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sábado, 11 de dezembro de 2021

TEMOS ALGO A COMEMORAR NESTA 2ª FEIRA? SIM, A CERTEZA DE QUE O AI-5 CONTINUARÁ ONDE ESTAVA: NA LIXEIRA DA HISTÓRIA!

Personagens que desembestaram o terrorismo de Estado
O dia 13 de dezembro de 1968 foi um dos mais funestos e vergonhosos da nossa história, pois nele se promulgou o Ato Institucional nº 5.   

Dezessete sinistros personagens deram sinal verde para torturas, assassinatos, estupros, ocultação de cadáveres e todo o festival de horrores dos anos subsequentes, principalmente até meados dos '80.

Eram eles o ditador Costa e Silva e 16 de seus ministros: Albuquerque Lima (Interior); Augusto Rademaker (Marinha); Carlos Simas (Comunicações); Costa Cavalcanti (Minas e Energia); Delfim Netto (Fazenda); Gama e Silva (Justiça); Hélio Beltrão (Planejamento); Ivo Arzua (Agricultura); Jarbas Passarinho (Trabalho); Leonel Miranda (Saúde); Lyra Tavares (Exército); Macedo Soares (Indústria e Comércio); Magalhães Pinto (Relações Exteriores); Mário Andreazza (Transportes); Souza e Mello (Aeronáutica); e Tarso Dutra (Educação).  

Só um permanece vivo até hoje, Delfim Netto, que está com 93 anos e não se arrepende da autoria de uma assinatura da qual tanto sangue jorrou: segue afirmando que, se as circunstâncias fossem as mesmas, voltaria a proceder da mesmíssima maneira.

O 16º a falecer foi (em junho de 2016) o igualmente empedernido Jarbas Passarinho, de origem militar, que  ao proferir seu voto, disse a frase mais emblemática daquela infame reunião ministerial:
Jarbas Passarinho assumiu-se inescrupuloso 

"Às favas, sr. presidente, neste momento,
todos os escrúpulos 
de consciência"
.
Ele continuou, pelas décadas adentro, enturmado com as aves de mau agouro, sempre defendendo o regime de exceção ao qual serviu nas equipes ministeriais de Costa e Silva, Médici e Figueiredo.

Um mês depois chegou a vez de Rondon Pacheco, cuja assinatura não consta do documento, embora chefiasse o Gabinete Civil. Talvez a lacuna se deva a haver sido um personagem reticente naquele momento, tendo inclusive tentado fixar prazo para a vigência do AI-5: um ano apenas. 

Também se atribui a ele e ao ministro da Justiça Gama e Silva o mérito de, numa reunião prévia, terem excluído do documento alguns pontos mais duros, como o fechamento do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal. 

Outra voz dissonante foi a do vice-presidente Pedro Aleixo, que inclusive empenhou-se adiante em restabelecer a legalidade. Chegou a convencer Costa e Silva, mas este morreu antes de concretizar o intento (coincidência?).

O  golpe dentro do golpe, que levou ao paroxismo o fechamento ditatorial do País, foi o lance decisivo da disputa interna entre a linha dura militar (que queria radicalizar o arbítrio) e os conspiradores originais (oficiais veteranos da participação brasileira na 2ª Guerra Mundial). 
Arbítrio ditatorial foi levado ao paroxismo

Os últimos, encabeçados por Castello Branco, pretendiam manter a usurpação do poder por pouco tempo. Falavam numa intervenção cirúrgica, durante a qual imporiam medidas que modernizassem o Estado e enfraquecessem a esquerda (prisões, perseguições, cassações, extinção de entidades legais, etc.). 

Aprenderam, contudo, que implantar uma ditadura é bem mais fácil do que dar-lhe fim.

As duas posições competiram acirradamente pela hegemonia na caserna ao longo de 1968, mas o crescimento dos movimentos contestatórios fez a balança pender para  o lado dos ferrabrases. 

Estes iam ao encontro da cultura de intolerância que grassava nos quartéis, pois se propunham a dotar o regime de meios para reagir com maior contundência às manifestações de rua e ao desafio das organizações armadas, passando por cima dos direitos humanos.

Pesaram também os interesses mesquinhos dos oficiais das três Armas, seduzidos pelas perspectivas que o prolongamento do regime de exceção e a ampliação dos poderes ditatoriais abriam para seu enriquecimento pessoal:
— os da ativa, como gestores de um setor estatal que estava sendo cada vez mais inflado, ou como beneficiários de suas boquinhas; e
— os da reserva como facilitadores dos favores oficiais (quase todos os grandes grupos privados contrataram militares reformados para integrarem seus conselhos de administração, como forma de terem seus interesses contemplados nos altos escalões governamentais).
"...gado a gente marca, tange, ferra, engorda e mata, mas com gente é diferente..." É mesmo?

