sexta-feira, 25 de agosto de 2023

'O LEÃO DO DESERTO' ABRE NOSSO PEQUENO FESTIVAL DE FILMES ANTICOLONIALISTAS

Tenho muitas saudades daquelas lutas nas quais inexistia qualquer dúvida sobre a trincheira que deveríamos ocupar.  

A resistência contra o fascismo na Espanha foi um exemplo. Voluntários de vários países engrossaram as fileiras dos idealistas que combatiam Franco, embora seus respectivos governos permanecessem vergonhosamente em cima do muro.

Então, como acabo de encontrar no YouTube um filme pouco conhecido sobre uma dessas heroicas lutas contra o colonialismo, resolvi não apenas postá-lo hoje, como também acrescentar alguns congêneres nos próximos dias.

Vale, contudo, ressalvar que atualmente não só os acontecimentos deixaram de apresentar-se com idêntica clareza, como o inimigo se tornou bem mais difícil de ser vencido, pois a correlação de forças ficou ainda mais desigual do que era nos séculos passados.

Então, meu propósito não é ressuscitar formas de luta que caducaram e hoje seriam suicidas, mas apenas apontar o destemor e o espírito de sacrifício daqueles combatentes como um componente que precisamos resgatar, pois nos faz imensa falta. (por Celso Lungaretti)

O ANCIÃO QUE SUSTENTOU UMA LUTA DE QUASE
20 ANOS CONTRA OS INVASORES ITALIANOS

Nascido em agosto de 1862, Omar Mukhtar organizou e, a partir de 1912, liderou lutas de resistência contra o controle italiano da Líbia, sendo finalmente capturado e enforcado pelos fascistas em 1931. Morreu vigoroso e lúcido aos 73 anos.
O Omar Mukhtar da vida real

Tudo começou quando, já cinquentão, reuniu um contingente entre 2 mil e 3 mil beduínos para resistir à invasão italiana, impondo consideráveis danos ao inimigo ao cortar-lhe as linhas de comunicação e surpreendê-lo com emboscadas frequentes.

Finalmente, em 1923, aos 63 anos, o emir Idris I o incumbiu de liderar a guerrilha anti-italiana na Líbia inteira. Talvez já estivesse prevendo que a chegada dos fascistas ao poder na Itália levaria aquela guerra para outro patamar.

E foi o que realmente aconteceu, mas até 1930 Mussolini ainda acreditou que seria possível submeter os líbios sem apelar para a devastação total. 

Quando se deu conta de que jamais o conseguiria, incumbiu um general carniceiro, Rodolfo Graziani, de usar força desmedida: extermínio de civis, aprisionamento em campos de concentração, expropriação de seus bens, destruição de aldeias, envenenamento de poços d'água, inutilização de terras utilizadas na agricultura, etc.

A cereja do bolo foi a instalação de uma muralha de arame farpado dividindo a Líbia ao meio, para evitar que os rebeldes (que se ocultavam em montanhas inacessíveis para os italianos e guerreavam no deserto) recebessem armas e víveres. 

Estavam reduzidos a cerca de 700 beduínos quando Mukhtar foi baleado, aprisionado, julgado e executado. Isto significou para eles o golpe de misericórdia. 

Mas sua longa resistência foi épica  e seu estrategista combatente deveria ser reconhecido como um dos maiores comandantes militares da história. Mas, claro, não é este o tipo de herói que convém à academia e à indústria cultural aclamarem...
Oliver Reed e Anthony Quinn como
o general Graziani e Omar Mukhtar

O leão do deserto
, produção libio/estadunidense dirigida pelo cineasta sírio Moustapha Akkad em 1980, não deixa de ser um filme correto e bem realizado, com sequências de batalhas convincentes e tendo o mérito de manter viva a lembrança de uma das primeiras guerras sujas  do século 20 (elas jamais devem ser esquecidas!). 

Reconstitui o período da consolidação a ferro e fogo do domínio italiano, quando Graziani é designado para, com poder ilimitado, dar um fim à rebelião

E é, como seria de prever-se, um tanto apologético, mas, sendo o cinebiografado um personagem de grandeza histórica indiscutível, dá para relevarmos alguns excessos louvaminhas aqui e ali.

Anthony Quinn interpreta o velho guerreiro de forma até comedida para quem o conhece de outros carnavais. Pareceu perceber que o brilho do seu personagem existia por si, não precisando de retoques.

Já Oliver Reed, como Graziani, fez um vilão meio caricato, mau como um picapau e com trejeitos de Mussolini, como quando se posta em pé com o queixo erguido, as pernas abertas e ambas as mãos na cintura. Fica parecendo mais o duce do que o próprio duce, interpretado por Rod Steiger.

Raf Vallone está muito bem como  um oficial mais digno e compassivo. E Irene Papas, grande dama do cinema, merecia muito mais minutos em cena do que lhe foram dados. (CL)  
 
Obs: para acessar os vídeos do PEQUENO FESTIVAL DE
FILMES ANTICOLONIALISTAS, clique nos seus títulos:

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