Para além da mera condenação à quebradeira ou ao coro do ridículo discurso midiático de chamar os militantes bolsonaristas de terroristas - depredação não é e nunca será terrorismo - cabe focar no que de fato importa: o sentido político e as tendências do movimento da extrema direita.
Não restam dúvidas que tal movimento é capitaneado por amplos setores do agronegócio e do extrativismo, sobretudo das regiões norte e centro-oeste, mas também com forte ação de indivíduos do Sul e de São Paulo. Também conta com considerável inserção nas forças policiais e nas forças armadas. Embora esteja centralizado na pessoa de Jair Bolsonaro, possui autonomia frente a ele, servindo o ex-presidente fujão muito mais de aglutinador do processo que de seu idealizador.
Após as ações em Brasília e a forte repercussão, a tendência é ocorrer um refluxo dos atos. Enganoso, no entanto, é considerar tal refluxo como algo duradouro, sendo muito mais uma forma de recuo estratégico. No ínterim, prisões devem acontecer, sobretudo de militantes diretamente envolvidos nas ações e, talvez, alguns financiadores também venham a ser responsabilizados, mas com o tempo o movimento se reorganizará, pois possui financiamento e organização robustos.
No coração de todo o processo está a agonia do capitalismo que implica na decomposição do regime político a ele associado. Claramente, a democracia liberal constituída e estabelecida ao redor do planeta no período pós-guerra encontra-se em franco declínio, apodrecendo a olhos vistos.
Esta crise de dominação vem abrindo um flanco de batalha ao redor do mundo desde o Occupy Wall Street, passando pela Primavera Árabe, pelas Jornadas de 2013 e outras insurreições populares associadas. Inicialmente com conteúdo revolucionário, tais movimentos foram sendo esmagados ou se dissipando por falta de direção clara.Em seu lugar, começaram a surgir insurreições neofascistas enquanto formas contrarrevolucionárias, nas quais o descontentamento e a insatisfação popular foram sendo apropriados por forças da extrema-direita capitaneadas por setores do grande capital.
No Brasil, tais forças apareceram nitidamente durante o Impeachment de Dilma Rousseff e foram naturalizadas pelos grupos conservadores interessados na queda da ex-presidente. Porém, logo ganharam vida própria e com um discurso antissistêmico chegaram ao poder através de Bolsonaro.
Há um projeto claro da extrema-direita brasileira, implementar um regime policialesco, com o enfraquecimento dos direitos jurídicos e sociais, o qual estará ancorado no novo regime econômico instalado no Brasil de neoextrativismo ilimitado e de super exploração dos trabalhadores. Ou seja, estabelecer uma República ancorada no aprofundamento da devastação capitalista e no cerceamento à vida democrática.
As eleições já mostraram que este projeto, com maior ou menor compreensão, possui amparo popular e eco mesmo entre as classes trabalhadoras. Por isso, as ações bolsonaristas de modo algum podem ser consideradas como atos isolados de alguns gatos pingados, mas antes uma ação massiva enraizada na própria dinâmica da crise vivida atualmente, com propósitos claros e articulação em níveis superiores do empresariado.
A ilusão lulopetista da pacificação nacional e mesmo da trégua precisa dar lugar a uma leitura mais realista dos tempos de crise vividos.A grave situação social e econômica, a estagnação, o desemprego, a fome e a miséria galopantes são fatores propícios a garantir eco junto ao povo de ações insurrecionais da extrema direita, situação que pode se agravar. Caso observemos a situação dos atuais governos ao redor do mundo, acossados por crises de ingovernabilidade, o futuro de Lula 3 parece pouco promissor. Sua derrocada, contudo, significaria um final trágico para o próprio Brasil.
A olhos vistos, as instituições estão irremediavelmente condenadas ao ocaso e não virá delas a saída para a situação atual. Neste momento, a grande disputa é sobre o que será colocado no lugar do que está aí e apenas a chama revolucionária poderá fazer frente às trevas do reacionarismo. (por David Emanuel Coelho)
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