segunda-feira, 5 de março de 2012

RESPOSTAS A UM GENERAL INSUBMISSO

Como os leopardos não perdem as pintas, o jornal O Globo deu enorme destaque às sandices (vide íntegra aqui) de um dos militares insubmissos empenhados em intimidar a Comissão da Verdade, ministros, a presidente, os Poderes Executivo e Legislativo: o general Luiz Eduardo Rocha Paiva (foto), que chefiou a Escola de Comando do Estado-Maior e foi secretário-geral do Exército.

Lá pelas tantas, ele indaga, sobre a presidente Dilma Rousseff:
"Ela era da VAR-Palmares. E a VAR-Palmares foi a que lançou o carro-bomba que matou o soldado Mario Kozel Filho. Ela era da parte de apoio. Será que ela participou do apoio a essa operação? A comissão da Verdade não vai chamá-la, por quê?"
Respondo eu: porque a VAR-Palmares nada teve a ver com tal ação, uma vez que... nem sequer existia em julho de 1968.

Quem soltou um carro-bomba ladeira abaixo na direção do QG do Exército, sem nem de longe imaginar que um sentinela pudesse abandonar o posto e aproximar-se do suspeitíssimo veículo sem motorista, foi a VPR --a qual considerou depois um grave erro ter respondido desta forma à bazófia do comandante do II Exército que, pela imprensa, desafiou os "terroristas" a virem enfrentá-lo "como homens" no seu quartel.

Naquele ano Dilma militava no Colina, que não atuava em São Paulo nem mantinha qualquer esquema de cooperação com a VPR.

Foi só no Congresso de Mongaguá, em abril de 1969, que a VPR decidiu manter entendimentos com o Colina e com a ALN, visando a uma possível somatória de forças.

Como sei? Simples: estava lá. Participei como convidado, representando meu grupo de secundaristas que, no final do congresso, foi oficialmente admitido na VPR.

As negociações com a ALN não frutificaram, mas a fusão com o Colina acabou acontecendo, em junho de 1969. Foi quando nasceu a VAR-Palmares.

Ou seja, o generalão insubordinado pretende que uma presidente da República seja convocada para depor sobre algo do qual só tomou conhecimento por ter lido e ouvido falar. Brilhante!

De quebra, o general perguntou à entrevistadora se ela ela estava certa de que Dilma havia sido torturada:
"Ela diz que foi submetida a torturas. A senhora tem certeza?"
Respondo eu, de novo: como a tortura era generalizada, atingindo dirigentes, militantes, aliados e até simpatizantes (o número de torturados ultrapassou 20 mil) , a única hipótese de uma comandante deixar de sofrer os piores suplícios seria ela ter colaborado com o inimigo.

Mas, disto os verdugos jamais ousaram acusar Dilma. Até a ignomínia tem limite. Então, não faz sentido nenhum Rocha Paiva colocar em dúvida suas afirmações. 

Os mentirosos são os de sempre, aqueles que esperneiam contra a Comissão da Verdade por saberem que sairão muito mal na foto.

QUEM DISSE QUE VLADIMIR HERZOG FOI MORTO PELOS 
AGENTES DO ESTADO? TODOS, INCLUSIVE A JUSTIÇA...

Rocha Paiva questionou também a convicção nacional de que o jornalista Vladimir Herzog morreu sob torturas ("E quem disse que ele foi morto pelos agentes do Estado? Nisso há controvérsias. Ninguém pode afirmar").

A esta infamia quem responde é o Instituto Vladimir Herzog (vide íntegra aqui):
"Como se alguém que se apresentara para depor não estivesse sob a guarda e a responsabilidade do Estado e de seus agentes. Como se assegurar a integridade física e a própria vida de um depoente, qualquer depoente, não fosse obrigação oficial fundamental do Estado e de seus agentes, a quem ele se apresentara. Como se a Justiça do Brasil já não houvesse reconhecido oficialmente, há 33 anos, em decorrência de processo movido pela viúva Clarice Herzog e seus filhos, que Vladimir Herzog foi preso, torturado e assassinado nos porões da ditadura, por agentes do Estado.

Além de tudo isso, posteriormente, em julgamento proferido no âmbito da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, criada pela Lei nº 9.140/96, o próprio Estado brasileiro ratificou o reconhecimento dessa prisão ilegal, tortura e morte".

3 comentários:

J.Burato disse...

Muito bom. Depoimento histórico.
Espero que a verdade seja como a água que nada a segura - demora, mas acaba vazando.

Papajojoy disse...

Penso que poderá haver um momento no futuro, talvez nem tão distante, em que dizer que um general disse sandices possa ser motivo de arrependimento. Amargo arrependimento.
O ventre que gerou o passado em questão ainda é fecundo.

celsolungaretti disse...

Arrependemo-nos dos erros que cometemos, não dos acertos. Se houver uma volta às trevas, ficarei, isto sim, orgulhoso de ter sempre lutado contra o obscurantismo.

E seria uma tragédia histórica terrível a ponto de tornar bem secundárias as tragédias pessoais.

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