NAS RUAS PARA QUÊ?
"o domingo de manifestação virou o dia do lazer bolsonarista" |
Uma vez por mês, cidadãos vestidos de verde e amarelo, aguerridos defensores do governo Bolsonaro, caminham pela avenida Paulista, ouvem uns discursos, gritam algumas palavras de ordem e voltam para casa.
A cada reedição, o número e a garra dos participantes parecem diminuir um pouco. É essa a grande estratégia do governo?
Moro sem dúvida agradece essa mostra de popularidade, mas não é como se ela trouxesse alguma novidade. Seus apoiadores agora estão estritamente circunscritos ao bolsonarismo. E é nessa condição de fiel escudeiro do Mito e nada mais que ele deve continuar ministro. Fora do governo, os protestos estão se tornando irrelevantes.
A ideia era que Bolsonaro não precisava negociar com o Congresso porque a força da pressão popular sobre os parlamentares os obrigaria a seguir as ordens do Executivo. Na prática, contudo, o Congresso vê os manifestantes entoando cantigas de amor ao presidente e seus ministros e não sente medo nenhum. Não vemos nas ruas as multidões a perder de vista.
Não seria parcialidade, retrocesso e pibinho? |
E como elas não apresentam grandes riscos de partir para a violência, invadir o Congresso, parar a cidade (até o dia dos atos é escolhido para não interferir no trânsito) ou algo do tipo, perdem o potencial intimidatório. O domingo de manifestação virou o dia do lazer bolsonarista.
Assim, deputados e senadores sentem-se à vontade para inviabilizar o decreto que liberava o porte de armas, propõem mudanças várias à reforma da Previdência sem se pautar pelo número mágico do R$ 1 trilhão em dez anos e já se preparam para tocar uma agenda econômica própria assim que a página da Previdência tenha sido virada.
E ao fazê-lo criarão uma situação difícil para a militância bolsonarista: se o Congresso toma a dianteira nas reformas econômicas do Brasil, o governo não poderá acusá-lo de sabotar seu trabalho.
A pressão popular, para ter algum efeito, precisa ser rara e impactante. E ela o será tanto mais quanto mais parecer que o Congresso —para defender interesses próprios— se coloca contra mudanças importantes do país. Se ele for o motor dessa mudança, a grande crítica do bolsonarismo à velha política estará desarmada.
A kriptonita do Intercept o reduziu a piada |
O governo terá três opções. A primeira é aceitar um papel menos importante, apostar na recuperação econômica que o Congresso trará e colher os frutos eleitorais disso.
A segunda é continuar apostando no embate e tentar sabotar as iniciativas do Congresso (como a reforma tributária); mas transformar essa jogada pelo poder em alguma narrativa virtuosa que convença a opinião pública será difícil.
E a terceira é correr atrás do prejuízo e fazer o trabalho que deveria estar fazendo, com menos conflitos, menos bravatas e mais discussão de projetos.
A cada nova intriga que vaza para a mídia, a cada nova humilhação pública e demissão sumária imposta a um ministro ou funcionário do alto escalão (como no caso de Joaquim Levy e do general Santos Cruz), o governo perde a confiança e a boa fé de todos aqueles que poderiam colaborar com ele, tornando mais difícil fazer um trabalho sério.
Os domingueiros de verde-amarelo gostam, festejam cada novo ato intempestivo do Mito. Mas a ideia de que eles possam carregar o governo nas costas nunca pareceu tão distante. (por Joel Pinheiro da Fonseca)
Nenhum comentário:
Postar um comentário