dalton rosado
ESTADOS NACIONAIS, CAPITALISMO E
AS SUAS RELAÇÕES COM O BREXIT
"A União Europeia não modera a influência britânica – ela a amplifica. Uma Europa forte não é uma ameaça à
liderança global britânica – ela a eleva"
(Barack Obama)
Os estados acionais modernos são fruto da consolidação histórica do capitalismo.
As suas falências e constituição em blocos são, portanto, frutos da sua contradição implícita e de sua decadência; e se constituem em embrião e prenúncio da necessidade de uma nova ordem transnacional, sob novos critérios de produção e consumo.
Assim, o Brexit vai na contramão da história.
A ruptura com o feudalismo para implantação do capitalismo e seus mecanismos jurídico-constitucionais de controle é a razão pela qual houve confronto com a forma governamental de então em razão do conteúdo das relações sociais em mutação, cujo início data do século 16.
As dissenções atuais obedecem ao mesmo critério de base: as dores do parto de uma necessária superação de uma relação social, motivada pela falência de uma ordem econômica que se tornou obsoleta.
O absolutismo feudal monárquico-eclesiástico ocidental, baseado no modo de produção escravista direto (servos europeus, negros africanos, etc.) perdia força política diante das relações burguesas (escravização indireta pelo trabalho abstrato) em ascensão, que clamavam por uma nova ordem jurídico-constitucional adequada às relações mercantis em curso.
Exterminadores do futuro: Boris Johnson, o Bozo de lá... |
O processo de superação da velha ordem e a entronização dos estados nacionais burgueses (a república dita iluminista), nos últimos 500 anos, enfrentou obstáculos erguidos por reis e imperadores, pelos senhores feudais e pela igreja católica, até sua consolidação definitiva como democracia burguesa – tutelada pela vigilante força militar, sempre pronta para intervir quando necessário.
É sempre assim: o modo de produção social é o que determina o caráter político-jurídico da ordem estabelecida.
Vivemos agora, no início do século 21, um processo de mutação das relações sociais: o trabalho abstrato, base de sustentação do capitalismo já que é fonte de produção do valor (categoria capitalista que, tal qual o sangue em nossos corpos, irriga todo o organismo social, estatal e mercantil), decresce e ameaça colapsar em razão das próprias contradições das relações mercantis.
Ao criar novos nichos de trabalho abstrato, o capital está cada vez mais reduzindo a proporção do dito cujo nas mercadorias produzidas (com a consequente redução do valor global do trabalho abstrato); ou seja, vai matando a galinha dos ovos de ouro.
A criação de blocos econômicos estatais tem sido uma tendência do capitalismo como forma de sobrevivência e criação hegemônica de domínio econômico sobre regiões mundo afora que detêm níveis de produtividade menores de mercadorias e de acesso às sofisticadas tecnologias de produção patrocinadas pela microeletrônica e pesquisas científicas; e, ao mesmo tempo, para servir como estímulo interno ao consumo e consequente produção de mercadorias.
...e Bolsonaro, o Boris Johnson daqui. |
Também os traumas da primeira e segunda guerras mundiais contribuíram no velho mundo para a criação desses blocos (caso da União Europeia) como fonte de inibição de tentativas de dominações nacionalistas de um tirano qualquer, sequioso por impor poder hegemônico capitalista de um país sobre os demais mediante agressões bélicas.
Mas, como tudo no capitalismo é contraditório e irresolúvel no longo prazo por força dos seus pressupostos idiossincrásicos e irracionais, eis que as fissuras dentro desses blocos não tardaram a aparecer.
As divergências se prendem a fatores econômicos, pois são estes que regem o comportamento político estatal, e não o contrário.
Diante da crescente perda de poder aquisitivo mundial, não poupando nem mesmo os ricos de outrora, observa-se uma onda de insatisfação social, sem que a população saiba exatamente a origem dos seus infortúnios.
De tal insatisfação popular resulta n movimento pendular eleitoral entre partidos de direita, de ultradireita, de centro, de centro-esquerda, e de esquerda, que mais não passam de posições econômicas político-geo-referenciadas que lhes servem de norte (e isto dentro de um mesmo movimento pendular, no qual todos se mexem e nenhum sai do mesmo lugar).
Enquanto os blocos econômicos se esfacelam diante da insatisfação popular, com oportunistas demagogos sempre surfando nessa onda como pretensos salvadores da pátria, a saída para os povos da periferia do capitalismo não têm sido os aeroportos (de vez que lhes faltam dinheiro e passaportes regularizados para uma imigração segura).
O cenário para o qual o neoliberalismo nos conduz |
Restam-lhes os barcos precários para cruzar os mares (caso dos africanos) ou a travessia pelos subterrâneos das fronteiras terrestres vigiadas (centro-americanos e sul-americanos), para citar os exemplos mais emblemáticos.
Os estados nacionais da periferia do capitalismo estão em permanente ebulição política e com tendência de controle pela força militar aliada a poderes civis (ou ela mesma colocando a faixa presidencial sobre uma farda qualquer).
Por seu turno os Estados capitalistas dominantes sofrem como a migração das suas empresas em busca de mão-de-obra barata.
A Venezuela não é diferente da Bolívia; o Egito não é diferente da Líbia; a Coreia do Norte não é diferente da Arábia Saudita; o Zimbabue não é diferente da Angola; o Irã não é diferente do Iraque; a Inglaterra não é diferente da França; os Estados Unidos não são diferentes da China; o Vietnã do Norte não é diferente de Cuba, e por aí vai.
Seja sob o tacão militar ou sob o tacão do voto (caso do Chile), a base que orienta o poder político é a mesma: a relação social baseada na produção de mercadorias.
Como dizia Che Guevara “a mercadoria é o núcleo econômico do sistema capitalista e, enquanto ela existir, seus efeitos se farão sentir na organização da produção e, consequentemente, na consciência”.
Como dizia Che Guevara “a mercadoria é o núcleo econômico do sistema capitalista e, enquanto ela existir, seus efeitos se farão sentir na organização da produção e, consequentemente, na consciência”.
O Reino Unido, que já não usava a mesma moeda da União Europeia, consuma agora uma ruptura maior. Ela não passa, contudo, de um bravata inconsequente, decidida por uma população nacional insatisfeita com seu declínio econômico e saudosa dos tempos nos quais se dizia que no império britânico o sol nunca se põe...
Permanecer na UE, do ponto de vista econômico, traria mais vantagens para o Reino Unido do que a sua saída. Os conservadores, que mesmerizaram os britânicos com seus cantos de sereia, logo, logo os verão cobrarem as vantagens prometidas.
Permanecer na UE, do ponto de vista econômico, traria mais vantagens para o Reino Unido do que a sua saída. Os conservadores, que mesmerizaram os britânicos com seus cantos de sereia, logo, logo os verão cobrarem as vantagens prometidas.
Mas, claro, vão ser contraditados pela cruel realidade capitalista em processo de depressão globalizada.
Qualquer semelhança nacionalista-liberal britânica (guardadas as proporções de poder econômico) com as diretrizes e conceitos do governo brasileiro atual não é mera coincidência, mas opção ideológica irracionalmente consciente. (por Dalton Rosado)
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