O instituto de pesquisa Datafolha divulgou pesquisa de opinião pública sobre os principais problemas brasileiros.
Os resultados são os seguintes: corrupção, 34%; saúde, 16%; desemprego, 10%; educação, 8%; violência/segurança, 8%; economia, 5%.
Primeiramente, faz-se necessário esclarecer que as respostas dos entrevistados (foram ouvidas 3.541 pessoas em 185 municípios de todo o país no final de novembro último) confundem causas com consequências, pois houve um erro metodológico de pesquisa, intencional ou não.
Problemas na saúde, na educação, na segurança pública e de desemprego são consequências, e não causas.
A corrupção encabeça a lista devido ao enorme destaque que a mídia dá aos processos da Lava-Jato, os quais evidenciaram a existência de uma corrupção endêmica envolvendo o erário público, os interesses estatais, os políticos e o grande capital privado; e ela deve ser mesmo tida como causa, ainda que secundária.
Na questão da corrupção com o dinheiro público, como subproduto do capitalismo que é (para o capital, enquanto sujeito automático, e como um todo, convém a preservação do estado forte, como guardião da dinâmica autotélica do capital), há interesse na coibição da corrupção praticada por setores localizados do próprio capitalismo. Daí o seu combate (tardio) pelo poder Judiciário.
Os números da corrupção com o dinheiro público são insignificantes se comparados com a produção de valores feita pelo trabalho abstrato e sonegados dos que o produzem, os trabalhadores.
Há outras causas, como os escorchantes juros da dívida pública que o sistema financeiro internacional nos impõe. Orçados anualmente em R$ 400 bilhões (equivalendo a cerca de 8% do PIB e ao dobro do valor contábil do capital da Petrobrás), sequer aparecem como problema, e muito menos problema causal.
Há outras causas, como os escorchantes juros da dívida pública que o sistema financeiro internacional nos impõe. Orçados anualmente em R$ 400 bilhões (equivalendo a cerca de 8% do PIB e ao dobro do valor contábil do capital da Petrobrás), sequer aparecem como problema, e muito menos problema causal.
O item economia, que ficou em último lugar da pesquisa, escolhido por apenas 5% dos entrevistados, é, na verdade, a grande causa dos infortúnios sociais. Aparece, contudo, de forma genérica, não especificada, de modo a não se saber se a indicação se refere à questão de gerenciamento ou da própria economia em si, da sua natureza existencial (coisa que jamais se esclarece, seja nos bancos escolares básicos ou, mesmo, na academia, que sempre a positivou).
A inconsciência da sociedade sobre a origem dos seus males não é ocasional, mas sim uma omissão premeditada e matreira.
Desde quando o capitalismo, nos seus primórdios, estava sendo implantado a ferro e fogo, vemos as categorias capitalistas sendo positivadas como se tivessem um caráter civilizatório e humano, em contraposição ao regime de escravagismo direto feudal, apresentado como uma coisa má. Os pecados do feudalismo medieval serviam para justificar sua substituição por outra coisa má, o capitalismo liberal burgues ou estatal.
A relativização advém da doutrina iluminista que confrontou o absolutismo monárquico-eclesiástico feudal com a ideia da falaciosa igualdade, fraternidade e liberdade do liberalismo republicano capitalista.
O capitalismo sempre foi beligerante, genocida, insensível, reificado, fetichista e segregacionista. Provas disso são as maiores guerras mundiais já havidas na história da humanidade e que até hoje se perpetuam de modo genocida; e a miséria social que ora se aprofunda mundo afora, a despeito de todos os ganhos científicos havidos nos últimos dois séculos.
O caráter civilizatório do capitalismo se confunde com o conteúdo das suas guerras, nas quais sempre se descobriram novos engenhos tecnológicos sem que isto justificasse as suas existências ou representasse ganho civilizatório direto (ainda que as descobertas delas decorrentes pudessem ser aproveitadas como tais no pós-guerra).
A causa do nosso infortúnio social reside num modo de mediação social que atingiu seu ponto de saturação por força de suas contradições internas. Trata-se da inconciliável contradição entre forma e conteúdo.
