sábado, 26 de agosto de 2023

'QUEIMADA' É UMA LIÇÃO DE HISTÓRIA: PARA IMPOR SUA DOMINAÇÃO, A PÉRFIDA ALBION MANIPULAVA E DESTRUÍA PEQUENOS PAÍSES.

Foi o marquês de Ximenes, um poeta francês, quem cunhou em 1793  a expressão pérfida Albion, qualificando a Inglaterra de um reino de hipócritas, onde se pregava uma coisa e se fazia exatamente o contrário.

Napoleão Bonaparte gostou dela e a repetiu tantas vezes que acabou imortalizando-a, a ponto de até hoje, após 230 anos, ainda haver quem a utilize.

Ao chamar a Inglaterra de Albion, como era conhecida durante o Império Romano, o poeta subentendeu que as práticas dos Césares estavam sendo repetidas pelo Império Britânico: ambos conseguiam prevalecer sobre inimigos muito mais numerosos manipulando-os e dividindo-os para reinar. Na mosca!

A Inglaterra (pelo menos como ela era antes de virar um leão desdentado por ter exaurido suas forças resistindo a Hitler) nunca pareceu tão pérfida quanto em Queimada! (1969). 

Trata-se da obra máxima do cineasta italiano Gillo Pontecorvo e um dos mais perfeitos filmes políticos até hoje realizados, por ter encontrado a dosagem certa de reconstituição histórica, análise crítica e repúdio às injustiças sociais.

Considero-o, ainda, um dos ápices da carreira do grande Marlon Brando, no papel de William Walker, um agente do colonialismo que por duas vezes determina o destino de uma ilha caribenha dedicada à monocultura açucareira (qualquer semelhança com o Haiti não é mera coincidência, mas, para não afrontar a ditadura fascista de Franco, Pontecorvo se viu obrigado a descaracterizar sua identidade e até sua fala, trocando o espanhol pelo português) : 
— primeiramente, a serviço do governo britânico, Walker fabrica um líder revolucionário (Evaristo Marques, um ilhéu que jamais trabalhara como ator) para servir de espantalho, visando convencer os poderosos locais de que, se não dessem logo um fim à dependência de Portugal, as massas é que o fariam; 
— dez anos depois, ele é contratado por uma empresa britânica de comércio exterior porque o antigo títere encarnou bem demais seu papel e passou a encabeçar uma guerrilha contra a nascente e decepcionante democracia subjugada aos interesses econômicos da pérfida Albion. Walker, teoricamente apenas um consultor, é quem realmente comanda a repressão, cada vez mais impiedosa.

Face à constatação de que só conseguirá vencer incendiando as matas onde os rebeldes se refugiam, o que vai inviabilizar a plantação de açúcar por décadas, Walker não hesita: a prioridade é evitar que a revolta se espalhe por outras ilhas semelhantes a Queimada, pois a produção açucareira das ditas cujas é toda ela negociada pela mesmíssima companhia britânica. 

Então, com o apoio da tal companhia, militares derrubam o presidente civil (Renato Salvatori) e é o próprio Walker quem passa a comandar de fato a perseguição aos insurrectos. 

Moral da história,  por maiores que fossem os prejuízos imediatos, a rebeldia tinha de ser extirpada a ferro e fogo, pois o poder econômico fazia gato e sapato de paisecos como Queimada.

E, como o filme esteve proibido no Brasil até 1980, nossa censura passou recibo de que o mesmo sucedia com certos paisões deitados eternamente em berço miserável. (por Celso Lungaretti)
Obs: para acessar os vídeos do PEQUENO FESTIVAL DE
FILMES ANTICOLONIALISTAS, clique nos seus títulos:

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