sábado, 16 de dezembro de 2017

A VOLTA DO LULA À PRESIDÊNCIA É MESMO O QUE NOS CONVÉM? OU SERIA O HOMEM ERRADO NA HORA ERRADA?

Por Celso Lungaretti
Demétrio Magnoli, um dos raros articulistas da grande imprensa que ainda merece ser lido pelos que perseguem lampejos de vida inteligente, faz uma  análise exemplar do dilema brasileiro atual:
  • tudo leva a crer que Lula mereça mesmo ser condenado pelo conjunto da obra (e que deveria é estar sendo, mais do que ninguém, repudiado pela esquerda, pois jamais houve tamanha promiscuidade de um partido dito progressista com o grande capital como durante seu reinado!);
  • mas, o processo por corrupção que, em termos de timing, poderia alijá-lo do próximo pleito é o mais discutível dos seis a que Lula responde.
Assim como outros jornalistas que não morrem de amores por Lula, Magnoli é contra uma decisão conveniente ao invés de uma decisão juridicamente consistente. De casuísmo em casuísmo, este país está levando a breca.

Não considero que, se Lula puder concorrer, sua vitória seja favas contadas. Muita água ainda vai rolar debaixo da ponte até outubro. Basta, p. ex., haver uma melhora econômica significativa (ainda que seja de fôlego curto, fadada a dissipar-se adiante) no 2º semestre de 2018 para os humores do povo mudarem, como tantas vezes já aconteceu no Brasil.

Mas, é à esquerda que me dirijo, pois é a ela que pertenço e o que realmente me importa são as aflições e as agruras dos explorados.
Rendição incondicional ao inimigo

O PT já dava nítidas mostras de esgotamento durante a campanha presidencial de 2014. Nada tinha a propor que trouxesse esperanças ao povo e o impelisse a mobilizar-se para lutar por seus direitos. Apenas satanizava os adversários e até mentia sobre as intenções dos mesmos. Foi com uma pregação eminentemente negativa que conquistou sua vitória de Pirro.

Por absoluta falta de ideias, o que fez, no quarto mandato, foi render-se incondicionalmente à pauta econômica do inimigo: entregou o comando da economia a um neoliberal. E nem com um tranco desses o carro pegou...

Era a degringola econômica o motor do impeachment. E Dilma não tinha, em 2016, uma mísera proposta a apresentar ao povo, no sentido de tirar a economia brasileira da marcha para o abismo. Nada! 

Foi este o principal motivo do seu defenestramento por meio de um piparote parlamentar, tendo a narrativa do golpe servido apenas para que os culpados por inação no auge da crise e pelo abandono do povo sofrido à própria sorte se eximissem de suas enormes responsabilidades.

Ora, se tudo der certo para os derrotados de 2016 e eles voltarem o poder unicamente graças ao carisma do Lula como pai dos pobres e ao voto anti-Temer, o que acontecerá? Apenas a tentativa de restabelecer a conciliação de classes num momento muito mais radicalizado da crise capitalista. Lula não é, nem nunca foi, um revolucionário; e a fase histórica do reformismo está definitivamente encerrada no Brasil.
"Lula não é, nem nunca foi, um revolucionário"
Haveria, portanto, o empenho em anular tudo o que Temer fez, sem terem o que colocar no lugar, pois sob o capitalismo e a democracia burguesa o cobertor nunca mais será suficiente para nos cobrir do pescoço aos pés. 

A única opção possível é a superação do capitalismo e a reorganização da sociedade tendo como prioridade o bem comum e não o lucro. Mas é exatamente aonde o PT não quer chegar e é justamente para cumprir esta missão histórica que o Lula não serviria nem a pau, Juvenal!

Que os companheiros ainda movidos por ideais (e não interesses) ponham a mão na consciência e se indaguem: vale a pena insistir em estratégias e posturas anacrônicas, tão somente para vencer uma eleição que não nos levará à posse do poder efetivo nem nos vai dar meios para sustentar a posição conquistada nas urnas caso o poder econômico decida novamente encerrar o jogo e levar a bola para casa? Ou é hora de reposicionarmos a esquerda e organizarmos o povo para conquistas muito maiores?

O Brasil está prenhe de uma revolução. Mas, ela só acontecerá se dermos os passos certos em sua direção. E não é com Lula que faremos tal caminhada.

3 comentários:

Unknown disse...

