terça-feira, 12 de janeiro de 2021

MONTEIRO LOBATO NÃO ERA RACISTA. EU, PEDRINHO, GARANTO!

(este post foi ao ar nesta 2ª feira, 11, com um erro imperdoável, a falta dos quatro últimos parágrafos do artigo de Antonio Lefèvre. Para corrigir
a lambança, decidi republicá-lo por inteiro; e aproveitei para trocar o título do post por um do próprio Lefèvre, já que o meu de ontem,
percebi depois, estava agressivo em demasia. CL)  
E
m 27 de dezembro 2020, a Folha de S. Paulo  cometeu falha muito grave, expressa num editorial sob o título O racismo de Lobato...

Endossando a visão de alguns dos politicamente corretos de hoje, que acusam Lobato de racismo por causa de uma ou outra frase dos personagens do Sítio do Picapau Amarelo em que a Tia Nastácia é chamada de negra, o editorialista ignora que são diálogos de um livro infantil, repleto de provocações, em especial por parte da desbocada boneca Emília. 

Levar isso ao pé da letra, como se fosse manifestação de racismo por parte do autor do livro, revela uma profunda e total ignorância sobre a obra de Lobato.

Quem leu todos os livros do Sítio na infância, como eu, sabe muito bem que não tem neles nada de racismo. 

Pelo contrário, a personagem Nastácia é apresentada como uma pessoa sábia, de enorme simpatia. E, ao chamá-la de negra de estimação, Lobato deixa claro que se opunha cabalmente a qualquer preconceito.

Mas o pior de tudo no editorial da Folha foi a frase final, que sugere que a obra infantil de Lobato, considerada como racista, deva deixar de ser lida pelas crianças. Assemelhando-se a uma sentença do Tribunal da Inquisição, o editorial termina dizendo: “Ora, se uma obra reflete uma sensibilidade ultrapassada, é natural que seja logo esquecida”.

Eu sou um legítimo 
filho de Lobato, conforme José Roberto Whitaker Penteado tão bem descreveu em seu livro a influência marcante do escritor nas gerações seguintes. 

A essa influência geracional se soma o fato de meu pai ter sido amigo e médico de Lobato, e eu mesmo ter interpretado o Pedrinho na primeira série de TV do Sítio do Picapau Amarelo (TV Tupi SP, 1954).

E hoje sou próximo e amigo de Cleo Monteiro Lobato, bisneta do autor, que está reeditando os livros do Sítio, eliminando ou substituindo a palavra negra para evitar que os corretinhos de hoje julguem Lobato racista, quando o objetivo de Lobato era exatamente o oposto. Ele foi um ativo militante antirracista, e não um racista.

Ah, a boneca Emília, que tudo percebe antes dos outros, me apontou o que ela descobriu como razão para o ataque da Folha a Lobato: 
"É que dois bolsominions ignorantes, um tal de Sérgio Camargo e um tal de Mario Frias, ambos achando que Lobato era de direita, o estão defendendo e dizendo que ele não era racista. 
Então, como a Folha é contra o Bolsonaro (aliás, com toda razão), mas, por ignorância, não sabe que Lobato era de esquerda, achou que tinha que divergir dos bolsominions e chamar Lobato de racista. Cada um mais bobo que o outro, não é, Pedrinho?"
Eu, Pedrinho, espero que a Folha faça um mea-culpa para evitar que o próprio jornal, um dia, venha a ser colocado no índex por um governo de direita ou de esquerda, já que não sabe distinguir os dois lados e acusa um pensando ser o outro. (por Antonio Silvio Lefèvre, sociólogo formado pela Université de Paris, editor e livreiro) 
T
OQUE DO EDITOR
 Também li a coleção completa do Sítio quando menino e também me considero um legítimo filho de Lobato, tendo lançado vários artigos contundentes contra os patrulheiros cricris quando esse disparate foi levantado pela primeira vez por um caçador de pelo em ovo perdido qualquer, em 2010. 

Os iletrados aprendizes de censores foram botados para correr por um sem-número de letrados ilustres e, para mim, não há mais o que discutir. A insistência obsessiva dos aprendizes de censores que, depois de derrotados na batalha dos argumentos então travada, não cansam de martelar indefinidamente a mesmíssima calúnia, é idêntica à do Trump quando perde eleições...

No cerne da questão, o Lefèvre está certíssimo: as malcriações da Emília jamais podem ser confundidas com a opinião de Lobato. Ele falava pela boca da Dona Benta e do Visconde de Sabugosa. Cansei de repetir isto na época.

Mas, não foram as 
saudades da infância querida o motivo de eu entrar naquela polêmica, mas sim o fato de haver sido Lobato o primeiro autor que me desviou do caminho que a família traçara para mim: um engenheiro capaz de chegar aonde meu pai não conseguira e que levaria uma confortável vidinha de classe média.

O desprezo do Lobato pelos sôfregos ganhadores de dinheiro, capazes de pisar no pescoço da mãe para acumular mais e mais vil metal, perpassa toda sua literatura infantil e colocou muito cedo a semente da dúvida na minha cabeça.

Admirador entusiástico da Grécia Antiga, ele me levou a considerar pensadores, artistas e cidadãos idealistas como imensamente superiores a empreendedores, mercadores e políticos. Indispôs-me com os poderosos da nossa sociedade para sempre.

Daí eu ter começado, lá pelos meus 14 ou 15 anos, a buscar outra vida que não fosse a de serviçal bem-pago de um sistema desumano. Queria uma finalidade mais nobre para a minha existência e fui procurá-la nos livros de Dostoievski, Kafka, Sartre, Camus e outros. Acabei encontrando-a em Marx e Engels, aos 17.

Só bem depois vim a saber que Lobato era um homem de convicções firmes, que confrontava o imperialismo e foi prisioneiro da ditadura getulista. Constatei, mais uma vez, que pessoas basicamente afins têm destinos parecidos. 

Ele foi um gigante na sua época, enfrentando corajosamente os poderosos inimigos de então. O que é bem diferente de almejar holofotes apenas por colocar em questão besteirinhas, como algumas palavras soltas em Caçadas de Pedrinho, arriscando-se tão-somente ao ridículo... (por Celso Lungaretti)

2 comentários:

Anônimo disse...

Aqui no Brasil, no entanto, em 1926, Monteiro Lobato publicava seu único romance, um libelo racista, o qual foi fracasso.

A fim de atingir o público norte-americano e de divulgar as ideias da eugenia no Brasil, lançou a obra O Choque das Raças, posteriormente renomeada para O Presidente Negro.

https://www.conjur.com.br/2015-dez-12/literatura-racismo-analise-monteiro-lobato-obra

celsolungaretti disse...

Puxa, um advogado criminalista botou uma toga de juiz e condenou Monteiro Lobato como racista!

Acho curiosa esta tendência dos brasileiros de acreditarem em tudo que tenha sido publicado em algum lugar, sem levar em conta se o autor tem ou não autoridade para deitar falação sobre tal assunto.

Enfim, peço que não incluam esses links-canetadas, quando são, como este, irrelevantes ao que se está discutindo.

Argumentem por si próprios, ao invés de recorrer à autoridade alheia – ainda mais quando nem sequer de uma autoridade reconhecida no tema em questão.

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