Há historiadores hoje sustentando (vide aqui) que o AI-5 teria objetivado, principalmente, intimidar e enquadrar setores da sociedade civil que haviam apoiado o golpe de 1964, mas que, quatro anos depois, estavam ficando descontentes com a ditadura (casos da Igreja Católica, da imprensa, do Poder Judiciário e de líderes políticos). Fica o registro.

O pretexto para a nova virada de mesa foi um discurso exaltado do deputado Márcio Moreira Alves numa sessão esvaziada (o chamado pequeno expediente) da Câmara Federal, no início de setembro de 1968.

Tratava-se de uma lengalenga sem verdadeira importância (incluía até uma sugestão às moças, de que não namorassem alunos das academias militares – vide aqui), proferida apenas para constar dos anais e poder ser exibida depois aos eleitores, quando ele lhes fosse pedir votos num pleito vindouro.
Moreira Alves deu o pretexto que a linha dura buscava

Mas, um jornalista favorável ao arbítrio vislumbrou a oportunidade de uma provocação e trombeteou-a; em seguida, os partidários do enrijecimento a divulgaram amplamente, mimeografada, entre os fardados, insuflando a indignação.

As Forças Armadas se declararam atingidas e o governo pediu ao Congresso Nacional a abertura de um processo visando à cassação de Moreira Alves. 

Os parlamentares, depois de em tantas ocasiões, tão vergonhosamente, se prostrarem aos ultimatos da caserna, daquela vez rechaçaram o pedido, temendo que outras cabeças fossem exigidas na sequência e a caça às bruxas acabasse extinguindo o mandato de muitos deles. 

Pateticamente, encerraram a sessão cantando o Hino Nacional, sem perceberem que tinham é escancarado as portas do inferno.

A resposta da ditadura foi imediata e a mais tirânica possível: colocou os Legislativos federal e estaduais em recesso e impôs à Nação, na marra, novas e terríveis regras do jogo.

O presidente da República (escolhido por um Congresso Nacional expurgado e intimidado) passou a dispor de totais poderes para:
— cassar mandato eletivos;
— suspender direitos políticos;
— demitir ou aposentar juízes e outros funcionários públicos;
Este desafio foi outro pivô do AI-5
— suspender o habeas corpus em crimes contra a segurança nacional;
— legislar por decreto; e
— julgar crimes políticos em tribunais militares, dentre outras medidas totalitárias.

Principal ferramenta do terrorismo de Estado, o AI-5 só seria atirado na lixeira dez anos depois.

Nesse meio tempo, centenas de resistentes foram executados, dezenas de milhares torturados, mais de uma centena de parlamentares cassados, um sem-número de funcionários públicos atirados no olho da rua, a arte amordaçada (mais de 500 filmes, 450 peças teatrais, 200 livros e umas 500 canções sofreram os rigores da censura), etc.

Quando os gorilas saíram do armário, o Brasil entrou num dos períodos mais bestiais e vergonhosos de sua História.

Hoje, embora a efeméride seja das mais negativas, há algo a ser comemorado: o fracasso acachapante da horda de mentecaptos ultradireitistas que, com o destrambelhado incentivo de um presidente cujos sintomas de insanidade mental são indisfarçáveis, tentou nos últimos três anos retirar tal abominação nauseabunda da lixeira da História. 

Mas, a micareta golpista que eles programaram para o último dia 7 de setembro flopou de forma tão ridícula que só haverá condições de repetirem tal palhaçada daqui a outra metade de século, caso a agonia do capitalismo não chegue ao fim até lá e suas vítimas, desesperadas, tenham nova crise de amnésia.

Desta vez não passaram. E, para os que virão depois de nós, fica a tarefa de garantir que nunca mais passem!
.
UM DEPOIMENTO PESSOAL – Para jovens estudantes que, como eu, ingressaram na luta a partir do novo ascenso do movimento de massas,  aquele agourento 13 de dezembro de 1968 marcou o fim da aventura e o início da tragédia.

Passáramos o melhor ano de nossas vidas descobrindo a luta e descobrindo-nos na luta. Aí veio aquele pacote de medidas draconianas ao extremo, cujas implicações captamos de imediato: haviam declarado guerra contra nós e os riscos dali em diante seriam imensos. 

Mesmo assim, diante da alternativa desistir x perseverar, fizemos a opção digna... que se revelaria das mais sofridas.

