrás, evitando superestimar a democracia burguesa, nem de longe adivinhava o tamanho da decepção e do desencanto que viriam.

Uma tragédia muito maior do que as nossas próprias forças. 

sexta-feira, 26 de setembro de 2014

JUSTIÇA DE SP DÁ À PM "UM SALVO-CONDUTO PARA A TRUCULÊNCIA E A VIOLÊNCIA SEM LIMITES"

Por concordar com cada palavra deste artigo dos presidentes do Sindicato dos Jornalistas Profissionais de SP (José Augusto de Camargo) e da Associação de Repórteres Fotográficos e Cinematográficos de SP (Rubens Chiri), reproduzo-o na íntegra. 

Só faço uma pequena ressalva: o título ficaria melhor com o acréscimo do advérbio mais, pois decisões judiciais infames (esta aqui, p. ex.) pululam em São Paulo, onde o autoritarismo que emana do Palácio dos Bandeirantes parece ter contaminado o Palácio da Justiça. 


Às vezes, tenho a impressão de que os dois palácios se tornaram vasos comunicantes...

UMA DECISÃO JUDICIAL INFAME

Com uma penada, a Justiça de São Paulo colocou em risco dois direitos fundamentais para a vida em um Estado democrático de Direito: o de informar corretamente e o de ser bem informado.

Foi esse o sentido do acórdão votado por unanimidade no Tribunal de Justiça de São Paulo, que atribui culpa "exclusivamente" ao repórter fotográfico Alex Silveira por ele ter levado um tiro de bala de borracha no olho esquerdo enquanto registrava um protesto de servidores na avenida Paulista, em 2000. Disparado pela Tropa de Choque da Polícia Militar, o projétil deixou o fotógrafo cego de uma vista.
Consequência da impunidade: Alex Silveira já havia sido atingido em 2000...

Diz o texto do acórdão que, ao se manter "no meio" do conflito entre manifestantes e policiais, Alex Silveira "colocou-se em quadro no qual se pode afirmar ser dele a culpa exclusiva do lamentável episódio do qual foi vítima".

É claro que repórteres podem fazer suas reportagens por telefone, que fotógrafos podem cobrir manifestações voando de helicóptero ou operando o "joystick" de um drone. Se procedessem assim, jamais se colocariam "no meio" de conflitos.

A melhor tradição do jornalismo, contudo, privilegia o colocar-se "no meio" do cenário dos acontecimentos para, assim, narrar com mais precisão e verossimilhança os enfrentamentos que ocorrem e que constituem a própria matéria-prima da notícia. Ou alguém imagina que Euclydes da Cunha (1866-1909) poderia escrever "Os Sertões" sentado em uma escrivaninha na sede do jornal "O Estado de S. Paulo"?

"Estar no meio" é missão do jornalismo, do jornal e dos jornalistas, que, aliás, por isso mesmo, compõem o que se chama de "media", ou, em bom português, meio. Só os inimigos da liberdade de informar e de ser informado podem imaginar que se possa produzir jornalismo de qualidade e com alto grau de confiabilidade "de longe".

A decisão da Justiça de São Paulo embute mais um sério agravante. É o que dá à Polícia Militar --a quem caberia garantir a segurança nas manifestações-- um salvo-conduto para a truculência e a violência sem limites, inclusive atacando jornalistas quando no estrito cumprimento do dever de informar.
...por uma bala de borracha igual à que vitimaria Giuliana Vallone em 2013.

É sabido que, de junho de 2013 até hoje, 190 jornalistas foram agredidos durante manifestações --88% deles foram vítimas de abusos cometidos por policiais. Preocupa-nos a escalada de violência da PM contra as manifestações populares e, em seu bojo, as evidências de que as forças policiais passaram a atingir deliberadamente jornalistas, tentando impedir que registrem abusos e ilegalidades.

A decisão do Tribunal de Justiça no caso do fotógrafo Alex Silveira dá cobertura aos abusos da polícia e abre precedente inaceitável para que esse tipo de violência prossiga e, quem sabe, até se agrave.

Por isso, consideramos imperioso que as instâncias da Justiça brasileira reformem a infeliz, gravíssima e injusta decisão tomada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo. Os jornalistas e repórteres fotográficos prestam solidariedade ao colega Alex Silveira e desejam que o Estado seja responsabilizado por essa terrível agressão ao nosso companheiro e à liberdade de imprensa. (José Augusto de Camargo e Rubens Chiri)

quinta-feira, 25 de setembro de 2014

AINDA NÃO SERÁ DESTA VEZ QUE MALUF VAI PENDURAR A CARTEIRA...

Quando foi noticiado o indeferimento do recurso do deputado federal Paulo Maluf por parte do Tribunal Superior Eleitoral, acreditei que a trajetória política do odiado personagem (antes muito nefasto, hoje mais para folclórico...) fosse, finalmente, terminar. Daí ter escrito o post TSE rejeita recurso de Maluf: sua carreira está por um fio.

