dalton rosado
A INSENSIBILIDADE E ALHEAMENTO DO
CAPITAL E SEU ESTADO AO DRAMA HUMANO
Não é incomum, no curso da história da humanidade, o distanciamento dos governantes e seus sistemas em relação às transformações sociais profundas que se operam nas sociedades em razão do processo dialético do movimento que tudo modifica, tal como uma pequena rachadura num dique eventualmente se transforma numa avalanche incontida.
Os imperadores da fase de decadência de Roma já não se apercebiam da insatisfação popular e decomposição da organização político-militar, nem se dava conta do perigo representado pelo surgimento dos hordas de bárbaros que ameaçavam o poderio militar romano e que terminaram por destrui-lo.
Quando a 2ª Guerra Mundial já estava nos estertores, Adolf Hitler, mesmo no mês do seu suicídio, ainda conclamava divisões militares inexistentes e o povo alemão à resistência diante do ataque soviético e dos aliados que já haviam subjugado todas as forças armadas alemãs.
O último monarca da longeva dinastia dos Bourbons, Luís 16 e sua esposa Maria Antonieta ficaram completamente atônitos com a evolução da revolução republicana burguesa que os levaria à guilhotina em 1793. É celebre a frase atribuída a essa rainha austríaca de nascença, que, ante as queixas dos franceses por causa da falta de pão, os teria desdenhosamente aconselhado a comerem brioches.
No início do século 20, o último czar da Rússia, Nicolau 2º e sua czarina Alexandra Feodorovna envolveram-se com o conselheiro místico Rasputin, um charlatão de primeira, o que demonstra bem onde estavam as suas cabeças.
No Brasil sob o governo pretensamente nacionalista de Boçalnaro, o ignaro e do liberal ortodoxo Paulo Guedes (aliança que por si só já denota a contradição implícita de pensamentos doutrinários paradigmáticos), tanto o próprio genocida quanto os políticos em geral (aí incluída a esquerda dita anticapitalista) estão mais preocupados com as eleições de outubro de 2022 do que com o mês de maio de 2021 e os mortos pela covid, os milhões de desempregados e a mendicância chocante nas ruas.
Passamos por um desses momentos históricos. O capitalismo vive um artificialismo de seus conceitos firmados sob suas categorias fundantes cujas características se encontram em fase de decomposição orgânica, já não cumprindo a contento as suas funções sociais.
Mas os capitalistas e seus representantes políticos (os segmentos conservadores, os de centro e, inclusive, a oposição bem comportada, na qual se inclui a esquerda institucional) parecem alheios ao que está subjacente aos seus comandos e gera a insatisfação popular que aqui e ali explode em razão de pequenas reivindicações. Foi o caso dos protestos contra o aumento das tarifas de ônibus em 2013 na capital paulista e do movimento dos coletes amarelos iniciado no final de 2018 na França em função de variadas queixas.
O último grande levante popular brasileiro, naquele inesquecível junho de 2013, não foi nem de longe compreendido pela outrora revolucionária Dilma Rousseff e seu outrora combativo partido, havendo até hoje esquerdistas que o desqualifiquem como uma manifestação urdida pelo conservadorismo verde-amarelo (que apenas se aproveitaria, depois dos acontecimentos, do vazio político advindo).
Dissequemos as categorias capitalistas sucintamente (e a título de breve explicitação do que virá a seguir):
1. a forma-valor – Quando os seres humanos passaram a usar os seus excedentes de produção comunitária ou individual em trocas por outros bens de que necessitavam, ao invés de partilhá-los como antes se fazia, estabeleceu-se naturalmente um critério de mensuração de quantidade e qualidade dos bens a serem trocados.
Tal critério era o tempo de esforço físico para a obtenção do resultado final de cada bem. Se uma determinada quantidade de cereal demandava menos tempo de esforço humano de produção que a produção de uma quantidade de tecido, tal tecido deveria valer uma determinada quantidade de cereal, de acordo com o grau de tempo e esforço de produção utilizado para um bem e para o outro.
Foi assim que, rudimentarmente, passou-se a ter uma ideia de quantificação qualificada de cada produto destinado ao consumo. Estava introduzida socialmente a ideia de valor e das trocas de objetos que passaram à condição de mercadorias e toda as suas negatividades intrínsecas.
Portanto, o valor passou existir como cálculo do tempo de esforço humano de produção, capaz de representar o seu próprio acúmulo enquanto riqueza individual, inicialmente sob a forma de objetos armazenados e destinados à troca, como forma de poder de uns sobre outros.
Parte da produção social passava a ter um valor de troca baseado no esforço humano e de sua carência e necessidade de consumo. Era o valor de uso (socialmente natural) subsumindo-se ao valor de troca (socialmente artificial).
Estava decretado o futuro fim da produção social partilhada, para que no seu lugar fosse entronizada a produção social exclusivista. (por Dalton Rosado)
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