William Waack, que continua sendo um dos expoentes mais lúcidos do jornalismo político brasileiro, acaba de fazer (vide aqui) a melhor análise sobre a volta ao ponto de partida na qual se constitui a reentronização ostensiva do Centrão como a força de sustentação do atual desgoverno, repetindo o que já acontecera com os vários governos que se têm sucedido desde a redemocratização de 1985:
"O que é o governo Bolsonaro dominado pelo Centrão? É a política brasileira como sempre foi nas últimas décadas......(o) último grande divisor de águas na política brasileira (foi) o processo de redemocratização do período entre 1985 e 1989...
...(foi quando se iniciou) uma tentativa fracassada de estabelecer no Brasil um estado de bem-estar social aos moldes do sul da Europa, sem que cuidássemos de que nossa economia de baixa produtividade e competitividade conseguisse financiar gastos públicos que subiram sempre acima da inflação, não importa qual fosse o governo...
...desde aquele período grupos diversos foram capturando a máquina de Estado – ou ampliaram o domínio já existente...
...A política foi se reduzindo à negociação entre grupos esparsos, com cada vez menos direção central, para acomodar às custas dos cofres públicos interesses setoriais e regionais dos mais variados".
É tão deprimente esse nosso eterno patinar sem sairmos do lugar que apenas acrescentarei o óbvio ululante:
— enquanto participarmos desse joguinho de cartas marcadas da democracia burguesa, estaremos apenas iludindo os explorados, por impingir-lhes falsas esperanças;
— a ruptura tem de vir de fora da institucionalidade por meio da qual o capitalismo se perpetua, mantendo uma sobrevida que ameaça a própria sobrevivência da espécie humana e tendo se tornado extremamente desigual, disfuncional, destrutivo e autodestrutivo;
— daí eu e o companheiro Dalton Rosado estarmos há décadas pregando, até agora no deserto, que a esquerda só cumprirá seu papel se erguer novamente a bandeira revolucionária, assumindo corajosamente que existe para superar o capitalismo e não para tentar domesticar tal ogro.
A volta dos que nunca foram embora, evidentemente, estabelece um equilíbrio precaríssimo no esquema do poder, dadas as contradições, entre si, dos participantes desse amontoado de forças imantadas pelo fisiologismo, e também das pressões decorrentes da nova postura dos EUA e da Europa, de revigorar o capitalismo a partir de investimentos ambientais.
Nossa posição deve ser inflexível quanto ao genocídio praticado/ensejado por Jair Bolsonaro: tal crime contra a humanidade não pode ficar impune em nenhuma hipótese!
O afastamento imediato do pior presidente do Brasil em todos os tempos, seguido de sua responsabilização criminal pelas mortes inúteis que fez brotar como cogumelos, tem de ser nossa principal bandeira imediata e, em nome dela, precisamos levar o povo às ruas.
Mesmo que exerçamos papel complementar e o golpe de misericórdia venha a ser dado pelo poder econômico (hipótese bem provável), com a condução de Hamilton Mourão à presidência, é de suma importância marcarmos nossa presença, como ponto de partida para a retomada da combatividade que deixamos esvair-se nos últimos anos.
Tendo, contudo, muita clareza quanto ao fato de que um novo governo articulado pelo poder econômico e seus serviçais não será nosso governo e que, em tal eventualidade, não deveremos dele participar, mas sim mantermo-nos firmemente na oposição e irmos acumulando forças para o atingimento de nossos objetivos estratégicos, bem diferentes dos deles! (por Celso Lungaretti)
5 comentários:
Grande Celso!
Assisto diletantemente os vídeos da Boston Dynamics e fico imoressionado com os avanços deles.
Também fico imaginando como poderiam os pobres revolucionários enfrentar aquelas máquinas, ou como os escravocratas de todos os matizes não se aliarão a eles num futuro próximo.
Se é que já não estão.
Veja bem, assim como a burguesia ocupou o lugar da nobreza, serão os detentores desta tecnologia (que prescinde quase totalmente de mão-de-obra humana) que irão substituir a burguesia no domínio do mundo.
O chato é que eles ainda não tem um nome, enquanto classe, mas atendem aos requisitos de classe.
E eles criarão a sua própria narrativa e institucionalidade, por sobre as ruínas do estado-nação burguês.
Farwell Rousseau e seu o contrato social baseado na violência, arrecadação de impostos e, subsidiariamente, na moeda fiduciária.
Kabôsse!
Um velho tema da ficção-científica é o desenvolvimento de sentimentos humanos nos robôs. Então, o Bozo já superou a Boston Dynamics: sua boiada não tem NENHUM sentimento humano e jamais terá. Vai fazer sempre o que seu controlador mandar.
Mas, colocando os pés novamente na Terra, essa hipótese que você coloca contém variáveis demais para um analista de política tirar alguma conclusão.
E, para dizer a verdade, nunca gostei do Isaac Azimov (com a única exceção de "A Fundação") e aquela sua chatice das leis da robótica. Curto mesmo é a sci-fi que aborda como os humanos se adaptarão ao detestável mundo novo e a ele reagirão. Autores como Kurt Vonnegut, Phillip K. Dick, Robert Silverberg e Ray Bradbury.
Acredito que nem chega a ser uma hipótese.
Os cânones para compreender essa narrativa ainda não foram dados.
Mas, concordamos que é o modo de produção quem molda a sociedade?
O desses caras dispensa quase totalmente os seres humanos.
E afinal, humanos que existem decaídos no tempo ordinário e controlados por regras absurdas, nada mais são do robôs. É a robopatologia!
Os robos autênticos são mais eficientes e são a base do novo modo de produção que avança agora no terreno da economia política.
Engana-se ao imaginar que meu pensamento venha de Asimov.
Vem de Heidegger que aponta o ente previlegiado.
O ser humano!
Aquele que detem o previlégio ontólogico do sentido de ser.
O único que sabe-se ser, sendo.
Exercer esse previlégio é, na minha opinião, a única saída para nós.
***
Companheiro,
desculpe-me a brincadeira de ter citado o Azimov. Era só uma forma delicada de dizer que para mim esse tipo de especulação sobre o futuro cabe mais na ficção-científica.
Lá pelos meus 16 anos eu tentava penetrar no pensamento do Sartre e me lembro que às vezes ele fazia referência ao Heidegger. No ano seguinte, contudo, encontrei a minha verdadeira praia e nunca mais saí dela: a filosofia só me interessa quando ilumina a prática revolucionária. "Os filósofos até agora interpretaram o mundo, de diversas maneiras. Chega a hora de transformà-lo" (Marx).
O meu caminho não tem volta. Autores pelos quais tive algum interesse momentâneo, como os inspiradores do existencialismo, ficaram definitivamente para trás. No tempo que me resta, o máximo com que posso sonhar é ainda dar uma contribuição significativa à revolução brasileira.
É, reconheço, um objetivo dificílimo, por vários motivos. Mas, é o que me resta e eu sou teimoso: sempre travo minhas lutas até o fim. Abs.
Perfeito Celso.
Você sabe que nós antigões entendemos essa fuga no ideal.
Por isso Heidegger e o chamado a pensar por si mesmo.
Exercer o privilégio ontológico!
(Escrevi certo dessa vez PRIVILÉGIO)
Ria, aproveite viv, aos robôs dos cara, e também os caras, nunca farão isso
De um humano a outro.
Torço muito por você e pelo Dalton.
Celebremos!
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