quinta-feira, 1 de outubro de 2020

OS INVISÍVEIS DA REPÚBLICA DESNUDADA/ 2

(continuação deste post)
A
MP do Governo Dilma Rousseff de desoneração da folha, que possibilita a substituição da contribuição previdenciária empresarial pelo pagamento de contribuições que tomem como base o faturamento bruto da empresa, foi vetada pelo governo atual, mas, mesmo que haja uma reconsideração e a sua manutenção venha a ocorrer, como quer corretamente o movimento sindical, representa medida de pouco fôlego diante do quadro geral.

Os sindicatos, sem qualquer poder reivindicatório num quando de depressão capitalista no qual a mercadoria força de trabalho dos seus filiados é oferecida a preços vis, cumprem o seu triste papel de pedintes fragilizados, ao invés de se portarem como força mobilizadora da sua própria superação enquanto artífices da produção do valor, elemento e alimento primário do capital.

O capital já não se preocupa com a mobilização sindical sem força, mas sim com a própria insustentabilidade dos seus fundamentos em fase de autodestruição social (agressão ecológica, outro sério fator contributivo do caos ora instalado, à parte). 

A força da insatisfação popular dos desempregados preocupa mais o capital do que os empregados que se apegam ao baixo salário como forma de sobrevivência familiar e aceitam tudo que é imposição patronal e política.

Como é triste ver o movimento sindical atrelado à velha cantilena da impossível busca de melhores salários ao invés de lutar contra a existência do próprio salário, superando-o e substituindo-o por um modo de produção no qual os verdadeiros produtores sociais (homens e mulheres que são obrigados a venderem a única mercadoria que têm, as suas forças de trabalho, agora sem compradores) sejam donos do seu nariz! 

Como é triste vê-lo (o movimento sindical) atrelado aos projetos eleitorais partidários que apenas legitimam uma ordem político-econômica que deve ser superada in totum!     

Não podemos continuar impotentes e ficarmos com a boca escancarada, cheia de dentes, esperando a morte chegar, como na canção do Raul Seixas apropriadamente intitulada "Ouro de tolo". 

O futuro que se prenuncia não é de retomada do crescimento econômico (que já não servia desde antes), mas do apertar de cintos numa barriga vazia que já encostou na costela.

As premissas da luta revolucionária de hoje são diferentes daquelas que marcaram o período inicial da ascensão capitalista e da luta contra o feudalismo, e que sucumbiram por incapacidade da esquerda de superação da forma-valor como relação social emergente.

Hoje o sujeito da revolução não é a classe operária enquanto tal, mas o seu oposto, ou seja, a falência do sujeito automático da valorização do valor, que sucumbiu pelos seus próprios fundamentos e criou um exército de desempregados tão expressivo que a inclusão desse contingente populacional somente pode ocorrer a partir de um novo modo de produção.

Isto implica a conclusão de que não devemos almejar o poder político, mas negá-lo enquanto força auxiliar de um modo de produção já que já esgotou todas as suas possibilidades. 

Significa que devemos queimar etapas e passarmos diretamente para o estágio do controle horizontal da organização social diferenciada e de uma produção de bens voltados exclusivamente para a satisfação das necessidades de consumo, uma vez que a economia da forma-valor já se mostrou impossível de responder às necessidades sociais de consumo. 

Devemos subir nos ombros dos ensinamentos de Karl Marx sobre a crítica da economia política para dar continuidade do seu projeto revolucionário (que previu, no futuro, a superação das categorias capitalistas, ou seja, do valor econômico, do trabalho assalariado, do partido da classe operária, do próprio estado proletário, das classes sociais, da política, do dinheiro, da mercadoria, do mercado, etc.) sem reproduzir os conceitos de participação política institucional. 

Por quê? Justamente porque vivemos um estágio diferenciado do desenvolvimento capitalista, relativamente àquele no qual o velho barbudo formulou as suas teses científicas. 

A falência do projeto republicano de governo e de suas instituições, decorrente da falência do modo de produção ao qual serve, o capitalista, está a clamar por uma superação. 

Sejamos capazes de atender a este apelo do processo dialético histórico social!!! (por Dalton Rosado)

2 comentários:

SF disse...

E aí, Dalton, tudo bem?
No último parágrafo você conclama a atendermos ao apelo do processo dialético histórico mas como?!
***

celsolungaretti disse...

Caro SF,

antes, no marxismo tradicional, tínhamos uma receita de revolução que nos levaria ao paraíso. Guiados pelo Partido da classe operária, faríamos a revolução armada e tomaríamos o poder político criando a Estado proletário; eliminaríamos, com a estatização dos meios de produção, a extração de mais-valia privada, e caminharíamos para uma sociedade sem classes sociais, sem partido político, sem Estado, sem dinheiro, sem mercado, sem mercadoria, etc.

O que aconteceu, diferentemente do que previu Marx e, principalmente, Engels, e posteriormente Lenin e Mao, o Estado dito proletário caminhou em sentido contrário, pois além de suprimir liberdades individuais terminou por se tornar politicamente despótico e praticante de um capitalismo estatal anacrônico até se transformar no mais selvagem capitalismo liberal, um misto de Estado politicamente fechado com economia aberta à extração de mais-valia privada no mais alto grau de exploração.

Mas as contradições capitalistas continuaram dentro daquilo que consiste o processo dialético histórico que denuncia a insustentabilidade de um conceito de relação social fadado ao colapso. É nisso que a teoria marxiana da crítica à forma-valor e seus estudos do materialismo dialético histórico é consistente.

Entendo que é a própria necessidade de subsistência humana e sua eterna capacidade de superação dos problemas que ela própria coloca aquilo que forçará uma tomada de posição capaz de nos conduzir a uma sociedade verdadeiramente emancipada, mas sem receita de bolo sobre o que se deve fazer.

Ao sabermos o que não devemos fazer já estamos no caminho de saber o que fazer. A questão principal é usarmos a teoria e a prática revolucionária no sentido de nos apropriarmos dos meios de produção e os usarmos para satisfazer necessidades de consumo, e não para comprar e vender os bens produzidos. É evidente que se faz necessário que as lideranças do processo revolucionário compreendam que devemos abandonar conceitos equivocados de luta que vimos praticando há mais de um século.

Dentre estes podemos elencar alguns exemplos: nos desligarmos do processo político eleitoral (daí o não vote!) e das migalhas que a ordem capitalista nos oferece para legitimarmos o que está posto; deixarmos de lutar pelo exercício nosso do poder burguês que só nos desgasta; deixarmos de lutar por empregos (até porque não mais virão) e procurarmos ser, paulatinamente, nós mesmos os produtores com nossa capacidade de produção integrada e inclusiva, sem salários e sem mercadorias; denunciarmos diuturnamente o ordem jurídica burguesa e sua falaciosa justiça dentro do direito burguês; denunciarmos as agressões ecológicas próprias ao capitalismo e lutarmos por uma relação sustentável com a natureza; negarmos todas as categorias capitalistas com base na teoria revolucionária; etc., etc., etc.

Assim, o caminho vai nos ensinar a caminhar. (Dalton Rosado)

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