Então, o AI-5 foi o divisor de águas entre o 1968 exuberante e o 1969 soturno.
A passeata dos 100 mil foi o ápice dos protestos de 68

Entre o enfrentamento a céu aberto e o martírio nos porões.

Entre a luta travada ao lado das massas despertadas e a luta que travamos sozinhos em nome das massas amedrontadas.

Meu avô morreu quando meu pai tinha 11 anos. Como era o primogênito, minha avó fez com que começasse imediatamente a trabalhar  numa fábrica escura, barulhenta e empoeirada, burlando a legislação que exigia idade mínima de 14 anos.

Passou o resto da vida lamentando a responsabilidade que desabou cedo demais sobre seus ombros. Num dia, estava despreocupadamente jogando bola no campinho ao lado de sua casa. No outro, esfalfando-se oito horas seguidas para colocar o pão na mesa familiar.

O AI-5 teve o mesmo efeito sobre mim. Até então, a militância era puro deleite. De um momento para outro, tornou-se um pesadelo que me deixou em frangalhos, além de tragar alguns dos meus melhores amigos e tantos companheiros estimados.

Parafraseando uma bela canção de Neil Young, foi a saída do azul e entrada nas trevas. (por Celso Lungaretti)
 

domingo, 16 de fevereiro de 2020

GOEBBELS ESTÁ MAIS VIVO DO QUE NUNCA NO ESGOTO DAS REDES INSOCIÁVEIS

flávia lima
ÀS FAVAS COM A VERDADE
Faz lembrar um western famoso: a boa e digna jornalista...
Ex-funcionário de uma agência de disparos de mensagens em massa por WhatsApp foi convocado na 3ª feira (11) a prestar depoimento na comissão parlamentar que investiga a disseminação de notícias falsas na eleição.

Hans River do Nascimento foi fonte de uma reportagem da Folha de S. Paulo, publicada em dezembro de 2018, sobre o uso fraudulento de nomes e CPFs no disparo de mensagens pelo aplicativo. 

Diante de deputados e senadores, Hans River ofereceu informações falsas e fez acusações contra uma das autoras da matéria, Patrícia Campos Mello.

A repórter juntou provas —capturas de tela de conversas, áudios e documentos enviados pelo agressor—e rebateu ponto a ponto as mentiras reproduzidas nas redes sociais.

Desmascarada a mentira, diferentemente do esperado, não houve um recuo nas postagens. O que se viu nas redes sociais foi uma enorme disposição em negar provas e evidências, num grande movimento de manada rumo à desinformação.

...o mau caráter que esfaqueia mulher pelas costas ...
Prevaleceu a tendência a acreditar apenas no que é conveniente —o chamado viés de confirmação, conceito cada vez mais relevante no jornalismo.

Levantamento exclusivo feito pela empresa de análise de dados Bites deixa isso claro.

A Bites analisou posts de deputados federais em seus perfis oficiais no Facebook, Twitter, Instagram e YouTube.

Entre a tarde de 3ª feira (11) e as 18h de 6ª feira (14), os deputados publicaram 9.644 posts, alcançando 11,7 milhões de interações (entre curtidas, retuítes, comentários e compartilhamentos).

Três assuntos sobressaíram, todos de alguma forma ligados ao governo ou à família Bolsonaro: a morte do miliciano Adriano da Nóbrega, a fala do ministro Paulo Guedes sobre viagens de domésticas à Disney e o show de Hans River.

Embora em número de posts os preconceitos destilados por Guedes tenham ficado à frente (372 posts contra 187 da comissão e 122 do miliciano), a performance de Hans River foi imbatível em interações: 873.179 interações nas redes oficiais dos deputados, ou o equivalente a 7% do total do período (contra 460.533 de Guedes e 291.868 do miliciano).
...e o feio (de tão brega!) títere que dá show de cafajestagem 
Em defesa da jornalista, 37 deputados publicaram 127 posts com 113.757 interações—defesa feita pelo PT e legendas próximas, ressalvadas algumas exceções. 

No campo dos apoiadores das declarações de Hans River contra a repórter, apenas sete deputados produziram 60 posts que alcançaram assombrosas 759.422 interações, ou quase sete vezes mais que o movimento de defesa.

Das 60 publicações dos sete deputados, 23 partiram da conta de Eduardo Bolsonaro. Sozinho, o filho do presidente alcançou 50% das interações contrárias à jornalista.

Performances como as criadas por Hans River reforçam convicções e animam a tropa virtual a continuar o processo difamatório nas redes. Não há o que os faça parar porque a verdade—e aqui não estou falando de grandes questões filosóficas, mas do que aconteceu ou não—não importa.

