REALIDADE PARALELA
Perdidos por falta de oportunidades... |
Fato é que Jair Bolsonaro, como nenhum outro de seus antecessores, mostra-se incapaz de governar para a maioria –e até desinteressado em fazê-lo. Mantém-se refugiado na parcela minoritária, mas expressiva, do eleitorado que se dispõe a compartilhar de sua realidade paralela, ou a tolerá-la em nome de preferências ideológicas.
São 26% os que dizem confiar às vezes no que diz o presidente, e 13% os que confiam sempre. Estes acreditam, pois, que vacinas conta a Covid-19 estão associadas ao desenvolvimento da Aids; que eleições no país têm sido fraudadas sistematicamente; que os fracassos do governo decorrem de sabotagem dos opositores.
Decorridos quase três anos de mandato, é evidente a indisposição de conviver, que dirá dialogar, com forças políticas, setores da sociedade e instituições que não estejam associadas a seu projeto de poder.
Mesmo tendo deixado de lado a pregação abertamente golpista, Bolsonaro e seu governo continuam hostis à crítica, à divergência e ao mero cotejo dos fatos.
A truculência contra a imprensa, que dá exemplo a seguidores e a profissionais que cuidam da segurança presidencial, é apenas a manifestação mais comum dessa intolerância.
Nesta semana até o formalíssimo Fundo Monetário Internacional anunciou o fechamento de seu escritório no Brasil, em meio a grosserias do ministro da Economia, Paulo Guedes.
O auxiliar de Bolsonaro –que, entre outras proezas, prometeu zerar o déficit público em apenas um ano e acabou por elevar o teto de gastos– renega as previsões pouco lisonjeiras do Fundo e do próprio mercado doméstico para a atividade econômica do país.
A reprovação ao mandatário, que se expandiu durante a tragédia da pandemia, mantém-se no patamar mais elevado, de 53%, num contexto de desemprego elevado, escalada da inflação e queda da confiança de empresários e consumidores.
A aposta derradeira para o ano eleitoral de 2022 será buscar os estratos carentes, justamente os mais refratários ao presidente –na parcela com renda até dois salários mínimos, 55% consideram seu governo ruim ou péssimo e 66% nunca confiam no que ele diz.
O recém-criado e necessário Auxílio Brasil é uma versão ampliada do Bolsa Família, outrora chamado por Bolsonaro de instrumento de compra de votos. Trata-se, pois, de um caso que testa as fronteiras da sinceridade do presidente. (editorial da Folha de S. Paulo de 18/12/2021)
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