Nestes dias de debacle econômica mundial fica desnudada a impotência da política na solução de problemas sociais decorrentes das dificuldades de subsistência dos agora chamados de invisíveis.
É a prevalência da insustentabilidade da lógica subtrativa do capital em fase de declínio com as consequências previsíveis da subordinação da política a seu serviço.
Não gosto do termo invisíveis porque nunca entendi (ou entendi e não quero aceitar) o porquê de não enxergarmos à nossa volta aqueles que, por sua pobreza material e majoritária presença na periferia das cidades, não chamam atenção, sejam eles cidadãos de países economicamente portentosos ou dos oceanos de países que circundam essas ilhas de relativa prosperidade.
Aliás, o termo cidadão é também de sub-reptício significado, por representar uma impropriedade: nem todos os indivíduos sociais reconhecidos como cidadãos podem gozar a proteção social daquilo que pretensamente seria a cidadania.
Há cidadãos de primeira classe que podem transitar livremente pelos países porque têm recursos e outros que são obrigados a morrer nas precárias travessias das fronteiras por não serem aceitos nas suas fugas desesperadas da opressão e da miséria.
A depressão econômica brasileira desde 2013 sinaliza que a crise atual é bem mais profunda e duradoura do que as anteriores, evidenciando o atingimento, por parte do capital, do seu estágio de limite interno de expansão. Nestas circunstâncias, o que é que se faz politicamente?
Recicla-se o programa de assistência social do Bolsa Família, com seus míseros valores e com o nome trocado para Renda Cidadã, como forma de contenção da queda vertiginosa de popularidade que o atual desgoverno vinha tendo com sua cantilena golpista de fechamento do Congresso Nacional e do STF, na vã suposição de que as forças armadas apoiassem tal aventura.
O plano B corresponde a uma guinada de 180° ou a um cavalo de pau, demonstrando a inconsistência de um governo que não tem passado, nem tem presente e, muito menos, terá futuro.
Tal tábua de salvação foi um alinhamento com o centrão, segmento político par(a)lamentar –desculpem o trocadilho infame!– cujos membros estão comprometidos com o que há de mais nocivo em matéria de vida social saudável, ao mesmo tempo em que promove a distribuição de dinheiro sem produção de mercadorias cujos efeitos já e já se farão sentir.
O primeiro deles é o aumento da inflação de preços dos alimentos, que representam percentagem significativa no orçamento familiar dos mais pobres (a grande maioria da população).
Para se manter o teto dos gastos orçamentários, o desorientado governo atual já pensa em reproduzir as pedaladas que serviram de justificativa legal para o impeachment do então fragilizado governo da Dilma Rousseff, ou seja, já se fala em dar calote nos precatórios (dívidas públicas judiciais orçadas) e desvio de verbas da educação (do Fundeb).
A esta altura o projeto liberal do ministro da Economia Paulo Guedes, do Estado mínimo e orçamento ajustado à compatibilidade entre receitas e despesas foi para o espaço.
Sem o menor pejo, e demonstrando quão insustentáveis e falaciosos são os ensinamentos da cartilha dos Chicago boys, dos quais Paulo Guedes diz ser profundo conhecedor e discípulo, o submisso ministro coloca a sua viola no saco em nome de uma pretensa (mas pouco provável) reeleição do seu chefe.
Lembro a série de quatro artigos (começando por este) nos quais, durante a campanha presidencial de 2018, simulei um debate meu com o Guedes. Então eu já alertava para a insustentabilidade de seu projeto num país da periferia capitalista, e o fiz baseado em uma entrevista sua à então blogueira Joice Hasselmann, cujo resultado, hoje, conhecemos (para os dois).
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