domingo, 24 de novembro de 2019

O MISTER COLOCOU OS ATRASADOS TREINADORES DO BRASIL NO CHINELO

"nem sequer é de 1ª linha na Europa"
Não sou flamenguista e nem simpatizo muito com o clube de regatas. Enquanto mineiro e cruzeirense, sempre fui muito desconfiado com relação ao clube cujos favorecimentos da arbitragem e da mídia são notórios. 

Tampouco compro por completo a ideia de time do povo, visto que o clube carioca efetivamente popular é o Vasco da Gama, clube da zona norte, região proletária, cujo estádio servia para os discursos de Vargas no dia do trabalho e que foi um dos primeiros no Brasil a permitir a participação de negros. 

Dito isto, não posso, contudo, me omitir diante da brilhante conquista da América feita pelo Flamengo. Mais ainda porque tal conquista é o resultado direto da vinda de um técnico de verdade: Jorge Jesus. 

Há quase um ano, lancei este artigo comparando a vitória de Bolsonaro na eleição presidencial com a de Felipão no Campeonato Brasileiro. Argumentei que ambos eram a representação do nosso atraso no futebol e na política. Dinossauros, vivem com a cabeça no pretérito mais que perfeito e só conseguem destaque por aqui devido ao contexto de completa mediocridade do país. 

Bolsonaro mostrou este ano o quanto é um político abaixo do volume morto. Não fosse Maia e Toffoli, seu destino seria tombar feito um peão girando em falso. 

Já Felipão teve um time milionário nas mãos, tecnicamente tão bom quanto o do Flamengo e igualmente caro. Mas naufragou sem esperanças, sobretudo diante da modernidade de Jesus e de Sampaoli. Acabou chutado do Palmeiras antes que fosse tarde demais para o clube paulista.

Mas Felipão e Bolsonaro, repito, espelham o que são a política e o futebol no Brasil. O resto dos treinadores brasileiros também não passa de um museu de arcaísmos, não sendo, portanto, à toa que Jesus está sobrando no Brasileirão: sua capacidade técnica está muito acima da rotineira por aqui. 
Meme zoando o chocolate de 5x0 que o Grêmio tomou do Fla
E olhe que Jesus nem sequer é um treinador de primeira linha da Europa. Está no terceiro escalão, mas isto equivale a anos-luz à frente do melhor que o Brasil tem a oferecer. 

Quem assiste o futebol europeu de modo algum fica surpreso com o jogo praticado pelo Flamengo, é a média dos clubes de lá e não precisamos analisar Barcelona ou Real Madrid para ver esse futebol em campo, basta olharmos times mais modestos como os portugueses Porto e Sport. 

A alta competitividade europeia, aliada à boa organização dos clubes e das federações, é o motivo disso. Na Europa, mesmo clubes pequenos, de terceira ou quarta divisões levam multidões aos estádios e possuem uma estrutura invejável. 

Obviamente, o dinheiro conta muito e nisto não apenas o Brasil fica para trás, mas grande parte do mundo também. No entanto, convenhamos, o futebol brasileiro tem ficado para trás mesmo em comparação com forças modestas como os países árabes, a Ucrânia e o México.

Tite, noutro dia mesmo, considerou a Coréia do Sul um adversário de respeito para a seleção pentacampeã mundial!

Jesus não é um gênio, ele é o produto médio de um ambiente com alto nível técnico. E demonstra na Libertadores e no Brasileiro, o quanto nosso ambiente é baixo tecnicamente. 

Já na semifinal ele escancarou para quem quisesse ver o abismo que nos separa do velho mundo, ao massacrar o boleiro boquirroto Renato Gaúcho. 

A voz da dor-de-cotovelo
O ex-ponta direita é o símbolo do futebolista nacional, já tendo feito até mesmo profissão de fé na ignorância e na preguiça, ao declarar que não se importava em buscar aperfeiçoamento técnico. 

Óbvio, no Brasil de Weintraub, ser um idiota é tudo de bom. Letramento é coisa de trouxa, o negócio é puxar saco dos poderosos para tentar emplacar uma boquinha qualquer. 

O recente 5x0 ficou barato para quem simplesmente não sabe até hoje o que aconteceu. Gaúcho passou pela mesma experiência que outro representante do atraso teve em 2011 no Mundial de Clubes. Oito anos depois, Muricy Ramalho ainda tenta compreender o que se passou naquele Santos 0x4 Barcelona, cujos números teriam sido bem mais acachapantes caso os catalães não se mostrassem piedosos.

