dalton rosado
Série AS DETURPAÇÕES CONCEITUAIS E SEMÂNTICAS / parte a
O s conceitos são manipulados no sentido de reproduzirem um viés prévio, que obedece ao interesse do poder instituído e é disseminado na comunicação de massas e até no processo educacional do Estado.
É comum tratar-se uma determinada prática social de forma depreciativa ou mesmo caluniosa, ao mesmo tempo em que se enaltece outra de teor negativo como heroica.
Sobre o terrorismo – Uma dessas distorções de cunho maniqueísta (mais adiante abordarei o maniqueísmo como prática política ou religiosa) volta e meia se verifica ao se qualificarem de terroristas os adversários do stablishment.
Quando um país invade outro e mata civis inocentes, fizeram os Estados Unidos ao atacarem o Iraque ou como ora faz a Rússia na Ucrânia, as adjetivações dadas pelos mandatários promotores de tais genocídios são as mais diversas.
Discursando no Congresso Nacional em 2002, o presidente dos EUA, George W. Bush, justificou a invasão do Iraque como sendo uma guerra contra o terrorismo e o eixo do mal (embora o atacado, o ditador sanguinário Saddam Hussein, fosse antiga cria estadunidense).
Em Bagdá, enquanto dormiam em seus lares, morreram milhares de crianças sob as bombas libertárias dos EUA. Se uma dessas crianças fosse seu filho e você um mero cidadão iraquiano, qual o adjetivo que você usaria para classificar os assassinos do seu filho???
Alegaram que no Iraque existiam, prontas para serem usadas contra os Estados Unidos pelos terroristas, armas químicas e biológicas que jamais foram encontradas.
Na verdade. tudo não passou de uma resposta política equivocada, mas capaz de satisfazer, para fins eleitoreiros, a sanha dos estadunidenses face ao ataque às torres gêmeas do WTC.
A irracionalidade coletiva exigia que se usasse a lei do talião contra os deploráveis fundamentalistas religiosos islâmicos (não devemos confundir tais seitas com a religião islâmica convencional, ainda que tenhamos discordâncias quanto a qualquer conteúdo desta) e, assim, aceitou-se matar inocentes com bombas lançadas a mais de 10 mil metros de altura por aviões inatingíveis pela defesa aérea iraquiana.
Da mesma forma, não há como justificar a invasão da Ucrânia pela Rússia usando mísseis de longo alcance contra objetivos civis, matando quem não guerreava e provocando um êxodo populacional somente comparável aos da 2ª Guerra Mundial.
As afirmações de que o objetivo seria a desnazificação da Ucrânia ou de que se tratasse de uma operação especial étnica seriam apenas ridículas e patéticas, caso não fossem genocidas.
Após o golpe militar de 1964 no Brasil, sob a alegação falaciosa de luta contra o comunismo (eram tempos da chamada guerra fria, após a tomada de poder pelos guerrilheiros em Cuba) que estaria sendo implantado pelo presidente Jango Goulart ou com sua conivência. Seguiu-se uma sequência interminável de:
— demissões de funcionários públicos, mesmo os que eram estáveis;
— cassação de mandatos eletivos;
— aparelhamento do Estado para interesses corporativos militares;
— censura à imprensa e às artes; e
— doutrinamento conservador sob a égide do Estado.
Tudo isso ocorreu com alto grau de arbitrariedade e sob o primado da impunidade, a pretexto de defender uma democracia que nunca havia estado realmente ameaçada..
Diante do ascenso das forças democráticas que resistiam ao arbítrio, ao invés da promoção da redemocratização burguesa, ocorreu um recrudescimento da ditadura militar e uma caça às bruxas desembestada, com execuções e torturas daqueles alcunhados pela ditadura como terroristas.
Estes são apenas alguns exemplos históricos e atuais da prática do terrorismo de Estado.
Entretanto, a menos que se chegue às portas do bunker dos terroristas de Estado, como correu com Adolf Hitler (que preferiu suicidar-se do que responder por seus atos), tal crime jamais é classificado como tal, nem seus promotores sentenciados e presos.
Somente são considerados terroristas aqueles heroicos militantes que arriscam suas vidas contra os que assassinam sob o manto protetor da institucionalidade estatal!!!
Soberania do voto e democracia – O voto não representa soberania de vontade. Escolhe-se dentre o que já foi previamente escolhido, ou seja:
— primeiramente os eleitores estão, na prática, ratificando os preceitos constitucionais anteriormente estabelecidos como resultante da vontade geral firmada pelos constituintes, que receberam outorga do voto para a elaboração do texto constitucional por representação;
— secundariamente, elegem-se pelo voto os governantes e parlamentares que obedecerão às regras previamente fixadas e juramentadas (no capitalismo, obviamente, regras capitalistas) e que são escolhidos pelos partidos políticos para participarem de um processo eleitoral.
Algum democrata-burguês mais convicto certamente objetará que o contrário disto seria a ditadura, do mesmo modo que os capitalistas costumam chamar de comunismo o que nunca foi comunista. É como se costuma dar significado negativo e deturpado às palavras e conteúdos doutrinários que estão na contramão de determinados interesses inconfessados. (por Dalton Rosado – continua)
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