quinta-feira, 13 de junho de 2019

UMA GREVE GERAL É SEMPRE EDUCATIVA E FAZ TREMEREM OS EGOÍSTAS INSENSÍVEIS

Um slogan do maio de 1968 francês
dalton rosado
AS BANDEIRAS CONSISTENTES DE
 UMA GREVE GERAL
A primeira greve que realmente tocou na questão da negação da vida mercantil ocorreu em maio de 1968 na França, quando estudantes e operários cruzaram os braços e paralisaram o país. 

Charles de Gaulle, partidos de direita e de esquerda, sindicatos patronais e de trabalhadores, todos ficaram atônitos com muitas das inusitadas bandeiras ali levantadas, cujos teores remetiam à contestação de tudo o que até então era tido como conceito positivo.  

Ao serem indagados sobre a pauta de reivindicações do movimento grevista, ouviram dos estudantes e operários: Queremos o direito à vida! 

E havia slogans que evocavam aspirações difíceis de serem compreendidas pela lógica do enquadramento sistêmico. Sejamos realistas, peçamos o impossível! 

Os incríveis anos 60 e seu sentimento libertário não se coadunavam com as reivindicações costumeiras dos movimentos grevistas tradicionais, cujos eixos principais reivindicatórios se cingiam às melhoras salariais e de condições de trabalho, ou seja, pugnavam pela permanência implícita das relações capitalistas sob critérios mais humanizado (estes sim, impossíveis de serem concretizados!). 
A Sorbonne ocupada na greve de maio/68: "fechada para a administração, aberta para seus estudantes"
Este diferencial do maio de 68, numa das principais economias do 1º mundo e num período de ascensão capitalista, parecia aos olhos conservadores como um raio em céu azul, mas que já era cinzento aos olhos revolucionários.  

A negação do stalinismo revisionista do Partido Comunista Francês e das bandeiras das centrais sindicais transcendia a compreensão das corporações que somente conseguiam raciocinar a partir do seu umbigo, entendendo que o particular beneficia sempre o coletivo. 

Mas a vida não era e não é bem assim ... 

Na atualidade brasileira, amanhã (14) será dia da primeira greve geral a partir da posse do governo ultradireitista. Ela deve ser saudada como retomada da presença contestatória nas ruas de uma população oprimida e como uma paralisação da produção em meio à crescente perda de direitos econômicos e sociais. 

Mas ela embute um risco que deve ser cuidadosamente compreendido sob pena de reforçarmos tudo aquilo que secularmente nos oprime, pois a greve sem consistência de conteúdo e de rumo não é remédio genérico para as agruras da opressão de que somos vítimas. 

Uma greve meramente politicista corre o risco de cair no vazio, cansar os seus participantes e provocar descréditos contestatórios. 

É justo reivindicarmos mais verbas para a educação quando o governo faz um corte linear do orçamento para esse setor vital da vida social, colocando tal medida como necessária para o ajuste fiscal (compatibilização de receita dos impostos com as despesas orçamentárias do governo)?  

A resposta a esta indagação é sim, mas desde que façamos a ressalva de que a solução definitiva do problema não está no fortalecimento do Estado que cobra impostos de uma população economicamente exaurida, para que, assim, ele possa manter (e até ampliar) o financiamento da educação. Urge, isto sim, superarmos o próprio Estado! 

Reconheço que não é fácil acrescentar-se à questão circunstancial (melhores condições de trabalho ) a questão principal (superar o trabalho, enquanto categoria capitalista que é).

Mais difícil ainda é fazer os cidadãos em geral compreenderem que aquilo que tanto se reivindica (mais dinheiro sob a forma de salário) corresponde à manutenção implícita da célula germinal de nossa tragédia, qual seja a mediação social pelo dinheiro e mercadorias.

Mas, separar uma coisa da outra representa uma tarefa de indispensável ao meticuloso discernimento e condução da luta emancipatória social dos protestos grevistas. Faz-se necessário afirmar durante a greve que queremos um escola que ensine a negatividade da exploração capitalista e a vacuidade do seu fim, o qual é, em si, irracional, destrutivo e autodestrutivo, daí causar tanta infelicidade. 