Mas, como faço questão de informar bem os meus leitores, vou cantar a bola: ainda não será desta vez. Começo a acreditar que o fim da sucessão de mandatos do já octogenário estupra-mas-não-mata só se dará por decisão celestial, não dos tribunais...

É que a sua defesa alega a falta de um requisito fundamental para o enquadramento na Lei da Ficha Limpa: ter sido condenado por ato doloso de improbidade administrativa. Trocando em miúdos, haver conscientemente concorrido para uma falcatrua. Então, como a sentença condenatória da Justiça de SP não especificou que Maluf estivesse ciente do superfaturamento das obras do túnel Airton Senna, ele não poderia agora ser banido das urnas como ficha suja. [Trata-se, certamente, de mais um que ignorava o que acontecia sob o seu nariz. Os distraídos pululam...]

Um dos sete que julgaram o recurso de Maluf, o ministro Gilmar Mendes, foi voto vencido e criticou a decisão, tomada por 4x3. Sugeriu que a composição do tribunal teria sido determinante no resultado.

Três dos membros (no caso Mendes, Luiz Fux e Dias Toffoli) são do Supremo Tribunal Federal; dois (João Otávio Noronha e Maria Thereza de Assis), do Superior Tribunal de Justiça; e os outros dois (Admar Gonzaga e Luciana Lóssio) provêm da advocacia.

Como os dois advogados ficaram contra Maluf, são eles os alvos óbvios da acusação de Mendes, de que a corte não estaria preparada para "enfrentar pressão".

Quando chegar a vez do STF se pronunciar, provavelmente Mendes e Toffoli reafirmarão seu entendimento de que o STJ "mudou a jurisprudência só para prejudicar Maluf" e Fux vai continuar favorável à sua exclusão das eleições por cinco anos.

Além desta tendência de, antes do pontapé inicial, o placar já ser favorável a Maluf por 2x1, há o fato de que o Supremo é mais legalista e não cede facilmente ao clamor popular (que, aliás, arrefeceu muito com o passar do tempo e a crescente desimportância do personagem).

Resumo da opereta: como a lista dos candidatos que vai aparecer na urna foi fechada antes do indeferimento do recurso, Maluf dela constará, podendo, portanto, ser votado; se ganhar no STF seus votos valerão, caso contrário vão ser anulados; é bem provável que o STF acabe, depois da eleição, rechaçando seu enquadramento na Lei da Ficha Limpa.

Disse e repito que, num ambiente político no qual a corrupção é generalizada, Maluf merecia o banimento, a execração e até a prisão por algo muito maior: sua conivência com as execuções extralegais da Rota quando era governador.
Recordar é viver...

Como nosso país nunca demonstrou grande apreço pelos direitos humanos (ainda mais quando as vítimas são coitadezas da periferia, como os que a Rota exterminava), o pior dos seus crimes jamais será punido.

Esta tentativa de escrever certo por linhas tortas lembra outra semelhante, a de condenar os torturadores por crimes comuns, como se não estivessem cumprindo as determinações da ditadura e como se a prática das atrocidades não constituísse uma decisão de Estado nos anos de chumbo. É atalho, é forçação de barra. 

E, também, perda de tempo. O Supremo invariavelmente fulmina tais subterfúgios.

Então, meus palpites são de que o Maluf, se quiser, seguirá sendo deputado federal até o dia de sua morte (desde que os eleitores o continuem, absurdamente, reelegendo); e de que o nó da punição dos torturadores só será desatado com a revisão da Lei da Anistia, sendo inúteis as iniciativas para a contornar.

quarta-feira, 24 de setembro de 2014

LIVRE PENSAR É SÓ PENSAR

Leio diariamente a Folha de S. Paulo, porque tive a sorte de contratar o provedor UOL no comecinho, quando o livre acesso à Folha e à veja fazia parte do pacote.

A Folha saiu fora desta jogada há muito tempo, mas continuou honrando o compromisso assumido: quem tinha adquirido o direito, o manteve.

A veja o desonrou, passando a dar acesso gratuito à edição de um sábado apenas a partir da 6ª feira seguinte. Até nisto se tornou uma revista picareta, para quem o solenemente pactuado entre duas partes não vale nada.

Às vezes vou também no portal do Estadão, da IstoÉ e da Época, geralmente atrás de uma informação específica. E, claro, acompanho o noticiário do UOL.

Fiz esta introdução porque, nesta 4ª feira, a Folha traz um bom número de textos que dão o que pensar. Vale a pena dar uma refletida em cima deles.

ELEIÇÕES: QUADRO ESTABILIZADO.

Sobre as eleições, a nova pesquisa do Ibope mostra um quadro estabilizado: Dilma, 38%; Marina, 29%; e Aécio, 19%. Apesar do wishful thinking dos internautas-torcedores e dos blogueiros amestrados, o cenário é desfavorável a Dilma, que não leva jeito nenhum de liquidar a fatura no 1º turno nem tem motivos para sonhar com uma virada de Aécio que tire Marina do 2º. 

