terça-feira, 21 de novembro de 2023

A WEB SE TORNOU UM ESPAÇO CONCEDIDO PELO SISTEMA PARA CRERMOS QUE AINDA INFLUENCIAMOS AS GRANDES DECISÕES/1

CASO BATTISTI: EM 2011 A MOEDA CAIU EM
PÉ, MAS HOJE ELA DESLIZARIA PARA O RALO. 
A épica vitória que, em 2011, um punhado de antifascistas alcançamos contra  o rolo compressor italiano e a lavagem cerebral da grande imprensa brasileira no
Caso Battisti me fez acreditar que conseguiríamos tornar as redes sociais e a blogosfera antídotos contra a manipulação das consciências por parte da indústria cultural. Quanta ingenuidade!

Hoje percebo que foi apenas uma moeda que caiu em pé. E que, de tão circunstancial, tal êxito foi revertido em 2018 sob Michel Temer, mediante o estupro de várias leis brasileiras. 

Para quem ainda não percebeu ou tomou conhecimento, embora eu haja batido nesta tecla num artigo recente, advém daí a minha firme rejeição à perseguição ilegal movida pelos patrulheiros da internet:
— contra o técnico Cuca por conta de um caso  ocorrido nada menos do que 35 anos atrás e que estava definitivamente prescrito aqui e na Europa, não tendo nenhum(a) feminista fanático(a) o direito de recolocá-lo em discussão na web, inclusive publicando peças que estavam sob segredo de justiça, no sentido de negar a um idoso o legítimo direito de exercer o seu ofício; e
— contra Robinho, com o UOL publicando uma longa série de peças processuais igualmente sob segredo de justiça alhures, numa clamorosa pressão para o STF aceitar o cumprimento aqui da sentença de lá.  

[Fez-me lembrar as versos de um tema musical da peça 
Arena conta Tiradentes"Eu sou brasileiro, mas não tenho o meu lugar,/ pois lá sou estrangeiro, estrangeiro no meu lar./ A quem não é de lá, essa terra tudo dá./ Essa terra não é minha, é de quem não vive lá".]

Sendo vedado ao Supremo questionar a sentença italiana em si, a disponibilização dos chamados grampos do Robinho
para a mídia brasileira e consequente estardalhaço contra o acusado criou uma absurda desigualdade para seus defensores. 

Como contestarem a distorção causada na opinião pública brasileira (e que, embora não se admita, influencia também os ministros do STF) se o erro foi cometido pela corte estrangeira que vazou ilegalmente tais gravações? 

Como questionar agora tal comportamento escandalosamente abusivo, verdadeira interferência italiana nas decisões brasileiras, se ao STF não cabe colocar em questão a sentença daquele país? 

E afinal, por que a aberrante perseguição ao Cuca e a quebra do segredo de justiça no caso do Robinho me incomodaram tanto? PORQUE REPRODUZEM AS MANOBRAS ILÍCITAS EUROPEIAS CONTRA AS QUAIS NOS BATEMOS EM ABSOLUTA DESIGUALDADE DE FORÇAS NO CASO BATTISTI

Então também o jogo sujo foi praticado às escâncaras, tanto que a sentença italiana também já estava prescrita quando a pátria de Berlusconi movia céus e terras para forçar sua repatriação.
Cezar Peluso, relator do pedido de extradição do Cesare no STF, fez
contas mágicas para defender o indefensável. E foram igualmente fantasiosos os cálculos da justiça italiana para recusar uma revisão de sua sentença iníqua depois que o troféu tão ardentemente buscado pelos neofascistas de lá finalmente lhes caiu nas mãos.

São gritantes as evidências de que a condenação de Battisti na Itália se baseou exclusivamente em delações premiadas por meio das quais os aspirantes a recuperarem a liberdade com acordos podres descarregaram suas culpas sobre ele, confiantes em que Battisti nada sofreria por contar com a garantia de François Mitterrand de que poderia continuar vivendo e trabalhando em paz na França até o fim dos seus dias.

Após a morte de Mitterrand, sua solene promessa não foi honrada por Jacques Chirac e Battisti se tornou alvo de uma perseguição sem fim, por amor ou por dinheiro, da parte de Berlusconi e seus cúmplices.

É óbvio que muito me decepcionei quando o Cesare, em 2019, admitiu ter sido realmente responsável por dois dos assassinatos que lhe imputavam.  Sabendo que o inimigo mentia o tempo todo, não deveria jamais ter-lhe fornecido tal trunfo propagandístico em troca de promessas (que acabaram sendo descumpridas) de receber tratamento civilizado nos cárceres italianos. 

Também me magoava demais sua insinceridade conosco, os apoiadores brasileiros, que mesmo se soubéssemos de toda a verdade continuaríamos rechaçando as ilegalidades praticadas contra ele por Estados poderosos. 

Afinal, os autores dos grandes atentados terroristas cometidos pelos neofascistas, nos quais haviam sido exterminado civis como moscas, tinham recebido tratamentos jurídico e carcerário brandos, enquanto os de autoria de grupúsculos de esquerda contra alvos isolados mas não desconectados daquela luta, foram objetos de rigor extremo. 

Depois que tudo terminou, as escandalosas injustiças que marcaram os anos de chumbo italianos, o verdadeiro festival de dois pesos e duas medidas que assolou o país,  tudo isso só poderia ter sido sanado por uma ampla anistia. Por que não ocorreu? O fantasma de Mussolini explica.

Do ponto de vista estritamente legal, tudo aquilo era arquivo morto e a falaciosa condenação por quatro homicídios (dois dos quais ocorridos simultaneamente em locais demasiado distantes entre si para um mesmo indivíduo poder estar presente em ambos) valia tanto quanto papel higiênico usado. 

Era tendenciosa ao extremo a legalidade adotada aquele período infame, no qual, como bem ressaltou o ex-ministro Tarso Genro, as instituições democráticas italianas funcionavam a contento, mas a Justiça e a Polícia se constituíam em flagrante exceção, pouquíssimo diferindo de suas congêneres das ditaduras do 3º mundo.

A vitória que então fomos buscar na bacia das almas, acabou sendo revertida adiante por mais e piores manobras sujas e ilegais, inclusive uma tentativa de sequestro quando o Cesare era residente legal no Brasil. 

Hoje já não existe mais ânimo na esquerda brasileira para travar batalhas tão desiguais como a que encaramos em 2008/2011; ademais, a possibilidade de equilibrar na internet o jogo (de cartas marcadas) praticado pela grande imprensa já foi devidamente neutralizada pelo sistema. 

Então, só me resta endossar e aplaudir o vigoroso artigo de Eugênio Bucci, O entretenimeno engole a política, que será publicado amanhã neste blog como a segunda parte da presente duologia. Tem tudo a ver.

Mas, sendo absolutamente sincero, embora considere que ficou ainda mais difícil (praticamente impossível!) a moeda cair de novo em pé como em 2011, mesmo assim, caso me pedissem uma colaboração solidária num caso com as mesmas características, eu não hesitaria um segundo em (e encontraria forças para) assumi-lo também.

Pois a missão de um revolucionário só termina no túmulo. E a dos que lutamos contra a ditadura militar nem de longe terminou, tanto que houve a recaída bolsonarista na década passada. A luta continua. (por Celso Lungaretti)

2 comentários:

Anônimo disse...

https://aterraeredonda.com.br/quando-a-guerra-vira-entretenimento/

celsolungaretti disse...

É também um bom artigo, mas publicado há mais de um mês. Caducou um pouco.

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