domingo, 9 de agosto de 2020

GENOCIDAS TÊM DE SER PUNIDOS: A RESPONSABILIZAÇÃO PELA TRAGÉDIA HUMANA DA COVID-19 É OBRIGATÓRIA!

PERDEMOS 100 MIL VIDAS
Movidos por compaixão, declaramos nossa proximidade com todas as famílias enlutadas no país, reverentes que somos aos 100 mil mortos vitimados pela atual pandemia e suas consequências.

Não se trata de uma fatalidade, mas de uma tragédia humana que poderia ter sido evitada.

Em 7 de abril deste ano, Dia Mundial da Saúde, as entidades que hoje assinam este artigo juntaram suas vozes para lançar o Pacto pela Vida e Pelo Brasil, um alerta à sociedade brasileira sobre a crise que avançava no país —crise não apenas sanitária, mas social, econômica e política. O Brasil contabilizava, então, 14.049 pessoas infectadas e 688 mortos pelo novo coronavírus.

Passados quatro meses, essa crise humanitária ganhou patamar bem mais elevado: com cerca de 3 milhões de infectados, hoje o país se curva diante da triste marca de mais de 100 mil mortos pela Covid-19, sem ações articuladas e alinhadas à altura de mudar este cenário preocupante.

Sabia-se que a pandemia poderia assumir proporções importantes no Brasil, um país com imensa desigualdade regional e social, concentração de renda, altas taxas de desemprego, economia em decadência, atendimento público à saúde fragilizado e um vergonhoso índice de saneamento básico.
Sabia-se, também, que o enfrentamento daquele vírus até então pouco conhecido, de contágio fácil e efeitos devastadores, oferecia um importante rumo a seguir: o isolamento social, para quebrar a cadeia de transmissão e dar tempo para a organização do sistema de saúde diante do esperado aumento de casos. Foi exatamente isso o que preconizou a Organização Mundial da Saúde, em consonância com os melhores centros de pesquisa em saúde do mundo.

No entanto, o Brasil trilhou o caminho da insensatez. Ao mesmo tempo em que o Ministério da Saúde defendia que o país seguisse as normas da OMS —inclusive com base no que ocorrera em outros países—, autoridades faziam, publicamente, afirmações que negavam a evidência científica, como a de comparar a Covid-19 a uma gripezinha e a de propagandear um medicamento não certificado por diferentes fontes científicas, além de estimular aglomerações e o contato físico com pessoas desprotegidas.

Desde a divulgação do Pacto pela Vida e pelo Brasil, foram 120 dias de turbulências políticas e de ausência de um plano nacional coerente para combate à pandemia.
As medidas de enfrentamento dos efeitos da Covid-19, especialmente no que diz respeito às populações mais vulneráveis, deixam muito a desejar. 

A renda emergencial colocada à disposição dos mais pobres, embora seja uma resposta imediata, está longe de sanar as necessidades básicas de cerca de 50 milhões de brasileiros. 

A transferência de recursos a estados e municípios para o enfrentamento da pandemia, aprovada pelo Congresso, ainda não chegou ao patamar de 35%.

A lei 14.021/20, estabelecendo ações emergenciais de saúde em comunidades indígenas, quilombolas e tradicionais, foi sancionada com vetos a serem urgentemente derrubados –entre eles, vetos à obrigatoriedade de acesso à água potável, a serviços de saúde de média e alta complexidade, à oferta emergencial de leitos hospitalares e UTIs e à disponibilização de ventiladores e outros equipamentos médicos.

A responsabilização por esta tragédia humana não pode deixar de ser feita. 

É evidente que o Brasil tem sido abalado pela força da própria pandemia, mas também tem sido duramente castigado pela incapacidade do governo federal em unir o país numa hora tão difícil, atuar de forma republicana em articulação com governadores, prefeitos e Poder Legislativo, e levar em consideração as orientações da ciência, das organizações de saúde, das entidades médicas e de saúde pública.

Deixamos registrada nossa solidariedade aos profissionais da saúde e aos trabalhadores de serviços essenciais que têm estado na linha de frente da batalha contra o novo coronavírus, muitas vezes em condições precárias e de alto risco.

Em memória das vítimas da Covid-19, exortamos a todos, brasileiras e brasileiros, mulheres e homens de boa vontade, a se juntarem neste momento de luto e reflexão. Certamente, a melhor forma de homenagear os que partiram será a nossa união para exigir respeito à vida e responsabilidade com o destino de 210 milhões de brasileiros, no exercício de práticas cidadãs que construam um novo tempo para o Brasil.

(assinam os presidentes da ABC, Luiz Davidovich; da ABI, Paulo Jeronimo de Souza; da CNBB, Dom Walmor Oliveira de Azevedo; da Comissão Arns, José Carlos Dias; da OAB, Felipe Santa Cruz; e da SBPC, Ildeu de Castro Moreira)

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