O mais provável é mesmo que a disputa final seja entre Dilma e Marina, quando a acriana terá tempo igual no horário gratuito e vai se beneficiar da rejeição ao PT (que, aliás, é acentuada a ponto de até uma vitória sobre o Aécio ser incerta, conforme alertei; ao mover uma verdadeira guerra de extermínio contra Marina, uma candidata do campo da esquerda, o PT assumiu o insensato risco de devolver o governo à direita).

LATA D'ÁGUA NA CABEÇA

Em editorial, a Folha adverte que o (des)governador Geraldo Alckmin brinca com fogo e os paulistas poderão se queimar. O posicionamento é inatacável, desta vez assino embaixo de cada palavra:
"... a crise de abastecimento [de água] é grave. Reconheça-se que se abate sobre a Grande São Paulo a maior estiagem em 84 anos --e, segundo especialistas, o panorama só deve melhorar a partir de meados de outubro.
Diante desse cenário excepcional, seria de esperar respostas também excepcionais, mas o governo paulista parece orientar-se mais pelo cronograma eleitoral do que pelo calendário das chuvas.
...Num ano eleitoral, opta-se pela solução menos desgastante para a imagem da administração estadual: o uso do volume morto.
 ...uma segunda parte dessa reserva (...) acrescentará 10,7 pontos percentuais à capacidade das represas.
 Dado o ritmo de queda do Cantareira, o volume atual se esgotará em dois meses. Com a nova cota, o sistema ganhará sobrevida até fevereiro; o governador sustenta que as águas alcançarão março.
Que seja. Mesmo que as expectativas oficiais se confirmem, estará desenhado um quadro hídrico alarmante para o próximo ano.
...Ou seja, a não ser que as chuvas deste verão sejam abundantes, o sistema chegará ao início do próximo período de estiagem já num nível bastante crítico.
Como se vê, não se trata simplesmente de garantir o abastecimento até março de 2015. Mesmo que isso esteja assegurado, convém perguntar: e depois?"
EMISSÃO DE GASES ESTUFA 

Ainda na linha dos efeitos futuros das nossas omissões atuais no trato das questões ambientais, Roberto Smeraldi, diretor da ONG Amigos da Terra, faz um alerta veemente (que dificilmente será ouvido, como sempre):
"A atual conjuntura climática é inédita: os 13 anos deste século estão entre os 14 mais quentes desde que se mede a temperatura de forma sistemática. Da Califórnia, nos EUA, ao Brasil, estiagens inusitadas geram escassez no abastecimento de água, queda na produção agrícola, picos nos preços na energia.
...No Brasil, em plena campanha eleitoral, seria importante os candidatos à Presidência explicarem como pretendem enfrentar um tema que já deixou de ser ameaça e se tornou realidade.
 ...Na perspectiva econômica, a única maneira de enfrentar a mudança climática é a de precificar o carbono, como agora reconhecem alguns importantes formadores de opinião. Ao precificar o carbono, seja por meio de impostos ou de alocação de cotas, promove-se a inovação e a eficiência.
Essa medida é essencial no Brasil, pois há dois indicadores preocupantes de perda de competitividade. O primeiro é que no último decênio piorou nossa quantidade de energia necessária para produzir uma unidade de PIB, isto é, nossa intensidade energética. O segundo é a piora de nossa intensidade de carbono, ou seja, a emissão de gases estufa por unidade de PIB.
...é sinal de que precisamos reverter a atual tendência. Corretamente, a presidente Dilma Rousseff disse ontem que ao reduzir emissões nos tornamos mais produtivos. Mas as atuais políticas públicas não captam esse conceito [o grifo é meu]".
"CONFUSÃO DANADA" OU GAFE?

Rui Castro faz fina ironia com a declaração de Dilma sobre o papel da imprensa (adiante corrigida, como vocês podem verificar aqui):
"Na sexta passada (19), a presidente Dilma afirmou que 'o papel da imprensa não é de investigar, e sim de divulgar informações'. A imprensa tomou nota e obedeceu. Ouviu a fala da presidente, dispensou-se de investigá-la e divulgou sua declaração.
Aliás, nem haveria o que investigar, já que foi uma declaração para vários jornalistas ao mesmo tempo, e no Palácio da Alvorada, residência oficial da Presidência. Como todos os jornais publicaram a mesma frase, supõe-se que foi exatamente o que a presidente falou e disse.
Dois dias depois, no entanto, Dilma acusou a imprensa de ter feito 'uma confusão danada' com a sua declaração. Disse que não disse o que disse, mas que, ao contrário, a imprensa deve investigar, sim, 'para informar e até para fornecer prova'. E foi além: 'O jornalismo investigativo pode até fornecer elementos. Agora, quem faz a prova é a investigação oficial. Sem ela, você não consegue condenar ninguém'.
É verdade. Se, mesmo com a investigação oficial, não se consegue condenar ninguém, imagine sem. Mas foi refrescante ouvir de Dilma que ela autoriza a imprensa a investigar --até para evitar outras 'confusões danadas' quando se trata de divulgar o que ela diz e, ao ser alertada para as gafes que comete, desdiz. Como isso é frequente, o aconselhável seria que a imprensa, ao ouvir suas declarações, fosse logo investigar para saber se ela declarou ou não o que declarou"
A REPRODUÇÃO DA MEDIOCRIDADE

Moralmente, Delfim Netto carregará até a morte o estigma de ter sido um dos signatários do AI-5, acumpliciando-se com a abertura dos portões do inferno.

