NA GUERRA DA VACINA,
DORIA INJETOU VENENO DE
DESCRÉDITO NA TESTA
Ao fim da guerra da vacina, João Doria poderia parecer um líder mais nacional e um contraponto da razão a Jair Bolsonaro. O governador paulista decerto fez o bom serviço de cutucar a inoperância federal.
Mas, depois dos vexames recentes, Doria pode parecer apenas um destrambelhado provinciano. Pior, lançou desconfiança sobre a própria vacina que comprou, grave em termos sanitários e econômicos.
Por duas vezes, o governo de São Paulo adiou a publicação da eficácia da Coronavac. Na 4ª feira (23), o país foi induzido a esperar boas notícias. Em vez disso, ouviu uma conversa palerma de que os dados precisariam ser antes mastigados pela Sinovac, por uma obrigação contratual, e de que a eficácia da vacina era diferente daquela verificada em outros países, no limite de apenas 50%.
Descobriu-se que Doria estava em Miami, o que pareceu fuga do fiasco. Para piorar, soube-se na sexta (25) que a Turquia não teria obrigação contratual, pois divulgou, de modo mambembe, que a Coronavac seria eficaz em 91,25% dos casos.
O governo Doria suscitou desconfiança sobre os números que virão sobre a vacina, já objeto de propaganda negativa criminosa de Bolsonaro.
Quanto menos confiança, menos gente tende a aderir ao programa de vacinação. Quanto menos vacinados, menor a possibilidade de a vacina evitar mortes, aliviar hospitais e atenuar as restrições obrigatórias ou autoimpostas de contato social, o que tem óbvio impacto econômico também.
Mesmo com uma vacina eficaz em 85% dos casos, a campanha contra a Covid teria de atingir adesão do nível de vacinações contra a gripe (uns 95%) para propiciar um alívio notável apenas a partir lá de maio. A vida, porém, ainda teria restrições sérias, em especial para negócios e empregos que dependem de aglomerações e circulação livre pelas cidades.
Na reunião dos governadores com o capacho do ministério da Saúde, dia 8, Doria já trocara as mãos pelos pés. Em vez de vencedor generoso e agregador, pareceu um mauricinho metido e exibido, como disse a este jornalista um governador ainda simpático ao colega paulista. Depois, houve duas negaças dos resultados da vacina. Doria blefava, com confiança temerária?
No mundo político, ficou a impressão de que Doria não sabia bem o que estava fazendo, o que sublinhou sua imagem de pouco confiável, um tipo obstinado que faz qualquer negócio, de atropelar aliados a apoiar Bolsonaro num dia para sair de fininho pouco depois.
O governo paulista poderia simplesmente apresentar a situação tal como ela é, dando publicidade e explicações racionais para a atos e processos, o que seria um contraponto confiável ao desvario bolsonarista. Tem gente para fazê-lo. Doria nomeia muitos bons quadros para seus governos.
Não se trata de ser transparente. Apenas na fantasia juvenil ou anarquista um governo pode ser um BBB ao vivo. É política, administrativa e tecnicamente inviável. Mas, claro, em qualquer tempo e lugar, gente com poder sonega informação do público, o que é autoritário.
Terá de contar com sorte também, que a vacina seja eficaz em nível relevante, uns 75% ao menos, e fazer a mais bem-sucedida campanha de vacinação da história. (por Vinicius Torres Freire)
TOQUE DO EDITOR – A imagem do meio se refere ao Movimento Cansei, articulado pelo João Doria em 2007, na vã esperança de que reeditasse a Marcha da Família, com Deus, pela Liberdade de 1964, deslanchando a acumulação de forças para a derrubada do então presidente Lula. Apesar da propaganda maciça, foi um fracasso total, conforme se pode constatar no balanço que publiquei então. (por Celso Lungaretti)
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