terça-feira, 19 de março de 2019

INÓCUO SOB O CAPITALISMO, O COMBATE À CORRUPÇÃO É UMA BANDEIRA QUE SEMPRE ALAVANCA O POPULISMO DE DIREITA

Quando, na década passada, contingentes da nossa esquerda tomaram partido por uma facção de ganguesteres do capitalismo, de preferência à outra que com ela travava uma disputa mafiosa pelo florescente mercado de telecomunicações, fui um dos poucos articulistas a alertar que tal imbróglio não nos dizia respeito e nele não havia ninguém com quem devêssemos nos alinhar.. 

De inocente útil chegava o delegado Protógenes Queiroz, que tirou as batatas do fogo enquanto um ex-superior dele, alinhado com uma das quadrilhas litigantes, evitava queimar as mãos. Detonou sua carreira policial, mas ganhou inesperado prêmio de consolação: uma cadeira na Câmara Federal... pela legenda do PCdoB! 

A tal populismo rasteiro se reduzia um partido que ousou pegar em armas contra a ditadura militar. E não estava sozinho: o Psol também estendeu o tapete vermelho para o ingênuo delegado Brancaleone, sendo preterido daquela vez.

Foi quando recoloquei em circulação uma conclusão definitiva do Paulo Francis sobre o udenismo e o golpismo de meados do século 20: "O combate à corrupção é uma bandeira da direita" (mais tarde, cunhei eu também um bordão nessa linha, "a corrupção é intrínseca ao capitalismo").


Eis minha argumentação de quase 10 anos atrás (abril/2009): 
Protógenes: fox terrier no meio de uma briga de cachorro grande
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"...as intermináveis denúncias de corrupção acabam minando as esperanças do cidadão comum na transformação da realidade por meio da ação política. Se tudo não passa de um lodaçal, as pessoas de bem devem mesmo é cuidar de sua vida...

De quebra, fornecem pretextos para quarteladas, sempre que os meios de controle democráticos das massas não estão funcionando a contento.

Então, Paulo Francis dizia e eu assino embaixo: denúncias de corrupção política são bandeira da direita, que acaba sendo sempre sua beneficiária final, a despeito dos ganhos momentâneos que proporcionem à esquerda.

Esta deveria, isto sim, demonstrar que o capitalismo em si causa prejuízos imensamente maiores para o cidadão comum do que os desvios de recursos dos cofres públicos; e que a moralização da política não se dará com medidas policiais, mas sim com uma transformação maior da sociedade.

Não o faz. Desatinadamente, algumas de suas tendências reforçaram as denúncias que culminaram no suicídio de Getúlio Vargas em 1954 e as que deram pretexto à dita redentora de 1964 (que, claro, nada mudou exceto a relação dos beneficiários do butim).
1954, 1964, 2016/18... o que somos, desmemoriados ou idiotas?
Agora, o PSOL chega a acompanhar o apocalíptico delegado Protógenes Queiroz em sua tentativa de implodir o sistema, provocando uma crise que não deixaria pedra sobre pedra no Executivo, Legislativo e Judiciário.

Ingenuamente, parece crer que se beneficiará com o descrédito absoluto das instituições, sem perceber que isto criaria, isto sim, cenários favoráveis ao golpismo de extrema-direita.

Então, digo e repito: em vez de pegar carona nos temas que a imprensa burguesa prefere magnificar, cabe à esquerda definir sua própria pauta e explicá-la aos cidadãos.

A corrupção política não é nossa prioridade, mas sim o combate ao capitalismo, verdadeira raiz dos principais males que infelicitam os brasileiros.

Precisamos ter a coragem de assumir a posição correta diante do povo, ao invés de tentar combater o inimigo num jogo de cartas marcadas, travado no terreno que só a ele convém".
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E por que a corrupção não pode ser erradicada sob o capitalismo? Porque este coloca como prioridade máxima da existência humana o enriquecimento individual, a vitória na luta de todos contra todos por um lugar ao sol, ainda que pisando no pescoço da mãe para alcançar tal intento, como diria o Brizola.