Como economista, sempre foi e dificilmente deixará algum dia de ser um defensor empedernido da perversidade e da desigualdade capitalistas --o que foi relevado, p. ex., por Lula, ao acolhê-lo como uma espécie de eminência parda dos seus governos, o grande guru macroeconômico de mediocridades como Antonio Palocci.

Mas, claro, é um homem sofisticado, capaz de nos oferecer observações e argumentações inteligentes. Então, como não sou nenhum fanático religioso, recuso-me a considerá-lo um demônio do qual só se podem esperar diabruras. Prefiro ler seus textos com espírito crítico, descartando muita coisa e aproveitando alguma.

Na sua coluna desta 4ª feira, p. ex., estes trechos são simplesmente irrespondíveis:
"Uma das mais graves consequências da submissão das campanhas eleitorais ao domínio irresponsável dos 'marqueteiros' é a deseducação do honesto cidadão e a vacina contra a ética que transmitem à sociedade.
Não tem o menor constrangimento de afirmar o 'fisicamente impossível' ou mentir descaradamente, confiados na ingenuidade que é própria daqueles aos quais os sucessivos poderes incumbentes negaram, pela falta de educação, o espírito crítico. Trata-se de um processo de reprodução da mediocridade.
...Para o "marqueteiro" tudo isso não interessa. Se vendeu ou não o seu 'sabonete', embolsa a grana da sua genialidade e vai descansar até a próxima eleição. Para o candidato eleito não!
As falsidades que o elegeram são as mesmas que lhes serão cobradas no exercício do governo".
De duas aberrantes falsidades propagadas pelo PT, uma é que Marina, ao defender corretamente a atualização da ultrapassadíssima CLT, pretenda tornar mais selvagem ainda a terceirização (o que, convenhamos, seria simplesmente impossível!). A outra, que eu também tenho apontado, o Delfim detona com a maior facilidade;
"Afirmar que um Banco Central independente 'rouba a comida da boca do pobre' é uma ignomínia.
Independente de quem, se sua diretoria é escolhida pelo presidente que lhe fixa os objetivos e aprovada pelo Senado, ao qual presta contas regularmente?"
Bota ignomínia nisto! Ignóbil não é apenas a mentira em questão, como também o recurso desmedido às práticas nazistas e stalinistas de manipulação da opinião pública, por parte de quem jamais deveria espelhar-se em exemplos tão execráveis.

TSE REJEITA RECURSO DE MALUF: SUA REELEIÇÃO ESTÁ POR UM FIO.

O deputado federal Paulo Maluf perdeu mais uma batalha da sua luta para escapar dos efeitos da Lei da Ficha Limpa. Depois de ter sua candidatura à reeleição impugnada pelo Tribunal Regional Eleitoral de SP, recorreu ao Tribunal Superior Eleitoral, sofrendo nova derrota nesta 3ª feira (23), desta vez por 4x3. 

Seu advogado ainda vai tentar a sorte no Supremo Tribunal Federal. Se sair com as mãos abanando, será a provável pá de cal na carreira política que Maluf iniciou em 1969, depois de ser  vice da Associação Comercial de SP e de presidir a Caixa Econômica Federal. 

Caso a decisão da Justiça Eleitoral não seja derrubada, permanecerá inelegível pelos próximos cinco anos. É tempo demais para quem acaba de completar 83 invernos.

Para que os jovens fiquem conhecendo melhor tal personagem, emblemático no pior sentido possível, republico o artigo que escrevi em 2012, quando o Lula --embora tenha sido preso pela polícia política do estado de São Paulo durante o governo de Maluf-- levou seu candidato a prefeito Fernando Haddad para beijar a mão do velho cacique direitista, em troca de um punhadinho de tempo a mais no horário gratuito. 

A repercussão acabou sendo tão negativa que, na repetição da opera bufa em 2014, o Alexandre Padilha foi sozinho pedir a benção do Maluf (desempenhou direitinho o constrangedor papel, mas o PPS decidiu posteriormente abandonar a noiva no altar, atrelando-se à campanha de Paulo Skaf). 

O HOMEM QUE TODOS AMAM 
ODIAR: PAULO MALUF.

Nunca antes neste país se viu um político detentor de enorme popularidade sofrer rejeição tão extremada e generalizada quanto a que o ex-presidente Luiz Inácio Lula experimentou ao serem divulgadas as fotos de sua alegre confraternização com Paulo Maluf.

