terça-feira, 5 de novembro de 2019

O LIBERALISMO NÃO É LIBERAL – 2

(continuação deste post)
Diferentemente do que pode sugerir o seu nome, o liberalismo é intolerante para com os que explora quando os pressupostos de sua lógica autotélica do vazio fim em si mesmo de sua reprodução cumulativa desumana apresenta os travamentos cíclicos decorrentes de suas contradições intrínsecas.

Aliás, tais crise são cada vez menos espaçadas no tempo e cada vez mais intensas, circunstância que agora é vivida mundo afora pela maioria dos indivíduos sociais transformados em cidadãos. 

A cidadania é um cilada liberal econômica; não é por menos que se exige comprovação de renda para a concessão de passaportes. Quem é pobre não entra! 

O universo liberal ou keynesiano tutelado pelo Estado não passa de uma grande farsa, na qual o cidadão custeia a sua própria opressão pela via do pagamento dos impostos.

Quando os políticos liberais defendem a restrição dos direitos trabalhistas e previdenciários, sob a oposição da esquerda keynesiana estatista, esta é encarada pelos trabalhadores como sua legítima defensora.  Ledo engano.

Trata-se, na verdade, de uma falsa dicotomia de posições, já que ambos estão errados: o xis da questão não é a restrição ou a defesa de pretensos direitos, a sua intensificação ou atenuação, mas sim a superação desses pretensos direitos próprios à escravização.

A racionália da direita liberal, segundo a qual a supressão dos direitos trabalhistas beneficiaria os próprios trabalhadores, habilitando-os a conseguirem empregos numa economia desenvolvida, é falaciosa, pois a impositiva redução de salários em face da concorrência mundial de mercado (prevista pelo Marx esotérico) corresponde à fabula na qual se mata a galinha dos ovos de ouro para que ela tenha maior produtividade.

O raciocínio da esquerda keynesiana, que defende de pires na mão o respeito aos direitos trabalhistas e previdenciários, impossível de ser assegurado na atual conjuntura de decesso capitalista, é também falacioso, pois a solução real não está em melhorarmos as condições do trabalho abstrato e do trabalhador, mas sim na superação das suas próprias existências enquanto categorias capitalistas que são.
O liberalismo do ministro Paulo Guedes quer o Estado mínimo, capaz de suprir a contento a função repressora de regulamentação social restritiva de direitos pelas leis (e pela força, quando necessário). Isto não significa a negação do Estado, mas sim a corroboração de suas funções estratégicas. 

Tal postura liberal se choca, muitas vezes, com o orgulho militar do poderio da sua força bélica, com tendência estatizante (os governos militares de 1964 a 1985 estatizaram mais do que pretendia João Goulart, ainda que as estatizações tivessem conteúdos diferentes) e a necessidade capitalista nesses tempos de depressão econômica mundial.

O governo atual é dividido entre:
— o pensamento militarista estatizante;
— as astro-ilógicas teses olavistas; 
— o fundamentalismo religioso damareseano e da bancada governamental e parlamentar evangélica;
Chile: repudio emblemático ao liberalismo
— a cegueira ecológica do ministro do Meio Ambiente;
— a relação com a elite parlamentar fisiológica; e
— a simbiose armamentista entre o crime organizado, milícias e segmentos da polícia, que se dizem antagônicas dentro de um mesmo espectro funcional de morte.

Em último caso, é o capital quem comanda a idiossincrasia do atual governo, presidido por um governante primário cuja pretensão é que tudo termine em pizza e que ele seja preservado do impeachment até 2022, quando ele supõe que ainda possa tentar reeleger-se  (três batidas na madeira), tudo isto com o gosto forte de molho de sangue.     

A nós, os revolucionários emancipacionistas, cabe distanciarmo-nos do processo eleitoral viciado e potencializarmos pela conscientização o imenso sentimento de insatisfação popular contra tudo isso que 'tá aí, demonstrando que é possível uma sociedade organizar-se de forma horizontal, num processo de produção social equânime, sem mercado e sem mercadoria (portanto sem valor, dinheiro e trabalho abstrato) e com consciência ecológica de sustentabilidade. 

Nesse sentido o Brasil, por sua extensão territorial e potencialidade material de suas riquezas, é um dos países do mundo com mais possibilidade de consolidação de um processo emancipacionista nesses moldes.

Definitivamente o liberalismo não é liberal como quer parecer, nem socialmente isento. O liberalismo é intervencionista do ponto de vista estatal sempre que veja ameaçados (como agora ocorre) os seus corroídos pilares de sustentação pela oxidação dos seus fundamentos erodidos.

Trata-se de uma doutrina econômica fadada ao fracasso por suas próprias contradições internas, ainda que os economistas burgueses disseminem ilusões de um futuro dourado, sempre desmentidas pela realidade. 

Alguém se lembra de quando foi a última vez em que viu uma projeção de crescimento do PIB do Brasil para os anos seguintes ser adiante confirmada?!. Pois é...

Os vaticínios que fazemos não são derivados de um sentimento parcial, faccioso, derrotista ou pessimista da realidade, mas de uma análise científica da economia política, aqui criticada, cujos conceitos vimos colocando à luz dos debates e em original contraponto às teses conservadoras ou reformistas, hoje e ontem mais vulgarmente difundidas. 

É por acreditarmos na viabilidade do futuro emancipado da humanidade que somos emancipacionistas! (por Dalton Rosado)   

2 comentários:

Anônimo disse...

Mais um texto esclarecedor.

Estive assistindo um filme a respeito da Coréia do Norte e me impressionou o fato de que lá não se pagam impostos e o estado provê todo o necessário aos norte-coreanos.
Logo lembrei-me do você, Dalton, e gostaria de perguntar se a sua tese baseia-se em algo semelhante ao que está ocorrendo na Coréia do Norte?
É um tipo de sociedade como da Coréia do Norte que você visualiza quando fala da extinção das relações capitalistas?

celsolungaretti disse...

Caro leitor,

a relação social em voga na Coreia do Norte é a antítese de tudo o que nós propomos.

Com uma economia estatal completamente nacionalizada, na qual as categorias capitalistas estão presentes (valor, trabalho abstrato, dinheiro, mercadorias, etc.), o Estado é o senhor de todas as riquezas abstratas (produzidas sob esse critério, da mensuração pelo valor) e controla tanto a produção como a distribuição dos bens necessários ao consumo.

Assim, com salários baixíssimos (USS 47 por mês), reina a pobreza naquele país com uma casta privilegiada (militares, que são financiados pelo Estado, e burocratas em torno do exercício autoritário de poder) que se diferencia da maioria do povo norte-coreano amordaçado pela força do autoritarismo militar.

É graças a isso que aboliu em abril de 1974 a cobrança de impostos, porque o Estado se apropria de toda a riqueza abstrata (dinheiro e mercadorias) produzida pelos trabalhadores. Trata-se da maior carga tributária do mundo, mas com outro nome.

Com solo pouco fértil, e economia industrial sem ligações com o comércio internacional, somente se mantém de pé porque a China sustenta a sua economia deficitária por conta de apoio incondicional e como resultante simbólica dos tempos da guerra fria, mantendo ali forte aparato militar (a guerra da Coreia no início dos anos cinquenta dividiu o lado dito comunista, Coreia do Norte, do lado dito liberal, apoiado pelos Estados Unidos, Coreia do Sul).

O que queremos é bem diferente do modelo norte-coreano.

Obrigado pela leitura e oportunidade de esclarecermos essa questão. (Dalton Rosado)

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