O PROCESSO DIALÉTICO HISTÓRICO DA EMANCIPAÇÃO POPULAR
As revoluções comportamentais das sociedades, principalmente aquelas que dizem respeito ao modo social de produção dos meios de subsistência, não se dão de modo cirúrgico.
Elas obedecem a um processo histórico que depende do grau de condições objetivas (teóricas e práticas) para a sua consolidação. Como processo que é, está em constante mutação, no que Friedrich Engels chamou de dialética do movimento.
Assim, o movimento armado que se contrapôs heroicamente à ditadura militar quando esta, a partir da assinatura do AI-5 (dezembro/1968), direcionava-se para o terrorismo de Estado pleno, não morreu juntamente com seus mártires, posto que a sua análise histórica, hoje, ganha contornos de avaliação contextual educativa.
Os exemplos históricos da luta pela emancipação que marcaram, cada um, a sua época, mesmo que tenham sido sufocados pelas circunstâncias históricas, não se encerram em si.
Eles deixam sementes revolucionárias que, em algum momento da História, deverão frutificar. É o processo dialético da tese e da antítese que desemboca na síntese; tal processo não se conta em dias e horas de uma vida humana, mas no tempo histórico das mutações sociais.
Vale lembrar, à guisa de exemplo, a trajetória da 1ª Internacional dos Trabalhadores.
Criada sob a orientação de Karl Marx e Friedrich Engels em setembro de 1864 (momento histórico no qual ocorria a primeira grande revolução industrial na Inglaterra), ganhou um bom impulso inicial em função da miséria a que eram submetidos os trabalhadores.
Contudo, posteriormente foi esvaziando-se e acabou dissolvida pela ação violenta da repressão do Estado burguês emergente, combinada com algumas concessões do capital (um trunfo os qual os países capitalistas dominantes sempre podem recorrer em momentos estratégicos).
Mas os seus ensinamentos deixaram marcas profundas na consciência revolucionária, que iriam aglutinar forças para, meio século depois, o ímpeto transformador da sociedade renascer das cinzas com a revolução soviética de 1917 na Rússia, cujos fundamentos doutrinários leninistas e trotskistas se embasaram no chamado marxismo tradicional.
Podemos considerar que a eclosão da revolução bolchevique (que instituiu o primeiro Estado expropriador dos meios de produção capitalistas privados para torná-los propriedade estatal sob os mesmos critérios de produção de valor e extração de mais-valia, agora e então patrocinados pelo patrão Estado) é um exemplo das marchas e contramarchas da humanidade buscando romper com um passado de escravização dos que somente possuem na vida a sua força física de produção, sem riqueza abstrata nem poder político.
Os paradoxos desse itinerário de avanços e recuos civilizatórios devem ser compreendidos no seu processo dialético histórico, sob pena de fazermos uma leitura precipitada e equivocada de cada acontecimento, sem compreendê-los na sua verdadeira dimensão.
O exemplo atual da China (país gigantesco, tanto do ponto de vista territorial quanto do de seu contingente populacional, e agora com importância econômica), é bem ilustrativo, se fizermos a leitura correta de tudo que a inserção chinesa no contexto capitalista mundial está a provocar.
O exemplo atual da China (país gigantesco, tanto do ponto de vista territorial quanto do de seu contingente populacional, e agora com importância econômica), é bem ilustrativo, se fizermos a leitura correta de tudo que a inserção chinesa no contexto capitalista mundial está a provocar.
A China, que fez a revolução marxista-leninista em 1949, logo após a 2ª Guerra Mundial e ainda sob os efeitos da divisão mundial entre os projetos políticos dos países aliados (que gerou a tensão da guerra fria, explicitada pela Guerra da Coreia em 1950-53 e posterior divisão desta nação em duas,uma dita comunista e a outra capitalista), tem hoje relevância no cenário internacional.
Mas, paradoxalmente, a ela não chegou pelo caminho preconizado por Marx e Engels (de gradativa superação e supressão do Estado, do partido político revolucionário e das classes sociais), mas justamente pela intensificação das categorias capitalistas que deveriam servir-lhe apenas durante a transição para a sociedade comunista.
Deveria solapar o capitalismo com exemplos práticos da superação das categorias fundantes de tal modo de relação social (valor monetário, trabalho abstrato, dinheiro, mercadorias, mercado, Estado, política, etc.) e encaminhar, progressivamente, a sua completa extinção.
Fez, no entanto, o caminho inverso, ou seja, intensificou, ao seu modo, a positivação dessas categorias para tornar-se uma gigante do capitalismo mundial (mesmo que com os pés de barro, graças à sua colossal dívida pública e privada).
E tudo ocorre sob o manto de um Estado e de um partido que se dizem comunistas e marxistas. É um paradoxo total.
De resto, o mesmo aconteceu com a União Soviética, de forma menos estridente.
Mas, o processo dialético histórico escreve certo por linhas tortas, e mantém a sua rota inexorável de eterna busca de novos horizontes e sepultamento da velharia social que a cada movimento se torna obsoleta. O que podemos, então, inferir do caso chinês?
Ao ofertar mão-de-obra escrava abundante, a preços inimagináveis para os padrões capitalistas dos países dominantes, e favorecer ao máximo a reprodução do capital internacional em seu território, a China forçou a migração do grande capital industrial para lá, facilitada pelo crédito fácil de um sistema de crédito bancário internacional carente de exploração de juros. Ou seja, juntou-se a fome com a vontade de comer.
Estava criada a globalização da produção de mercadorias, ao invés de sua superação, possibilidade contra a qual Karl Marx advertira logo no 1º capítulo de O Capital. E por um país que intitula a si próprio de comunista! (por Dalton Rosado)
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