A invasão da Ucrânia, e seu iminente controle militar pela Rússia, já representa um prejuízo para Putin na balança de perdas e ganhos.
Invadir um país com população (40 milhões de habitantes) bem inferior e sem os mesmos armamentos sofisticados (a Rússia há anos vem se preparando para a anexação de territórios vizinhos, como fez Hitler a partir de 1939) é uma coisa; administrá-lo politica e economicamente, é bem outra.
Temos o exemplo recente do povo do Iraque, que mesmo detestando o ditador Saddam Hussein, revidou o ataque covarde e cruel dos Estados Unidos com uma guerrilha urbana que traumatizou os jovens soldados que lá pereceram ou voltaram para casa mutilados ou com agudos traumas.
Há uma diferença fundamental entre Saddam Hussein e Volodymyr Zelensky. O primeiro era uma ditador sanguinário e corrupto que se mantinha no poder pela força e adesão de grupos étnicos que se beneficiavam com a apoio que lhes era dado.
O segundo é um presidente eleito após uma luta sangrenta em 1914 do povo ucraniano para a derrubada de um títere russo e que, à frente dos ucranianos, resiste heroicamente ao invasor.
Este é um problemas adicional para Vladimir Putin: a consciência do povo da Ucrânia sobre o ultraje sofrido, após ter conseguido acordos de reconhecimento russo e internacional como país soberano. A pasta de dente não volta mais para o tubo.
E se trata de apenas um dos problemas. O maior é o isolamento econômico russo após ter entrado definitivamente para a economia de mercado a partir de 1989, com a queda do muro de Berlim.
O capitalismo internacional saudou a queda do murro de Berlim como o fim do comunismo; definitivamente, bradaram os capitalistas de todos os gêneros (dos fascistas aos sociais-democratas): ganhamos!
Mal sabiam que a expansão do capitalismo de Estado da antiga URSS apenas se submetia, pelas próprias regras capitalistas de relação social, a uma inevitável necessidade de expansão.
Então, com a sua economia em cacos, aceitou a separação pacífica, do bloco sob sua influência, das nações do leste europeu, de etnia eslava, e uma relativa autonomia política e econômica destes países.
Passado este período, eis que entra em cena um salvador da pátria; um agente da antiga KGB, faixa preta de judô, educado como espião patriota. Putin, tal como Hitler na depressão alemã, ascendeu ao poder, criou um estado cleptopcrata, ditatorial e policialesco, prometendo a volta do pretenso apogeu soviético e sua correspondente opressão capitalista de Estado.
A história belicosa se repete, nem oito décadas depois de encerrada a guerra na qual cerca de 3% de toda a população mundial foi bestialmente dizimada.
A realidade social deste 2022 é bem diferente dá de 1917, quando a devastação da 1ª Guerra Mundial propiciou a queda da monarquia czarista. O isolamento da Rússia, com o fechamento das suas fronteiras (como ocorreu em 1917) hoje acarreta dificuldades intransponíveis.
"é só um exerciciozinho" |
Então foi possível contar com a fervorosa simpatia de um povo analfabeto, rurícola, que exultava com a libertação após ter sofrido durante séculos a opressão de uma monarquia cada vez mais decadente e opressiva.
O apoio aos revoltosos bolcheviques se desenvolveu intramuros, a ponto de prevalecer sobre o poderio bélico alemão (ainda que com sacrifício três vezes maior de mortes entre a sua população, comparativamente ao povo germânico). Agora isto não é mais possível.
Hoje, o povo russo é alfabetizado; em termos de consumo e confortos da vida moderna, equivale-se aos povos desenvolvidos, ainda que já esteja sofrendo com as consequências das depressões mundiais do capitalismo; e não aceitará a escassez a que vai estar submetido em razão do corte das conexões capitalistas internacionais.
O tiro saiu pela culatra e Putin não pode sequer recuar na sua intempestiva invasão ucraniana, cujas imagens, filmadas em tempo real por milhares de celulares, vêm estarrecendo a humanidade.
Acabar com a invasão mediante um acordo que equivaleria a uma capitulação perante o governo ucraniano atual é inaceitável para o autocrata, pois representaria uma renúncia aos seus princípios de orgulhosa manutenção do poder.
"a única coisa necessária para o mal invadir é os homens de bem nada fazerem" |
Assim, ele insistirá com esta guerra insana até a tomada do poder, mesmo que isto represente mortes para so povos russo e ucraniano, antes, durante e, principalmente, depois.
O estrago já está feito e até a China sai prejudicada deste conflito, que tomou proporções muito maiores do que ela esperava. A tentativa de formação de um bloco capitalista autônomo, capaz de fazer frente à decrepitude do capitalismo ocidental, flopou (como diz o nosso editor).
Como o incêndio na casa ao lado deixa as barbas dos vizinhos de molho, a China agora vacila; assumindo uma posição pouco clara diante do conflito, de vez que se absteve de votar contra a invasão russa no Conselho de Segurança da ONU, e fraquejou.
Terminou por se envolver numa aliança de morte, pois, tendo firmado uma aliança incondicional com a Rússia, depara-se com duas perspectivas perigosas:
— assumir a solidariedade completa à Rússia e também isolar-se economicamente do mundo, com as implicações que isto acarretaria para uma economia tão integrada ao mercado mundial;
— abandonar a Rússia à própria sorte, dando adeus às suas pretensões de liderar um bloco hegemônico capitalista novo, inclusive com moeda única (a exemplo da União Europeia).
A primeira opção vai causar um abalo sísmico capitalista no mais alto grau por força da sua colossal dívida pública, equivalendo, p. ex., à diferença entre a explosão de uma bomba atômica atual e as de Hiroshima e Nagasaki (outra comparação possível é com a contundência da crise do subprime, em 2008).
"Senhor, as pessoas não saem mais invadindo outros países. Isto era coisa do século 19" / "Correto, mas meu país ainda está no século 19" |
A segunda opção representará ficar à mercê das manipulações financeiras e monetárias do ocidente capitalista, provavelmente levando à deposição de Vladimir Putin e eleição de um dirigente russo submisso ao capital internacional e à própria China.
A verdade é que o capitalismo caminha para o cadafalso justamente no momento em que todos festejavam a morte do seu mais lúcido e digno opositor: Karl Marx.
Eis que ele ressurge, não sob a forma falsificada do marxismo tradicional (capitalista de Estado), mas sob a respeitabilidade de seu vaticínio: segundo o qual, “quando as máquinas [trabalho morto] atingirem um grau de desenvolvimento capaz de promover em maior escala a dispensabilidade do trabalho vivo [da força de trabalho humana, única produtora de valor], todo o edifício capitalista voará pelos ares”.
Mas será que, ao voar pelos ares enquanto forma de relação social, o capitalismo (que já nos ameaça ecologicamente) vai nos levar junto com ele? Este pesadelo poderá se materializar a partir do desespero de um acuado Vladimir Putin, com seu arsenal de bombas atômicas.
Pergunto a mim mesmo, sempre que me vêm à mente as figuras sinistras de Adolf Hitler e Joseph Goebbels se suicidando ao ouvirem do bunker as explosões de bombas russas e temendo que seus corpos servissem de troféus para os vencedores, o que fariam se pudessem, tal como pode hoje o Putin, acionar o botão da hecatombe atômica final??? (por Dalton Rosado)
Os coquetéis Molotov desta canção do Dalton voltam a ser
utilizados, agora pelos heroicos ucranianos contra os invasores russos
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