sábado, 8 de outubro de 2022

A RECEITA QUE DEI HÁ 4 ANOS CONTRA A DESTRUIÇÃO DO BRASIL CONTINUA VÁLIDA

Ensaio de orquestra –filme raríssimo, mas que vocês ainda podem acessar, completo e legendado, clicando aqui  é, seguramente, o mais amargo de Federico Fellini, um dos maiores diretores de todos os tempos, cujo Oito e Meio (1963) está entre os monumentos da sétima arte.

Realizado em 1978, é inusualmente curto (só tem 69 minutos), não conta com grandes nomes no elenco, nem eles fazem falta. Basta a força da história, a criatividade delirante de Fellini e a genialidade musical de Nino Rota.

Expressa magnificamente um dos piores momentos da vida italiana, quando a esquerda tradicional se avacalhou e os agrupamentos mais combativos embarcaram na desastrosa aventura da luta armada.

Não sobrou nada. Os partidos de direita estavam emporcalhados até a medula, envolvidos com a máfia, as negociatas do Vaticano, a corrupção desenfreada. 

O PCI jogara seus ideais e sua história no lixo para dividir o poder com a putrefata Democracia Cristã. 

A extrema-esquerda facilitava a própria destruição ao tomar decisões insensatas como a de executar Aldo Moro.

O sensível Fellini respondeu a este quadro desolador com uma parábola devastadora. Mostra uma orquestra que se rebela contra o diretor tirânico mas, depois de o expulsar, não sabe o que fazer com a liberdade conquistada. 

Direciona-se cada vez mais para a irracionalidade e o caos, até que o diretor escorraçado volta para evitar o pior: um buraco negro que ameaça a todos tragar. 

Mas, sua liderança logo deixa de ser comedida e conciliatória; mal restabelece a ordem, vai se tornando cada vez mais autoritário e odioso. É a volta ao ponto de partida.

Aparentemente, Fellini concluiu que a sociedade não tinha mais jeito, oscilando entre o chicote e o esfarelamento.

Qualquer semelhança com o Brasil de hoje não é mera coincidência. Se o Brasil sair da eleição  como entrou, cindido em duas metades irreconciliáveis, a etapa seguinte será o confronto aberto e depois o vencedor terá de implantar alguma forma de ditadura, mesmo que não queira, pois vai estar sob ameaça de uma revanche do vencido.

É isto que queremos, a autofagia? Não? Então, temos de mandar um firme recado aos antagonistas: chega de ódio! Precisamos do diálogo e do entendimento entre as partes para escaparmos do buraco negro que  poderá nos destruir a todos. 

Quem conseguir passar esta mensagem à sociedade de forma convincente, vencerá o 2º turno. 
.
Por Celso Lungaretti
(post publicado neste blog em 7 de outubro de 2018, mostrando um quadro semelhante ao atual, com algumas diferenças como o de que a destruição do Brasil e o retrocesso civilizatório avançaram acentuadamente, tornando ainda pior o que já era um pesadelo, além de o confronto aberto não ter vindo depois daquela eleição nem tender a vir depois desta, continuando, contudo, a drenar dia após dia as energias de que nosso país precisa para sair do fundo do poço)

2 comentários:

SF disse...

Aristocles já dizia, enquanto dava de ombros:
“Muitos odeiam a tirania apenas para que possam estabelecer a sua.”
Quááá!

celsolungaretti disse...

É o que me atrapalhou muito depois de haver conseguido, em 2004/2005, esclarecer o episódio da luta armada que motivara minha estigmatização injusta. Levei quase 35 anos, mas resgatei a verdade. Pensava que, dali em diante, teria possibilidade de dar uma contribuição bem maior à esquerda revolucionária.

Mas, quando era preso político, refleti muito sobre tudo que ocorrera. Antes mesmo de ser marxista, já sabia o quanto um Estado todo poderoso pode destruir qualquer indivíduo. Lera Kafka, que expressava seus pesadelos de forma artística, mas também George Orwell e Arthur Koestler, que partiam da história real dos julgamentos stalinistas.

Mas, enfrentando uma ditadura assassina, esqueci um pouco esse lado, achando que tudo se resolveria depois que nos livrássemos dos militares.

Quando eu experimentei na carne tudo que um Estado pode fazer quando tem poder de vida e de morte sobre um cidadão, concluí que nada, absolutamente nada, justificava dar aos Estados tal poder.

Então, quando voltei à liberdade, estava decidido a não transigir mais com os regimes esquerdistas autoritários, praticantes da ditadura do proletariado. E a esquerda brasileira, infelizmente, tem um acentuado vezo autoritário, a ponto de até partidos com tradição trotskista proporem estatização da economia.

Como se a experiência soviética já não tivesse sido uma comprovação cabal de que todos os Estados tendem a se tornar leviatânicos, dominados por nomenklaturas, e estatizar 100 empresas significa apenas dar a essas nomenklaturas mais 100 opções para se concederem privilégios inacessíveis aos trabalhadores.

Adorei quando li O ESTADO E A REVOLUÇÃO (1917), do Lênin, no qual ele teorizou que a função do Estado, num regime revolucionário, era criar as condições para sua extinção por se ter tornado supérfluo. Pena que isto nunca aconteceu. Todas as nomenklaturas só fizeram aumentar cada vez mais o poderio estatal que as beneficiava, até serem desalojadas.

E quase vomito quando vejo esquerdistas vibrando com o pré-sal e defendendo com unhas e dentes a Petrobrás, quando deveriam é estar defendendo com unhas e dentes a substituição dos combustiíveis fósseis por energia limpa, para salvar a humanidade.

Enfim, desde 1973 sou totalmente contrário a todas e quaisquer ditaduras, inclusive a do proletariado, e coloco como metas revolucionárias primordiais a justiça social e a liberdade, em pé de igualdade. Não aceito de forma nenhuma que se sacrifique a liberdade em nome da justiça social, pois sei que isto sempre acaba mal.

Mais: a defesa dos direitos humanos se tornou uma das linhas-mestras da minha atuação. Como não não sou caçador de holofotes, evito oferecer minha colaboração a toda e qualquer luta dessas, mas nunca deixei de fazer tudo que podia quando companheiros vieram me pedir ajuda. Consegui levar a bom termo algumas lutas, noutras a vitória era impossível, mas tentar, sempre tentei. Revolucionário de minha geração não recusa pedidos formulados em nome da solidariedade revolucionária.

Quanto ao desenho de um regime revolucionário, eu penso na organização das atividades produtivas de forma a atender as necessidades coletivas e viabilizar o bem comunm. Haveria condições tecnológicas para todos disporem de tudo que necessitam para uma existência gratificante, e trabalhando bem menos do que na atualidade. E que a autogestão se disseminasse, tirando do Estado o poder de impor gestores a bel prazer.

Quanto ao que cada indivíduo quisesse fazer com seu tempo livre, considero que não seja problema do Estado, desde que não explorasse outras pessoas para enriquecer cada vez mais, colocando em xeque a base igualitária do regime. Que cada um emprendesse, criasse, inventasse, mas essa esfera secundária nunca poderia adquirir poder suficiente para competir com a principal.

Se a vida deixasse de ser uma batalha de todos contra todos, podemos acalentar a esperança de que as pessoas espontaneamente preferissem desfrutá-la em comunhão com as outras pessoas ao invés de se moverem céus e terras para se colocarem em patamar superior a elas.

Related Posts with Thumbnails