segunda-feira, 22 de março de 2021

UMA TENSÃO AGRESSIVA E REACIONÁRIA

O que está havendo com a (outrora estereotipada) imagem de cordialidade do povo brasileiro? 

Por que presenciamos tanta agressão física ou midiática anônima (ou até mesmo identificada) na linha da execração moral e até mesmo das ameaças à vida das pessoas?

Por que tanta intolerância com a opinião contrária, como se tivéssemos de apenas dizer amém aos que se consideram donos da verdade?

Por que assistimos a volta de posturas e usos simbólicos de insígnias que, num passado recente, representaram a sacralização fanática de posturas de intolerância e aceitação social passiva de agressões indiscriminadas (como o envio para a solução final em campos de concentração e/ou extermínio, de famílias judias cujo único crime era o de pertencerem àquela etnia)?

Por que surgiram tantos milicianos políticos (ou do crime organizado mesmo!), midiáticos ou em carne e osso, se jactando de suas performances marombadas e capacidades bélicas?

Não gosto de estereótipos que classificam comportamentos étnicos do tipo o baiano é preguiçosoo carioca é malandroos africanos são indisciplinadoso estadunidense é racista, etc., etc., etc. 

Geralmente, tais estereótipos são criados como forma de exaltação ou estigmatização, em ambos os casos embutindo preconceitos e tendo objetivos politicamente definidos e condenáveis. Tudo o que se faz desconsiderando o interesse geral da humanidade, mas apenas considerando o interesse de grupos, corporativos ou nacionalistas, regionais ou étnicos, é sempre destrutivo. O estigma estereotipado é a resultante disso.

Os comportamentos humanos são pautados por uma ambientação que lhes formata o agir dentro de determinados conceitos preestabelecidos. Não raros, os grupos sociais podem agir como manada, seguindo aquilo ou aquele que está à sua frente como 
condottiere

Não há um comportamento social preestabelecido e ditado por uma formação étnica específica; tudo depende dos condicionamentos sociais que pautam o comportamento social.

[Ou seja, o homem é produto do meio, ainda que seja ele mesmo o transformador desse meio pelo processo dialético do movimento social e seus entrechoques diários.]  

Nos momentos como o atual, de aguda crise social  –fruto da conjugação de uma crise do limite interno de expansão capitalista, que é incompatível com a sustentação social viável, e uma crise sanitária que impede o relacionamento social próprio ao sistema produtor de mercadorias, as tensões tendem a aflorar do modo mais irracional e animalesco possível. 

É o que hoje ocorre com muita intensidade no Brasil (e também noutras regiões do mundo).

A defesa encarniçada de postulados ideológicos tidos pelos seus defensores como verdades absolutas leva a um estado de sociopatia social no qual qualquer ação agressiva é justificada em nome de princípios que supostamente seriam a solução dos problemas sociais, ainda que aí estejam embutidos interesses políticos inconfessáveis, corporativos, partidários, classistas patronais ou da aristocracia social ou de operários.  

Temos muitos exemplos de tal comportamento na atual realidade política brasileira, país que amarga um dos piores indicadores econômicos mundiais e sociais diante da paralisia econômica. 

Temos queda do PIB; inflação, dívida pública e desemprego crescentes; falência de pequenos empresários; perda de renda de prestadores de serviços, etc. E tudo isso conjugado com um dos piores gerenciamentos da crise sanitária do planeta. 

O comportamento agressivo, reacionário, quase bélico, que nos indica um caminhar no sentido de configuração de beligerância civil acentuada, tem um nome: aprisionamento a um pensar ideológico maniqueísta conservador que não admite o fracasso de um modelo social exaurido, o capitalismo. 

Admitir o esgotamento do modelo capitalista significa pensar alternativamente a ele, e isto as elites não querem, pois: 
— o segmento intermediário instruído na educação positivadora dos valores capitalistas ocidentais, dela beneficiário e formador de opinião pública, tem medo e se mantém cada vez mais aferrado à retórica e conceitos do passado; e
— e o segmento dos trabalhadores somente pensa na obtenção do emprego (cada vez mais escasso) que lhes garanta a vida, e acredita que apenas a volta aos tempos difíceis da vida mercantil normalizada (bem menos ruim do que a anormalidade atual!) resolverá a atual situação.  

