segunda-feira, 20 de setembro de 2021

SE A EMANCIPAÇÃO HUMANA NÃO FOR ALEGRE E FRATERNA, JAMAIS SERÁ EMANCIPATÓRIA – 1

dalton rosado
UMA REFLEXÃO PROPOSITIVA E
 AUTOCRÍTICA HISTÓRICA DA ESQUERDA
Entre outras questões, o grande embate dos anarquistas com os marxistas tradicionais sempre foi a negação do Estado como etapa de se alcançar uma sociedade sem classes sociais. 

Os primeiros sempre admitiram que o Estado nas mãos dos trabalhadores promoveria, pela via revolucionária da tomada do poder burguês, a necessária transição; os anarquistas diziam que esta via do poder estatizante não seria capaz de usar o veneno como antídoto do dito cujo, algo assim, como se desconfiassem que o uso do cachimbo entortasse a boca.

Os marxistas tradicionais, que se diziam sábios do socialismo científico, criticavam (e, o que é pior, perseguiam) os anarquistas, atribuindo-lhes falta de consistência programática e organizacional, além de qualificá-los de pequenos burgueses inconsequentes, por mera divergência doutrinária.

Os anarquistas acusavam os marxistas tradicionais de estatistas totalitários, capazes de justificar todas as injustiças cometidas no processo revolucionário em nome de um fim que (no entender deles, anarquistas) por aquela via jamais seria alcançado. 

Ambos repudiavam o poder burguês e clerical, sendo este último bastante influente no século 19, quando surgiram as teses doutrinárias socialistas de combate ao florescente capitalismo da primeira revolução industrial e tentativas de consolidação do republicanismo burguês com suas marchas e contramarchas do início daquele século.
Nascidos em 1809 e 1818, Proudhon e Marx foram os
grandes formuladores do anarquismo e marxismo
 

A Europa ferveu nas décadas iniciais e seguintes do século 19, marcado pelas guerras napoleônicas imperialistas; luta pela preservação e volta do poder monárquico; episódio da Comuna de Paris em 1871; guerra franco-prussiana, e ascensão do capitalismo imposto pelas armas de fogo (então desenvolvidas). 

Posteriormente a estes episódios, os dirigente de partidos comunistas, procurando ser fieis ao que julgavam ser o marxismo mais fidedigno, mandavam seus militantes pular a 1ª parte de O capital, por considerá-la filosofia hegeliana de menor importância, de vez que tentava explicar a essência da forma-valor (mercadoria e dinheiro), e isso lhes parecia tão fácil concluir que não mereceria maior atenção. 

Fixaram-se nas estratégias políticas de tomada do poder revolucionário sem considerar a essência mais acurada do pensamento de Karl Marx, escoradas justamente na crítica da economia política, que era mais profunda e analítica no longo prazo do que as escaramuças de revolução armada defendidas por Friedrich Engels, que encontrou em Lenin, posteriormente, um estrategista perfeito. 

Os anarquistas desconfiavam do poder político (daí a máxima anedótica Hay gobierno? Soy contra!), mas não propuseram a superação das categorias capitalistas, acreditando ingenuamente que, com os meios de produção nas mãos do operariado, mas sob a égide do mercado e sem tutela política e clerical, tudo estaria resolvido.

O Marx político errou, envelheceu; o Marx da crítica da economia política é mais atual do que nunca. 

O anarquismo, sem um melhor entendimento da negatividade da essência da forma-valor (dinheiro e mercadorias), era ingênuo e, apesar de tentativas comunitárias como a Colônia Cecília, não teve a capacidade de se contrapor à ordem militar e capitalista.
A influência dos anarquistas no Brasil durou pouco, mas a eles se deve a greve geral de 1917 
Então, fragmentou-se e foi  perdendo força como contingente aglutinador de expressão social transformadora e emancipacionista.

Ambas as tentativas sempre foram bem intencionadas mas, como disse o próprio Marx, o caminho para o inferno está cheio de boas intenções.

Como previu Marx nos Grundrisse, o capitalismo atingiu atualmente um estágio avançado e irreversível de contradições dos seus fundamentos existenciais, tornando-se claramente autodestrutivo de sua própria forma e socialmente destrutivo porque inviável como forma de mediação social minimamente eficaz; e, o que é pior, ameaçando-nos com uma crise ecológica capaz de acarretar o ecocídio da humanidade.   

Mas a autodestrutibilidade da forma capitalista não é, por si só, capaz de provocar a emancipação humana, caso inexista uma teoria revolucionária que dê um norte exequível e factível de ruptura, capaz de galvanizar a sociedade humana atual sob seus pressupostos. 

Afinal, a sociedade já não é composta majoritariamente por uma única categoria profissional, como o foi no passado pelo proletariado, o sujeito da revolução segundo a doutrina marxista tradicional, tida como única revolucionária. (por Dalton Rosado)
(continua neste link)
O Dalton escolheu para ilustrar este artigo a sua composição volta
do cipó, tributo que prestou a Geraldo Vandré, inspirando-se em 
duas canções do paraibano: Réquiem para Matraga e Aroeira

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