É óbvio que tal reação partiu principalmente a de um público bem informado, que se interessa pela política, acompanhando-a pela imprensa ou internet (nas quais aquelas imagens repercutiram da forma mais negativa possível). Até agora não se aferiu a impressão causada naqueles que veem Lula como o novo  pai dos pobres. Terão se indignado? Pelo menos sabem quem é Maluf?

E os bem pensantes, sabem?

Eu, que acompanho a carreira de Maluf desde os primórdios, sempre estranhei que estes últimos o erigissem no mais execrável de todos os execráveis políticos direitistas.

Em bateboca memorável num debate eleitoral de 1989, Leonel Brizola o qualificou várias vezes de "filhote da ditadura", o que não é toda a verdade.

Os  filhotes  paradigmáticos eram aqueles políticos inexpressivos e servis que  governaram São Paulo unicamente por terem o beneplácito dos ditadores, como Laudo Natel e Paulo Egydio Martins.

Maluf foi, isto sim, um sapo direitista que a ditadura ultradireitista engoliu. Com sorte e muita habilidade para cooptar e corromper delegados, três vezes conseguiu arrobar a festa.
Dona Flor e seus dois maridos

O governador Abreu Sodré escolheu Luiz Arroba Martins para ser nomeado prefeito de São Paulo, mas o dito cujo cometeu o deslize de, numa reunião no Palácio dos Bandeirantes, criticar o poder central. Imediatamente os militares o vetaram e Sodré foi obrigado a digerir a nomeação do pretendente alternativo, aquele presidente da Associação Comercial que Delfim Netto protegia. Assim Maluf se tornou prefeito (1969-1971).

Fiel ao seu estilo de  tocador de obras, fez muitas, tanto como prefeito quanto como secretário dos Transportes do Governo de Natel (1971-1975). E, claro, a corrupção correu solta --o que nunca foi novidade no Brasil. Vide seu antecessor mais célebre em SP, o interventor federal, prefeito e governador Adhemar de Barros, popularmente conhecido como o  rouba-mas-faz.

Maluf agradeceria a Natel pelo trampolim disponibilizado para sua ascensão política... traindo-o e o derrotando de forma vexatória. Natel foi escolhido pelos militares para governar São Paulo pela terceira vez e pensou que os convencionais da Arena bateriam continência; não deu a mínima para eles.

Maluf visitou os 1.261, um por um e, com os argumentos sonantes  habituais, acabou seduzindo 617 e ganhando a convenção por diferença de 28 votos. Os fardados, estupefatos, cogitaram virar a mesa, mas acabaram se conformando.
Lula preso pelo Dops. Adivinhem quem era o governador...

Cansaram de afastar arbitrariamente os políticos opositores e os que, mesmo estando ao seu lado no momento da quartelada, depois passaram a defender a redemocratização do País. Hesitaram, contudo, em dar o mesmo tratamento àquele que era o maior dos seus puxa-sacos; Maluf só os contrariava no tocante a suas ambições pessoais, beijando-lhes abjetamente os coturnos em todo o resto.

A pior faceta de Maluf, o motivo que o faz mais merecedor de repúdio (no meu entender) foi, como governador (1979-1982), ter dado carta branca para a tropa de choque da Polícia Militar, a Rota, barbarizar os bairros pobres, atuando com truculência desmedida e exterminando marginais com sanha comparável à do antigo Esquadrão da Morte. Depois, em cada uma das quatro tentativas frustradas de voltar ao Palácio dos Bandeirantes, Maluf repetiria o bordão: "Vou botar a Rota na rua!".

Vale lembrar que, em Rota 66 - A polícia que mata, o repórter Caco Barcelos documentou 4.200 casos (totalizando cerca de 12 mil vítimas inocentes) de assassinatos cometidos pela Rota nas décadas de 1970 e 1980, tendo como alvos, quase sempre, jovens pobres, pardos e negros, muitas vezes sem antecedentes criminais. Os cidadãos honestos atingidos por engano seriam em maior número do que os verdadeiros criminosos - cuja condição, claro, não eximia os policiais do dever de entregá-los à Justiça, ao invés de simplesmente os abater como moscas.

Valores distorcidos

Para lembrar outro filme: "Dormindo com o inimigo"...
Até hoje me indigna que Maluf haja se tornado um criminoso procurado pela Interpol em razão de crimes financeiros e não como patrono e incentivador de assassinos seriais, responsável último por uma infinidade de execuções maquiladas em  resistência à prisão. Isto dá uma boa ideia da escala desumana de valores do sistema capitalista...

Nos estertores da ditadura, Maluf repetiu a proeza de conquistar os convencionais do partido governista, convencendo-os a não endossarem a candidatura oficial de Mário Andreazza. Mas, uma parte deles preferiu debandar e constituir o PFL, garantindo sua permanência no poder como aliados do PMDB.

