sábado, 27 de agosto de 2022

BIBLIOTECAS PÚBLICAS SÃO INÚTEIS PARA PRIVILEGIADOS E HOMENS UNIDIMENSIONAIS

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eportagem de Thaís Carrança na BBC News Brasil alerta que nosso país perdeu ao menos 764 bibliotecas públicas entre 2015 e 2020. 

Eram 6.057, passaram a 5.293. Ou menos ainda, pois o poder público as trata com tal descaso que nem sequer o número de bibliotecas fechadas é totalmente confiável, tal a fragilidade do Sistema Nacional de Bibliotecas Públicas após a extinção do Ministério da Cultura. 

falta de controle efetivo pelos sistemas estaduais, cujos dados alimentam o sistema nacional, constatou a repórter.

Nada menos que 70% dessas bibliotecas fechadas se localizavam em São Paulo, o que sugere uma migração dos usuários para os meios virtuais. E o quadro deve ter piorado mais ainda com a pandemia, quando a ida pessoal às bibliotecas foi fortemente desestimulada.

Sou cria das bibliotecas públicas: comecei a frequentá-las lá por 1962, aos 11 anos, quando ingressei no ginásio. 

Lembro-me de que, além de utilizá-las para trabalhos escolares, li antologias de contos de vários países para conhecer autores. Daqueles que me agradavam muito eu ia, em seguida, retirar romances e novelas.
Do que me serviu o hábito da leitura? Antes de mais nada, para perceber melhor as motivações das pessoas, por que elas agiam como agiam, aonde queriam chegar e por qual ou quais motivos. 

Como naquele tempo os livros eram escritos (ou traduzidos) com muito mais correção gramatical e elegância, aprendi a expressar-me corretamente antes mesmo de conhecer as regrinhas ensinadas nas aulas de português. Tocava as músicas de ouvido.

E, principalmente, me dei conta de que havia uma infinidade de enfoques e explicações possíveis para quase tudo, de forma que nunca me aferrava à primeira informação absorvida. 

Já naquela idade eu adquiri imunidade, por exemplo, contra as pregações falaciosas dos mercadores da fé mercantilizada, bem como com o besteirol alucinado que fanatiza os ultradireitistas em geral e cada bolsominion em particular...   

Tornei-me um autodidata, preferindo abrir meus caminhos do que seguir orientações de adultos (até porque Monteiro Lobato me predispuzera a ver os medalhões das ciências e das letras como pavões ridículos, amiúde a soldo dos poderosos). 

E me apaixonei pelos romances biográficos e pelas novelas fantásticas ou de ficção-científica. 

A História já me fascinara bem antes, quando li A História do Mundo Para as Crianças, também do Monteiro Lobato. Na biblioteca circulante da Mooca descobri, atraído pelos títulos e dando olhadelas básicas na orelha de seus livros, autores como Maurice Druon, cuja série de sete volumes sobre Os Reis Malditos é um prodigio da romantização dos acontecimentos e personagens verídicos, muito mais agradável do que os insossos livros didáticos.

E a sci-fi provavelmente me encantou porque a época em que passei a meninice me parecia uma poça de água parada; eu esgotava com rapidez o processo de absorção da realidade presente e ficava ansioso pelas mudanças previsíveis que sempre demoravam demais para acontecer. 

Com a História minha mente vagava pelo passado; com os visionários (Júlio Verne, H. G. Wells, etc.)  e os distópicos (Aldous Huxley, George Orwell, etc.) conjeturava sobre o porvir. 

Ao adquirir tanto conhecimento sobre como se articulavam e que tipo de consciências formavam as sociedades do passado e ler projeções sobre as sociedades do futuro, percebi claramente que a História não tem fim (apenas os Fukuyamas da vida creem nisto) e que tudo sempre poderia mudar para melhor ou para pior. A revolução só entrou na minha vida em 1967, mas tal encontro estava escrito nas estrelas. 
por Celso Lungaretti
Temo que os jovens formados pela sofreguidão e utilitarismo digitais, que condiciona as novas gerações a buscarem rapidamente algum conhecimento específico para uso imediato, venham mesmo a se tornarem cada vez mais unidimensionais, conforme advertiu Herbert Marcuse no seu clássico de quase seis décadas atrás (
One-Dimensional Man, aqui intitulado Ideologia da Sociedade Industrial). 

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