A cassação de Deltan Dallagnol é mais um capítulo do processo de ostracismo que vem sendo imposto aos ex-membros da outrora poderosa operação Lava Jato, responsável por abalar os pilares da podre República brasileira entre os anos de 2014 e 2018.
Os chamados Tenentistas Togados espalharam o terror nas hostes políticas nacionais, atacando a tudo e a todos. Inicialmente, pareciam seguir a cartilha do Mensalão, focando o discurso da moralidade contra o governo petista, particularmente contra Lula, e por isso ganharam incondicional apoio da mídia e das altas instâncias do Judiciário. Gilmar Mendes, por exemplo, hoje grande inimigo dos lavajatistas, foi um entusiasmado apoiador de primeira hora da trupe.
Logo porém os tenentistas mostraram possuírem seu próprio programa político e começaram a estender investigações e devassas para todos os partidos e para todo o espectro do sistema. O objetivo não era apenas derrubar o lulopetismo, mas fazer vir a baixo toda a República, abrindo caminho para outra coisa mais assemelhada a um estado policialesco. Enquanto vigorou a aliança tática com o tucanato e a burguesia para viabilizar o Impeachment de Dilma, a corda dos togados foi sendo alongada, mas tendo se obtida a retirada da ex-presidente e, sobretudo, com a saída de cena de Lula, devido à sua prisão, as coisas começaram a desandar e o lavajatismo foi sendo paulatinamente minado.
A vitória de Bolsonaro em 2018 foi vista pelo establishment como efeito colateral do lavajatistismo graças ao seu discurso moralista e de crítica radical ao sistema político da República Nova. O plano era a vitória de Alckimin e o retorno do tucanato ao poder após quase 20 anos longe da rapadura, mas o ex-presidente fujão acabou faturando dentro da falência generalizada do sistema. A ida de Sérgio Moro para o Ministério da Justiça apenas evidenciou a íntima conexão entre a Lava Jato e a extrema-direita.
Foi sob a tutela de Bozo e de Moro que a Lava Jato começou a ser ostracizada. Já tendo cumprido seu objetivo de arruinar o lulopetismo e sob pressão dos políticos tradicionais - que condicionaram apoio ao governo em troca do desmonte da operação -, as investigações foram rareando e a autonomia da chamada República de Curitiba foi sendo podada. Em 2019, a Vaza Jato expôs os intestinos nada republicanos do grupo, demonstrando claramente o conluio existente entre MPF e Sérgio Moro e o quanto esse último era de fato o chefe do processo investigativo e não apenas um neutro juiz.Já no final daquele ano Lula era libertado e algum tempo depois teria seus processos anulados pelo STF. Estava montado o palco final do grande acordo nacional, com supremo, com tudo, nas imortais palavras de Romero Jucá, em que o petista seria a última salvação para o establishment impedir o bolsonarismo de engolir todas as instituições nacionais e ser definitivamente varrido do mapa.
Para os outrora heróis da Lava Jato o cenário agora era difícil. A maré virara e tinham feito inimigos para todos os lados, até mesmo com o próprio Bolsonaro, insatisfeito com as pretensões eleitorais de Moro. Esse abandona o governo acreditando na miragem de que seria candidato de uma suposta terceira via, nunca concretizada. Sem viabilidade presidencial, se agarra em um cargo de senador para ter imunidade e renda.
Deltan fareja o mesmo contexto difícil e o MPF, sob a tutela de Augusto Aras, inicia processo disciplinar contra ele. Para escapar, se demite do cargo do Ministério Público e, mesmo contrariando a Lei da Ficha Limpa, se lança candidato a deputado federal, conseguindo a vitória com tranquilidade.
No entanto, os tempos são outros e hoje o lavajatismo não possui mais nenhum poder para levar adiante qualquer ação política. A presença de seus membros no legislativo tem muito mais o papel de blindagem e salvaguarda financeira que o de avanço em um programa reformista. Não interessa mais à burguesia nacional e à plutocracia reviver os dias jacobinistas do Tenentismo Togado. Como resultado, deixam seus antigos vassalos entregues à sanha da miríade de inimigos que fizeram por todo lado naquela época.
Fosse possível sintetizar com uma só palavra a situação de Moro e Dallagnol neste momento e essa seria solidão. Tendo aberto múltiplos flancos de batalha, pois acreditavam estar fazendo desmoronar todo o sistema, fizeram centenas de inimigos, mas quase nenhum aliado. A conta está chegando e não parará de chegar tão cedo. (por David Emanuel Coelho)
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