Foi o fim das chances presidenciais de Maluf, que chegou perto mas não levou... felizmente! Teve de contentar-se em ser mais uma vez prefeito de São Paulo (1993-1996), mas a tentativa de nova decolagem enguiçou quando o sucessor que elegeu, Celso Pitta, teve gestão escandalosa e acabou rejeitado, como   ruim  ou   péssimo, por 83% dos paulistanos.
Lula salvou Sarney de ser escorraçado. Pode?

E Maluf acabou sendo mais execrado ainda do que Fernando Collor, o outro populista de direita importante das últimas décadas. Merece sê-lo por seu absoluto desprezo pelos direitos humanos, principalmente dos pobres e excluídos. Mas, no restante, corrupção inclusa, os dois são farinha do mesmíssimo saco.

Quanto a Lula, considero tão infames seus salamaleques com Maluf como com outros três grandes vilãos da direita: Collor (o cafajeste que invadiu sua intimidade e tornou público um assunto constrangedor --a existência de uma filha ilegítima que ocultava-- para usá-lo como munição eleitoral), Sarney (vaquinha de presépio dos milicos que deu um jeito de continuar emporcalhando a cena política depois de 1985) e ACM (o coronelão nordestino que mais poder acumulou durante a ditadura).

Sei lá por que foi desta vez que o copo transbordou. Mas, a intuição do Lula parece ter evaporado, pois a consequência daquelas fotos era mais do que previsível.

Bateboca famoso: 'filhote da ditadura' x 'desequilibrado'.

terça-feira, 23 de setembro de 2014

DEPOIS DA POEIRA COLORIDA NOS OLHOS DOS ELEITORES VIRÁ O OLHO DO FURACÃO

Josias de Souza, experiente jornalista que tem seu blogue hospedado no UOL, fez uma análise acurada da eleição presidencial (vide íntegra aqui), cujos trechos principais eu reproduzo abaixo:

"A 12 dias do encontro com as urnas, o eleitor brasileiro permanece no escuro em relação ao essencial. Admita-se que há duas crises sobre a mesa: a econômica e a ética. Quanto à primeira, os candidatos revelam-se capazes de quase tudo, menos de esmiuçar seus planos. Quanto à segunda, sabe-se que nem o petróleo é mais nosso. Um delator esclareceu que já não existem coisas nossas... 

À medida que o PIB cai e a inflação sobe, os receituários econômicos dos candidatos vão se tornando mais aguados, seus discursos mais evasivos. Todos sabem o que terá de ser feito. Nesta segunda-feira, o ex-presidente do BC Armínio Fraga, guru econômico de Aécio Neves, disse que a economia brasileira foi acometida de infecção generalizada.

“É uma septicemia, não é uma verruga que você precisa tirar. É grave mesmo”, disse Armínio. Com maior ou menor ênfase, a gravidade do quadro é admitida também atrás das cortinas nos comitês de Marina Silva e até no de Dilma Rousseff.

Considerando-se que ninguém combate septicemia com aspirina, vêm aí providências mais duras. Por exemplo: corte pesado de despesas, realinhamento dos preços da luz e da gasolina, reformulação do seguro-desemprego, reforma da Previdência e um imenso etcetera. Os presidenciáveis não falam sério com o eleitor porque a política virou apenas um ramo da publicidade".

A sopa dos pobres na depressão da década de 1930
Mandou bem, mas não disse nada de inusitado. Há meses eu venho alertando que, seja quem for o(a) vitorioso(a), o ano de 2015 será de tratamento de choque na economia, com grande possibilidade de os remédios amargos continuarem sendo ministrados em 2016. 

Mesmo tendo detestado cada minuto que trabalhei em editorias de economia, aprendi o suficiente para saber que, segundo a ortodoxia capitalista, da qual nenhum dos três candidatos com chance de êxito mostra a mínima intenção de discrepar, a recessão é inevitável e a depressão, bem provável. 

Isto já foi admitido inclusive pelo Guido Mantega, o ministro da Fazenda que derreteu após ter sido considerado rançoso pelos empresários. E até o Luís Nassif, apoiador de Dilma, reconhece que "no próximo ano, seja quem for o presidente eleito, haverá uma freada de arrumação na área econômica. A política econômica e suas vertentes monetária e cambial padecem de uma falta de rumo a toda prova... Não dá para continuar assim". Só discordo do eufemismo, a coisa se prenuncia mais como trombada...

Eu gostaria, claro, que Dilma ou Marina (Aécio, nem pensar!) ousassem trilhar outros caminhos. Mas, não existe sequer um nível de organização dos explorados suficiente para dar sustentação a uma ruptura, mesmo que parcial, com o receituário neoliberal. 

É o que dá a esquerda palaciana ver os trabalhadores apenas como os votantes que garantirão sua perpetuação no poder; quando precisa de algo além disto, não encontra, porque deixou de fazer a lição de casa lá atrás. [Mesmo caso do PCB em 1964: confiou que as Forças Armadas (!) defenderiam a Constituição e, na hora do golpe, não contava com um dispositivo militar próprio para encetar a mínima resistência.]

