Na verdade bem poucas o são, cerca de 90% delas apenas refletindo escaramuças de alcance limitado e efêmero.
Para os colegas dos jornalões, revistonas e tevezonas, faz todo sentido fingirem que se trava batalha titânica, com a vitória sendo disputada em cada detalhe insignificante.
É tal ilusão que faz aumentar o faturamento de seus respectivos veículos, portanto, quer queiram, quer não, precisam alavancar o interesse por essas tempestades de som e fúria significando nada, como diria Shakespeare.
Os comentaristas das redes sociais seguem ridiculamente na esteira dos bambambãs da mídia, apenas sendo menos hábeis em fazer passar por desinteressadas suas análises típicas de torcedores de futebol. O maniqueísmo deles transparece em cada frase.
Uma única vez na vida acompanhei atentamente e de cabo a rabo uma campanha eleitoral. Foi quando trabalhava na Agência Estado, em 1989. Era pago para fazer enrolações semelhantes às de todos os concorrentes, mas detestava tal papel. Sentia-me um charlatão, já que o resultado final quase sempre pode ser antevisto desde o comecinho da campanha.
Na de 1989, entrevistei longamente Lula e Collor logo no início da corrida, em abril. E percebi que o caçador-de-si-mesmo era quem falava o que o empresariado e a classe média queriam ouvir naquele período.
Isto porque as estatais (tão inchadas quanto ineficientes) e o protecionismo às empresas brasileiras de informática atrapalhavam a modernização e crescimento da economia. A oratória collorida ia ao encontro de uma insatisfação bem disseminada.
Lula, por sua vez, não se dera conta da importância do colapso do capitalismo de estado soviético e consequente queda do muro de Berlim. Defendia as detestadas estatais.
Quando lhe perguntei como as colocaria a serviço do povo e não dos mandarins que as chefiavam e seus respectivos grupos políticos, ele respondeu que entregaria o comando a conselhos de trabalhadores.
No exato instante em que ele me contava esta lorota eu já sabia que, caso chegasse ao poder, Lula jamais ousaria cumprir tal promessa.
Não deu outra. Teve oito anos para fazê-lo (de 2003 até 2010) e... nada! Perdeu, talvez, a chance de evitar que ocorresse o petrolão, consequentemente a Lava-Jato, consequentemente a derrocada petista na década passada.
Naquele abril de 1989, fui o primeiro a alertar que o Collor, líder das pesquisas iniciais, não era um cavalo paraguaio, mas sim o mais perigoso direitista no páreo. Ninguém acreditou.
Seria enfadonho enumerar todas as minhas antevisões que deram certo desde então, mas elas têm em comum o fato de que foram feitas com tempo suficiente para a esquerda brasileira evitar tragédias anunciadas, mas esta as ignorou olimpicamente.
Não há como provar que as linhas de ação alternativas por mim propostas produziriam resultados melhores, mas é certo que as linhas de ação adotadas pelas forças dominantes da esquerda produziram resultados catastróficos.
A invasão dos bárbaros não foi uma fatalidade, mas sim o desfecho de uma longa sucessão de erros crassos cometidos desde o primeiro governo da Dilma.
Quando o Bozo tomou posse, eu já tinha convicção plena de que em médio e longo prazo aquele fascismo redivivo fracassaria, mas não havia como descartar um autogolpe bem sucedido, ainda que de breve duração, em 2019.
Em 2020 passei a considerar pouco provável o sucesso golpista, principalmente depois que o bufão rompeu com Sergio Moro e a Lava-Jato, jogando no lixo a bandeira farsesca de combate à corrupção, como também jogaria a do liberalismo econômico.
O sonhado putsch igualmente esbarrava na resistência surda das Forças Armadas quanto a acompanharem o desvario golpista, jamais realmente superada pelo Bozo, apesar de seus faniquitos e da troca intempestiva de comandantes.
A genocida administração da pandemia foi, em seguida, o maior fator de esvaziamento do celerado.
Ainda mais quando ficou evidenciado que a insistência em drogas milagrosas fajutas embutia grandes negociatas. Se um dia isto for investigado a fundo, ele mofará na prisão até o fim de sua nociva e parasitária existência.
E se o esquema de sustentação política do Bozo já se fragilizara significativamente com o tchau Lava-Jato, alô corrupção, bem como com o maior extermínio de brasileiros já desencadeado por um presidente da República, a pá de cal foi a expulsão dos ultradireitistas da Casa Branca.
Por tudo que os EUA representam para nossa economia e pela influência determinante que exercem sobre o alto oficialato das Forças Armadas brasileiras, não tive mais a menor dúvida que a parada estava decidida. O ano de 2021 já começou com o autogolpe definitivamente inviabilizado.
Mesmo assim, o pária nº 1 no mundo civilizado ainda tentou uma última cartada, com a micareta golpista do último Dia da Pátria. Colheu derrota acachapante e teve de humilhar-se, implorando a ajuda do Michel Temer para safar-se da encrenca.