É possível se conscientizar com bandeiras coerentes e eficazes, ao mesmo tempo em que se mobiliza o povo insatisfeito com questões objetivas que expressa o seu brado de revolta contra tudo que está aí? Evidentemente, isto só será possível a partir de um elevado estágio de consciência dos organizadores e participantes. Eles precisam saber bem o porquê do movimento e quais seus corretos objetivos teleológicos de curto prazo e de longo prazo.

Duas frases panfletárias nesse sentido seriam: Hoje verbas para a educação, amanhã abolir o dinheiro graças à educação! e Educar é libertar!.

É justo nos rebelarmos contra a perda de direitos previdenciários no bojo do ajuste do déficit fiscal? É claro que temos de denunciar a supremacia da lógica do capital sobre a vida dos idosos e deserdados da sorte desta sociedade do capital tão insensível aos dramas humanos e que somente raciocina a partir de sua teleologia autotélica. É claro que devemos dar um sonoro não! à restrição de direitos da previdência social.

Duas frases panfletárias nesse sentido seriam: Os aposentados não podem pagar o ônus da falência capitalista e Paulo Guedes garfa os aposentados mas paga juros altos aos financistas!

É justo reivindicarmos melhores salários e empregos? É claro que devemos alertar para o perigo que isto representa, justamente porque mais e melhores salários representam a afirmação e manutenção da exploração capitalista (que consiste justamente na positivação do trabalho abstrato, fonte de todos os males advindos da riqueza abstrata) e sua acumulação segregacionista, sem a qual ela não sobrevive (não há como socializar o valor, ao contrário do que supõem muitos pretensos marxistas). 

Três frases panfletárias nesse sentido seriam: Não trabalhe jamais!, Não produza o dinheiro que o escraviza! e Produza para o consumo social, sem mercado!.
Sítio Brotando a Emancipação (CE): uma experiência avançada de produção para o consumo social
É justo aceitar-se no movimento grevista partidos de oposição ao governo, mas que involuntariamente ou inconscientemente fazem parte da estrutura opressora do Estado que os subvenciona? É evidente que não se deve excluir pela força e por censura ideológica aqueles agrupamentos e políticos que queiram aderir ao movimento grevista, mas sempre se fazendo a ressalva de que eles precisam ser superados, juntamente com todo o establishment institucional a que pertencem.

Duas frases panfletárias nesse sentido seriam: Os partidos são vassalos da economia e do Estado, abaixo os três! e Governemo-nos, antes que a barbárie nos destrua!.   

É justo se defender políticos corruptos em nome de uma partidarização maniqueísta?  Mesmo considerando que há muito de hipocrisia e de objetivos inconfessáveis no combate à corrupção (o principal deles é a defesa da saúde financeira do erário público opressor), não devemos jamais ter como princípio norteador das nossas ações a aceitação ou a tolerância com a desonestidade, seja ela de que tipo for. A corrupção é contrarrevolucionária; o combate institucional a ela, hipócrita. 

E importante se compreender que a existência do dinheiro é a corrupção em si enquanto instrumento da segregação social e da acumulação indébita pelo próprio capital. Tratando-se de riqueza abstrata e, consequentemente, da riqueza material transformada em mercadoria que é socialmente produzida, o dinheiro deve ser associado intrinsecamente à corrupção política.

Corrupção mercantil pela produção da mercadorias e corrupção com o dinheiro dos impostos são duas faces da mesma moeda, embora a primeira seja aceita oficialmente e a segunda, criminalizada. 

Quatro frases panfletárias nesse sentido seriam: Todo político, ou é corrupto, ou é servo involuntário da opressão estatal!, Não há eleição sem corrupção financeira da vontade!, O dinheiro é a corrupção em si! e Política e corrupção são irmãs siamesas!

São justas as instituições do Estado nas quais uma legisla e outra julga de acordo com esta mesma lei legislada? Como sabemos, todas as casas legislativas do mundo burguês (liberal ou estatista), consideradas falaciosamente como casas do povo, têm uma predominância de parlamentares eleitos pelas mais variadas formas de manipulação da livre vontade de escolha. 

É o dinheiro quem elege os parlamentares na sua grande maioria; e os poucos que não estejam contaminados pela corrupção eleitoral (os revolucionários que aceitam ocupar cadeiras no parlamento correm o risco de, laçados pela gravata, ficarem domesticados) apenas legitimam com suas presenças a permanência da chamada banda podre parlamentar. 

