A NOVA POLÍTICA
DE ENXAMES
DE ENXAMES
O termo nova política é conhecido. Marina Silva é uma campeã no uso dessa expressão. O sentido é mudar o fisiologismo da política brasileira e dar a ela um tom mais centrado no país e não nos interesses de lobbies corruptos e da casta política.
Bolsonaro navegou nessa ideia —apesar de, a cada dia, sua administração afundar em suspeitas de que há rachaduras na coisa.
Agora, o termo nova política está ganhando um novo significado, que nada tem a ver, diretamente, com combate à fisiologia.
A nova política está diretamente ligada às mídias sociais. A máquina política sentirá cada vez mais a pressão, vinda das redes, que as empresas e marcas já sentem há algum tempo. Quem achou que, com a entrada dessas ferramentas, a política ia ficar com menos marketing errou. Ela dependerá cada vez mais do marketing, agora digital.
O mundo dos costumes e da arte já vem sentindo a bota das mídias sociais em seu pescoço há anos. Artistas e gente famosa em geral já são presas de posts e vídeos de seus seguidores há algum tempo.
"Alguma instituição sobreviverá a esse enxame de irrelevantes que chegaram ao poder?" |
O problema é que, quando está a seu favor, você chama de democracia direta, mais poder para o povo e para o cidadão. Já quando está contra, diz que destruirá a democracia representativa, colocará em risco os ritos do Legislativo, é uma ferramenta populista.
A verdade final é que o problema é o mesmo que preocupava os autores de O Federalista. Essa obra foi escrita por Alexander Hamilton, James Madison e John Jay na virada do século 18 para o século 19, nos EUA. O problema deles era: como escapar da tirania do rei e não cair na tirania do rebanho ou da maioria?
As mídias sociais recolocam de forma dramática o mesmo problema. Agora, o efeito enxame está capilarizado ao infinito e se move na velocidade da luz.
"sintoma do retardo mental que assola o mundo" |
As mídias sociais recolocam de forma dramática o mesmo problema. Agora, o efeito enxame está capilarizado ao infinito e se move na velocidade da luz.
Alguns utópicos, à esquerda e à direita, dizem que isso tudo é bom e é, finalmente, a verdadeira democracia. Criptoanarquistas das bitcoins (coisa de gente narcisista com discurso bonitinho), defensores de comissariados do povo e anarco-capitalistas são todos utópicos mais ou menos oportunistas.
Sem dúvida chegamos à democracia na forma consumo. Se o consumidor-eleitor quiser algo, e esse algo viralizar, a pergunta que se colocará é: alguma instituição sobreviverá a esse enxame de irrelevantes que chegaram ao poder?
Muita gente associada à vitória de Bolsonaro acha que foi lindo as mídias sociais derrotarem a televisão. E antes que algum inteligentinho de direita grite que TV e jornais estão vendidos à esquerda (o que é mais ou menos verdade em termos da camada média do jornalismo que tem a cabeça feita na faculdade e nas redes), lembre que democracia direta é faca de dois gumes.
A única coisa que não é ambivalente nessa nova política é o fato de que ela opera pela lógica do consumidor. E o consumidor costuma ser alguém egoísta, mesmo quando boicota alguma coisa a partir de sua pouca informação, sua visão enviesada de mundo ou seu puro e simples ressentimento de pequeno cidadão.
"uma marca da morte do amadurecimento" |
O espetáculo da eleição para a presidência do Senado mostrou isso. Nada há de democracia direta nessa história, só há para gente que acredita na máxima um celular na mão e uma ideia na cabeça.
A democracia direta das mídias sociais como utopia é mais um sintoma do retardo mental que assola o mundo. Aliás, o próprio caráter direto como paradigma é traço desse retardo mental: acreditar num mundo limpinho, simples, verdadeiro, sem as sujeiras humanas, é uma marca da morte do amadurecimento.
Essa nova política terá procedimentos fake como paradigma. Bots [programas de computador que automatizam processos, geralmente repetitivos] como agentes políticos definitivos. Oportunistas como filósofos formadores de opinião. Um retorno à pauta dos federalistas americanos pode nos dar alguma luz.
Ainda que os oportunistas de salão continuem a delirar com o fato de que agora as pessoas estão empoderadas. Palavra horrorosa, que deveria ser escolhida por algum dicionário inglês chique como signo máximo do ridículo contemporâneo. (Luiz Felipe Pondé)
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