A forma de mediação capitalista consiste na criação de valor a partir do trabalho abstrato, com este mesmo valor servindo de instrumento de irrigação de todo o organismo social; ou seja, de financiamento do modo de aquisição social dos meios de sobrevivência dos indivíduos sociais transformados em cidadãos e do Estado, seu órgão de regulamentação e manutenção de uma ordem jurídico-constitucional garantidora da coerção tácita da dinâmica do capital.
Tal forma de mediação social impõe a acumulação crescente e contínua do próprio valor, que proporciona aos seus administradores, sejam privados ou estatais, os privilégios próprios a esse serviço prestado ao próprio capital. Trata-se do fim, vazio em si, da valorização do valor.
Graças às contradições internas acima destacadas, com o seu desenvolvimento ele se torna inoperante e incapaz de prover minimamente a consecução do seu objeto teleológico (a contínua e crescente valorização do valor). Então definha, aumentando ainda mais o sofrimento que é inerente ao seu modo de ser.
Vale repetir: a forma se contradiz com o conteúdo, seu objetivo teleológico, prenunciando a autodestruição sistêmica, com todos os riscos implícitos em tal condição.
A contradição entre forma e conteúdo produz todos os males que na pesquisa do Datafolha são apontados como problemas brasileiros, numa metodologia de pesquisa que leva o entrevistado a confundir causa com conteúdo.
P. ex., o emprego (trabalho), na medida em que é a forma de mediação social produtora de valor (causa), conflita com o desemprego provocado pela própria dinâmica capitalista (consequência), imposta pela concorrência de mercado que determina a redução de custos de produção de mercadorias, somente possíveis com a eliminação do trabalho abstrato em maior parte.
Nos itens elencados como maiores problemas brasileiros, a economia, que envolve todas as categorias capitalistas, aparece como problema secundário e de modo genérico; mas ela é, isto sim, a causa de todos os problemas estruturais que tiram o sono dos brasileiros, como educação, saúde, segurança pública e desemprego.
A corrupção com o dinheiro público é um fator de agravamento dos problemas sociais que são graves e facilmente perceptíveis porque atingem diretamente a população.
Tão alardeada pela grande mídia como causa de todos os males, a corrupção acaba servindo como argumento justificador de miséria reinante e protege a identificação da causa-mor desses problemas: o próprio capitalismo.
Tão alardeada pela grande mídia como causa de todos os males, a corrupção acaba servindo como argumento justificador de miséria reinante e protege a identificação da causa-mor desses problemas: o próprio capitalismo.
Eis o que se prega e o porquê de tratar-se de uma forma de escamotearem-se os problemas:
— se os políticos são corruptos, que se substituam os políticos e não a política e suas instituições estatais (saem uns, entram outros e nada realmente muda);
— se há desemprego, que se criem formas nacionalistas de empregabilidade para fazer face à concorrência de mercado internacional e de modo a que se consigam níveis elevados de empregabilidade, inclusive com redução de direitos trabalhistas, ao invés de superar-se o próprio emprego (a verdadeira solução);
— se o Estado está falido, que se adeque o déficit fiscal à receita, ainda que isso implique a redução do atendimento às demandas sociais, como apregoa o ministro Henrique Meireles, em lugar de se superar o próprio Estado (que é o deve ser feito);
— se o processo eleitoral é viciado pelo poder econômico, que se eliminem esses vícios, ao invés de superarmos o próprios processo eleitoral que é o canal de legitimação de uma ordem jurídica anti-povo.
Tudo na fase de decadência do capitalismo funciona na base do vão-se os anéis, mas que fiquem os dedos. Ocorre, contudo, que até os dedos estão definhando, de modo que todo o corpo já não consegue mais manter-se em pé.
O problema maior que enfrentamos para a superação dos nossos problemas é a nossa inconsciência (e, consequentemente, de toda a sociedade) sobre a natureza do que está na base desses problemas. (por Dalton Rosado)
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