segunda-feira, 15 de agosto de 2022

SARAVÁ, OGUM!

Não sou umbandista.

Nem católico, nem espírita, nem islamita, nem budista.

Menos ainda adepto de qualquer dos cultos ao bezerro de ouro que hoje proliferam, arrancando com  engodos as últimas moedas dos miseráveis.

Com os religiosos sinceros convivo.  Aos mercantilizadores da fé desprezo profundamente.   
Minha mãe era kardecista e eu a acompanhava às sessões quando criança. Lá pelos 11 ou 12 anos, numa semana estava doente e não fui. Noutra, chovia forte e não fomos. Na terceira percebi que, bem lá no fundo, eu realmente não queria ir, então nunca mais fui.

As religiões de matriz africana me agradam esteticamente, pela alegria, pelas cores, pelas danças, pela musicalidade e porque as histórias de orixás me lembram a mitologia grega, que eu adoro.

Se tivesse de escolher culto para assistir, dentre todas as religiões que conheço, seria um da umbanda. Certamente não ficaria entediado nem contando os minutos para dar o fora dali. Mas, e a fé?  Continuaria ausente.
Quando não passam de engana-trouxas, as religiões são exatamente o que Karl Marx disse no arrazoado célebre, tantas vezes e tão sordidamente deturpado:
"A religião é o suspiro da criatura oprimida, o ânimo de um mundo sem coração e a alma de situações sem alma. A religião é o ópio do povo.

A abolição da religião enquanto felicidade ilusória dos homens é a exigência da sua felicidade real. O apelo para que abandonem as ilusões a respeito da sua condição é o apelo para abandonarem uma condição que precisa de ilusões. A crítica da religião é, pois, o germe da crítica do vale de lágrimas, do qual a religião é a auréola".
O ópio, como todos deveriam saber, era uma droga utilizada no século retrasado para mitigar a dor. Cumpria bem tal papel, evitando que doentes graves sofressem terrivelmente. Mas, como não atacava a causa da moléstia, proporcionava apenas um alívio momentâneo. Foi neste sentido que Marx a ele se referiu, como se constata indiscutivelmente na frase completa.

Sou revolucionário e dediquei a minha vida a substituir as felicidades ilusórias dos homens pela satisfação das necessidades humanas, numa sociedade regida pela priorização do bem comum e pela fraternidade plena. 

Mas, até chegarmos ao reino da liberdade, para além da necessidade, os revolucionários não podemos jamais nos omitir da defesa dos injustiçados e perseguidos neste vale de lágrimas.
É o que estão sendo hoje e agora os devotos das religiões africanas. Impiedosamente.

Que ninguém se iluda: a cruzada encabeçada pela Micheque não é espiritual, mas racista. Apela aos piores instintos das piores pessoas, aquelas para quem um repulsivo consolo é existir alguém em situação mais desgraçada ainda. 

Nem me lembro mais de que personagem de filme ouvi a frase que melhor explica a atitude e a visão de mundo de um branco pobre e racista: "Se eu não sou melhor do que um negro, melhor do que quem eu vou ser?". 
Quem não tem coragem para queimar os negros nas cruzes, como os carrascos da Ku Klux Khan, inventa lorotas para disfarçar o sonho monstruoso que carrega na alma. 

Como revolucionários, nosso lugar é sempre ao lado dos negros barbarizados e que têm seus templos vandalizados, além de serem expostos à estigmatização pelos farsantes da política crapulosa. 

Se houvéssemos todos sido mais firmes na solidariedade às vítimas desse racismo travestido de religiosidade, tão ignóbil preconceito não estaria sendo usado nas fake news contra o candidato Lula, nem na cínica retórica das ovelhas desgarradas que Cristo, se aqui estivesse, expulsaria das marchas a si dedicadas como fez com os vendilhões do templo. (por Celso Lungaretti)
 

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