sexta-feira, 20 de maio de 2016

O MUNDO ESTÁ PRENHE DE REVOLUÇÕES

A alternância de fases de expansão e retração econômicas marca o capitalismo desde o seu início. Segundo Marx, isto se deve a seu pecado original, a mais-valia: como os assalariados não recebem de volta o valor total dos bens que produzem, estão impedidos de adquiri-los todos, daí o descompasso entre o estoque de produtos oferecidos e o poder aquisitivo dos consumidores.

Até a metade do século passado, tal descompasso se reequilibrava de formas dramáticas: desde as queimas de café para evitar a queda do preço internacional do produto (distribui-lo aos carentes estava fora de cogitação!) até as guerras, que geravam um mercado cativo para a produção excedente, na forma de armamentos.

Com o advento das armas nucleares, entretanto, os conflitos entre potências passaram a ter o pequeno inconveniente de poderem extinguir a espécie humana. Então, desde 1962, ano da crise dos mísseis cubanos, tais situações passaram a ser administradas com mais cautela. Os gigantes nunca mais se enfrentaram, passando a não intervir quando algum deles surrava um nanico da sua esfera de influência.
A desigualdade, entretanto, continuou caracterizando o capitalismo, com a agravante de que os formidáveis avanços científicos e tecnológicos das duas últimas décadas criaram plenas condições para proporcionar-se a cada habitante do planeta o suficiente para uma existência digna.

Em vez disso, o que houve foi um incremento ad absurdum das atividades parasitárias, totalmente inúteis para o ser humano, cuja expressão mais conspícua, claro, são os bancos, amos e senhores do capitalismo atual.

E, para que os bens e serviços continuassem sendo consumidos independentemente do poder aquisitivo insuficiente dos consumidores, expandiu-se a oferta de crédito também ad absurdum. Então, desde as nações até as famílias passaram a operar com as contabilidades mais insensatas, em que as contas nunca fecham e os débitos, impagáveis, são sempre empurrados para o futuro.

É sobre esse pano-de-fundo de artificialidade básica que se projeta a atuação dos grandes especuladores do mercado financeiro, cujo campo de ação foi enormemente ampliado pelo advento da internet.

Atribuir-lhes (ou às autoridades que não os policiaram suficientemente) a responsabilidade por recessões é tão falacioso agora quanto, p. ex., na quebra da Bolsa em 1929. O nome do vilão sempre foi outro: capitalismo.

E os Delfim Netto da vida têm a desfaçatez de sustentar que as teorias econômicas marxistas caducaram! Pelo contrário, estão mais vivas do que nunca. Tanto que as velhas crises cíclicas capitalistas continuam existindo no século 21, embora os intervalos não sejam mais de 10 anos: à medida que a putrefação do capitalismo avança, eles progressivamente diminuem.

E já não existe momento em que a prosperidade atinja todas as nações, há sempre algumas no sufoco. Quando o número aumenta, a indagação é sempre a mesma: será desta vez que as pedras do dominó tombarão uma após outra, mergulhando-nos numa depressão econômica muito pior que a da década de 1930? E, mesmo se os piores augúrios não se concretizam, ninguém suspira aliviado, pois a espada de Dâmocles continua pendente e os poupados de hoje poderão ser as vítimas de amanhã.

A indústria cultural, hoje totalmente a serviço dos poderosos, incute em seus públicos a noção de que a realidade presente é a única possível e as opções existentes são apenas as oferecidas dentro do sistema. Então, teríamos de nos conformar com etapas de vacas magras como a atual, pois se trataria pelo preço a pagarmos por fases menos ruins como a da década passada, quando as vacas nem sequer eram tão gordas assim...

Mas, salta aos olhos estarmos hoje pagando é pelas mazelas do capitalismo, que se torna mais nocivo à medida que aumenta o potencial (criminosamente desperdiçado!) para construirmos uma sociedade igualitária e livre, em que ninguém mais seja submetido ao tacão da necessidade.

Talvez o estímulo à diferenciação e à busca do privilégio tenha sido essencial no passado, como motivação para o homem dominar a natureza e alcançar a atual capacidade de geração de riquezas.

Hoje, entretanto, já temos tudo de que precisávamos. O que nos aflige não é mais a insuficiência de recursos, mas sim seu mau aproveitamento, com a desigualdade obscena condenando nações inteiras e parcelas da população de outros países a existências subumanas; e a prevalência de interesses particulares sobre o bem comum levando à dilapidação insensata dos recursos finitos do planeta.

Com suas contradições insolúveis e sua perversidade intrínseca, o capitalismo se torna, cada vez mais, uma força destrutiva direcionada contra a humanidade, podendo tanto infligir-nos a penúria, quanto fazer com que se abata sobre nós a fúria da natureza.

Mas, não há nenhum mandamento divino ou lei natural que nos obrigue a manter o rumo atual até o mais amargo fim. Tudo depende de vontade e consciência, corações e mentes. “Onde vivem os homens, a ajuda só pode vir dos homens”, disse o grande Brecht.

O mundo está prenhe de revoluções.
.

Nenhum comentário:

Related Posts with Thumbnails