sábado, 27 de julho de 2019

É INDISSOCIÁVEL A RELAÇÃO ENTRE O SIGILO DOS ATOS DO GOVERNO E A OPRESSÃO ESTATAL A SERVIÇO DO CAPITAL – 1

dalton rosado
EPISÓDIOS SOB BREVE ANÁLISE DA CRÍTICA SOCIAL: os hackers e
sua bisbilhotice.
Há hoje, no mundo inteiro, uma busca pela transparência das ações de governo. Assim se procede por se considerar que os atos de governo são bem diferentes dos atos da vida pessoal do cidadão.  

A segunda esfera se refere ao comportamento privado, que precisa ser preservado como garantia de liberdade pessoal. 

Já as ações dos titulares dos órgãos governamentais (não a vida privada desses titulares) é algo que interessa à sociedade como um todo. Portanto, os atos públicos, e principalmente as contas públicas, devem ser divulgados(as) e acompanhados(as) pelos cidadãos, pois para eles são, ou deveriam ser, direcionados.   

Não deve, portanto, haver segredos inconfessáveis por parte de quem age por representação social do poder estatal, seja por concurso público ou mandato eletivo. O interesse social legalmente constituído de um único cidadão tem repercussão geral no direito de todos os cidadãos; e os direitos dos cidadãos de um país devem ter repercussão geral entre os cidadãos de todos os países. 

Che Guevara afirmou corretamente que não há fronteiras na luta de morte pela emancipação, daí não devermos permanecer indiferentes face ao que acontece em qualquer parte do mundo. Segundo ele, a derrota de qualquer povo perante os seus algozes é a derrota de todos nós.

É indissociável a relação entre o sigilo dos atos de governo e o opressão estatal a serviço do capital.  

Insurgimo-nos contra o sigilo do interesse nacional, patriótico, protegido por lei como ato de segurança, porque ele não pode estar dissociado do interesse de nosso semelhante daqui ou de além-fronteiras. O interesse de um africano da Etiópia deve ser tão relevante quanto o interesse de um cidadão estadunidense; o interesse de um brasileiro deve ser tão respeitado como o interesse de um venezuelano, e por aí vai. 

Existe, na verdade, uma compreensão equivocada e hipócrita de que os interesses nacionais, consubstanciados na pretensa defesa dos interesses dos cidadãos do nosso país estejam acima e sejam conflitantes com o legitimo interesse dos cidadãos estrangeiros

Isto somente se dá porque há uma constante segregação social interna (cidadãos de primeira classe, os bem aquinhoados financeiramente, e os cidadãos de segunda classe, os assalariados de baixa renda) que se estende com maior vigor ainda à segregação humana internacional (entre países ricos e pobres). 
O ser humano rico (muitas vezes ladrão do erário, dito público), que deposita altas somas num banco internacional, recebe passe livre de trânsito e direito de permanência no país beneficiário porque ter dinheiro virou atestado de qualificação para a cidadania; e o cidadão pobre e desqualificado profissionalmente morre nos mares cheios de barcos de imigrantes rejeitados ou é perseguido nas terras para onde emigra em desespero. 

O indivíduo social, transformado em cidadão, é reduzido à condição de ser mercantil, de coisa abstrata, comparável à mercadoria da qual seja eventualmente detentor, sendo-lhe negado o direito à informação plena. Este é o conceito de cidadania nacional e internacional sob o capitalismo.

Quando o presidente destrumpelhado trombeteia o slogan América first, ele está confirmando, sem nenhum pejo, que os interesses dos cidadãos estadunidenses estão acima daqueles dos cidadãos dos outros países, como se fosse correto e aceitável que a humanidade se dividisse entre blocos territoriais díspares em privilégios. Corrobora, assim, o que o capitalismo faz na sua prática corriqueira: a segregação social entre os humanos. 

A necessidade de sigilo absoluto dos atos de governo, ditos públicos, corresponde, obviamente, à impossibilidade de confissão da natureza da opressão estatal neles contidas e de sua submissão incondicional ao capital, que é internacional.

Somente o que pode ser publicizado, dentro do interesse estatal de dourar a pílula amarga da cobrança de impostos que sustentam a opressão institucional (cujos verdadeiros fins são mascarados pelos falaciosos compromissos constitucionais de provimento das demandas sociais básicas) ou dos atos administrativos corriqueiros e orçamentários, é que pode ser revelado.

Ao invés de se criticar os hackers que bisbilhoteiam os atos de governo emanados das autoridades como uma prática ilegal, todos esses atos devem ser dados ao conhecimento público, justamente por serem atos públicos. 

Incluem-se aí os atos jurisdicionais, menos aqueles, que por interesse de investigação criminal, devam ser mantidos sob sigilo (e, mesmo assim, o embargo deve perdurar somente até a elucidação de tais episódios, por respeito ao direito de acesso à transparência dos atos de interesse social).

Tal deve ocorrer até como forma de coibição de práticas não isonômicas e corporativistas que conflitem com o interesse social. 

Quando o ex-juiz Sérgio Moro autorizou o hackeamento da ex-presidente Dilma Rousseff no episódio envolvendo o ex-presidente Lula (caso Bessias), afirmou ter agido por interesse investigativo, burlando a lei que o proibia de proceder de tal maneira.

Mas, quando ele mesmo é hackeado por terceiros, sabe-se lá com que interesses, e o conteúdo de suas práticas são divulgados, ele passa a ter outra postura, desconsiderando a validade do conteúdo sob a alegação de que teria sido criminosa a forma como foram obtidas as suas conversas aéticas e ilegais (processualmente falando). 

É o que popularmente se denomina utilizar dois pesos e duas medidas: no primeiro caso Moro argumentou que o fim justificava o meio e no segundo caso, alega que o meio invalida o fim. Este foi o critério parcial de quem teria a obrigação de ser imparcial no mister de distribuir justiça. 

É sempre assim: o sigilo dos atos de governo, na maioria das vezes, objetiva a preservação de interesses inconfessáveis para o grande público, justamente porque contrariam a melhor prática de sociabilidade, algo que tem forte liame com a natureza intrínseca à mediação social capitalista e seu poder institucional verticalizado.
Por Dalton Rosado

Este funciona de modo excludente, tal como a própria acumulação da riqueza abstrata e material feita por uns em detrimento de todos – e de modo sub-reptício quanto a acesso de todos ao processo de conhecimento da mecânica do seu conteúdo socialmente negativo.   
(continua neste post)

Um comentário:

SF disse...

+++
Aguardando a continuação deste artigo que, a meu ver, começou muito bem.

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