O NÓ GÓRDIO DO DEMÉTRIO - O excelente texto de Demétrio Magnoli foi "atado" à maneira do Nó Górdio, que precisa ser cortado. Não se trata de uma questão de "escolha" em favor da democracia, mas de um aperfeiçoamento desta diante das condições institucionais e do contraste social existentes no Brasil. A "Ficha Limpa" se constitui em um Direito elaborado para nosso país, pelas peculiaridades que apresenta. Se Demétrio Magnoli consultasse os anais da Constituinte, na fixação do texto do artigo 5º, veria as hesitações redacionais que os constituintes enfrentaram a respeito do cumprimento de sentenças antes do trânsito em julgado definitivo (o que, no Brasil e ao contrário de outras democracias, pode significar "nunca"). Uma leitura atenta do texto – procedendo a interpretação histórica - mostra que a "Ficha Limpa" não agride, de nenhum modo, a garantia constitucional relativa à formação da culpa.

Não fora isso, a magistratura profissional está impedida de manifestar 'interesse político', de modo que não consta em suas atribuições 'escolher' formas mais 'adequadas' de democracia. O pronunciamento judicial, no caso, em nada contraria a imagem primeva da "Justitia", antes está na projeção dela, pala torná-la efetiva e não apenas formal.

Os intelectuais de prestígio são tentados, volta e meia, a elaborar enigmas inextrincáveis ou raciocínios contendo alternativas inexoráveis, mas tudo se situa no campo tão caro à "intelligentsia", que é o de formulações causativas que reduzem as escolhas ao que o intérprete quer.

Na verdade, a aplicação da "Ficha Limpa" ao 'caso Lula' (ou qualquer outro) é um aperfeiçoamento. Lula poderia mesmo - além da inelegibilidade - começar a cumprir pena, se confirmada a condenação. Não importa se o triplex é a acusação mais importante ou não. Al Capone, envolvido em crimes brutais, foi condenado por sonegação fiscal.

Prossiga Demétrio: entender melhor o Judiciário só ajudará ao país. Porém, ainda temos os 'juízes de Berlim', poucos é verdade, mas referenciais. Por enquanto ainda temos também a salvaguarda de uma magistratura profissional (ainda que conspurcada por cúpulas podres estabelecidas por um esquema de ascensão viciado, pelo insano "quinto" de advogados indicados a dedo e, não menos, pelos que praticam escancaradamente o tráfico de influência e a advocacia administrativa).

Contudo, é bom lembrar que nos EUA, Trump está nomeando juízes federais incompetentes e comprometidos com sua política louca, assim como na vizinha Argentina a escolha também é viciada por procedimentos que não avaliam o mérito.

Não estamos bem no tópico da independência Judicial, mas - na verdade - pouquíssimas vezes (ou mesmo talvez nenhuma...) estivemos melhor.

Longa vida à "Ficha Limpa".

Esta é a escolha da "nossa" democracia.

Demétrio Magnoli só nos fará bem se procurar melhor entendê-la.

Luiz Fernando Cabeda

celsolungaretti disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
celsolungaretti disse...

Fiquei curioso sobre quem seria o comentarista Luiz Fernando Cabeda e, na busca virtual, este nome me levou a um desembargador inativo do Tribunal Regional do Trabalho, autor de dois livros jurídicos. É quase impossível tratar-se de homônimo.

Sem querer, ao contestar o fulcro do artigo do Demétrio Magnoli, ele colocou em evidência o fato de que minha apresentação, na verdade, abordou outro aspecto do texto: Magnoli, que considera uma vitória do Lula indesejável para a democracia brasileira, colocou em cheque a sentença que, se confirmada, provavelmente o tornará inelegível em 2018, enquadrando-a entre os "fétidos arranjos patrimonialistas tradicionais".

Eu, que não tenho a mais remota ilusão a respeito da democracia brasileira, considero uma vitória do Lula indesejável para a esquerda brasileira, pois desviará o foco da necessidade gritante de busca de caminhos fora do sistema e contra o sistema, na medida em que aqueles percorridos de 1980 para cá levaram a um beco sem saída e o aguçamento da degringola do capitalismo tornou inviáveis a conciliação de classes e o reformismo.

Dentro da minha linha de raciocínio, pouco importavam os aspectos negativos e positivos da Lei da Ficha Limpa, que é no que divergem o Magnoli e o sr. Cabeda. E não faria sentido eu responder ao sr. Cabeda, defendendo a posição do Magnoli, pois vejo a Ficha Limpa como, tão somente, mais uma tentativa de salvar-se nos detalhes um sistema que, no todo, ruiu fragorosamente.

Sem intenção polêmica, apenas lembro que já lá se vão mais de 10 anos que defendo a posição de que a corrupção é intrínseca ao capitalismo e inextirpável enquanto o capitalismo durar. E uns 60 anos que Paulo Francis apontou a luta contra a corrupção como uma bandeira de direita.

Mas, repito, não sou eu quem deve responder ao sr. Cabeda, mas sim o Magnoli. Vou dar-lhe conhecimento, torcendo para que responda.

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