terça-feira, 3 de setembro de 2019

HÁ 50 ANOS, SOB PRESSÃO DOS EUA, A DITADURA MILITAR FOI OBRIGADA A ENGOLIR UM SAPO DESCOMUNAL

Toque do editor
Um amigo virtual de longa data, o Ângelo Genovesi, insistiu muito para que eu postasse uma matéria sobre o sequestro do embaixador estadunidense Charles Elbrick ao comemorar-se o cinquentenário do episódio.

O diabo é que minha decepção com o apagão mental de 39% dos eleitores brasileiros em outubro último continua me tirando não só o sono, mas também o ânimo para escrever sobre a luta terrivelmente desigual que um dia travamos, convictos de que valia a pena sacrificarmos nossas vidas e nossa integridade física e psicológica para que o povo brasileiro não tivesse mais de rastejar sob as botas militares.

Não que nós, os que sobrevivemos e os que morreram, teríamos agido diferente se adivinhássemos que um dia tantos mitificariam os autoproclamados herdeiros do Brilhante Ustra. 

Jamais! Nossa convicção era tão profunda que, se não tentássemos nos colocar à altura daquele desafio, seria nossa morte moral, bem pior do que a física. 
Mas, relembro o entusiasmo ardente do Eremias Delizoicov, que eu conhecia desde o curso primário, e fico pensando em como conseguiria explicar-lhe tanta infâmia e tão chocante retrocesso. Creio que não conseguiria. 

Enfim, registrarei a efeméride com um correto texto do Memorial da Democracia e abrindo uma janelinha para o documentário Hércules 56 (2006), do Silvio Da-Rin.

E, como nos nefandos tempos da ditadura militar, continuarei me guardando (e guardando meus melhores textos) pra quando o carnaval chegar. (por Celso Lungaretti)
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O OUSADO SEQUESTRO DO EMBAIXADOR
 DOS EUA
Na mais espetacular ação da guerrilha urbana, um grupo formado por militantes da Ação Libertadora Nacional (ALN) e do Movimento Revolucionário 8 de Outubro (MR-8) captura o embaixador dos Estados Unidos, Charles Burke Elbrick, numa rua de Botafogo, no Rio. 

Em troca do diplomata, as duas organizações passam a exigir a libertação de 15 presos políticos e a divulgação em rádio e TV de um manifesto revolucionário. O prazo fixado para resposta é de 48 horas.

O sequestro surpreendeu a Junta Militar, que havia assumido o poder poucos dias antes. Alguns oficiais das Forças Armadas foram contra a libertação dos presos, mas a pressão do governo dos EUA, fiador do golpe de 64 e da ditadura brasileira, falou mais alto. Washington exigiu que tudo fosse feito para resgatar com vida seu embaixador. 
Durante três dias, o Rio foi tomado por um imenso aparato policial e militar, que vasculhou toda a cidade em busca dos sequestradores e do diplomata norte-americano.

A casa onde eles estavam, na rua Barão de Petrópolis, chegou a ser vigiada por agentes da Marinha, mas não foi invadida — seja porque os agentes da repressão não tinham certeza de que Elbrick se encontrava no local, seja porque as ordens eram claras para que a vida do embaixador não fosse colocada em risco. 

Encurralada, a Junta cedeu às exigências, e os 15 presos foram enviados para o México, que aceitou recebê-los. 
Foram é salvos. Os 15!

Entre os libertados estavam os líderes estudantis Vladimir Palmeira, José Dirceu e Luiz Travassos, o dirigente histórico do PCB Gregório Bezerra, o jornalista Flavio Tavares e o líder da greve de Osasco, José Ibrahim. 

Os demais eram membros de organizações revolucionárias, como a ALN, o MR-8 e a VPR. Para formalizar a libertação de presos, que nem sequer respondiam a processo, foi assinado às pressas o Ato Institucional n° 13, implantando o banimento do país.

O embarque dos banidos num Hércules da FAB e a viagem ao México foram cercados de tensão, devido ao temor de que o avião fosse atacado no solo ou em voo por militares descontentes com a libertação dos presos políticos. 

Depois da chegada do grupo na Cidade do México, o embaixador Elbrick foi libertado pelo comando da ALN e do MR-8. Era um domingo, 7 de Setembro, Dia da Independência do Brasil e da maior humilhação até então imposta à ditadura.

Dois dias depois, foi baixado o AI-14, instituindo a pena de morte e a prisão perpétua em casos de “guerra revolucionária e subversiva”. Nos anos seguintes, em ações cada vez mais desgastantes e arriscadas, seriam sequestrados e trocados por presos políticos os embaixadores da Alemanha e da Suíça e o cônsul do Japão em São Paulo.
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