Por trás disso, há método. A confusão é armada para criar um ambiente em que tudo vira uma versão e cada um pode escolher a sua. E, se algo der errado, há sempre a possibilidade de dizer que não foi aquilo que foi dito, que houve má interpretação dos fatos ou que não foi dito o que foi dito. (por Flãvia Lima, ombudsman da Folha de S. Paulo).

Toque do editor: este blog e respectiva equipe reiteram a solidariedade à Patrícia Campos Mello e expressam seu repúdio à ralé fascista que tenta intimidar a imprensa com as mais repulsivas grosserias. 

Parafraseando Oscar Wilde, tais ataques, extremamente ignóbeis e covardes, apenas revelam quão abalado Calibã fica quando vê sua imagem horrorosa no espelho. 

quinta-feira, 23 de janeiro de 2020

ÀS FAVAS COM TODOS OS ESCRÚPULOS! GUEDES ABRE MÃO DOS PRINCÍPIOS MORAIS EM NOME DE INTERESSES FINANCEIROS

flávia boggio
O MERCADOR DE ILUSÕES AGE COMO UMA FREQUENTADORA DO SHOPPING IGUATEMI, CLIENTE DA LOJA SINHÁ 
Durante uma conferência no Fórum Econômico Mundial, em Davos, Paulo Guedes declarou que “o pior inimigo do meio ambiente é a pobreza”. Para o ministro da Economia, pessoas pobres são as maiores causadoras do desmatamento e da poluição, “porque precisam comer”.

Ele já tinha mostrado sua aversão às classes mais baixas, quando as responsabilizou pela própria situação financeira. Para ele, é culpa do pobre gastar todo o dinheiro para pôr comida na mesa. O certo seria aplicar no Tesouro Direto.

Paulo Guedes representa exatamente a fatia da sociedade que o defende. Aquela pequena parcela mais rica da população que usa a meritocracia como desculpa por achar normal ver crianças dormindo na rua. “Ah, se os pais tivessem investido o salário, não estariam nessa situação. Estariam abrindo uma startup.”

Ele age como a frequentadora do shopping Iguatemi, cliente da loja Sinhá, que faz cara feia quando divide elevador com funcionário. Que paga uma miséria para empregada trabalhar 12 horas por dia e ainda a acusa de ter roubado a comida da despensa.

Ele representa o eleitor cansado de corrupção, mas que compra imóvel com dinheiro passado por fora.

Que traz importado sem pagar imposto, mas acha que muambeiro é coisa de pobre. A blogueira que faz namastê em Fernando de Noronha, hospedada em pousada construída ilegalmente em área de preservação. Mas vota no Bolsonaro porque basta de injustiça.

Para Guedes, o maior inimigo do meio ambiente não é o rico, que anda de SUV a diesel e come um bife de Kobe importado do Japão, mas do pobre que anda quatro horas prensado num ônibus para pôr uma salsicha no prato.

Assim como os eleitores liberais, que votaram num defensor de tortura e preconceito em nome da economia, Guedes não faz cerimônia ao abrir mão de qualquer princípio moral em nome dos interesses financeiros.

No mesmo Fórum de Davos, o ministro faz de tudo para mostrar aos investidores que o Brasil tem uma democracia estável. Isso depois de ameaçar a população insatisfeita com um AI-5. A arrogância dele termina onde está o dinheiro.

Para Paulo Guedes, a maior causa da pobreza é o pobre. E ele não pretende extingui-los tornando-os mais ricos. (por Flávia Boggio)
.
Toque do editor: a frase "Às favas com todos os escrúpulos!", citada no título, foi proferida por Jarbas Passarinho na reunião em que a ditadura militar decidiu a edição do AI-5.

sexta-feira, 13 de dezembro de 2019

VERGONHA NACIONAL, O AI-5 TEM DE CONTINUAR NA LIXEIRA DA HISTÓRIA

17 sinistros personagens desembestaram o terrorismo de Estado
Para os supersticiosos, o dia de hoje é um prato cheio: não só transcorre o 51º aniversário do Ato Institucional nº 5, como se trata da sétima vez, de 1968 para cá, que a data cai numa 6ª feira 13.  

Mas, depois de todos os demônios do inferno terem dado o ar de sua desgraça por aqui no 13 de dezembro de 1968, nada de remotamente comparável aconteceria nos anos de 1974, 1985, 1991, 1996, 2002 e 2013, nem tende a acorrer no restante do dia de hoje, para decepção do clã Bolsonaro, do Paulo Guedes e do charlatão da Virgínia.