Também tenho batido na tecla de que a "política virou apenas um ramo da publicidade" -principalmente ao responder a comentaristas crédulos e obtusos, que caem na esparrela de quererem discutir a sério programas de governo que não são sérios. Se soubessem a forma como os políticos se referem a tais papeluchos na intimidade! Dou pistas: Mirafiori, Neve, Personal, Primavera, Scott, Sublime...

O de Marina Silva não cumpriu bem a função de apenas fazer afagos ao máximo de fatias do eleitorado, pois deixou brechas para contestações -a maioria, tendenciosas- dos adversários.

Dilma Rousseff não lançou até agora o seu porque ainda não decidiu a quem descontentará: se às centrais sindicais que querem a redução da jornada de trabalho, o fim do fator previdenciário e a regulamentação da terceirização, ou aos grandes capitalistas que não querem nada disso; se aos inconformados com a impunidade dos torturadores, que querem a revisão da Lei da Anistia, ou aos altos oficiais que blefam descaradamente, fingindo terem o apoio das tropas para viradas de mesa.

Aécio Neves, o candidato ideologicamente mais afinado com o grande capital (diferentemente de Dilma, que submete-se ao poder econômico por interesse político e não por convicção), também não pode abrir o jogo, porque se revelar honestamente o tipo de política econômica que vai implementar, sua votação cairá para menos de 10%...

É patético que se faça tanta exegese do nada, atribuindo tamanha importância ao que não tem nenhuma: a peça publicitária imperfeita da Marina e as peças publicitárias que Dilma e Aécio continuam devendo, porque a indefinição lhes convém.

No final de outubro vão acabar os embustes e manipulações, com o vento soprando para longe a poeira colorida que a propaganda política espalhou. Ainda haverá, claro, a trégua natalina, mas em janeiro o povo começará a defrontar-se com a dura realidade. E ai vai ficar sabendo qual o preço a pagar pela escolha que fez.

segunda-feira, 22 de setembro de 2014

MATADOR À SOLTA!

Esta notícia me deixou profundamente chocado, tanto que a transcrevo na íntegra. É da repórter Giba Bergamim Jr., da Folha de S. Paulo, e acaba de ser colocada no ar pelo UOL:

"A Justiça mandou soltar o policial militar preso na última quinta-feira (18) acusado de matar um camelô durante uma blitz na Lapa, zona oeste paulistana.

Imagens gravadas por testemunhas mostram o momento em que o soldado Henrique Dias Bueno de Araújo dispara sua pistola .40 com a mão direita, depois que o ambulante Carlos Augusto Muniz Braga tenta arrancar um spray de pimenta que estava na mão esquerda do PM. O tiro atingiu a cabeça de Braga, que conseguiu correr alguns metros antes de cair.

O ambulante foi levado ao hospital, mas não resistiu aos ferimentos –segundo a polícia, ele chegou sem vida ao hospital.

O PM foi preso em flagrante por homicídio e levado ao presídio militar Romão Gomes no mesmo dia.

Porém, na noite de sexta (19), a Justiça emitiu um alvará de soltura em favor de Araújo. Em depoimento à polícia, ele disse que o disparo foi acidental.

CRIME EM ABRIL 

Araújo já responde a um outro caso de homicídio.

Ele atirou contra um morador de rua, há seis meses, também durante uma abordagem policial, quando tentou abordar um homem que empurrava um carrinho de ferro-velho pela rua.

Segundo a PM, o morador de rua teria se negado a parar e usado um facão para ameaçar Araújo e outro soldado que o acompanhava.

Araújo teria atirado duas vezes nas pernas do homem, que continuou a ir na direção dos policiais.

O soldado então atirou no tórax do homem, que morreu. A vítima não foi identificada até hoje"

Não costumo desejar o mal para ninguém, mas desta vez abro uma exceção: será uma Justiça poética se a próxima vítima do matador fardado for o juiz que, inacreditavelmente, o botou na rua, quando só há dois locais apropriados para ele: a prisão ou o manicômio judicial.

AVISO AOS NAVEGANTES: O TIRO PODE SAIR PELA CULATRA!

Há uma espécie de colaboração informal, de bastidores, das campanhas de Dilma Rousseff e Aécio Neves, no sentido de derrubarem a de Marina Silva com a mais sórdida campanha de difamações, calúnias e mentiras que o Brasil presencia desde a redemocratização.

Renovo o alerta que lancei desde o início: por mais que, em seu desespero para manter as benesses do poder, os petistas movam uma guerra de extermínio contra a candidata do PSB, continuam sendo duas forças pertencentes ao CAMPO DA ESQUERDA, que jamais deveriam digladiar-se assim.

Antigamente, quando a política  se fazia com mais desprendimento revolucionário e menos espírito interesseiro, as forças de esquerda, ao se confrontarem na disputa por seus objetivos, o faziam como ADVERSÁRIAS, enquanto combatiam as que expressavam o capitalismo e a ditadura como INIMIGAS.

