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Manifestação na porta da Folha contra o editorial que qualificou de comedida a ditadura militar brasileira |
Resta saber até onde vai a alteração de rumo, por enquanto mais acentuada na Folha.
Se será apenas uma reação à retomada de algumas velhas palavras de ordem populistas do século passado por parte do PT (voltou a falar no abismo entre pobres e ricos, sem, contudo reassumir a luta de classes e a obrigatoriedade de superação do capitalismo) ou há algo de mais podre ainda no balaio. Fico com a primeira hipótese.
O Estadão é quem mantém a posição mais firme quanto ao golpismo: é totalmente avesso ao bolsonarismo e favorável à rigorosa punição da ralé estridente que lambe os sapatos de bilionários dos EUA. Critica algumas medidas de Moraes e do Supremo que considera excessivas, mas sem absolver os piores culpados pela insegurança institucional. Já no Governo Lula voltou a bater pesado, após um período em que pareceu poupá-lo para não favorecer a extrema-direita
Ziguezagues mais ou menos acentuados marcam toda a trajetória desses dos jornalões.
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Nos terríveis anos Médici, o Estadão preenchia com trechos de poesias o espaço das notícias censuradas |
Ninguém esquece a frase de um dos Mesquitas, após ordenar à equipe de segurança que impedisse a entrada da repressão no saudoso prédio da rua Major Quedinho para prender um profissional da casa: "Ele pode ser subversivo lá fora, mas aqui dentro é meu jornalista".
Dizimados os efetivos da luta armada, Ernesto Geisel assumiu o poder em março/1974 e começou a implementar sua abertura lenta, gradual e progressiva, desmantelando aos poucos a engrenagem de terrorismo de estado que se tornara dispensável.
Foi quando Golbery do Couto e Silva, eminência parda do governo que se iniciava, cochichou ao Otávio Frias pai: como Geisel, qual um déspota esclarecido, pretendia flexibilizar aos poucos a censura até extingui-la, convinha à Folha assumir uma postura mais crítica, não deixando O Estado de S. Paulo ocupar sozinho o espaço, que se abriria, de oposição jornalística (consentida) ao regime.
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A Folha saudando a marcha da família próspera, com Asmodeus, pela supressão da liberdade... |
Perspicazes, os Frias perceberam que, surfando nessa onda, poderiam não só limpar sua barra pelo colaboracionismo anterior, como tornar a Folha um jornal atraente para a classe média cada vez mais insatisfeita com o regime militar. Um ovo de Colombo que lhe garantiria, a médio prazo, a liderança do mercado brasileiro.
Deram carta branca para o trotskista Cláudio Abramo, diretor de redação, recrutar alguns dos maiores talentos do jornalismo brasileiro, oferecendo-lhes um porto seguro numa época em que tantos veículos temiam acolhê-los ou impunham-lhes restrições castradoras.
Então, os textos da Folha passaram a ostentar assinaturas vistosas como as de Alberto Dines, Gerardo Mello Mourão, Glauber Rocha, João Batista Natali, Lourenço Diaféria, Luiz Alberto Bahia, Newton Rodrigues, Osvaldo Peralva, Paulo Francis, Perseu Abramo, Plínio Marcos, Tarso de Castro, etc., todos escolhendo seus assuntos sem restrições editoriais (apenas não podiam ir além do que a ditadura conseguia digerir) e desfrutando de espaços generosos.
Além disto, formou uma valorosa equipe de repórteres especiais, com destaque para Ricardo Kotscho, passando a desenvolver um apreciável jornalismo investigativo.
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Manchete hilária: o Estadão acreditava que o poder seria saneado e logo devolvido aos civis. |
Surpreendentemente, Casoy foi até mais comedido em suas devoções direitistas do que o patrãozinho Otávio Frias Filho, que resolveu assenhorar-se do brinquedo em 1984 e se revelaria de corpo inteiro em fevereiro de 2009, no famoso editorial da ditabranda, quando a Folha grotescamente tentou provar que Sérgio Fleury e Brilhante Ustra exterminavam esquerdistas sem perder a ternura jamais...
Não lhe nego o mérito de haver engajado a Folha na campanha das diretas-já, mas era algo obrigatório, já que os leitores do jornal eram maciçamente pelo fim da regime.
Enfim, as preferências dos jornalões e do grande empresariado mudam com frequência e, no momento, os dois jornais devem estar considerando que a derrocada do bolsonarismo seja fato consumado (até o centrão já começa a descer do muro, sinalizando que não quer de volta os altamente tóxicos macaquinhos amestrados do Trump).
Não são demonstrações de força, mas sim meros blefes e cortinas de fumaça que antecedem a queda. (por Celso Lungaretti)
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