quinta-feira, 30 de janeiro de 2025

HÁ 2 FILMES BASEADOS EM HISTÓRIAS REAIS QUE TÊM PONTOS EM COMUM COM "AINDA ESTOU AQUI". VEJA-OS E COMPARE.

J
á que as novas gerações começam a interessar-se pelo festival de horrores das ditaduras sul-americanas nos anos de chumbo, é um bom momento para indicar-lhes dois filmes que, em muitos aspectos, vão além de Ainda estou aqui na exposição dos crimes hediondos cometidos pela extrema-direita de então (que continua inspirando a de hoje!).

Desaparecido: um grande mistério (1982), p. ex., mostra centenas de cadáveres espalhados em grandes ambientes, saldo da bestial repressão desencadeada pelos golpistas de Augusto Pinochet assim que derrubaram o presidente chileno Salvador Allende, em 1973. 

Além disto, escancara o envolvimento da CIA naquela quartelada, algo que ocorreu também no Brasil mas não consta de Ainda estou aqui, sabe-se lá o porquê. A cúpula estadunidense estava ciente de todas as execuções e sumiços de restos mortais perpetrados pelos militares brasileiros, o que vem sendo comprovado desde que começaram a ser abertos, do lado de lá, os arquivos secretos daquele período (e ainda faltam muitos...)

Os fascistas chilenos foram responsáveis por mais de 3 mil mortes e desaparecimentos políticos, pela tortura de milhares de prisioneiros e pelo exílio de pelo menos 200 mil pessoas.

O filmaço do diretor grego Costa Gravas mostra um cientista cristão estadunidense (Jack Lemmon) desembarcando no Chile em busca do filho jornalista que sumira durante os primeiros dias do golpe. Ele chega convicto de que as pesadas denúncias contra o regime seriam exageros da propaganda esquerdista. 

Contará, na sua empreitada, com a ajuda da nora (Sissy Spacek), a quem até então desprezava por ser uma moça de costumes modernos. E terá portas abertas para suas investigações pessoais porque uma notícia desfavorável que circulasse no poderoso movimento religioso ao qual pertence poderia causar enorme dano aos carrascos chilenos e a seus cúmplices estadunidenses, daí preferirem apaziguá-lo.

Aos poucos vai dolorosamente se inteirando de que a verdade era muito pior do que imaginava. A ponto de, tão logo volta para os EUA, processar seu governo por cumplicidade na morte do filho. Disponível no streaming da Globo Play.
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"SÓ QUERIA EMBALAR MEU FILHO
 QUE MORA NA ESCURIDÃO DO MAR"
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Já o episódio evocado por
Zuzu Angel (filme de 2006, dirigido por Sérgio Rezende) ocorreu nos anos Médici, o pior momento da ditadura brasileira. 

Em 1971, o filho da conhecida estilista Zuzu Angel, o militante do MR-8 Stuart Angel,  já muito debilitado por torturas, foi amarrado à traseira de um jipe da Aeronáutica e arrastado com a boca colada ao cano de descarga do veículo. Em seguida, atiraram o corpo no mar.

Zuzu denunciou incansavelmente o assassinato e a ocultação do cadáver de Stuart. Chegou a invadir uma auditoria militar e lá gritar corajosamente a sua revolta de mãe. Foi vítima fatal de um acidente automobilístico pra lá de suspeito, em 1976.

Chico Buarque, amigo a quem ela escrevera carta levantando a possibilidade de ser igualmente assassinada pelos militares, homenageou-a com a canção “Angélica”, lançada em 1981, quando o Brasil começava a desmontar a engrenagem repressiva de exceção.

Tanto quanto Desaparecido..., também Zuzu Angel bate mais pesado do que Ainda estou aqui nos vilãos que produziram essas páginas infames da nossa história. 

Como contemporâneo e vítima dessa sanha repressiva, dou meu testemunho de que o David Coelho (vide aqui) tem toda razão ao avaliar o filme do Walter Salles como bonzinho demais com verdadeiras bestas-feras. (por Celso Lungaretti)
 

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