Se esta é a lógica do sistema, sempre haverá quem busque atalhos para alcançar o objetivo à margem das regras que o próprio sistema estabelece mas manda às favas quando lhe convém. 
A repulsiva prática da agiotagem era condenada. Bons tempos!

[Vale lembrar, p. ex., que a Inglaterra já chegou a estimular a pirataria contra a Espanha e que a repulsiva prática da agiotagem era condenada pela Igreja Católica na Idade Média, mas hoje são os agiotas modernos, vulgo banqueiros, que mandam e desmandam no capitalismo, com a conivência eclesiástica, a ponto de o Perdoai as nossas dívidas assim como perdoamos os nossos devedores do Pai Nosso haver sido alterado para Perdoai as nossas ofensas assim como perdoamos a quem nos tenha ofendido...]

Então, a alternância de cruzadas moralizadoras com períodos em que a corrupção corre solta dá a tônica do capitalismo. Revolucionários não deveriam jamais vergar-se aos estados de ânimo popular produzidos pela lavagem cerebral permanente do sistema, mas sim esclarecer corajosamente seus públicos que todas as Lava-Jatos cumprem a mesmíssima função de enxugar gelo e, enquanto a ilusão não se desfaz, alavancar golpes de estado, impeachments, vitórias eleitorais de demagogos grotescos e outros desdobramentos nefandos.

Foi o filme a que assistimos no Brasil ultimamente. E que devemos ajudar a tirar de cartaz antes que produza mais aberrações.

É fundamental, p. ex., darmos total apoio ao Supremo Tribunal Federal (mesmo que lhe guardemos ressentimento por decisões anteriores) na luta contra os procuradores da Lava-Jato e os aloprados fascistoides do bolsonarismo.
Prazo de validade vencido explica passo em falso
Os primeiros, apropriadamente apelidados de tenentes togados, alçaram-se a alturas insuspeitadas durante a caça às bruxas (quer dizer, a caça aos corruptos) e tudo fazem para não voltar à estatura anterior, agora que sua utilidade caducou. Daí suas canhestras tentativas passadas, em parceria com Rodrigo Janot e Joesley Batista, de derrubar Michel Temer e o esforço atual para solapar a autoridade do Supremo.

Perderão, claro, pois lhes falta o essencial para se perpetuarem em posição dominante: uma base econômica. 

Não são uma classe, nem um setor da economia ou parte dele, apenas pessoas cujo poder advém dos cargos transitórios que ocupam. Ainda que conseguissem dispor, para seu projeto de poder, dos US$ 2,5 bilhões da Petrobrás que tentaram garfar, ganhariam algum fôlego mas acabariam fracassando do mesmo jeito no fim da linha.

Só que, com sua ambição desmedida, podem produzir muito estrago antes da derrocada definitiva. Todo cuidado é pouco, pois, talvez até sem que o percebam, o ponto de chegada dos seus esforços é... um estado policial (não necessariamente sob o controle deles)! 

Quanto aos bolsonaristas de raiz e aos olavetes, já devem ter percebido que seus desvarios boçais e ignaros serão limitados pelo poder econômico (ao qual não convém que o Brasil se torne um país-espantalho, pois isto prejudica os negócios, sobretudo com o exterior) e pela quase nenhuma disposição por parte dos militares, de embarcarem numa roubada igual à de 1964.
Governo-barafunda não durará nem mais seis meses

Então, essa gente só poderá prevalecer se conseguir criar tamanho caos que as Forças Armadas sintam-se obrigadas a intervir .

Se a esquerda mantiver muita calma nesta hora, evitando cair nas provocações desses desvairados, tudo indica que finalmente o Olavo de Carvalho verá uma de suas bombásticas previsões tornar-se realidade: a de que o governo atual não durará nem mais seis meses.

Pois está derretendo a olhos vistos!

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