Neste sentido, as leis obedecem ao interesse sistêmico e os magistrados se portam da mesma forma que Pilatos no credo, ou seja, como meros cumpridores das leis e dos seus ritos processuais de execução; e, sendo parte integrante do Estado que os subvenciona, tornam-se (com raras exceções) felizes cumpridores da opressão contida nessas mesmas leis. 

Três frases panfletárias nesse sentido seriam: A imparcialidade do Moro desmoronou!, O deputado legisla pelo capital e o juiz executa! e A justiça é cega, os políticos não têm olhos!.

Vou ficando por aqui e me preparando para participar da greve, pois, afinal, apesar de todos os riscos de manipulação, viva a greve geral!. Ainda que que suas bandeiras possam ser equivocadas ou oportunistas, ela é sempre educativa e faz tremer o bloco dos egoístas insensíveis! (por Dalton Rosado)

3 comentários:

Anônimo disse...

***
Dalton,
Concordo plenamente com o título insinuando que a greve geral levará temor e ainda mais se os rodoviários aderirem.
Por precaução, já estou com meu estoque de gás de cozinha, minhas bicicletas azeitadas e um tanto de alimentos na despensa. Vai que pega... né?
***
Marx a seu tempo e o pessoal de 68 tem revelado este anseio humano pela liberdade, por livrar-se de cada grilhão que o escravize. E pessoas tem expressado esta vontade ao Leviatã da vez, ao longo do tempo, debalde.
Ocorre, que estamos agora no limiar de uma mudança de paradigma tão grande que nem Marx teria sonhado e nem aquela menina falando com a mãe do Cohen-Bendit poderia imaginar.
Ela, inclusive, estaria obsoleta hoje que existe o zap-zap (ou telegram para as conversas não republicanas).
A mudança é na governança do planeta, que está saindo do círculo da alta finança e do estado para as companhias de alta tecnologia.
***
Scientia potentia est.
Se não acredita em mim digite Boston Dynamics no youtube e veja o que já existe.
***
Some placas fotovoltaicas, inteligência artificial, computação quântica e mecatrônica.
Pronto! Já eram o proletariado/burguesia, luta de classes e todas as categorias dialéticas do marxismo.
O homem não está mais sendo alienado do fruto do trabalho, mas de sua possibilidade de trabalhar.
Agora ele é rico. Livres!
Mas, isso trará problemas que são desconhecidos.
Como viver bem a vida quando o mundo do capital e suas categorias esfumaram-se no ar?
Como ser alguém quando não existe mais o outro para ser o inimigo?
(Acredite, haverá quem tentará ser inimigo daquelas máquinas ou dirá que elas é quem são o inimigo).
***
As incensadas estratégias de greves e "lutas" do proletariado são contra um cachorro morto.
Os caras, cuja face visível é Boston Dynamics, ganharam a parada.
Eles já dominam a sociedade global.
Agora é só uma questão de tempo para que a "coisa" contra a qual e pela qual lutam as gentes seja extinta.
***
Quem sobreviver aprenderá que nunca foi uma questão de dialética, mas de o agente ser capaz de viver bem e ser feliz com aquilo que tem no momento.

Por favor, não deixe a imanência sufocar a transcendência que é sua consciência.
É a única coisa que o distingue de uma máquina.

Fausto Neves disse...

Conheço Boston Dynamics, prefiro a Chinezada
MAAAS, Seinão, Anônimo! Seinão meeeesmo!

SF disse...

***
As vezes eu digito em comps que não estão configurados para o meu perfil do google e, para não logar e deslogar escrevo como anônimo.

As três estrelinhas simbolizam os valores: bom, belo e justo da filosofia clássica e que são o que distinguem um ser humano de uma máquina.
Gosto de colocar esse símbolo.

Tenho dito que a revolução é outra e que as categorias dialéticas do marxismo são finadas.
A dialética que se impõe atualmente não é funcional.

Trata-se de construir um mundo que seja bondoso e, portanto, belo e justo com os recursos que tivermos a mão.

A mim pouco importa em fazer coisas que uma máquina pode fazer melhor.
A questão não é mais trabalho humano/trabalho máquina.

A dialética agora é imanência/transcendência.

Teremos cada vez mais tempo livre.

As máquinas já lavam nossas roupas, em breve, produziram nosso alimento e demais bens, inclusive, se construirão a si mesmas.

O mundo se desenha mais como Asimov descreveu do que como Marx previu.
***

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