Os comentaristas esportivos brasileiros são tais quais os econômicos: vivem para omitir e induzir opinião e, impossibilitados de camuflar a realidade decadente do futebol nacional, abraçam-se ao argumento miserável de que o futebol é universal e, por isso, não importa muito a origem de Jorge Jesus, mas sim suas ideias. 

Curioso que não haja técnicos bons de origem saudita ou indiana! Talvez a genialidade não tenha batido à porta por lá... 

Na realidade, posso dizer tranquilamente que o jogo deste sábado, 23/11, foi o primeiro desafio verdadeiro de Jorge Jesus no Flamengo. Enfrentou outro grande treinador, o qual embora não venha da escola europeia, está num país onde o futebol sul-americano ainda respira. 

Gallardo é um técnico de nível excepcional e até mesmo superior a Jorge Jesus. Montou um belo esquema tático e consegui neutralizar o time carioca durante boa parte do jogo. 

Melhor resposta ele daria depois no campo
Soube aproveitar bem o nervosismo da equipe rubro-negra, sobretudo no primeiro tempo, mas acabou falhando no fim, por excesso de preciosismo e por terem faltado pernas a seus jogadores, os quais possuem uma média de idade um pouco superior à dos flamenguistas. 

No entanto, Gallardo e Jesus fizeram um jogo memorável, não do ponto de vista do espetáculo, mas do ponto de vista técnico. Jesus ganhou no detalhe e na sorte. 

O próximo desafio para Jesus é o Mundial de Clubes. Chegar à final e enfrentar o Liverpool. Será quando, em definitivo, teremos noção de quão bem estruturado tecnicamente está o time do técnico português. 

Para mim, a maior contribuição desta equipe do Flamengo é desnudar a mediocridade do futebol brasileiro. 

Fez bem a direção rubro-negra em trazer o português para cá e tomara que isto incentive outros clubes a fazerem o mesmo. A própria direção da CBF, se fosse esperta, seguiria pelo mesmo caminho e daria um jeito de arranjar um técnico europeu de primeira grandeza para o lugar do mediano Tite. 

Porém, apenas isto não é o bastante. É preciso reconstruir o futebol nacional, valorizar os clubes pequenos, corrigir distorções nos campeonatos, trazer de volta o povão para os estádios, acabar com o monopólio da Rede Globo sobre o esporte e pôr fim à prática de sermos exportadores de pé-de-obra. Isto, no entanto, é algo radical demais e complexo demais para os limites da nossa burguesia colonial. 

O futuro do futebol brasileiro, de resto como da sociedade em geral, parece depender do futuro da revolução brasileira. Por enquanto, o Flamengo nos dá um alívio momentâneo. Até quando? – eis a grande pergunta. (por David Emanuel de Souza Coelho)

3 comentários:

Anônimo disse...

Boa noite Celso, tudo bem?!

Como Rubro negro, me orgulha ( e me emocionou ), não apenas os últimos minutos de jogo, como também as reverências e patamar que começa a serem recuperados, por um um time tão potente e imponente como Marca Esportiva, e tão maltratado por péssimas administrações nas últimas décadas porém, sem me esquecer um só dia como contraste, a infeliz tragédia na qual não se toca, a não ser como forma de provocação hipócrita de torcedores de outros clubes e demagogos, infelizmente.
Uma mancha na administração atual.
Somente gente mais séria dentro do jornalismo ( a exemplo de Mauro Cezar Pereira ), tocam no assunto, e cobram.
Ouvi do jornalista Maurício Menezes, que o presidente alega que por exigência das famílias ( que moram em áreas de risco e por temer aproximação de pessoas alheias ao vítimas ), o acordo corre em segredo.
Este fato junto ao lamentável ato de demagogia típica da velha politicagem ( a mesma que engrossa o caldo de administração de policiais despreparados ), rechaçada por Gabriel Barbosa, são os pontos negativos da conquista.

Pois é, Nada é perfeito, não é verdade?!

Parabéns ao David Emanuel de Souza Coelho pela crônica,
e forte abraço do Hebert.

celsolungaretti disse...