A efeméride negativa em questão é a da canetada com a qual 17 sinistros personagens deram sinal verde para torturas, assassinatos, estupros, ocultação de cadáveres e todo o festival de horrores dos anos subsequentes, principalmente até meados dos '80.

Eram eles o ditador Costa e Silva e 16 de seus ministros: Albuquerque Lima (Interior); Augusto Rademaker (Marinha); Carlos Simas (Comunicações); Costa Cavalcanti (Minas e Energia); Delfim Netto (Fazenda); Gama e Silva (Justiça); Hélio Beltrão (Planejamento); Ivo Arzua (Agricultura); Jarbas Passarinho (Trabalho); Leonel Miranda (Saúde); Lyra Tavares (Exército); Macedo Soares (Indústria e Comércio); Magalhães Pinto (Relações Exteriores); Mário Andreazza (Transportes); Souza e Mello (Aeronáutica); e Tarso Dutra (Educação).  
Jarbas Passarinho assumiu-se inescrupuloso 

Só um permanece vivo até hoje, Delfim Netto, que está com 91 anos e não se arrepende da autoria de uma assinatura da qual tanto sangue jorrou: continua afirmando que, apresentando-se as mesmas circunstâncias, voltaria a proceder da mesmíssima maneira.


O 16º a falecer foi (em junho de 2016) o igualmente empedernido Jarbas Passarinho, de origem militar, que  ao proferir seu voto, disse a frase mais emblemática daquela infame reunião ministerial:
"Às favas, sr. presidente, neste momento,
todos os escrúpulos de consciência"
Ele continuou, pelas décadas adentro, enturmado com as aves de mau agouro, sempre defendendo o regime de exceção ao qual serviu nas equipes ministeriais de Costa e Silva, Médici e Figueiredo.

Um mês depois chegou a vez de Rondon Pacheco, cuja assinatura não consta do documento, embora chefiasse o Gabinete Civil. Talvez a lacuna se deva a haver sido um personagem reticente naquele momento, tendo inclusive tentado fixar um prazo para a vigência do AI-5: um ano apenas. 

Também se atribui a ele e ao ministro da Justiça Gama e Silva o mérito de, numa reunião prévia, terem excluído do documento alguns pontos mais duros, como o fechamento do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal.  
"o arbítrio ditatorial foi levado ao paroxismo"
Outra voz dissonante foi a do vice-presidente Pedro Aleixo, que inclusive empenhou-se adiante em restabelecer a legalidade. Chegou a convencer Costa e Silva, mas este morreu antes de concretizar o intento (coincidência?).

O  golpe dentro do golpe, que levou ao paroxismo o fechamento ditatorial do País, foi o lance decisivo da disputa interna entre a linha dura militar (que queria radicalizar o arbítrio) e os conspiradores originais (oficiais veteranos da participação brasileira na 2ª Guerra Mundial).

Os últimos, encabeçados por Castello Branco, pretendiam manter a usurpação do poder por pouco tempo. Falavam numa intervenção cirúrgica, durante a qual imporiam medidas que modernizassem o Estado e enfraquecessem a esquerda (prisões, perseguições, cassações, extinção de entidades legais, etc.). 

Aprenderam, contudo, que implantar uma ditadura é bem mais fácil que dar-lhe fim.

As duas posições competiram acirradamente pela hegemonia na caserna ao longo de 1968, mas o crescimento dos movimentos contestatórios fez a balança pender para  o lado dos ferrabrases. 

Estes iam ao encontro da cultura de intolerância que grassava nos quartéis, pois se propunham a dotar o regime de meios para reagir com maior contundência às manifestações de rua e ao desafio das organizações armadas, passando por cima dos direitos humanos e das garantias constitucionais.
"...gado a gente marca, tange, ferra, engorda e mata, mas com gente é diferente..." Será mesmo?
Pesaram também os interesses mesquinhos dos oficiais das três Armas, seduzidos pelas perspectivas que o prolongamento do regime de exceção e a ampliação dos poderes ditatoriais abriam para seu enriquecimento pessoal:
— 
os da ativa, como gestores de um setor estatal que estava sendo cada vez mais inflado, ou como beneficiários de suas boquinhas; e
— os da reserva como facilitadores dos favores oficiais (quase todos os grandes grupos privados contrataram militares reformados para integrarem seus conselhos de administração, como forma de terem seus interesses contemplados nos altos escalões governamentais).

