celso rocha de barros
BOLSONARO E AS MILÍCIAS
A esta altura, é difícil não concluir que Fabrício Queiroz, ex-assessor de Flávio Bolsonaro, seja enrolado com milícias.
O jornal O Globo descobriu que, quando o escândalo dos depósitos suspeitos veio à luz, Queiroz se escondeu na comunidade do Rio das Pedras, berço das milícias cariocas, onde sua família operaria um negócio de transporte alternativo (atividade tipicamente controlada por milicianos).
A jornalista Malu Gaspar, da revista piauí, apurou que Queiroz foi colega de batalhão de Adriano da Nóbrega, foragido da polícia e acusado de liderar a milícia Escritório do Crime, sob o comando de um coronel envolvido com a máfia dos caça-níqueis (outra atividade típica de milícia).
A polícia e o Ministério Público cariocas suspeitam que o Escritório do Crime matou Marielle Franco, a da placa que os bolsonaristas volta e meia rasgam às gargalhadas. Adriano da Nóbrega é foragido da polícia.
E, antes que os bolsonaristas digam não acreditarem em polícia, Ministério Público ou imprensa que não entreviste Bolsonaro de joelhos, lembrem-se do que disse Flávio Bolsonaro, o zero-um: Fabrício Queiroz, segundo o filho do presidente da República, lhe indicou a mãe e a mulher de Adriano da Nóbrega para cargos de assessoria em seu gabinete.
Repetindo: esta é a versão oficial, em que o único pecado da família presidencial foi amar demais o Queiroz.
A versão oficial confessa, portanto, o seguinte: o presidente da República emprestou R$ 40 mil para um enrolado com milícias cuja filha, Nathalia Queiroz, era funcionária-fantasma de seu gabinete.
Sim, fantasma: Nathalia trabalhava como personal trainer no Rio de Janeiro enquanto seu ponto era assinado no gabinete do então deputado federal Jair Bolsonaro.
O empréstimo foi pago pelo enrolado com milícias por meio de um depósito na conta da primeira-dama.
Mesmo na versão oficial, é um PowerPoint do Dallagnol bem curto: três círculos, duas linhas, milícia-Queiroz-Bolsonaro.
Com base só na versão oficial, portanto, pode-se dizer, sem medo de errar: se o Coaf não houvesse feito seu trabalho, já teríamos milicianos fazendo churrasco no Palácio da Alvorada, brindando com os generais, escolhendo Moro para zagueiro do time na pelada.
Se essa é a versão oficial, imagine o que deve ser a versão verdadeira.
Temos algumas pistas.
A família Bolsonaro já defendeu as milícias publicamente repetidas vezes. E conhecia muito bem Adriano da Nóbrega muito antes da suposta indicação de Queiroz. Jair Bolsonaro defendeu o sujeito no plenário da Câmara já em 2005.
Flávio Bolsonaro foi mais longe: já homenageou o suposto líder do Escritório do Crime na Assembleia Legislativa duas vezes, nas duas ocasiões elogiando-o com entusiasmo. Concedeu-lhe a Medalha Tiradentes, maior honraria oferecida pelo legislativo estadual fluminense. Na ocasião, Nóbrega estava preso por assassinato. Recebeu a medalha na cadeia.
Vamos ver se novas pistas aparecem. Mas o quadro já é bem feio.
Foi uma ofensa à memória de Tiradentes |
Enfim, Bolsonaro é o herdeiro ideológico da facção das Forças Armadas ligada aos torturadores, que não aceitou a abertura democrática e partiu para o crime: esquadrão da morte, garimpo, jogo do bicho. É a mesma linhagem que nos deu as milícias.
Essa herança agora ronda o Planalto. (por Celso Rocha de Barros)
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Toque do editor: sobre o envolvimento do clã Bolsonaro com as milícias do Rio Janeiro, recomendo também este artigo de Felipe Betim, publicado em novembro na edição brasileira do jornal El País.
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