BOLA PLANA
Bate uma certa tristeza quando, p. ex., chorar a morte de Kobe Bryant é criticado porque em Belo Horizonte morreram mais pessoas.
Ou quando se comover com as homenagens feitas nos EUA a um dos maiores ídolos do esporte mundial rende comentários sobre as mortes que o governo norte-americano promove mundo afora.
Será que cabe mesmo comparar?
Será que cabe mesmo comparar?
Do mesmo modo, embora sem a mesma insensibilidade, apenas com a mesma ignorância, é triste ver que, quando se diz ser desumano fazer atletas jogar futebol sob o sol do meio-dia, alguém diz que desumano é morar embaixo do viaduto ou que jogos de tênis sob sol levam quatro horas.
Outra vez, compara-se laranja com avestruz.
Por que há pessoas que fazem questão de se revelar tão cruas? Não poderiam, ao menos, guardar para si?
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Toque do editor — este desabafo do Juca Kfouri, decerto magoado com comentários recebidos no seu blog, eu também poderia ter escrito, só alterando os exemplos.
Uma das minhas maiores decepções no presente século foi ter sonhado com o papel grandioso que a internet poderia cumprir, levando conhecimento a um povo dele tão carente e dando aos que não são proprietários de veículos de comunicação a oportunidade de tornar menos desiguais as batalhas pela formação das consciências, como aconteceu no Caso Battisti.
2 comentários:
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Mestre,
O primarismo, ignorância e barbárie hoje magnificadas nos domínios da internet não deveriam ser novidade para quem leu alguma coisa de Sigmund, principalmente aquelas palestras onde ele mostra os indícios do inconsciente nos atos falhos, sonhos e outros que não me lembro mais, pois li aos 20 anos numa biblioteca pública que tinha as Obras completas de Freud.
Ora, o verniz de civilidade e comedimento, imposto pela censura social, é facilmente rompido pelo anonimato relativo da rede.
Então, sem peias, uma mínima parcela do inconsciente surge e ISSO é a coisa mais importante que a internet fez.
Revelou ao macaco arrogante e esquizofrênico o quão louco e pervertido é e o quanto tem ainda que evoluir.
Aos intelectuais que tinham o biombo de alguma mídia resta mostrarem-se serenamente acima da bestialidade geral e irrestrita, neles também existente, da melhor forma possível.
Sem descartar que podem se irritar e serem tão humanos e primitivos quanto os que os agridem.
Só não é aceitável a autopiedade.
Hoje nominada pelas bestas de "mimimi".
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Estranha coincidência: eu também li as Obras Completas de Freud, retiradas da Biblioteca Circulante da Mooca, quando tinha 20 anos.
Só que, no meu caso, foi porque eu estava preso e decidira que, ao sair, leria os autores da chamada "esquerda freudiana", começando pelo Marcuse.
O impacto da terrível derrota que sofrêramos me fez ver a necessidade de reconsiderar muitas questões teóricas. Mas, se me pusesse a ler livros característicos da esquerda, provavelmente meus carcereiros me cassariam o "privilégio".
Então, como Marcuse ia na direção de uma síntese entre Marx e Freud, resolvi aproveitar o tempo para conhecer bem a obra do Freud. Meus pais retiravam os livros na biblioteca e me levavam nas visitas.
Mas, o problema da internet me parece também o da desvalorização do saber profundo. A grande maioria dos que não o detêm passaram a crer que ele não é necessário e a se considerarem no mesmo plano de quem foi fundo na busca de conhecimentos e experiências de vida.
Isto me faz, p. ex., fugir de discussões com internautas mais primários como o diabo da cruz. Porque com eles qualquer discussão se torna infinita. Basta desmontarmos qualquer de suas alegações para contra-atacarem com outra que não tem absolutamente nada a ver, tipo provarmos que os desvarios do Bozo fazem crescer os homicídios decorrentes de intolerância ideológica e rebaterem que morreram milhões de pessoas na Rússia sob o Stalin.
Aí, se lançarmos algumas luzes sobre o que foi o stalinismo, pessoas desse tipo são capazes de trocar o assunto para as novidades tecnológicas introduzidas pelo capitalismo, e assim por diante. Vira história sem fim.
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