Há historiadores hoje sustentando (vide aqui) que o AI-5 teria objetivado, principalmente, intimidar e enquadrar setores da sociedade civil que haviam apoiado o golpe de 1964, mas que, quatro anos depois, estavam ficando descontentes com a ditadura (casos da Igreja Católica, da imprensa, do Poder Judiciário e de líderes políticos). Fica o registro.
Moreira Alves forneceu o pretexto que a linha dura buscava

O pretexto para a nova virada de mesa foi um discurso exaltado do deputado Márcio Moreira Alves numa sessão esvaziada (o chamado pequeno expediente) da Câmara Federal, no início de setembro de 1968.

Tratava-se de uma lengalenga sem verdadeira importância (incluía até uma sugestão às moças, de que não namorassem alunos das academias militares –vide aqui), proferida apenas para constar dos anais e poder ser exibida depois aos eleitores, quando ele lhes fosse pedir votos no pleito seguinte.

Mas, um jornalista favorável ao arbítrio vislumbrou a oportunidade de uma provocação e trombeteou-a; em seguida, os partidários do enrijecimento a divulgaram amplamente, mimeografada, entre os fardados, insuflando a indignação.

As Forças Armadas se declararam atingidas e o governo pediu ao Congresso Nacional a abertura de um processo visando à cassação de Moreira Alves. 

Os parlamentares, depois de em tantas ocasiões, tão vergonhosamente, se prostrarem aos ultimatos da caserna, daquela vez rechaçaram o pedido, temendo que outras cabeças fossem exigidas na sequência e a caça às bruxas acabasse extinguindo o mandato de muitos deles. 
Revista tida como outro pivô do AI-5

Pateticamente, encerraram a sessão cantando o Hino Nacional, sem perceberem que tinham é escancarado as portas do inferno.

A resposta da ditadura foi imediata e a mais tirânica possível: colocou os Legislativos federal e estaduais em recesso e impôs à Nação, na marra, novas e terríveis regras do jogo.

O presidente da República (escolhido por um Congresso Nacional expurgado e intimidado) passou a dispor de totais poderes para:
— cassar mandato eletivos;
— suspender direitos políticos;
— demitir ou aposentar juízes e outros funcionários públicos;
— suspender o habeas corpus em crimes contra a segurança nacional;
— legislar por decreto; e
— julgar crimes políticos em tribunais militares, dentre outras medidas totalitárias.

Principal ferramenta do terrorismo de Estado, o AI-5 só seria atirado na lixeira dez anos depois.

Nesse meio tempo, centenas de resistentes foram executados, dezenas de milhares torturados, mais de uma centena de parlamentares cassados, um sem-número de funcionários públicos atirados no olho da rua, a arte amordaçada (mais de 500 filmes, 450 peças teatrais, 200 livros e umas 500 canções sofreram os rigores da censura), etc.

Quando os gorilas saíram do armário, o Brasil entrou no período mais bestial e vergonhoso de sua História.
.
UM DEPOIMENTO PESSOAL – Para jovens estudantes que, como eu, ingressaram na luta a partir do novo ascenso do movimento de massas,  aquele agourento 13 de dezembro de 1968 marcou o fim da aventura e o início da tragédia.

Passáramos o melhor ano de nossas vidas descobrindo a luta e descobrindo-nos na luta. Aí veio aquele pacote de medidas draconianas ao extremo, cujas implicações captamos de imediato: haviam declarado guerra contra nós e os riscos dali em diante seriam imensos. 

Mesmo assim, diante da alternativa desistir x perseverar, fizemos a opção digna... que se revelaria das mais sofridas.

Então, o AI-5 foi o divisor de águas entre o 1968 exuberante e o 1969 soturno.
A passeata dos 100 mil foi o ápice dos protestos de 68

Entre o enfrentamento a céu aberto e o martírio nos porões.

Entre a luta travada ao lado das massas despertadas e a luta que travamos sozinhos em nome das massas amedrontadas.

Meu avô morreu quando meu pai tinha 11 anos. Como era o primogênito, minha avó fez com que começasse imediatamente a trabalhar  numa fábrica escura, barulhenta e empoeirada, burlando a legislação que exigia idade mínima de 14 anos.

Passou o resto da vida lamentando a responsabilidade que desabou cedo demais sobre seus ombros. Num dia, estava despreocupadamente jogando bola no campinho ao lado de sua casa. No outro, esfalfando-se oito horas seguidas para colocar o pão na mesa familiar.

O AI-5 teve o mesmo efeito sobre mim. Até então, a militância era puro deleite. De um momento para outro, tornou-se um pesadelo que me deixou em frangalhos, além de tragar alguns dos meus melhores amigos e tantos companheiros estimados.