Anônimo,

a morte dos meninos do Ninho do Urubu foi um acontecimento que ainda me chocou, depois de tanto tempo constatando o desprezo pela vida humana por parte do capitalismo brasileiro.

Aliás, os valores ínfimos das indenizações geralmente pagas aos pobres nesses casos são um acinte, uma vergonha.

Um amigo judeu, já falecido, certa vez me contou quanto sua família recebeu da Alemanha por causa do assassinato de um dos seus durante o Holocausto. Era um valor bem elevado.

Incrivelmente, um vizinho francês que havia sido paraquedista durante a Guerra da Argélia, quando sua unidade era afamada torturadora, décadas depois foi chamado a Paris para receber uma bolada por causa das sequelas psicológicas que participar daquelas práticas desumanas pudessem ter-lhe causado.

Daí eu especificar acima: o capitalismo BRASILEIRO é um dos piores do mundo, outros países capitalistas não tratam com tamanho desprezo as suas vítimas.

Então, depois da ditadura, enquanto me virava bem como jornalista, não movi uma palha para receber qualquer indenização. Afinal, não fora para isso que eu enfrentara os nazistas daqui.

Mas, aos 50 anos tomei a decisão de ser pai biológico (objetivo que não perseguira antes por força da vida agitada que levava) e isto deixou minhas minhas finanças em parafuso, quando a idade já começava a me prejudicar no mercado de trabalho.

Então, com uma companheira grávida e meu emprego em sério risco, um advogado que, por solidariedade, me ajudava a segurar a onda naquela fase complicada avisou-me que o FHC havia instituído o programa de reparações a sobreviventes da ditadura.

A situação financeira dramática que eu estava passando me fez reavaliar a questão: já que assumira a responsabilidade de engravidar uma moça, não tinha mais direito de recusar aquele direito que, no meu caso, era líquido e certo, pois saíra dos cárceres da prisão com uma lesão permanente e sofrendo enormes danos morais, psicológicos e profissionais.

Acabei conseguindo, a duras penas, uma pensão vitalícia que acabaram me concedendo porque eu andava colocando em xeque várias irregularidades e favorecimentos do programa. Na verdade, a primeira fase se destinava aos "amigos do rei" e, atendidos estes, os valores concedidos foram reduzidos a um terço ou um quarto dos iniciais.

(continua)

celsolungaretti disse...

(continuação)

Ou seja, por estar desempregado e desesperado, acabei fazendo muito barulho e furando a fila, daí ter recebido valores pelo menos aceitáveis. Quem esperou pacientemente enquanto eles organizavam tudo do jeito que queriam, foi muito prejudicado. Os beneficiários de sempre das "boquinhas" reservaram para si todas as regalias.

E se vingariam de mim depois, ao embaçarem de tudo que é jeito o pagamento da indenização retroativa que a Comissão de Anistia também me concedeu, por ter sido triturado em 1970 e só recebido a primeira quantia indenizatória em janeiro de 2006, 35 anos depois! Até hoje não recebi tal retroativo.

Contar com ele porque as normas do programa estabeleciam que deveria ser pago em 60 dias (!!!) e a União não honrou sua responsabilidade nem depois de eu obter vitória total no julgamento de mérito e de três embargos de declaração por parte do STJ e num julgamento genérico do STF: foi isto que acabou complicando tanto minhas finanças e arruinando meu segundo casamento.

E hoje, claro, a administração dos inimigos continua prejudicando a mim e aos anistiados políticos em geral tanto quanto pode e até em detalhes que não pode, mas faz do mesmo jeito.

Mas, foram os "muy amigos" dos governos do PT, que deixaram a situação chegar a tal ponto, ao utilizarem de todas as manobras protelatórias possíveis e imagináveis contra mim. O PT trata muito pior a seus adversários pertencentes ao campo da esquerda do que aos inimigos de classe. Se eu me chamasse Maluf ou Sarney, certamente já estaria tudo resolvido.

Afora o fato de que, antes mesmo de ser instituído um programa governamental de reparações, alguns deles foram à Justiça Comum para obterem isoladamente suas pensões e/ou indenizações. E não exatamente os que tinham sofrido maiores horrores nas garras da ditadura.

Isto tudo estava atravessado na minha garganta e queria deixar registrado em algum lugar (mas sem muito destaque, para não fornecer munição à direita), enquanto ainda estou vivo. É o que acabo de fazer. (Celso)

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