william waack
FLAGELO CONVERGENTE
Os seguidores de Lula e os de Bolsonaro detestam que seus respectivos chefes sejam comparados entre si.
Sim, são gritantes as diferenças, mas ambos convergem em ponto crucial: os líderes das pesquisas não apresentaram até aqui um conjunto de ideias coordenado de como tirar o País da estagnação.
Cada um ajudou a aprofundar aquilo que o professor e economista da FGV Fernando de Holanda Barbosa intitulou, em recente publicação, de flagelo da economia de privilégios.
Os privilegiados, segundo o autor, são:
— empresários obtendo subsídios;
— tratamento fiscal diferenciado;
— conjuntos de trabalhadores com tratamentos especiais;
— funcionários dos três Poderes com salários acima do setor privado, além de aposentadorias e pensões também especiais.
O conflito social entre enormes grupos de privilegiados e o resto produz as cíclicas crises fiscais das quais a atual está longe ainda de ter sido debelada. E ela precisa ser resolvida logo, sob o risco de tirar qualquer perspectiva de futuro para o País.
A manutenção do sistema de privilégios é também o pano de fundo para se entender o embate político no Brasil que, no extremo, não passa de disputa cada vez mais acirrada (pois os cofres quebraram) por extrair renda do Estado.
A esfera da política, em especial a do Legislativo, reflete essas escolhas pelo voto, e sustenta o cenário macro no qual falta investimento pois falta poupança e falta poupança pois não há uma escolha política nesse sentido.
A convergência entre os personagens políticos Lula e Bolsonaro se dá, portanto, no fato de representarem a manutenção do status quo – algo que enfurece as respectivas claques, especialmente a acadêmica, mas que todo dia encontra exemplos no noticiário sobre a facilidade com que os grupos de privilegiados pulam de um lado para o outro do espectro político.
A rigor, as próximas eleições deveriam ser vistas como o verdadeiro choque entre as forças empenhadas em mover o País para fora do flagelo dos privilégios e o sistema, que dá sinais de estar confortável com Lula ou Bolsonaro (o centrão vai mandar, tanto faz com qual dos dois seja).
Mas essas forças, chamadas de 3ª via, estão desarticuladas, ainda que tenham cabeças brilhantes, think tanks [uma tradução aproximada desta expressão é fábricas de ideias] excelentes e diagnósticos precisos.
É necessário reconhecer que não se trata apenas de sucesso eleitoral em prazo historicamente muito curto. O problema maior é enfrentar a situação de um país que dá preferência a consumo em vez de poupança, e está desprovido de uma noção geral de justiça social e combate à desigualdade. (por William Waack)
2 comentários:
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Catilinárias remetem a Cícero e a série Roma da HBO.
Pois bem, Cícero é o proto-político brasileiro.
Um consumado patife, porém extremamente inteligente.
Ocorre que por aqui todos convergem para o lado vicioso de Cícero, sem o brilho da sua inteligência.
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Há os estultos e os que se fazem de estultos para melhor dilapidar o dinheiro dos impostos.
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O Mahabaratha tem a história do rei cego cuja esposa cegou a si própria para se tornar rainha.
Desse casamento nasceram 100 príncipes, cada um com um vicio diferente.
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Isso que dá colocar cegos para governar e a cegueira ser a condição exigida para ascender ao poder em banânia.
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Ah um ensaio sobre a cegueira... mas, peraí, já escreveram esse livro.
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Assisti à série e concordo quanto ao Cícero.
Já o Cesar não se parece nem um pouco com o descrito pelo Suetônio, "o homem de todas as mulheres e a mulher de todos os homens".
E o Augusto inteligente e astucioso da série jamais poderia tornar-se o bobalhão da vida real, que a Lívia manipulava como bem entendia.
Um livro que vc deverá gostar, nessa linha, é "Eu, Claudio, imperador", do Robert Graves. Tem também na forma de minissérie, mas muito rara. Já a continuação, "Claudio, o deus, e Messalina" é um tanto anticlimático.
Um abração e bom domingo!
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