quarta-feira, 17 de maio de 2023

LIVRO DE JOSÉ CHASIN É RELANÇADO EM BELO HORIZONTE. RETOMAR O CAMINHO DA REVOLUÇÃO É HOJE MAIS FUNDAMENTAL DO QUE NUNCA.

 

Realizou-se nessa terça-feira, 16/05, na Faculdade de Direito da UFMG - Universidade Federal de Minas Gerais - o lançamento do livro O Futuro Ausente, do marxista José Chasin, que pode ser baixado gratuitamente nesse link

Na realidade, o texto foi escrito há trinta anos na esteira da falência da URSS e do fiasco da transição democrática no Brasil com a eleição de Collor e o naufrágio da dita nova esquerda, com o PT à frente. Contudo, quando se lê o texto revela-se mais atual que a maioria esmagadora do que é escrito hoje em dia em nome do marxismo ou da esquerda em geral. Suas análises e problemas continuam na ordem do dia e não é possível refletir sobre os problemas e desafios da esquerda sem necessariamente passar por essa obra. 

Chasin é formado em filosofia pela USP, tendo sido ativo no movimento estudantil no período pré-1964. Fez parte à época do PCB - Partido Comunista Brasileiro - dentro do qual fez forte oposição às perspectivas teóricas e práticas do partido, sobretudo em sua ideia de apoiar uma suposta revolução burguesa no Brasil, posição com fundamental responsabilidade, como se sabe, pelo fiasco da esquerda em se opor ao golpe militar. Após a instalação da ditadura, perseguido pelo regime, não encontrou oportunidades para lecionar, tendo de ir para empregos comuns no setor privado, assim ficando até meados da década de 1970, quando consegue posto de professor na Escola de Sociologia e Política de São Paulo (Fesp-SP).

Ali, bastante fora do radar da repressão - que se concentrava na USP- desenvolve forte movimento de debate intelectual das obras de Marx, questionando as leituras simplistas da esquerda dominante e introduzindo outros marxistas, notadamente Lukács. Logo, porém, o regime também se atenta à dinâmica que lá se passava graças à ação de Vicente Unzer de Almeida, então professor da Fesp, alto executivo da Mercedes-Benz e colaborador da ditadura, além do apoio de professores da esquerda descontentes com as críticas desenvolvidas por Chasin. Diante desse movimento, acaba sendo demitido em 1976 com base no Ato Institucional nº 5 e no Decreto-Lei 477.

Mesa de lançamento do livro. Da esquerda para a direita: Vitor Sartori,
Sabina Silva, Vânia Noeli e Ester Vaisman. 
Voltou assim à condição de aperto financeiro, vivendo de cursos livres e aulas particulares. Sem opções no país, embarca em 1978 para Moçambique, para estruturar o ensino universitário naquele país. Acaba voltando de lá em 1980, após a Lei da Anistia, para trabalhar na Paraíba, logo porém também sendo perseguido pelas forças mais reacionárias do estado. Por fim, se estabelece em Belo Horizonte, dando aula de filosofia na UFMG até seu falecimento em 1998.

Nesse meio tempo entre sua volta de Moçambique e seu falecimento, foi responsável pelo surgimento do movimento Ensaio, editora que publicou diversas traduções importantes do pensamento marxista e uma importante revista para o debate intelectual entre várias vertentes da esquerda nacional. Por lá escreveram e debateram Florestan Fernandes, Paulo Freire, Ricardo Antunes, Antônio Cândido, Sérgio Lessa, entre outros. 

Na realidade, eu nunca tive aulas com José Chasin, mesmo tendo estudado no mesmo departamento onde deu aulas, e isso porque minha entrada na universidade ocorreu 8 anos após sua morte. Fui apresentado ao filósofo através de sua viúva, Ester Vaisman, a quem devo muito de minha formação marxista. Antes de tomar contato com suas obras, eu já tinha uma posição revolucionária, mas de forma alguma uma formação marxista adequada, tendo sido apenas com a leitura de seus textos que consegui chegar a um nível de rigor teórico e prático adequado.

Chasin me apresentou um marxismo além do lugar comum ou dos chavões partidários e militantes, fazendo-me compreender o papel determinante da teoria e a necessidade imperiosa de articular essa teoria com o entendimento do mundo concreto, do desdobramento histórico. Também me ensinou a não ter ilusões com a política tradicional e os partidos da dita esquerda, estando a única alternativa possível na emancipação humana total e completa. 

Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da UFMG,
meu local de formação universitária e último espaço de
trabalho de José Chasin. 
Quando escreveu seu texto, há trinta anos, Chasin se desamparava diante de um cenário de terra arrasada. O fracasso histórico da União Soviética tornava acéfalo por completo os partidos e movimentos revolucionários ao redor do mundo, ao mesmo tempo que mantinha o chamado por ele de cadáveres insepultos, estalinistas saudosos desse mesmo regime falecido. Em paralelo, a nova esquerda rejeitava o marxismo e embarcava em análises do mundo capitalista sem qualquer rigor teórico, não tardando muito para nadarem na corrente neoliberal. Já à época ele dizia que o Império do Nada passava a presidir - se referindo a Collor - trazendo a primeiro plano todos os preconceitos e tendências conservadoras, com a morte da revolução. Mal sabia ele o quanto as coisas piorariam muito décadas após sua morte. 

Na realidade, quando se lê seus textos entre as décadas de 1980-90 é notável o quanto ele viu com clareza o desenvolvimento histórico mundial e particularmente do Brasil, antecipando em muito fenômenos que viriam a ocorrer apenas na época atual. Significativo, por exemplo foi seu prognóstico do fiasco de PT e PSDB - devemos recordar que, na década de 1990, os tucanos eram considerados de esquerda... - e sobretudo o quanto Lula, ou melhor, Luís Inácio, era um político medíocre  com profundo peso reacionário. 

Vinte e cinco anos após sua morte, é preciso reconhecer o quanto seu pensamento segue vivo e necessário. Se quisermos trabalhar por um futuro que não seja ausente, José Chasin é um dos autores fundamentais para esse processo. (por David Emanuel Coelho) 

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