Por Clóvis Rossi |
MEMÓRIAS DE UM CAUDILHO
CHAMADO LULA
Caudilhos têm o péssimo hábito de impedir que nasça até mesmo uma humilde graminha ao redor deles. Menos ainda, portanto, que surja uma palmeira capaz de lhes fazer sombra.
Luiz Inácio Lula da Silva é o mais notável exemplar da raça dos caudilhos no Brasil.
A discussão em torno de um eventual plano B para a candidatura petista, se Lula ficar mesmo inabilitado, demonstra que ele não permitiu que despontasse um único nome capaz de consolidar-se à sua volta.
Não é apenas teoria. Há dois episódios que provam que Lula carrega os genes dos caudilhos. Primeiro, quando houve o momento anterior em que não podia ser candidato, escolheu uma figura menor, medíocre, despida do mais leve teor de carisma, para substituí-lo.
Dilma Rousseff serviria apenas para esquentar a cadeira até a volta de Lula nas eleições de 2014 (só lhe faltou coragem para dizer a Dilma que voltasse para casa que ele seria candidato). Mas, em 2018, voltaria, não fosse a Lava Jato.
Um segundo episódio ocorreu em 1997, véspera de uma eleição (1998) em que a vitória de Fernando Henrique Cardoso parecia absolutamente inevitável. O real ainda era um sucesso de público e crítica, como se verificou no pleito que deu a vitória a FHC no primeiro turno.
Lula já havia perdido duas eleições presidenciais e uma para governador de São Paulo. O debate no PT era se convinha ou não submeter seu líder a uma nova derrota ou se seria melhor experimentar um outro nome, em uma espécie de vai que cola.
Foi nesse cenário que houve, em um resort próximo a Santiago do Chile, uma reunião da esquerda latino-americana, convocada pelo sociólogo mexicano Jorge Castañeda e pelo filósofo brasileiro Roberto Mangabeira Unger.
No jantar que precedeu a abertura do encontro, os quatro petistas presentes discutiram a situação, em uma mesa isolada, enquanto o pianista tocava Besame Mucho.
Eram Lula, José Dirceu, Marco Aurélio Garcia e Tarso Genro. Em uma mesa distante, Ciro Gomes. Ao meu lado, Leonel Brizola nos divertia com suas saborosas histórias.
Os petistas comunicaram depois a decisão: Tarso Genro seria o candidato em 1998, desde que conseguisse seduzir as bases do PT.
Na volta ao Brasil, Lula não deu a mais leve chance para que Tarso consolidasse seu nome no partido. Ao contrário de Dilma, não seria um poste de Lula, mas o substituto do caudilho —uma palmeira que não poderia crescer.
Agora, a situação é diferente: se não houver alguma mudança dramática, Lula estará inabilitado para sempre e, portanto, não lhe importará regar uma árvore que possa crescer no seu território. Minha dúvida é saber se Lula está ou ficará convencido de que seu tempo acabou.
Se continuar achando que ainda jogará uma prorrogação, desconfio que não abençoará ninguém que lhe possa de fato fazer sombra.
Nenhum comentário:
Postar um comentário