Agora, o PT chega ao cúmulo de repetir e trombetear as acusações que o PSDB faz a Marina, num conluio imoral com o INIMIGO DE CLASSE

Aécio está certíssimo nos seus cálculos, terá grandes chances de ser eleito se conseguir desalojar Marina e for para o 2º turno.

Dilma e o PT estão erradíssimos, não percebem que o desgaste de 12 anos no poder é tamanho, e os escândalos a serem explorados tantos, que a grande imprensa pode, sim, conduzir os tucanos à vitória em 26 de outubro.

Então, por medo de quem tem o mesmo DNA do petismo e é, indiscutivelmente, uma liderança popular, estão se arriscando a abrirem as portas para o retrocesso, com a volta dos tucanos ao governo.

Que chocante transição negativa, a de "sem medo de ser feliz" para "tenha medo do meu rival", a do discurso da esperança para as campanhas do medo e do ódio!

Sei que continuarei sendo uma voz a clamar no deserto, mas advirto agora e os chamarei à responsabilidade depois, caso este pesadelo se consume: a opção que estão fazendo é uma traição aos princípios revolucionários que todos um dia seguimos, que eu continuo seguindo até hoje e nem sei quantos mais (parecem ser bem poucos!)...

sábado, 20 de setembro de 2014

OS MILITARES FINALMENTE ADMITEM AS ATROCIDADES DOS ANOS DE CHUMBO

A notícia é de Eliane Cantanhêde e está na edição deste sábado, 20, da Folha de S. Paulo (a íntegra pode ser acessada aqui):

"O ministro da Defesa, Celso Amorim, encaminhou nesta sexta-feira (19) à Comissão Nacional da Verdade (CNV) ofícios das três Forças Armadas admitindo, pela primeira vez, que não têm condições de negar a ocorrência de graves violações aos direitos humanos em instalações militares durante a ditadura.

Conforme a Folha apurou, o Comando da Aeronáutica afirma não ter elementos para contestar que houve graves violações nem o reconhecimento da responsabilidade do Estado, e o da Marinha alega que não tem provas para negar nem confirmar as violações apontadas pela CNV.

O ofício do Comando do Exército não contradiz os dados de violações fornecidos pela comissão, alegando que não seria pertinente contestar decisões já tomadas pelo Estado brasileiro (que já reconheceu a existência de torturas e mortes no período) nem as circunstâncias configuradas em lei neste sentido.

Foi uma referência à lei que concedeu indenização às vítimas e às famílias de mortos e desaparecidos e à que criou a Comissão da Anistia.

Na avaliação da Defesa, é um passo importante a mais no processo de reconhecimento público, pelas três Forças, de que houve torturas e mortes durante aquele regime e que o Estado brasileiro tem responsabilidade pelo ocorrido. A área civil dos sucessivos governos já reconhece essa realidade há anos.

...Em documento a subordinados em fevereiro, o general Enzo Peri, comandante do Exército, proibira que unidades militares dessem informações sobre crimes ou violências em suas dependências. No texto, Peri ordenou que qualquer informação referente ao tema só deveria ser respondida pelo gabinete".

RESUMO DA OPERETA

Antes tarde do que nunca e apesar das reticências que utilizaram para não darem o braço totalmente a torcer ("não seria pertinente contestar", etc.), os comandantes militares insubmissos foram colocados no seu devido lugar.  Sob vara, tiveram de atualizar seus calendários, reconhecendo que estamos em pleno século 21 e não na tenebrosa década de 1970. Alvíssaras!

Mas, não nos empolguemos em demasia. É bom lembrarmos que a resposta ultrajante dos fardados à Comissão Nacional da Verdade, negando os assassinatos e torturas dos anos de chumbo, data de 17 de junho; e que o ofício de 25/02/2014 do comandante do Exército, general Enzo Peri, proibindo os oficiais de colaborarem com as investigações da Comissão da Verdade e orientando-os a repassarem os pedidos e questionários para seu gabinete,  só se tornou conhecido quando O Globo noticiou, em 22 de agosto, caso contrário o estaríamos ignorando até hoje.

Nos dois casos, impunha-se uma resposta imediata, que restabelecesse o respeito à hierarquia. Afinal, como  o próprio Comando do Exército agora reconhece, o Estado brasileiro já dera seu posicionamento definitivo sobre tais crimes. Fico me indagando se não foi o fato de estarmos num ano eleitoral que evitou os habituais panos quentes...

Quem ousou cutucar tal ferida, como o Luiz Cláudio Cunha e eu, deveria agora ter sua coerência reconhecida: não é calando para evitar constrangimentos ao governo, mas sim botando a boca no trombone, que se consegue direcionar os acontecimentos no sentido correto.

Em tempo: desde a primeira insubordinação dos comandantes militares, em agosto de 2007 (vide aqui), tenho me posicionado contra a contemporização e várias vezes afirmei que os altos oficiais blefavam, pois atualmente não conseguiriam arrastar as tropas para aventuras golpistas. Agora ficou provado que eu estive certo durante todo esse tempo.
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