Lula praticou corrupção no sentido jurídico. Porém, tal forma de corrupção é apenas consequência de uma outra corrupção mais fundamental, de natureza ética.
Claro que se associar a pilhadores do dinheiro público é um desvio desmoralizante por si só. Porém, numa sociedade regida pela pilhagem generalizada, tal conduta não chega a ser anti-ética.
A pilhagem é o valor supremo do capitalismo, sendo todo milionário e bilionário um pilhador por excelência. Na dinâmica do capital, legalidade e ilegalidade se embaralham e, no fim, a dose certa do crime acaba sendo a métrica de ação das forças judiciais.
Como já se falou por aí, de tempos em tempos a justiça burguesa opera uma limpeza no excesso de criminosos do colarinho branco, tudo para manter o crime nos limites toleráveis. Tal como no futebol, a disputa física é permitida, e até mesmo um tronco mais forte é aceitável; mas, quando a violência descamba, é preciso agir.
O erro ético de Lula é mais profundo, trata-se do erro de ter escolhido os valores da sociedade burguesa.
A autêntica ética é regida pelo humanismo, a busca pela realização, autonomia e completude do ser humano. Algo radicalmente contrário ao capitalismo e aos valores burgueses, centrados na diminuição do ser humano em favor do capital.
Durante certa época, nos primórdios do capitalismo, a burguesia também foi humanista, ao menos nos países centrais. Tal fato, porém, mudou no século XIX, diante da realidade implacável de que seu poder só se sustentaria baseado na exploração e espoliação dos trabalhadores.
A partir daí, a burguesia renegou o humanismo e aderiu a um discurso cínico e apologético. A desigualdade foi transformada em fato natural, inescapável, e a crítica social foi abandonada em prol da culpabilização individual: se você está na pior, o problema é seu e não da sociedade.
O humanismo, contudo, não morreu, apenas mudou de mãos. Agora, o princípio humanista estava com a classe trabalhadora. Enquanto classe explorada, caberia a ela conduzir a crítica social e denunciar a desumanidade do capitalismo.
Na mesma época em que a burguesia abandonava o humanismo, a classe trabalhadora, por meio de seus pensadores, identificava o capitalismo como sendo radicalmente desumanizador. Seja com os socialistas utópicos – de modo ainda confuso e idealista – ou com os anarquistas e comunistas, a sociedade capitalista era entendida como geradora de miséria, opressão e sofrimento.
Com o tempo, foi transparecendo que a única solução possível seria a superação radical da sociedade capitalista em prol de uma nova sociedade. Revolução, portanto, seria a única alternativa viável para a realização do humanismo.
Ora, sendo o humanismo um valor ético, a revolução só pode ser, igualmente, uma opção ética. A ética está no terreno da liberdade, e cada ser humano pode escolher adequar-se ou não a ela. Portanto, cada ser humano pode escolher ou não o humanismo, escolher ou não a revolução.
Lula rejeitou a revolução e, portanto, rejeitou o humanismo, o resto é consequência. A corrupção fundamental de Luís Inácio foi a corrupção ética, quando aceitou a sociedade burguesa como o estágio definitivo da humanidade.
Ao proceder deste modo, escolheu também os valores burgueses com todo o seu rosário de iniquidades. Aceitou que a exploração e a espoliação são elementos naturais da sociedade.
A partir daí, participar da espoliação de modo ilegal seria apenas mais um fato da vida. Se todo mundo faz, por que ele não poderia também?
A partir daí, participar da espoliação de modo ilegal seria apenas mais um fato da vida. Se todo mundo faz, por que ele não poderia também?
Como dito antes, a sociedade burguesa oscila entre o legal e o ilegal. Longe de ser uma anomalia, a ilegalidade é parte essencial do sistema capitalista, mas, igual às bactérias de nossos corpos, a ilegalidade precisa ser mantida em níveis aceitáveis. Faz, portanto, parte da calibragem do sistema o combate esporádico à corrupção.
Do mesmo jeito que faz parte dele um certo controle da pobreza e miséria extremas, donde podemos concluir que a famosa sensibilidade de Lula com os pobres não é um fator ético, mas tão somente parte de uma sistemática burguesa que oscila entre a denúncia implacável da feiura da fome e a culpabilização dos pobres pela sua própria pobreza.
Nunca, é claro, tocando na raiz da origem da miséria: a sociedade capitalista ela mesma.
Nunca, é claro, tocando na raiz da origem da miséria: a sociedade capitalista ela mesma.
Portanto, se Lula é hoje um corrupto do ponto de vista jurídico, é porque, antes de tudo, corrompeu-se eticamente, ao rejeitar o humanismo e a revolução.
3 comentários:
.
Celso,
Seu entusiasmo revolucionário é admirável, mas poupe-nos.
Textos maniqueístas me cansam...
Primeiro o cara confunde moral e ética.
Veja. Se um cara enche a moringa de cachaça todo santo dia ele é imoral, mesmo que defenda a ética.
Porque não existe moral que seja diferente da ética.
Se houver dissonância entre a ética (das palavras e intenções) e a moral (mores- costumes) então não há ética!
Simples assim.
Logo, dizer que um bêbado tenha tido algum dia alguma ética já é demais.
Não se pode perder o que nunca se teve!
Por outro lado o desconhecimento (do autor) do que seja Humano e querer associar o humano à revolução também é uma coisa atroz.
O nome disso nem é maniqueísmo, parece mais um estelionato.
Ó tempora ó mores!
Ciço véi já bradava na antiga Roma.
A jornada para se tornar humano é individual, mas numa sociedade justa pode ser menos penosa.
Mas ser honesto, sóbrio, prudente, temperante, verdadeiro, bondoso, justo e harmônico, ou seja, obter todos os valores Humanos, independe de sociedade ou dos outros.
E não se conquista esse domínio sobre si mesmo com revoluções e lutas contra algo externo.
O inimigo são nossos vícios.
A vitória é sobre nós mesmos.
Isso é Ser Humano.
Esse é o caminho do Humanismo.
Se tivermos que lutar um guerra, por dever, lutaremos.
Porém, sabemos perfeitamente que não existe coisa mais imoral que a guerra.
Que ela só traz dor e sofrimento.
Assim luta o guerreiro virtuoso.
Nunca cantará loas a ela (a guerra), mas sempre exaltará a paz e a harmonia.
Por último, se as pessoas não optam pela virtude, pelo que é ético, e tem uma moral vacilante.
Serão corrigidas por uma Lei inescapável.
A Causalidade.
A sociedade e os indivíduos vivem imersos nas consequências das ações que praticaram. E só podem mudar o futuro se, no presente, tiverem ações virtuosas.
O mais são flores, para quem plantou e planta flores.
Quanto aos espinhos, compre luvas, porque você irá colhê-los.
Avisarei o David que vc comentou o artigo dele.
Ética e moral são a mesma coisa. Morus é tradução latina do grego ethos. Ethos significa justamente "morada", "coabitação", portanto é algo ligado ao coletivo.
Postar um comentário