Saudei a vitória da Dilma, abrindo-lhe um crédito de confiança. Manifestei a esperança de que, na Presidência, ela continuasse sendo a militante de outrora, que "como Chaplin, queria chutar o traseiro dos ociosos" e "como Marx, pretendia proporcionar a cada trabalhador o necessário para sua realização plena como ser humano".
Mantive-me, contudo, cautelosamente reticente, pois ela me inspirava mais dúvidas do que certezas:
"Dilma (...) terá de provar que é algo mais do que uma estátua de esculpida com tamanha perfeição pelo artista Michelangelo da Silva que acabou ocupando o melhor pedestal no panteão do Planalto.
...O lulismo no poder já provou sua competência no gerenciamento do estado em conformidade com os interesses dominantes, mas garantindo uma fatia um pouco maior do bolo para aqueles que produzem todas as fatias.
A dívida social, entretanto, está muito longe de ser zerada, como o foi o débito com o FMI.
Torço para que a Dilma saiba aproveitar seu grande momento..."
E, aliviado, voltei a me distanciar da política oficial, pois a linha que definira para minha atuação na web era a de ignorar as escaramuças e pendengas da Corte, defendendo apenas os personagens e valores revolucionários.
P. ex., projetos governamentais e as críticas que opositores lhes faziam não estavam na minha mira, mas o da transposição do rio São Francisco passou a estar quando o bispo Luís Flávio Cappio contra ela utilizou um recurso frequente nas lutas revolucionárias, o da greve de fome. Fiquei indignado com a decisão do Lula, de pagar para ver, tão insensível como qualquer Margaret Thatcher, ajudando a esvaziar uma forma extrema de protesto a que já recorremos muitas vezes no passado e poderemos ter de voltar a recorrer.
Então, até hoje sou implacável com essa maracutaia do agronegócio, sempre destacando as notícias negativas que pipocam: não cumprimento de metas, estouros do orçamento, evidências de inutilidade ou insuficiência de algumas iniciativas do programa e, claro, corrupção. Tudo aquilo que D. Cappio tentou evitar.
Então, até hoje sou implacável com essa maracutaia do agronegócio, sempre destacando as notícias negativas que pipocam: não cumprimento de metas, estouros do orçamento, evidências de inutilidade ou insuficiência de algumas iniciativas do programa e, claro, corrupção. Tudo aquilo que D. Cappio tentou evitar.
Mas, é uma exceção. Como regra, considero que os governos, sob o capitalismo, jamais levarão os explorados aonde eles precisam chegar, daí não merecerem a atenção obsessiva que a grande imprensa e a esquerda chapa branca lhes dedica. Fixo-me nas perspectivas de transformação da sociedade, não no dia a dia do gerenciamento da dominação burguesa.
Então, mesmo percebendo que Dilma se tornara uma pessoa bem diferente daquela que conhecera, evitei comentar sua atuação presidencial, salvo no que esta se chocasse frontalmente com o ideário da esquerda.
Então, mesmo percebendo que Dilma se tornara uma pessoa bem diferente daquela que conhecera, evitei comentar sua atuação presidencial, salvo no que esta se chocasse frontalmente com o ideário da esquerda.
Em 1969, ela seguia fielmente a linha da VAR-Palmares, que acreditava ser imprescindível algum enraizamento nas massas para a organização não se tornar apenas um exército combatendo outro.
Já para nós, os egressos e depois refundadores da VPR, bastava estarmos imbuídos da ideologia do proletariado, sendo dispensável o contato orgânico com o mesmo, que nos acarretaria riscos terríveis de segurança. O perfil de nosso pessoal seria mais apropriado para o cumprimento das tarefas militares da revolução, propaganda armada inclusive, deixando para outros grupos os laços com a população.
Já para nós, os egressos e depois refundadores da VPR, bastava estarmos imbuídos da ideologia do proletariado, sendo dispensável o contato orgânico com o mesmo, que nos acarretaria riscos terríveis de segurança. O perfil de nosso pessoal seria mais apropriado para o cumprimento das tarefas militares da revolução, propaganda armada inclusive, deixando para outros grupos os laços com a população.
Paradoxalmente, aquela que em 1969 nos acusava de vanguardistas não mais procurava, quatro décadas depois, estar junto das massas e interagir com elas.
Integrando governos desde 1986, adquirira os jeitos e trejeitos dos tecnoburocratas, passando a se ver como a mulher sapiens a quem competiria detectar o que fosse melhor para o povo e, gerindo pedaços do Estado, impulsionar as transformações que via como necessárias, independentemente de as massas compreenderem tais intentos e com eles concordarem.