Parafraseando uma bela canção de Neil Young, foi a saída do azul e entrada nas trevas. (por Celso Lungaretti)

sexta-feira, 1 de novembro de 2019

O EDUARDO BOLSONARO QUER AS PORTAS DO INFERNO ESCANCARADAS DE NOVO

"E você tendo ido,
não pode voltar,
quando sai do azul
e entra nas trevas"
(Neil Young,
Hey Hey My My)
Já lá se vai mais de meio século desde que o Brasil saiu não do azul, mas de um cinza já bem escuro, para entrar nas trevas absolutas do Ato Institucional nº 5.

O 13 de dezembro de 1968 caiu apropriadamente numa 6ª feira –a mais funesta da História brasileira. Foi quando 17 sinistros personagens, com uma simples canetada, deram sinal verde para torturas, assassinatos, estupros, ocultação de cadáveres e todo o festival de horrores dos anos subsequentes.

Eram eles o ditador Costa e Silva e 16 de seus ministros: Albuquerque Lima (Interior); Augusto Rademaker (Marinha); Carlos Simas (Comunicações); Costa Cavalcanti (Minas e Energia); Delfim Netto (Fazenda); Gama e Silva (Justiça); Hélio Beltrão (Planejamento); Ivo Arzua (Agricultura); Jarbas Passarinho (Trabalho); Leonel Miranda (Saúde); Lyra Tavares (Exército); Macedo Soares (Indústria e Comércio); Magalhães Pinto (Relações Exteriores); Mário Andreazza (Transportes); Souza e Mello (Aeronáutica); e Tarso Dutra (Educação).  

Só um permanece vivo até hoje, Delfim Netto, que está com 91 anos e não se arrepende da autoria de uma assinatura da qual tanto sangue jorrou: continua afirmando que, apresentando-se as mesmas circunstâncias, voltaria a proceder da mesmíssima maneira.
Eles desembestaram o terrorismo de Estado

O 16º a falecer foi (em junho de 2016) o igualmente empedernido Jarbas Passarinho, de origem militar, que  ao proferir seu voto, disse a frase mais emblemática daquela infame reunião ministerial:
.
"Às favas, sr. presidente, neste momento, todos os escrúpulos de consciência"
.
Ele continuou, pelas décadas adentro, enturmado com as aves de mau agouro, sempre defendendo o regime de exceção ao qual serviu nas equipes ministeriais de Costa e Silva, Médici e Figueiredo.

Um mês depois chegou a vez de Rondon Pacheco, cuja assinatura não consta do documento, embora chefiasse o Gabinete Civil. Talvez a lacuna se deva a haver sido um personagem reticente naquele momento, tendo inclusive tentado fixar um prazo para a vigência do AI-5: um ano apenas. 

Também se atribui a ele e ao ministro da Justiça Gama e Silva o mérito de, numa reunião prévia, terem excluído do documento alguns pontos mais duros, como o fechamento do Congresso Nacional e do Supremo Tribunal Federal.  
"o arbítrio ditatorial foi levado ao paroxismo"
Outra voz dissonante foi a do vice-presidente Pedro Aleixo, que inclusive empenhou-se adiante em restabelecer a legalidade. Chegou a convencer Costa e Silva, mas este morreu antes de concretizar o intento (coincidência?).

O  golpe dentro do golpe, que levou ao paroxismo o fechamento ditatorial do País, foi o lance decisivo da disputa interna entre a linha dura militar (que queria radicalizar o arbítrio) e os conspiradores originais (oficiais veteranos da participação brasileira na 2ª Guerra Mundial).

Os últimos, encabeçados por Castello Branco, pretendiam usurpar o poder por pouco tempo. Falavam numa intervenção cirúrgica, durante a qual imporiam medidas que modernizassem o Estado e enfraquecessem a esquerda (prisões, perseguições, cassações, extinção de entidades legais, etc.). 

Aprenderam, contudo, que implantar uma ditadura é bem mais fácil que dar-lhe fim.

As duas posições competiram acirradamente pela hegemonia na caserna ao longo de 1968, mas o crescimento dos movimentos contestatórios fez a balança pender para  o lado dos ferrabrases. 

