quarta-feira, 24 de março de 2021

NÓS DEVEMOS TEMER UM NOVO GOLPE NO ANIVERSÁRIO DA QUARTELADA? O BRASIL AGUENTARIA OUTROS 21 ANOS PERDIDOS?

rui martins
...E SE OS EVANGÉLICOS APOIAREM UM GOLPE?
F
altando uma semana para os bolsonaristas comemorarem os 57 anos da quartelada de 1964, começamos a viver outro tipo de polarização – não a de Lula versus Bolsonaro, mas sim a entre o nascente movimento pela destituição do presidente insano/genocida e a campanha ultradireitista pelo fechamento das instituições democráticas mediante um novo golpe.

Isto me levou a fazer comparações com o golpe ocorrido em 1º de fevereiro último, no país asiático hoje conhecido como Mianmar (ex-Birmânia). 

Porque em Mianmar existe uma população doutrinaria e basicamente pacifista, que segue os ensinamentos de Buda. Há 14 anos, milhares de monges budistas saíram às ruas numa manifestação silenciosa e ordeira de protesto contra o aumento do preço dos alimentos ou alta do custo de vida. Também silenciosamente, pois 90% da população é budista, os monges influíram no retorno dos militares às casernas e na libertação da mulher líder da democracia, Aung San Suu Kyi, depois de 14 anos de prisão domiciliar.

Entretanto, após cinco anos de governo democrático com Aung San Suu Kyi, a imprensa internacional tinha manifestado sua inquietação por ver, nos últimos meses, importantes dirigentes budistas se encontrando com generais birmaneses da época da ditadura. 

Doações eram feitas, assim como promessas para reabertura dos pagodes ou templos. Esses dirigentes budistas não deram as caras nem fizeram declarações quando o golpe foi desfechado e a presidente democraticamente eleita, presa uma vez mais.
Aung San Suu Kyi, deposta por um golpe que
poderá servir de modelo para um similar daqui
Os budistas birmaneses não constituem um grupo religioso, existem diversas tendências, entre elas a dirigida por um clero formado de sacerdotes ultranacionalistas. Tal grupo se tornou majoritário e se aproximou dos militares. 

A existência no país de uma minoria de muçulmanos justificou uma política de perseguição étnica e também religiosa aos ditos cujos, vítimas de expulsões e violências. 

A existência desse inimigo comum, os muçulmanos Rohingyas, acabou por aproximar muito os militares dos budistas nacionalistas.

Ora, embora Aung San Suu Kyi sempre demonstrasse sua fé budista, a líder dirigente democrata tentava criar uma distância entre a religião e o poder (aqui diríamos: tentava manter distância entre igreja e Estado). 

Isto incluía leis regulamentando as finanças do clero budista, geradoras de um certo esfriamento desses dirigentes religiosos com relação a Aung San Suu Kyi. Eles inclusive criticavam o fechamento dos templos por causa da pandemia e foram atendidos: os militares golpistas logo reabriram todos os pagodes.

Em síntese, embora alguns monges venham participando das atuais manifestações contra os usurpadores do poder  (um deles já foi preso e outro, morto), o clero budista, na sua grande maioria, demonstra, por sua passividade, um apoio, mesmo que discreto, às violências cometidas contra manifestantes, mesmo quando são assassinados pela junta militar golpista no poder.
Lema que os bolsonaristas copiaram do
nazista
Alemanha acima de tudo
C
ONSPIRAÇÃO COM OS EVANGÉLICOS
– Na Birmânia, o inimigo comum unificador do clero budista com os militares são os muçulmanos. No Brasil, o inimigo comum, criado pelos gabinetes do ódio de Bolsonaro, contra os quais unem-se os evangélicos e os militares, são os comunistas (embora quase inexistentes) e os petistas.

A doutrina evangélica enfatiza o amor e a prática do bem contra o mal e a violência, como também fazia Buda, mas influentes líderes do evangelismo brasileiro não tiveram nenhum pudor em apoiar o programa de violência preconizado durante a campanha eleitoral de Bolsonaro, nem as numerosas declarações incitando truculências contra os adversários depois de eleito.