Passou a ter como único real sustentáculo o centrão, que agora está raspando os recursos públicos que restam no fundo do tacho e logo pulará para a arca de Noé na qual Lula acolhe todos os canalhas da política fisiológica brasileira.
Aí o palhaço sinistro terá também contra si os poderosos da economia (até a Fiesp e a Febraban hoje defendem a democracia, como se não soubéssemos o que elas fizeram na ditadura passada...), a sociedade civil, os militares, os Estados Unidos e a quase totalidade das nações civilizadas do planeta.
Resumo da ópera: o Bozo inevitavelmente será reconduzido ao seu verdadeiro patamar, de 15% a 20% de fanáticos obtusos e rancorosos, insuficientes para dar qualquer golpe ou para ganhar qualquer eleição majoritária.
Não serão os resultados das pesquisas eleitorais que vão alterar este roteiro. Ele teve princípio, meio e fim. O debiloide ainda poderá espernear, gente ainda poderá morrer, mas a página ultradireitista por esta vez está virada. Ponto final.
A cautela que precisamos ter não é com relação à nova micareta (de antemão fracassada), mas sim com uma volta por cima das hordas do retrocesso caso D. Sebastião da Silva não consiga a partir de 2023 entregar o que o povo dele espera.
Por ora o fantasma foi exorcizado e logo vai estar arrastando correntes apenas no limbo. E, se o Brasil, no espírito do 11 de agosto, resolver tornar-se um país sério, o Bozo não escapará das grades que já fazia por merecer muito antes de 2018. (por Celso Lungaretti)
5 comentários:
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Texto desalentador e desalentado, tanto que no único fio de esperança você grafou errado uma palavra: "entreguar".
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No texto anterior você se diz incrédulo, mas é preciso uma fé muito grande para continuar procurando algo de bom no cenário atual da ordenação política de banânia.
As mesmas caras, as mesmas lorotas, a mesma empostação de voz, inexplicáveis punições e mais incríveis ainda perdões... não dá para ser feliz.
Kabôsse!
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Nas minhas andanças, um babalaorixá disse que eu era filho de Xangô.
Gratuitamente, por amizade.
O orixá da justiça e, por consequência, da verdade.
"Kaô Kabecilê"!
Acho que ele estava enganado, pois nunca gostei de saudar rei nenhum.
Mas gosto de ser verdadeiro.
Se bem que a verdade dói e poucos gostam dela.
Então, passei a ser bondoso. É mais fácil.
Estou mais para Oxalá.
"Èpao, èpa bàbá"!
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Lendo do exu Sartre (Laroiê Exu!) entendi que o ser se funda sobre o nada e "é o que não é e não é o que é".
Então eu resumi em: o nada que alguma coisa é.
Ou seja, só fato de existirmos já aponta para o mistério.
E só isso, só até aqui, o resto é ópio do povo.
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O mestre Manoel Pires dizia "é tempo de murici, cada qual sabe de si"!
Mais sartreano impossível!
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https://www-theguardian-com.translate.goog/world/2022/aug/16/lula-bolsonaro-brazil-possessed-by-devil-election?_x_tr_sl=en&_x_tr_tl=es&_x_tr_hl=es
Fio de esperança, o Lula? Está mais para fim da esperança.
Aguentei esses 43 meses e meio de retrocesso e barbárie me consolando com a possibilidade de finalmente rompermos a alternância entre a esquerda domesticada e a direita bestializada. Ela paralisou a História aqui no Brasil, enquanto nos outros países começa a ressurgir uma esquerda de verdade, com novas propostas e a combatividade que a nossa não mostra mais.
É profunda a minha decepção ao ver que tudo foi inútil, sofremos e nada aprendemos, depois do celerado voltará o reformista, que não conseguirá tirar a economia do buraco e propiciará a volta da barbárie, e assim por diante, num círculo vicioso que pode muito bem durar o tempo de vida que me resta.
E o que eu queria era tão pouco: que a polarização fosse para o inferno e a História se destavasse, da estagnação nada de bom jamais brotará. Queria deixar um Brasil menos destruído para minhas filhas. Cada vez tenho mais receio de não conseguir.
Boa tarde. O 7 de setembro não será pequeno pois 28% ainda apoiam as ideias do presidente. Importante é na eleição fluir o voto naquele que parece o mais próximo de tira-lo de Brasília. Não gosto do Lula mas não há outra alternativa. Abraço
Mas, com o recuo do Bozo que está se desenhando, tende mesmo a haver o esvaziamento, William. Afinal, foi também assim no 7 de setembro de 2021 e os bolsominions não se esqueceram.
Desde então, a parte mais radical dos seguidores passou a olhar com desconfiança o "mito". Com razão: na hora H ele amarela.
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