É o que chamo de aprisionamento do pensar, restringindo-o a uma única forma social, aquela que é imposta pela forma-sujeito da mercadoria, insana, lógica e socialmente destrutiva, e intrinsecamente autodestrutiva de sua própria lógica funcional. 

Um exemplo: o combate insano à indicação para o Ministério da Saúde, após o fracasso retumbante do general cujo curriculum era totalmente impróprio para a função, de uma profissional da medicina das mais experientes: a dra. Ludhmila Hajjar, reconhecida como médica competente pelos vários segmentos do poder. 

Bastou o fato de ser querida por todos e, portanto, por segmentos políticos a favor ou avessos ao bolsonarismo, para que surgisse uma campanha difamatória nas redes sociais, além de uma tentativa de invasão do quarto da dita cuja num hotel de Brasília (cuja equipe de segurança abortou o intento).

É assim o sectarismo ideológico: quem pode ajudar mas não corresponde ao perfil de fidelidade canina aos princípios ideológicos conservadores e reacionários da horda não serve para ajudar.  

Como bem disse Fernando Gabeira, os dois ministros anteriores que eram do ramo caíram porque não obedeceram à ilogia da receita médica da cloroquina; e o estranho no ninho caiu por ter aderido à dita cuja. Este é um bom exemplo de comportamento idiossincrático.

Assim, caminhamos, como diz a pungente música do Antônio Maria, compositor de outrora: Vim pela noite tão longa de fracasso em fracasso/ e hoje, descrente de tudo, me resta o cansaço,/ cansaço da vida, cansaço de mim,/ velhice chegando e eu chegando ao fim.

O governo Bolsonaro já chegou ao fim: envelheceu e definhou, tornando mais insuportáveis ainda os 21 meses em que teremos de continuar suportando a sua idiossincrasia, se antes não o interditarmos por sociopatia comprovada. 
Enquanto isto, hordas de fanáticos, diante do clamor nacional de repulsa ao seu comportamento claramente genocida, promovem a chamada 
fuga para a frente, pugnando por medidas contra o isolamento social e defendendo o enfrentamento virótico com a volta das relações de produção e comercialização, como se viver ou morrer desse no mesmo.

Muitos dos que assim agem têm parentes e amigos mortos, mas o aprisionamento ideológico conservador, ignorante, fanatizado e sem autocrítica possível, não os deixa pedir desculpas e adotar um pensar que, ao invés de apontar para um passado definitivamente superado pela dialética do movimento social, pelo menos aceitasse um pensar propositivo adequado à realidade contemporânea. 

A polarização entre o entulho que aí está (eleito pelo povo com promessas que são todos os dias contrariadas pelo pragmatismo oportunista de deslumbrados com o poder repentinamente alcançado, cujo norte é o poder conservador a qualquer custo) e a socialdemocracia que apenas que humanizar o capitalismo esgotado, representa uma falsa dicotomia, de vez que são galhos de uma mesma raiz: o modo de produção de mercadorias. 

Tal postura agressiva e reacionária está nos levando a um confronto perigoso, que poderá resvalar para uma guerra civil caso não adotemos medidas de suprimento das necessidades sociais cada vez mais acentuadas.

E tem como explicação a fidelidade canina e fanatizada ao aprisionamento ideológico conservador, agressivo e reacionário que se acha dono da verdade. (por Dalton Rosado) 

2 comentários:

celsolungaretti disse...

Companheiros, antes que alguém se queixe de que este texto já foi postado faz pouco tempo, explico.

Estamos turbinando alguns de nossos posts no Facebook, para que atinjam leitores fora de nossas respectivas "bolhas".

Os anúncios são montados pelo próprio Facebook, a partir do post que sai na página do Náufrago no próprio Face. Nela, o que aparece é o título do post, a imagem do topo e o comecinho do artigo.

Mas, a imagem do topo do post do Dalton era uma epígrafe, não daria um bom anúncio. Então, rediagramei o post e o publiquei pela segunda vez, agora com um novo título e uma nova imagem, para ficar do jeito que calharia bem para o anúncio no Face.

Aos demais, que já o haviam lido, minhas desculpas. Mas, queria que soubessem que não lhes tentei vender o mesmo peixe duas vezes... (CL)

Anônimo disse...

De volta à selva da Idade Média. Ou será que um dia saímos dela ?

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