sábado, 26 de setembro de 2009

O BRASIL NUM MATO SEM CACHORRO

A rede da legalidade de Leonel Brizola foi fundamental para frustrar golpe semelhante ao hondurenho

Manuel Zelaya foi deposto por um golpe desfechado pelas Forças Armadas hondurenhas, com apoio da Corte Suprema e da maioria do Congresso.

A nenhum comentarista parece ter ocorrido que o paralelo histórico mais apropriado é a tentativa de usurpação do poder do vice-presidente João Goulart em agosto/1961.

Com a renúncia do presidente Jânio Quadros, os ministros militares e as forças reacionárias no Congresso Nacional pretenderam suprimir o direito do primeiro na linha sucessória, Goulart. Preferiam que o poder ficasse com o segundo substituto legal: o presidente da Câmara dos Deputados, Pascoal Ranieri Mazzilli.

A virada de mesa foi frustrada pela decidida reação do governador gaúcho Leonel Brizola, que entrincheirou-se no Palácio Piratini e passou a exortar o povo à resistência através da rádio (a chamada rede da legalidade); pela rejeição de sargentos e cabos das Forças Armadas ao golpe a que havia aderido a maioria dos oficiais; e pela tomada de posição ao lado da democracia do III Exército, baseado no RS, criando a ameaça de uma guerra civil.

Golpes brancos como esses dois são mais difíceis de combater do que os nitidamente totalitários, como a quartelada brasileira de 1964 e o pinochetazzo de 1973.

Quando um Castello Branco ou Pinochet assume o poder, há a certeza de que o país será submetido ao arbítrio por tempo indeterminado.

Quando quem assume é um Mazzili ou Micheletti, prometendo entregar a presidência a quem sair vitorioso num próximo pleito, há tendência à acomodação: por que mover céus e terras se a democracia foi apenas arranhada, mas não extinta?

Os golpistas brasileiros de 1961 sucumbiram à reação interna. É provável que, dependendo apenas da OEA e da ONU, ficasse tudo como estava, com Mazzili completando o mandato de Jânio Quadros.

Em Honduras a reação interna foi insuficiente para reconduzir Zelaya ao poder.

E os organismos internacionais emitiram as resoluções condenatórias de praxe, mas ficaram nisso. Seu repúdio ao golpe não implica a tomada de medidas realmente eficazes para frustrar o real objetivo das forças conservadoras: o afastamento do presidente legítimo durante o processo eleitoral.

Ao regressar clandestinamente a Honduras e colocar-se sob a proteção da embaixada brasileira, Zelaya apostou que sua presença na pátria desencadearia a sonhada reação popular, ou os organismos internacionais criariam vergonha na cara, ou ambos.

Negativo. Povo desarmado pouco pode fazer contra as Forças Armadas. E a recém-finda reunião do Conselho de Segurança da ONU deu um claro recado aos golpistas hondurenhos: se vocês não invadirem a embaixada brasileira, nada de mais grave lhes acontecerá.

Assim, o Brasil ficou num mato sem cachorro.

É o chamado óbvio ululante que conhecia as intenções de Zelaya e compartilhou sua aposta. Só ingênuos engolirão os protestos de inocência angelical.

Ao conceder-lhe abrigo por tempo indeterminado, sem obedecer as regras do asilo político nem impor limites à sua atuação dentro da embaixada, colocou-se numa situação vulnerável. Formalmente, o governo ilegítimo não deixa de ter alguma razão ao pedir que o Brasil explicite qual o status de Zelaya. As regras do jogo diplomático são essas.

A resposta de Lula foi um irritado "vocês são golpistas e não têm direito de me cobrar nada". Rugiu como leão.

Mas, se os golpistas não cometerem a asneira de invadir a embaixada, legitimando uma intervenção militar contra eles, o impasse permanecerá.

E o Brasil terá de decidir entre conformar-se com um desfecho pífio ou agir como os grandes países sempre agiram: impondo sua vontade aos países menores.

Ou seja, a escolha será entre sair como banana ou sair como imperialista. Dar um rugido mais forte ainda ou miar.

E o pior é que o golpismo poderá ter feito seu reingresso furtivo na cena política latino-americana, por conta da inépcia de quem poderia/deveria mantê-lo onde merecidamente estava: na lata de lixo da História.

2 comentários:

José Carlos Lima disse...

Mazilli, Pinochet, Micheletti...

Estes nomes tem uma sonoridade idêntica.

Pelo jeito o trio fará sucesso daqui prá frente, pois a direita achou um jeito de, como disse Jabor, praticar seu "golpe democrático".

Onde próximo "ditador democrático" emergirá das sombras após sequestrar o presidente eleito e mandá-lo de pijama para bem longe?

( )Nicarágua
( )Bolívia
( )Venezuela
( )Guatemala
( )EUA
( )Todas as alternativas

romério rômulo disse...

celso:
com toda essa turma que encabeça o seu blog, te deixo um abraço.
romério

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