Estes iam ao encontro da cultura de intolerância que grassava nos quartéis, pois se propunham a dotar o regime de meios para reagir com maior contundência às manifestações de rua e ao desafio das organizações armadas, passando por cima dos direitos humanos e das garantias constitucionais.
Pelo menos 434 opositores foram mortos da ditadura 

Pesaram também os interesses mesquinhos dos oficiais das três Armas, seduzidos pelas perspectivas que o prolongamento do regime de exceção e a ampliação dos poderes ditatoriais abriam para seu enriquecimento pessoal:
  • os da ativa, como gestores de um setor estatal que estava sendo cada vez mais inflado, ou como beneficiários de suas boquinhas; e
  • os da reserva como facilitadores dos favores oficiais (quase todos os grandes grupos privados contrataram militares reformados para integrarem seus conselhos de administração, como forma de terem seus interesses contemplados nos altos escalões governamentais).
O pretexto para a nova virada de mesa foi um discurso exaltado do deputado Márcio Moreira Alves numa sessão esvaziada (o chamado pequeno expediente) da Câmara Federal, no início de setembro de 1968.
Discurso errado, hora errada
Tratava-se de uma lengalenga sem verdadeira importância (incluía até uma sugestão às moças, de que não namorassem alunos das academias militares –vide aqui), proferida apenas para constar dos anais e poder ser exibida depois aos eleitores, quando ele lhes fosse pedir votos no pleito seguinte.

Mas, um jornalista favorável ao arbítrio vislumbrou a oportunidade de uma provocação e trombeteou-a; em seguida, os partidários do enrijecimento a divulgaram amplamente, mimeografada, entre os fardados, insuflando a indignação.

As Forças Armadas se declararam atingidas e o governo pediu ao Congresso Nacional a abertura de um processo visando à cassação de Moreira Alves. 

Os parlamentares, depois de em tantas ocasiões, tão vergonhosamente, se prostrarem aos ultimatos da caserna, daquela vez rechaçaram o pedido, temendo que outras cabeças fossem exigidas na sequência e a caça às bruxas acabasse extinguindo o mandato de muitos deles. 

Pateticamente, encerraram a sessão cantando o Hino Nacional, sem perceberem que tinham é escancarado as portas do inferno.
Revista tida como outro pivô do AI-5

A resposta da ditadura foi imediata e a mais tirânica possível: colocou os Legislativos federal e estaduais em recesso e impôs à Nação, na marra, novas e terríveis regras do jogo.

O presidente da República (escolhido por um Congresso Nacional expurgado e intimidado) passou a ter plenos poderes para cassar mandatos eletivos, suspender direitos políticos, demitir ou aposentar juízes e outros funcionários públicos, suspender o habeas-corpus em crimes contra a segurança nacional, legislar por decreto e julgar crimes políticos em tribunais militares, dentre outras medidas totalitárias.

Principal ferramenta do terrorismo de estado, o AI-5 só seria atirado na lixeira dez anos depois. Nesse meio tempo, centenas de resistentes foram executados, dezenas de milhares torturados, mais de uma centena de parlamentares cassados, um sem-número de funcionários públicos no olho da rua, a arte amordaçada (mais de 500 filmes, 450 peças teatrais, 200 livros e umas 500 canções sofreram os rigores da censura), etc.

Quando os gorilas saíram do armário, o Brasil entrou no período mais bestial e vergonhoso de sua História.
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UM DEPOIMENTO PESSOAL – Para jovens estudantes que, como eu, ingressaram na luta a partir do novo ascenso do movimento de massas,  aquele agourento 13 de dezembro de 1968 marcou o fim da aventura e o início da tragédia.

Passáramos o melhor ano de nossas vidas descobrindo a luta e descobrindo-nos na luta. Aí veio aquele pacote de medidas draconianas ao extremo, cujas implicações captamos de imediato: haviam declarado guerra contra nós e os riscos dali em diante seriam imensos. 

Mesmo assim, face à alternativa desistir x perseverar, fizemos a opção digna... que se revelaria das mais sofridas.

Então, o AI-5 foi o divisor de águas entre o 1968 exuberante e o 1969 soturno.
A passeata dos 100 mil foi o ápice dos protestos de 68

Entre o enfrentamento a céu aberto e o martírio nos porões.

Entre a luta travada ao lado das massas despertadas e a luta que travamos sozinhos em nome das massas amedrontadas.

Meu avô morreu quando meu pai tinha 11 anos. Como era o primogênito, minha avó fez com que começasse imediatamente a trabalhar  numa fábrica escura, barulhenta e empoeirada, burlando a legislação que exigia idade mínima de 14 anos.

Passou o resto da vida lamentando a responsabilidade que desabou cedo demais sobre seus ombros. Num dia, estava despreocupadamente jogando bola no campinho ao lado de sua casa. No outro, esfalfando-se oito horas seguidas para colocar o pão na mesa familiar.

O AI-5 teve o mesmo efeito sobre mim. Até então, a militância era puro deleite. De um momento para outro, tornou-se um pesadelo que me deixou em frangalhos, além de tragar alguns dos meus melhores amigos e tantos companheiros estimados.

Parafraseando a bela canção de Neil Young, foi a saída do azul e entrada nas trevas. (por Celso Lungaretti)
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