Integrando governos desde 1986, adquirira os jeitos e trejeitos dos tecnoburocratas, passando a se ver como a mulher sapiens a quem competiria detectar o que fosse melhor para o povo e, gerindo pedaços do Estado, impulsionar as transformações que via como necessárias, independentemente de as massas compreenderem tais intentos e com eles concordarem.
Para ela, implicitamente, os humildes explorados deixaram de ser os sujeitos da História, tornando-se apenas os beneficiários da ação estatal. Sua nova postura era um amálgama do velho nacional-desenvolvimentismo na economia com um bolivarismo light na política (uma tendência a avassalar outros Poderes e entes estatais, mas de forma gradual e sutil, sem incorrer num autoritarismo chocante).
Não deixo de compreender o que levou Dilma e muitos outros esquerdistas a abdicarem dos projetos de transformação em profundidade da nossa sociedade, contentando-se com mudanças bem mais tímidas. O desencanto da terrível derrota da geração que pegou em armas contra a ditadura os fez procurar atalhos para obterem, pelo menos, alguns resultados.
Se tivessem lido com mais atenção Marx, Rosa Luxemburgo e outros clássicos, saberiam que o reformismo convém muito mais à burguesia do que aos explorados; e que a mera infiltração no Estado não equivale a uma revolução, pois aquilo que o povo verdadeiramente não conquista, dificilmente conseguirá manter depois.
Até porque acaba não reconhecendo como seu o governo de seus presumidos benfeitores, muitas vezes interessados mais em se perpetuarem indefinidamente no poder do que em fazerem avançar o processo revolucionário.
Não me dispus, contudo, a fazer críticas mais contundentes ao primeiro governo da Dilma, pois sabia que, com tais premissas, ela não iria longe --ou seja, dificilmente conseguiria consolidar o reformismo e fechar, por longo período, as portas à revolução. Sua esperança de fazer deslanchar a economia brasileira a partir da ação estatal era um anacronismo, o pré-sal o sonho de uma noite de verão. Isso tudo jamais daria certo.
E, claro, a fetichização dos governos por parte da esquerda (além da gana de parte dela pelas boquinhas) ainda é tão forte que, sensatamente, avaliei como contraproducente abrir o jogo: eu ficaria isolado.
Algo que para mim é questão de princípio me fez, no entanto, deixar de lado o cálculo político e assumir uma postura mais incisiva com relação ao Governo Dilma: a criação de uma Comissão da Verdade como contraponto propagandístico a algo muitíssimo mais sério, a decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos sobre a guerrilha do Araguaia, responsabilizando o Brasil pelo extermínio de 70 militantes (em sua grande maioria, capturados com vida) e exigindo apuração rigorosa dos massacres, localização dos restos mortais e punição dos carrascos. (continua)
Não deixo de compreender o que levou Dilma e muitos outros esquerdistas a abdicarem dos projetos de transformação em profundidade da nossa sociedade, contentando-se com mudanças bem mais tímidas. O desencanto da terrível derrota da geração que pegou em armas contra a ditadura os fez procurar atalhos para obterem, pelo menos, alguns resultados.
Se tivessem lido com mais atenção Marx, Rosa Luxemburgo e outros clássicos, saberiam que o reformismo convém muito mais à burguesia do que aos explorados; e que a mera infiltração no Estado não equivale a uma revolução, pois aquilo que o povo verdadeiramente não conquista, dificilmente conseguirá manter depois.
Até porque acaba não reconhecendo como seu o governo de seus presumidos benfeitores, muitas vezes interessados mais em se perpetuarem indefinidamente no poder do que em fazerem avançar o processo revolucionário.
Não me dispus, contudo, a fazer críticas mais contundentes ao primeiro governo da Dilma, pois sabia que, com tais premissas, ela não iria longe --ou seja, dificilmente conseguiria consolidar o reformismo e fechar, por longo período, as portas à revolução. Sua esperança de fazer deslanchar a economia brasileira a partir da ação estatal era um anacronismo, o pré-sal o sonho de uma noite de verão. Isso tudo jamais daria certo.
E, claro, a fetichização dos governos por parte da esquerda (além da gana de parte dela pelas boquinhas) ainda é tão forte que, sensatamente, avaliei como contraproducente abrir o jogo: eu ficaria isolado.
Algo que para mim é questão de princípio me fez, no entanto, deixar de lado o cálculo político e assumir uma postura mais incisiva com relação ao Governo Dilma: a criação de uma Comissão da Verdade como contraponto propagandístico a algo muitíssimo mais sério, a decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos sobre a guerrilha do Araguaia, responsabilizando o Brasil pelo extermínio de 70 militantes (em sua grande maioria, capturados com vida) e exigindo apuração rigorosa dos massacres, localização dos restos mortais e punição dos carrascos. (continua)
Nenhum comentário:
Postar um comentário