O apoio de tais líderes evangélicos ao senador quebrador-de-placas Daniel Silveira foi bastante sintomático e revelador de uma predisposição de apoiar o uso excessivo da força por parte do governo Bolsonaro, quando isto for considerado necessário.

Como na Birmânia, a fim de manter o apoio dos evangélicos, o presidente Bolsonaro acaba de perdoar as dívidas do clero religioso, relacionadas com pagamento de impostos locais e de renda, de pastores, igrejas, instituições e escolas religiosas, num total de mais de R$ 1 bilhão. 

Ainda na semana passada, o pregador evangélico Silas Malafaia – que não esconde seu apoio político a Bolsonaro, mesmo diante do retumbante fracasso do presidente na gestão da crise do coronavírus, já causador de centenas de milhares de mortos — foi pedir sua intervenção para a reabertura das igrejas evangélicas, fechadas por determinação de governadores.

Os evangélicos conseguiram eleger importante bancada na Câmara Federal e no Senado, e imagino ter ocorrido o mesmo nas câmaras municipais e estaduais por todo Brasil. 
Marcha para Cristo?! Esta infâmia seria mais cabível
numa marcha para Abigor, o demônio da guerra...
 

O governo tem como ministros pastores representantes dos evangélicos, como André Mendonça, Milton Ribeiro e Damares Alves, perfeitamente entrosados com os programas de destruição do Estado e da Cultura, preconizados pelo presidente Bolsonaro. 

Fiéis não se manifestam diante do caos sanitário brasileiro, decerto acreditando piamente nas comparações distorcidas com outros países e na transferência da culpa para governadores, prefeitos, Congresso, STF, imprensa, etc.

Paralelamente, o apoio ao governo de Bolsonaro é reforçado todas as semanas por pastores, nos cultos e pregações nas centenas de milhares de igrejas evangélicas espalhadas pelo Brasil. Tais pregações pontuais e semanais são consideradas pelos fiéis como recados de Deus. 

Hoje, mesmo quando já começa a despencar o prestígio do governo Bolsonaro, cerca de 30% dos brasileiros permanecem bolsonaristas, o que em muito se deve à faina incessante dos pastores evangélicos, que repetem semanalmente as falsas informações e interpretações. Muitas igrejas não evangélicas, mas do grupo protestante, também incluíram nas suas doutrinas o apoio total ao presidente.

Os budistas são pacíficos, os evangélicos, mesmo escrevendo mensagens de ódio pela Internet e fazendo ainda hoje o gesto da arminha, se dizem pacíficos. A arma deles seria a Bíblia, já definida por alguém como uma velha viola na qual se pode tocar qualquer música ou melodia.
Os ultradireitistas tiveram de esperar três décadas para
que os horrores de 1964/1985 caíssem no esquecimento
 

Todos estão dispostos a lutar contra o Mal, no caso os inimigos do presidente. Com armas na mão? Deixando haver um golpe passivamente, sem interferir nas violências que forem cometidas, como os budistas da Birmânia?

Meu temor é o de ver o rebanho evangélico, tão bem doutrinado e controlado, reagir como os seguidores de Trump no ataque ao Capitólio, nos EUA, no caso de destituição do presidente, genocida e coveiro da nação, e mesmo no caso de uma derrota nas eleições de 2022. 

Os evangélicos passaram a ter ódio dos adversários do presidente: dos ministros do STF, dos governadores favoráveis ao confinamento, de parlamentares, de jornalistas que criticam os celerados no poder, etc. 

Nem sempre religião é sinônimo de amor e pacifismo. Os cristãos da Idade Média, p. ex., diversas vezes espalharam o terror. 

Se houver tropas nas ruas, golpe com guerra civil, não tenhamos ilusões, os evangélicos mesmerizados pelo gabinete do ódio usarão as arminhas em nome de Deus, Jeová, Cristo ou Buda. Que não cheguemos lá! (por Rui Martins)

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